Acórdão nº 12499/21.7T8LSB.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-03-02

Ano2023
Número Acordão12499/21.7T8LSB.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados

I - RELATÓRIO

AVILUDO - INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE PRODUTOS ALIMENTARES, S.A. intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra COMPROO, LDA. (1.ª Ré) e ZONE SOFT - FABRICO DE PRODUTOS DE SOFTWARE, UNIPESSOAL, LDA. (2.ª Ré), pedindo que fosse declarada ilícita a resolução de contrato efetuada pela 1.ª Ré e que esta fosse condenada a pagar-lhe a quantia de 198.000€, acrescida de juros legais de mora, vencidos e vincendos, sendo os calculados até à propositura da ação no valor de 7.833,21€; subsidiariamente, pediu que fosse declarado nulo o contrato de mútuo celebrado entre a Autora e as Rés, condenando-se a 1.ª Ré a pagar à Autora a quantia de 198.000€, acrescida de juros legais vencidos e vincendos, sendo os calculados até à propositura da ação no valor de 34.674,41€.
Na Petição Inicial, a Autora alegou, para tanto e em síntese, que:
- Celebrou com as Rés um contrato pelo qual a Autora ficava autorizada a utilizar a plataforma informática de compras desenvolvida pela 1.ª Ré com o software desenvolvido pela 2.ª Ré, passando os clientes da Autora (na área da restauração) a adquirir-lhe os produtos através da aludida plataforma, mediante a contrapartida do pagamento de comissões mensais calculadas nos termos do contrato;
- No cumprimento desse contrato, a Autora entregou à 1.ª Ré, ao longo de 12 meses, a título de fee reembolsável pelo uso exclusivo da plataforma, a quantia total de 198.000€;
- A Ré, a pretexto de incumprimento do contrato por parte da Autora, resolveu o mesmo, recusando-se a devolver aquela quantia, apesar de interpelada para o efeito.
As Rés apresentaram Contestação em que se defenderam, invocando a licitude da resolução do contrato, com fundamento no incumprimento do contrato pela Autora, alegando designadamente que esta, no seguimento dos leads gerados pela plataforma Comproo - como sucedeu com o caso dos três clientes que foram aí aceites e fizeram compras (no montante total de 72.349,45€) - desviava os clientes Zone Soft da plataforma da Comproo para a central de compras B2B, que era da própria Autora.
Realizou-se audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador e despacho de identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, os quais foram assim enunciados:
“1 - A equipa comercial da A., constituída por revendedores próprios, divulgou o projeto da plataforma por todo o país, tanto junto de atuais clientes, como de potenciais clientes, por contacto telefónico e pessoal, incluindo a entrega de brochuras (docs. 21 e 22).
2 - Para exponenciar a promoção da plataforma, a A. participou na iniciativa de incentivos adicionais à rede comercial para colocação da solução e angariação de novos clientes, cujo seguimento pertenceu à 1.ª R. (docs. 23 e 24).
3 - A A. explorou uma parceria com o revendedor da 1.ª R. no Algarve, tendo em vista aprofundar a interligação das soluções da 2.ª Ré com a plataforma, propondo a realização de testes de tais soluções com o cliente.
4 - A 1.ª R. omitiu a realização dos testes (docs. 30 e 31).
5 - A A. apostou na angariação de clientes na grande Lisboa, alocando os seus chefes de venda a esta região.
6 - A 1.ª R. omitiu a introdução do “botão Aviludo” no software utilizado pelos clientes, conforme tinha sido acordado entre as partes, mantendo o software com o nome “Comproo”.
7 - Em vez de demorar 6 meses a colocar a plataforma on line, a A. demorou 2 anos (doc. 33).
8 - A A. alterou a sua plataforma de gestão com a plataforma já em funcionamento.
9 - Tal obrigou a 1.ª R. a novos trabalhos de desenvolvimento e teste.
10 - A plataforma tinha erros de funcionamento, que a afetavam continuamente.
11 - A estrutura comercial da A. nada fazia para integrar os clientes da Aviludo (ou mesmo os clientes da ZS que não eram ainda clientes da Aviludo) na plataforma Comproo - em vez de criar o cliente na plataforma, o backoffice da A. desviava o “lead” Comproo para a anterior plataforma, a B2B.
12 - A A. angariou apenas três clientes para a plataforma.
13 - O volume total das compras realizadas pelos três clientes angariados ascendeu a 72.349,45€ (docs. n.º 35 a 37).”
De seguida, realizou-se a audiência de julgamento, tendo sido ouvidas as testemunhas arroladas pelas partes.
Após, foi proferida a sentença recorrida, cujo segmento decisório tem o seguinte teor:
“Pelo exposto, decide-se julgar a ação parcialmente procedente por parcialmente provada, condenando-se a 1.ª R. a pagar à A. €99.000,00.
Custas por A. e R. na proporção da sucumbência (art.º 527.º/1/2 do C.P.C.).
Notifique e registe.”
Tanto a 1.ª Ré como a Autora vieram interpor recurso de apelação da sentença, na parte que lhes foi desfavorável.
A Autora formulou na sua alegação de recurso as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso de apelação interposto da sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Central Cível de Lisboa – Juiz 8, a qual julgou parcialmente procedente a ação intentada pela Autora e, consequentemente, condenou a 1.ª Ré no pagamento à Autora de uma indemnização pela resolução ilícita do contrato celebrado entre as Partes, atribuída equitativamente, no montante total de €99.000,00.
2. Em primeiro lugar, são desde logo evidentes erros-vícios da sentença, nomeadamente, lapsos e omissões escrita, que se consubstanciam em (i) incorreta introdução de uma Parte estranha ao Processo, como Ré, e (ii) omissão de menção expressa aos temas da prova 12 e 13 como provados, apesar de, através da leitura de todo o texto da sentença, ser evidente e indubitável que foram considerados provados pelo tribunal a quo.
3. Em segundo lugar, a sentença sob recurso merece censura, na medida em que, salvo melhor opinião, existe matéria de facto e de direito incorretamente julgada e, concomitantemente, uma incorreta aplicação do Direito,
4. Devendo a mesma ser revogada na parte em que: i) considerou como não provado que a 1.ª Recorrida omitiu a realização dos testes à plataforma; ii) considerou como não provado que a 1.ª Recorrida omitiu a introdução do “botão Aviludo” na plataforma; iii) considerou como não provado que a plataforma tinha erros de funcionamento, que a afetavam continuamente; iv) apesar de ter considerado como provado que em vez de demorar 6 meses a colocar a plataforma on line, a 1.ª Recorrida demorou 2 anos, salientou que a testemunha LF indicou que a Recorrente já estava ciente que o projeto demoraria mais de 6 meses; v) apesar de ter considerado como não provado que a estrutura comercial da Recorrente nada fizesse para integrar os seus clientes ou mesmo os clientes da 2.ª Recorrida na plataforma Comproo, não tendo ficado assente a existência de qualquer desvio dos “leads”, pelo backoffice da Recorrente, para a plataforma B2B, considerou provado que houve comerciais da Recorrente que chamaram a atenção dos clientes para a circunstância de poderem continuar a recorrer à plataforma B2B, para a circunstância de que lhes poderiam continuar a ligar como forma de proceder às encomendas e para a circunstância de que o recurso à nova plataforma poderia ser prejudicial à continuidade do seu trabalho enquanto comerciais da Aviludo; e vi) condenou a 1.ª Recorrida ao pagamento da indemnização com base em juízos de equidade, apesar do prejuízo da Recorrente ser perfeitamente líquido.
5. Quanto ao recurso em matéria de facto, e pelas razões explanadas na sua alegação, entende a Recorrente que foram incorretamente julgados:
i) o tema da prova 4, dado como não provado;
ii) o tema da prova 6, dado como não provado;
e, iii) o tema da prova 10, dado como não provado,
iv) o facto 30 da matéria de facto assente
e v) o facto 31 da matéria de facto assente.
6. Entende a Recorrente que o tema da prova 4 – A 1.ª R. omitiu a realização dos testes – deveria ter sido dado como provado.
7. O tribunal de 1.ª instância entendeu, em primeira linha, que a questão em causa não ficou suficientemente dilucidada nos depoimentos das testemunhas, que não se referiam à mesma realidade, sendo contraditórios, tendo dado a matéria como não assente na ausência de maior circunstanciação.
8. Os testes em causa neste tema da prova 4 tratavam-se, em específico, dos testes relativos ao revendedor da 1.ª Recorrida no Algarve (mencionados no tema da prova 3, dado como provado, e bem, pelo tribunal a quo), como se retira do Despacho-Saneador e da análise dos documentos 30 e 31 juntos com a Petição Inicial
9. Assim, o tribunal a quo deveria, para além dos depoimentos, ter considerado a prova documental junta quanto aos mesmos, a qual não referiu na sua fundamentação, de todo.
10. Quanto aos depoimentos em que o tribunal a quo se alicerçou para a decisão quanto a esta matéria, apenas o depoimento da testemunha AC vertia sobre os testes efetivamente em causa neste tema da prova, ao contrário do que sucedia com a testemunha MA, que nada disse quanto ao tema da prova 4, na verdade.
11. Desta forma, com base na prova documental prestada e no único depoimento que realmente foi prestado sobre o tema, deve ser considerado totalmente provado o tema da prova 4, no sentido de “A 1.ª R. omitiu a realização dos testes”, devendo, igualmente, ser a menção quanto a este tema dos factos não provados.
Concomitantemente,
12. Entende a Recorrente que o tema da prova 6 – A 1.ª R. omitiu a introdução do “botão Aviludo” no software utilizado pelos clientes, conforme tinha sido acordado entre as partes, mantendo o software com o nome “Comproo”. – deveria ter sido dado como provado.
13. Quanto a este tema, o tribunal a quo apenas relevou o depoimento da testemunha FF, em detrimento dos restantes depoimentos, por o considerar, desconhecendo-se porquê, mais explícito.
14. A questão da implementação do botão “Aviludo” está adstrita em ter ficado acordado entre as
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