Acórdão nº 1244/22.0BELSB-S1 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17-11-2022

Data de Julgamento17 Novembro 2022
Ano2022
Número Acordão1244/22.0BELSB-S1
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
O Município de Lisboa, devidamente identificado nos autos, no âmbito do Processo de Contencioso Pré-contratual intentado pela V...... – C....., SA, veio interpor o presente recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 14 de julho de 2022, nos termos da qual foi indeferido o pedido de levantamento do efeito suspensivo do ato objeto de impugnação, i.e., da decisão relativa ao concurso para “Aquisição de licenciamento de software e serviços conexos na modalidade de aluguer operacional”.
Concluiu-se no referido Recurso:
“1. Em 23/06/2022 o Réu apresentou requerimento de levantamento do efeito suspensivo automático, no seguimento da instauração da presente ação de contencioso pré-contratual, por parte da Autora V...... – C....., SA.
2. A manutenção do efeito suspensivo automático por força do disposto no artº 103-A, nº 1, do CPTA, lesa gravemente o interesse público, e não se vislumbra no petitório da Autora quaisquer interesses superiores aos do Réu.
3. O ato de adjudicação suspenso tem como objeto a “Aquisição de licenciamento de software e serviços conexos na modalidade de aluguer operacional”, que visa assegurar a continuidade, necessária e imprescindível, do licenciamento de software Microsoft em regime de aluguer e visa garantir a continuidade do fornecimento de bens e serviços essenciais ao funcionamento do Município de Lisboa, uma vez que se destinam a ser disponibilizados a todo o universo municipal - Executivo, respetivos elementos dos gabinetes de apoio, corpo dirigente e de chefia, funcionários e colaboradores – garantindo-lhes o acesso a ferramentas de trabalho, que na era em que vivemos são imprescindíveis.
4. Mantendo-se a suspensão do procedimento concursal nº 13/CPI/DA/DCP/2021, todos os que trabalham para o Réu deixarão de ter acesso a ferramentas indispensáveis à sua atividade, como o office, o e-mail e a toda a documentação armazenada e partilha em Cloud, e, como consequência, compromete de forma irremediável o funcionamento dos serviços do Réu., uma vez que o paralisa, e afeta, necessariamente, o cidadão de Lisboa.
5. Como refere o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 24/11/2016, disponível em www.dgsi.pt com o n.º de processo 919/16.7BELSB o regime que parece resultar dos nº 2 e nº 4 do artigo 103º-A à luz da letra da lei e da teleologia do efeito suspensivo automático, em primeiro lugar, a metodologia decisória do juiz deve passar pela ponderação racional e expressa, num juízo de prognose, de todos os interesses em presença e de todos os danos respetivos. O Juiz não se deve abster de fazer esta ponderação, e fazendo só podia chegar a uma conclusão, o interesse público do Município de Lisboa é superior ao interesse da Autora, ora Recorrida.
6. Nos dois “interesses” em análise, para ponderação por parte do Juiz, temos por um lado os prejuízos a causar pela continuação do efeito suspensivo automático e, por outro, os prejuízos a causar pela retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós-adjudicatória.
7. Com base nestas premissas o Juiz decidirá levantar o efeito suspensivo da interposição da ação se concluir que os prejuízos que resultarão da manutenção do efeito suspensivo se mostraram claramente superiores aos prejuízos que possam resultar da retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós adjudicatória.
8. O Tribunal deve analisar todos os factos que lhe são submetidos e fazendo uso de todos os meios de prova admitidos, ponderar os prejuízos que a manutenção do efeito suspensivo impõe ao interesse público, e não o fez quando faz “tábua rasa” do documento junto ao requerimento e prescinde da inquirição da testemunha arrolada.
9. Este é o critério que o Tribunal deverá ter em consideração para a decisão a proferir no âmbito do regime do contencioso pré contratual, nos termos do artigo 120º, n.º 2 do CPTA, por remissão do artigo 103-A, n.º 3 do mesmo diploma, o que na presente ação, e com o devido respeito, não foi adotado.
10. Na sentença que ora se recorre o Tribunal a quo identifica os factos que considerou relevantes para a decisão da causa. E não se pronunciou sobre os factos que considerou como não provados, como obriga o art 607º do CPC, e, embora diga que o Recorrente não apresenta prova bastante da existência de prejuízo para o interesse público., a verdade é que, o Tribunal a quo considerou apenas como prova os documentos constantes do processo administrativo (PA) que foi anexo, não fazendo qualquer referência ao documento junto pelo ora Recorrente, cuja análise e ponderação deveria ter sido feita pelo Tribunal e não foi!
11. Com efeito, se o Tribunal a quo tivesse, como é sua obrigação, analisado o documento supra referido, tinha necessariamente concluído que a inquirição da testemunha arrolada era imprescindível, na medida em que iria dar corpo explicativo ao exposto no documento, e com toda a certeza a ilação do Tribunal teria sido outra que não a constate da sentença que se recorre.
12. Entendeu o Tribunal a quo a alegação do Réu, Município de Lisboa, (…)”se mostra amplamente genérica e conclusiva, a qual gravita maioritariamente em torno do próprio objeto contratual, para concluir que os mesmos são essenciais e que a sua interrupção comportará a paralisação da sua atividade.”
13. Que”(…) a linha argumentativa da Entidade Demandada, para além de lacónica, é manifestamente insuficientes para que este Tribunal conclua, sequer, pela ocorrência de um prejuízo sério e grave. Um incómodo sim, mas não um efetivo prejuízo. “ e “(…) não vêm alegados ou evidenciados quaisquer factos, que demonstrem a possibilidade de, com a suspensão dos efeitos do ato de adjudicação, se vir a verificar um grave prejuízo para o interesse público, em concreto, o prosseguido pelo Município de Lisboa; ou factos que permitam concluir que a atividade dos serviços elencados [ver Item 7.º do requerimento] fique irremediavelmente comprometida. “
14. O Recorrente discorda da posição do Douto Tribunal, e com o devido respeito, a Mmª Juíza do Tribunal a quo fez uma incorreta interpretação e aplicação do direito aos factos articulados e provados nos autos, incorrendo, a mesma em erro de julgamento, sendo por isso merecedor de censura e consequente revogação.
15. Ao contrário do referido pelo Tribunal o juízo de gravidade ou de proporcionalidade não tem de ser de certeza ou de probabilidade quase a tocar a certeza, o que o legislador exige ao requerente do levantamento do efeito suspensivo automático nos termos do n.º 2º, do artigo 103-A do CPTA, é que prove que “… o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para os interesses envolvidos …”. o que é a posição do Supremo Tribunal Administrativo, vide acórdão proferido no Recurso de Revista nº 62/18 - processo nº 1904/16.4BELSB – A, TCA Sul.
16. Com efeito, não há dúvida que o Réu cumpriu com esta exigência, ou seja, provou que a manutenção da suspensão do ato impugnado é gravemente prejudicial para o interesse público, na medida em que os serviços que se pretendem contratar e cujo ato de adjudicação está suspenso visa garantir a continuidade do fornecimento de bens e serviços essenciais ao funcionamento do Município de Lisboa - serviços, de que são exemplo a Cloud Email (Serviço de correio eletrónico), o Office, o OneDrive (Cloud Storage – Armazenamento na “nuvem”) e a Sharepoint CML (Cloud Storage e sites), essenciais para atividades desenvolvidas no posto de trabalho, em teletrabalho, e de ligação de equipas internas e destas com elementos externos - evitando a paralisação do normal funcionamento do Município, que será e trará um dano grave para o interesse público
17. Os factos alegados pelo Município de Lisboa são claramente demonstrativos de que a paralisação do contrato implica por si só o risco de paralisação de todos os seus serviços. sendo afetado o funcionamento da Assembleia Municipal, é afetado o funcionamento da Presidência da Câmara Municipal, os Vereadores, os Gabinetes que lhe estão associados, as Direções Municipais, os Departamentos e as Divisões, todos os serviços de atendimento ao munícipe.
18. Não se entende como é que o Tribunal pode concluir pela falta de alegação de factos que demonstrem a gravidade dos danos e grave prejuízo para o interesse público, com efeito, o interesse público específico, qualificado e concreto que importa salvaguardar no caso concreto dos autos, é garantir (dada a forma como as entidades, e a prestação do trabalho, se encontram atualmente organizadas) a prossecução das atribuições municipais e o exercício das competências dos respetivos órgãos, previstas na Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, e, assim, a prossecução do(s) interesse(s) público(s) nos domínios envolvido(s) ou afetado(s) pela falta de licenciamento.
19. A necessidade de garantir de imediato a “Aquisição de licenciamento de software e serviços conexos na modalidade de aluguer operacional”, que visa assegurar a continuidade, necessária e imprescindível, do licenciamento de software Microsoft em regime de aluguer, estando, assim, salvaguardada a contratação necessária para não existir interrupção desses serviços.
20. Sem prejuízo de tudo o que foi alegado, e cuja ilação facilmente se extrai atenta a notoriedade dos factos que são de conhecimento geral, o Tribunal a quo indefere o levantamento do efeito suspensivo automático requerido porque “(…) a situação factual trazida a estes autos não evidencia a produção de danos gravemente prejudiciais para o interesse público prosseguido pela Entidade Demandada, com a manutenção do efeito suspensivo automático.“
21. Andou mal o Tribunal a quo ao decidir que os...

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