Acórdão nº 133/22.2 BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-10-26

Ano2023
Número Acordão133/22.2 BELLE
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO
J....... instaurou providência cautelar contra o Município de Monchique, na qual peticiona a suspensão de eficácia do ato datado de 02/12/2021, que modificou unilateralmente o contrato de pré-reforma celebrado com o requerente, determinando que se procedesse à correção do valor da prestação em situação de pré-reforma, tendo por base a remuneração de referência correspondente à 6ª posição da carreira de assistente técnico e ao inerente 11º nível da tabela remuneratória única.
Por decisão de 12/04/2022, o TAF de Loulé recusou a adoção da providência cautelar requerida.
Inconformado, o requerente interpôs recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões (aperfeiçoadas) que seguidamente se transcrevem:
“I. A sentença ora sob recurso padece de uma manifesta insuficiência da decisão de facto, por ausência de juízos probatórios concretamente formulados.
II. Com efeito, quando a Senhora Juiz do a quo diz que vai versar a “fundamentação de facto”, limita-se a “declarar quais os factos que julga provados e quais os factos que julga não provados”,
III. Omitindo tudo o mais que previsto se acha, sobre a fundamentação da matéria de facto, no art. 607º do NCPC,
IV. Mormente, e como dizem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (in CPC anotado, vol. 2º, pág. 704, 3ª edição, Almedina, 2017), a “decisão sobre os factos sujeitos à livre apreciação judicial”, “analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais (e) especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção” e “extraindo dos factos apurados as presunções impostas (…) por regras de experiência”, “segundo a sua prudente convicção” (1ª parte dos nºs 4 e 5); considera plenamente provados “os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito” e extrai do conjunto dos factos apurados, de modo coerente (“assim compatibilizando toda a matéria de facto adquirida”), “as presunções impostas pela lei” (2ª parte dos nºs 4 e 5), determina as normas jurídicas aplicáveis, interpreta-as e aplica-as (nº3)”.
V. Ora, o modus operandi da Senhora Juiz, impede o recorrente de cumprir, nesta sede, o disposto no art. 640º do NCPC.
VI. Requer-se, por isso, e desde já, que com as necessárias consequências (al. c)-parte final, do nº2 do art. 662º do NCPC), V. Exas., Mmos. Juízes Desembargadores, reconheçam o vício de insuficiência da decisão de facto,
VII. Tudo, aliás, de acordo com quanto se decidiu no Ac. do STJ de 22/3/2918, tirado no proc. nº 290/12.6TCFUN.L1.S1, relatado por Tomé Gomes, em especial nas suas três primeiras súmulas, onde se lê:
I. O vício de insuficiência da decisão de facto é equacionável com base no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), parte final, do CPC, sendo de conhecimento oficioso e suscetível de implicar a ampliação daquela decisão, pelo que a sua eventual invocação pelo apelante não está sujeita aos requisitos impugnativos prescritos no artigo 640.º, n.º 1, do mesmo Código, os quais só condicionam a admissibilidade da impugnação, com fundamento em erro de julgamento, dos juízos probatórios concretamente formulados .
II. A natureza e estrutura da decisão de facto, bem como a economia da sua sindicância pelo tribunal ad quem, justificam o ónus, por banda do impugnante, de delimitar com precisão o objeto do recurso e o sentido da pretensão recursória nesse particular.
III. Assim, os requisitos formais de admissibilidade da impugnação da decisão de facto, mormente os constantes do artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) e c), do CPC, têm em vista, no essencial, garantir uma adequada inteligibilidade do objeto e alcance teleológico da pretensão recursória, de forma a proporcionar o contraditório esclarecido da contraparte e a circunscrever o perímetro do exercício do poder de cognição pelo tribunal de recurso.
B)
VIII. No vertente caso, a Senhora Juiz do a quo prescindiu da audiência final, sem qualquer aviso prévio, e consequente convite para o exercício do contraditório (art. 3º/1, 3 e 4 do NCPC), ainda que apenas em sede de audiência de julgamento, uma vez que também prescindiu do julgamento.
IX. Ora, como a requerida/recorrida se defendeu também por excepção, embora nunca o tenha expressamente admitido, como era seu dever, temos de concluir pelo não exercício do contraditório por parte do requerente/recorrente, já que a Senhora Juiz, numa decisão a todos os títulos surpreendente, tirou de pronto sentença a favor do recorrido.
X. Decidiu-se, nas súmulas I e IV do Ac. RL de 17/9/2019, tirado no proc. nº 29624/13.4T2SNT-W.L1-1.dgsi.Net, “não ser licito, ao juiz, pronunciar-se sobre questões, sem que as partes tenham tido a oportunidade de sobre elas se pronunciarem (...),pelo que, “nestes casos, antes de decidir, o juiz deve possibilitar ao réu (…) a possibilidade de se pronunciar (...)”.
XI. Sendo que, “o que se quis impedir, com o princípio do contraditório consagrado no art. 3º, nº3, do CPC, foi que, a coberto do princípio “jus novit curia”, emergente do art. 5º, nº3, , e do princípio da oficiosidade no conhecimento da generalidade das excepções dilatórias e das excepções peremptórias, (…), as partes fossem confrontadas com soluções jurídicas inesperadas, por não terem sido objecto de discussão no processo (súmula I do Ac. STJ de 19/12/2018, in proc. nº543/05.OTBNZR.C1.S1: dgsi.Net).
XII. “Consequentemente, tendo-se omitido o convite às partes para aquele efeito (exercício do contraditório), foi cometida nulidade, a apreciar nos termos gerais do art. 195º” (idem, súmula VI), “(…) com a consequente anulação da sentença subsequente a essa omissão” (cfr. a súmula I do Ac. RG de 17/12/2918, in proc. 216/16:dgsi.Net), por se tratar de uma “decisão surpresa” (cfr. o Ac. RG de 31/10/2018, in proc. 1101/15.6T8PVZ-C.G1.:dgsi.Net).
XIII. Devem, por isso, V. Exas., Mmos. Juízes Desembargadores, declarar esta nulidade processual (decisão final surpresa, já que sem prévia audição sobre as excepções), com todas as legais consequências, como seja a anulação de todo o processo.
C)
XIV. O objectivo desta providência cautelar, consiste em saber se, o Senhor “Vice-Presidente” da Câmara Municipal de Monchique, detinha ou não competência para tirar decisão a alterar unilateralmente, como tirou, o contrato de pré-refoma assinado pelo ora recorrente e a edilidade, então representada pelo seu anterior presidente,
XV. E se tendo-a, se a mesma cobria os poderes necessários para, por si só, desencadear, instruir e decidir, o competente procedimento, como deveras fez,
XVI. E, finalmente, se - como também fez - podia postergar a audiência prévia do requerente,
XVII. Tudo com o único fito de, embora com o carácter precário próprio das providências cautelares, aplicar ao vertente caso, o linimento adequado a evitar mais prejuízos ao requerente/recorrente, até que uma decisão definitiva seja tomada em sede dos autos principais.
XVIII. A este propósito, e em sede de prova do fumus boni juris, o requerente começou a sua PI a chamar a atenção do tribunal a quo para a publicação extemporânea e desprovida das “menções obrigatórias” previstas no art. 151º do CPA, do despacho de delegação de poderes do novel Presidente no seu Vice-Presidente,
XIX. O que violava o disposto nos arts. 47º/1 e 2, 151º e 159º do CPA,
XX. Tornando o acto de delegação pelo menos inválido,
XXI. Isto se não fosse mesmo de haver-se por inexistente,
XXII. Já que, como ensina Cabral de Moncada, tal é a sanção, quando a falta diz respeito a menções como o “conteúdo, o objecto e a forma da mesma delegação de competências (apud Cabral de Moncada, in CPA anotado, págs. 474/475, 2ª edição, Quid Juris, 2017),
XXIII. Coisa que aqui ocorreu, visto, como se disse, inexistirem, de todo, as “menções obrigatórias”: aquelas e as demais!
XXIV. Ora se, no caso sub-judicio os avisos respeitantes, quer ao despacho de nomeação do vice-presidente, quer o despacho de delegação de poderes neste, foram publicados em, respetivamente, 8/2/22 e 9/2/22 (“factos provados W e X” e confissão exarada no artigo43 da Oposição),
XXV. E se estes mesmos despachos haviam já sido prolatados, pelo Presidente da Câmara em, respectivamente, 11/10/21 e 14/10/21 (“factos provados K e L”),
XXVI. E convertidos em “avisos” em 12/10/21 e 15/10/21,
XXVII. Facto que a Senhora Juiz não levou em devida conta, pese embora ter sido expressamente confessado pelo Requerido/Recorrido, nos artigos 40 e 41 da Oposição,
XXVIII. Mas que tem agora de ser devidamente valorado por V. Exas., Mmos. Juízes Desembargadores,
XXIX. Então, tem de concluir-se que: os “avisos” extraídos daqueles dois despachos, chegaram à Imprensa Nacional, para publicação no DR, cerca de 4 meses depois da sua emissão,
XXX. E 3 meses depois dos 30 dias de prazo máximo, previstos no art. 159º do CPA, para que a sua publicação seja havida por eficaz,
XXXI. Sendo por isso publicados, como se disse, só em 8/2/22 e 9/2/22.
XXXII. Ora, este facto da extemporaneidade da publicação, aliado a este outro de, da leitura dos “avisos”, se retirar que as “menções obrigatórias” previstas no art. 159º do CPA estavam ali em falta,
XXXIII. Tornam ineficaz, em relação ao requerente, a decisão de alteração do seu contrato de pré-reforma pelo Vice-Presidente da Câmara, atenta a sua incompetência para tal,
XXXIV. Como ferem de ineficácia todos os actos pelo mesmo praticado ao longo de todo o procedimento,
XXXV. Começando no acto administraivo que o desencadeou.
XXXVI. É certo que, nos aludidos “aviso” se acha exarado acharem-se, os mesmos, já publicados “no site oficial do município”.
XXXVII. Ora, ainda que isso fosse verdade, que não era, como o recorrente teve ocasião de alegar e demonstrar nos artigos 261 a 264 da PI que pede vénia para aqui dar por inteiramente reproduzidos, e com a junção...

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