Acórdão nº 1303/22.9T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-20

Ano2024
Número Acordão1303/22.9T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 1303/22.9T8PRT.P1

Comarca: [Juízo Local Cível do Porto (J2); Comarca do Porto]

Juíza Desembargadora Relatora: Lina Castro Baptista

Juíza Desembargadora Adjunta: Márcia Portela

Juiz Desembargador Adjunto: Rodrigues Pires

Sumário

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Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I - RELATÓRIO

O CONDOMÍNIO ..., sito na Rua ..., Porto, representado pela sua administração “A..., Lda.”, sociedade com sede no ..., Rua ..., n.º ..., fração ..., Vila Nova de Gaia, intentaram a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra AA, residente na Rua ..., n.º ..., 1.º Dto., ..., Loulé, pedindo a condenação do Réu a:

A. Proceder à retirada dos placards publicitários colocados na fachada do Edifício ..., ....

B. Proceder à eliminação dos defeitos denunciados causados pela colocação de tais placards na fachada do edifício assegurando a impermeabilização do edifício.

C. Proceder à eliminação dos defeitos denunciados causados pela colocação do totem na zona de logradouro do edifício assegurando a impermeabilização das garagens da subcave.

D. Alternativamente, deverá o Réu pagar-lhe uma indemnização para efetuar a reparação/eliminação dos defeitos descritos nos pontos anteriores, em montante que vier a ser apurado, mas nunca inferior a € 11.000,00 (onze mil euros).

E. Pagar uma indemnização pelos danos acusados de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros).

Alega, em síntese, ser o condomínio do prédio em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ..., ..., freguesia ..., concelho do Porto.

Declara que a Assembleia de Condóminos dotou a sociedade sua administradora de poderes para constituir mandatário para a matéria dos presentes autos, conforme Ata da Assembleia de Condóminos junta.

Afirma, por outro lado, que o Réu é condómino, por ser titular da fração autónoma B no referido edifício.

Alega que o Réu, procedeu, sem autorização da assembleia de condóminos, à colocação de dois painéis publicitários relativos ao estabelecimento comercial “B...”, tendo colocado um na fachada do edifício e um outro na zona comum de logradouro/passeio.

Diz que tais intervenções foram efetuadas à revelia dos demais condóminos e violam a estética do edifício.

Defende que a colocação de qualquer reclame publicitário, totem, reclame luminoso ou qualquer outro meio de publicidade teria que ser devida e expressamente autorizados pela assembleia de condóminos e tal deliberação constar do teor da respetiva Ata.

Alega igualmente que a colocação do totem publicitário no local onde se encontra causou infiltrações nas garagens do edifício, que o condomínio teve de suportar.

Afirma que, na falta desta reparação, terá ele que proceder à reparação dos danos causados, o que implica a montagem de andaimes para a reparação da fachada e os materiais de revestimento necessários, bem como a reparação do piso e colocação da tela que foi perfurada com a colocação e fixação do Totem ao solo, sendo o valor estimado para esta intervenção de 11.000€ (onze mil euros), a que acresce a indemnização pelos danos causados aos condóminos e ao condomínio, a fixar de acordo com a livre convicção do tribunal, num valor nunca inferior a 2500€ (dois mil e quinhentos euros).

Alega finalmente ter notificado o Réu para proceder à remoção dos respetivos equipamentos publicitários, através de notificação enviada através da sua mandatária, cujo teor o Réu ignorou.

Advoga que a atuação do Réu constitui um claro abuso de direito, nos termos do art.º 334º do Código Civil[1], e consiste no exercício ilegítimo de um direito porquanto o titular excedeu manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito enquanto condómino ao impor aos restantes condóminos tais painéis.

O Réu veio contestar, excecionando que adquiriu a fração autónoma designada pela letra “B” em causa nestes autos em finais de 1997, sendo que era arrendatário da mesma desde 1995, usando o espaço para stand de automóveis.

Diz que tal fração autónoma havia sido ocupada anteriormente no mesmo ramo de atividade pela “C...” na década de 1970 e pela “D...”, a partir da década de 1980.

Alega que, na década de 1970, a “C...” colocou no local dois reclamos publicitários, sendo um na fachada do edifício e outro (totem) no espaço situado entre a loja e o passeio da rua, o que sucedeu com o conhecimento e consentimento de todos os condóminos do prédio em apreço.

Declara que as respetivas estruturas se encontram no mesmo local desde essa altura, apenas sendo alterada a publicidade aposta nos mesmo, feita às entidades que foram ocupando a loja, para o que basta desaparafusar a publicidade anterior e aparafusar a seguinte, não sendo realizada, para o efeito, qualquer operação na fachada do edifício onde se encontra um dos reclamos ou no murete existente no espaço situado em frente à loja onde se encontra o outro.

Defende que, há mais de 40 anos, que tais reclamos publicitários existem no local, com o conhecimento e consentimento dos condóminos e sem a oposição de quem quer que seja, sem prejudicar quem quer que seja nem a estética do edifício.

Mais defende que, independentemente do consentimento dado à colocação de tais reclamos pelos então proprietários das diversas frações autónomas, os condóminos do prédio em apreço, ao longo de mais de 20, 30 e 40 anos, permitiram que os mesmos se mantivessem onde estão, criandoa si e a quem o antecedeu na propriedade da indicada fração autónoma a convicção de que nada fariam no sentido de alterar essa situação.

Concretiza que os condóminos do prédio em questão reiteraram a sua autorização para a manutenção do reclamo publicitário existente na fachada do edifício através de deliberação tomada na assembleia de condóminos que decorreu no dia 29 de maio de 2019.

Advoga que, caso o Autor tivesse o direito de exigir a retirada dos referidos reclamos, sempre o exercício do mesmo, face às circunstâncias mencionadas supra, seria ilegítimo, por exceder os limites impostos pela boa fé e pelos fins económico e social desse direito.

Impugna a factualidade atinente a danos alegadamente causados com a sua atuação.

Remata pedindo que a presente ação seja julgada totalmente improcedente, por não provada, com as legais consequências.

Proferiu-se despacho saneador e dispensou-se a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos Temas da Prova.

Realizou-se julgamento de acordo com o legal formalismo e proferiu-se sentença, com a seguinte parte decisória: “Por todo o exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência condeno o Réu, AA, a proceder à retirada dos placards publicitários colocados na fachada do edifício ..., ....

Absolvo o Réu do demais peticionado pelo Autor.

Custas por Autor e Réu na proporção de metade para cada.”

Inconformado com o julgado, o Réu apresentou o presente recurso, terminando com as seguintes

CONCLUSÕES:

1. No caso dos autos não está em causa a realização de nenhuma obra que constitua uma inovação, já que essa suposta inovação, constituída pela estrutura metálica colocada na fachada do edifício que serve de suporte às placas publicitárias, existe há cerca de 40 anos no local (facto 16 dado como provado).

2. Daí que não seja aplicável ao caso dos autos, como se considerou na, aliás, douta sentença recorrida, o vertido no art. 1425º nº 1 CC nem seja necessária para o que está em causa nos presentes autos qualquer deliberação da assembleia geral aprovada por condóminos que representem dois terços do prédio.

3. O Recorrente apenas quer usar essa “inovação” efetuada há mais de 40 anos, isto é, usar as estruturas que, como foi dado como provado (ponto 12), se encontram “no mesmo local desde essa altura, tendo sido (apenas) alterada a publicidade aposta nos mesmo feita às entidades que foram ocupando a loja”.

4. Isto posto, nos termos do art. 1406º nº 1 CC, aplicável ex vi art. 1422º nº 1 CC, “na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito”.

5. Ao colocar a publicidade ao estabelecimento instalado na sua fração autónoma na parte da fachada adstrita à mesma, o Recorrente limita-se a fazer um uso lícito de uma zona comum, uso esse com o qual não priva nenhum dos demais condóminos do uso que igualmente têm direito a fazer da mesma zona comum, tanto assim que “existem reclamos na fachada do edifício, por cima da outra loja existente no prédio e por cima da entrada da garagem” (facto 17 dado como provado).

6. Daí que, mesmo sem qualquer deliberação da assembleia de condóminos, o Recorrente tivesse direito a usar, como vem usando, a zona comum em apreço para a colocação dos placards publicitários em questão.

7. Mas, acresce, essa deliberação existe, pois na assembleia de condóminos realizada em 29.5.2019 - única em que se debateu o tema – foi deliberada por maioria dos votos “a permanência da pala publicitária “E...” na fachada principal do edifício ..., ...” (facto 19 dado como provado), sendo que E... e B... (nome que consta dos painéis publicitários existentes no local – facto 4 dado como provado) são a mesma entidade (facto 10 dado como provado).

8. Tal deliberação, a que respeita a ata junta com a contestação, apenas carecia da maioria dos votos – art. 1432º nº 4 e 1429º-A CC.

9. Sem prescindir, atendendo a que, “em data que em concreto não foi possível apurar das décadas de 70/80 foram colocados no local dois reclamos publicitários, sendo um na fachada do edifício e outro (totem) no espaço situado entre a loja e o passeio da rua” (facto 11 dado como provado), “as estruturas encontram-se no mesmo local...

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