Acórdão nº 127/12.6BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-12-19

Ano2023
Número Acordão127/12.6BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I – R………….- Sociedade ………………, S.A., recorre para este Tribunal da sentença da M.ª Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial que deduziu contra o indeferimento do recurso hierárquico interposto da decisão de improcedência da reclamação graciosa apresentada contra o acto de liquidação do IRC do exercício de 2005, pretendendo a sua revogação.

Nas suas alegações de recurso formula as conclusões seguintes:
1ª) O custo incorrido pela recorrente e que não foi aceite, fiscalmente, pela Administração Tributária foi gerado na alienação de créditos;
2ª) Tal custo foi gerado pela diferença entre o valor nominal dos créditos e o valor pelo qual eles foram cedidos;
3ª) Ao invés do defendido pela Administração Tributária, a essa situação não é aplicável o regime previsto no artº 39º do Código do IRC;
4ª) Na verdade, não está em causa qualquer situação de incobrabilidade de créditos, na medida em que, o que ocorreu, foi a alienação de um activo, concretamente, do crédito em causa;
5ª) Os créditos são alienáveis, como alienáveis são outros activos, sendo que, como noutros activos, a diferença negativa entre o preço de aquisição/realização do crédito (o seu valor nominal) e o preço de venda desse mesmo crédito, é um custo fiscalmente relevante, nos termos do artº 23º do CIRC;
6ª) A invocação feita pela Administração Tributária, e sufragada pela douta sentença recorrida, de que o custo em causa não pode ser aceite fiscalmente por não ser indispensável à obtenção de proveitos ou à manutenção da fonte produtora, consubstancia uma errada interpretação do referido critério;
7ª) É que tem a jurisprudência firmado um entendimento de que só não são aceites, fiscalmente, como custos os incorridos para a prossecução de interesses alheios ao da sociedade;
8ª) Ora, a alienação de um activo, seja ela um imóvel, uma participação social, ou um crédito, é uma normal actividade que se insere no interesse próprio da recorrente;
9ª) Havendo estudos independentes demonstrando a total, ou quase total inviabilidade no pagamento da dívida, em face da situação económico-financeira da devedora, óbvio é que o activo em causa – o crédito – deixou de ter valor relevante;
10ª) Não fazia, assim, sentido, no plano de uma gestão racional, a recorrente manter na sua titularidade esse activo degradado;
11ª) Como tem assinalado a doutrina, o perdão de uma dívida é custo fiscal, quanto mais não seja por adesão aos princípios da capacidade contributiva e da tributação pelo rendimento líquido;
12ª) Ora, no caso da recorrente, nem sequer estamos perante um perdão de dívida, mas sim a alienação de um crédito por um preço que gerou um custo;
13ª) Também a doutrina tem assinalado que em situações de alienação de créditos por preço inferior ao seu valor nominal, a não aceitação como custo só é possível se a Administração Tributária fizer prova de que se está perante um negócio jurídico artificioso e fraudulento, ou demonstrando que a devedora tinha capacidade para pagar a sua dívida;
14ª) Ora, não só tal prova não foi feita, como é indiscutível a incapacidade da devedora de fazer face aos seus compromissos;
15ª) O custo em causa cumpre, assim, os requisitos da sua aceitabilidade fiscal estabelecidos no artº 23º do CIRC.

Não houve contra-alegações.

O Digno Magistrado do Ministério Público, junto deste Tribunal, emitiu douto parecer de fls. 164 a 169 dos autos, no sentido da improcedência do presente recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


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II.1. Fundamentação de facto
II - A sentença recorrida deu como assentes os seguintes factos:

A) A Impugnante exerce a actividade de sociedade gestora de participações sociais não financeiras, no âmbito da CAE 64202, sendo a sociedade dominante do grupo, estando sujeita ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (cfr. fls. relatório da IT, a fls. 50 e ss do processo de recurso hierárquico apenso).
B) A impugnante foi objecto de uma acção de inspecção, em sede de IRC, no âmbito da qual foram efectuadas correcções à matéria colectável, de natureza meramente aritmética resultante de imposição legal, ao exercício de 2005, no montante de 8.063.647,71€ (item III.3 do relatório), ajustamento dos prejuízos fiscais no montante de 13.507,95€ (item III.1 do relatório), e apuramento de imposto em falta no montante de 1.092,72€ (item III.2 do relatório) - (cfr. relatório de inspecção, a fls. 51 do processo de recurso hierárquico apenso).
C) As correcções mencionadas na alínea anterior foram efectuadas com o seguinte fundamento, que aqui se transcreve, em síntese, na parte com interesse para a decisão (cfr. relatório de inspecção tributária, a fls. 55 e ss. do processo recurso hierárquico apenso, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido):
III - 1.2 - De correcções efectuadas à sociedade dominante R................ SGPS - Anulação de saldos (artigo 23.0 CIRC)
O sujeito passivo registou nas suas contas individuais um custo fiscal no montante de €7.032.313,93 através de um débito contabilizado na conta poc# 7988 - Outros não especificados, conforme documento OD0512/0026, que se junta em Anexo 2 - 2 folhas, tendo como contrapartida diversas contas de terceiros com a seguinte descrição: Anulação de saldos. Tendo sido notificado, através do nosso ofício 488 no dia 2009/02/23, para que, no prazo de 10 dias, remetesse a esta Direcção de Serviços os seguintes elementos ou esclarecimentos:
Relativamente ao débito registado na conta poc#7988 pelo montante de €7.032.313,93 (ODO512/0026 - anul saldos), de forma a comprovar a dedutibilidade fiscal do custo é necessário:
1. Identificar os movimentos contabilísticos registados na contabilidade, designadamente nas contas poc# 2529301, 2529302 e 2689114, ocorridos no exercício de 2005 ou em exercícios anteriores, que concorreram para o registo a débito na conta poc# 7988 do montante de €7.032.313,93;
2. Qualificar quanto a natureza cada um dos movimentos registados no ponto anterior, juntar cópia do registo contabilístico bem como cópia da documentação que permite qualificar a sua natureza;
3. Justificar a racionalidade económico fiscal do débito efectuado na conta poc#7988.
Até à presente data ainda não foram disponibilizados os elementos ou esclarecimentos solicitados, pelo que foi levantado o respectivo Auto de Notícia.
O artigo 23.0 do CIRC estipula que, só se consideram custos do exercício, os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Atento o facto de não ter sido disponibilizado quaisquer elementos ou esclarecimentos que nos permitissem qualificar a natureza do débito, para além do descritivo: Anulação de saldos, registada no montante de €7.032.313,93 (sete milhões trinta e dois mil trezentos e treze euros e noventa e três cêntimos), não ficou comprovada a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora nos termos do n.º 1 do artigo 23.0 do CIRC.
Sem prejuízo da análise aos elementos que venham a ser disponibilizados pelo sujeito passivo que contribuam para a formação da decisão no âmbito do exercício do direito de audição previsto nos artigos 60.0 da LGT e 60.0 do RCPIT, a inspecção tributária tem a referir o seguinte:
O Código do IRC submete os diversos custos contabilizados a um processo de "sifting" composto por duas fases.
1.ª - fase (artigo 23.0 do CIRC):
Este artigo estabelece a noção de custos admissíveis para efeitos fiscais nos seguintes termos, "Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora." Esta noção tem presente duas condições essenciais: a necessidade de comprovar e a demonstração da indispensabilidade, assumindo a forma de " ( ... ) de uma verdadeira cláusula geral: serão aceites como tal, para efeitos fiscais, os constantes da contabilidade, desde que comprovados e indispensáveis", Quanto à comprovação do custo, a alínea a) do n.º 3 do artigo 115.0 do CIRC estabelece que qualquer registo contabilístico deve estar apoiado num documento justificativo que permita sindicar a substância da operação que deu origem aquele registo. Sobre a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora resulta claro a necessidade de demonstrar a existência de um nexo de causalidade. Neste sentido o acórdão de 26-01-2005 do Supremo Tribunal Administrativo realça a necessidade de existir uma ligação com a actividade das empresas (Ac. STA , Processo 0937/04)
2. - fase (artigos 34.0 a 38.0 e 39.0 do CIRC):
No caso em apreço, se atentarmos no descritivo registado no documento que suporta o lançamento contabilístico "Anulação de saldos" bem como nas contas movimentadas (2529301; 2529302 e 2689103), incluídas na classe 2 - (de terceiros) do Plano Oficial de Contabilidade, resulta que a operação originária se consubstancia no registo de um crédito sobre um terceiro.
Assim sendo, existem duas possibilidades dos créditos serem conformados no resultado fiscal, ou através da constituição de provisões (artigos 34.° a 38.°) ou através dos créditos incobráveis (artigo 39.°).
A constituição de provisões tem como finalidade incluir em custos ou perdas de um determinado exercício uma dotação que de outro modo nele não figuraria, por lhe faltar, logo à partida justificação documental para a respectiva movimentação. Por outro lado, permitem imputar os custos aos exercícios a que se...

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