Acórdão nº 12223/20.1T8LSB-B.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-02-22

Ano2024
Número Acordão12223/20.1T8LSB-B.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os abaixo assinados juízes do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
Caixa Geral de Depósitos, S.A., ré na ação declarativa de condenação que lhe é movida por «A», representada pelo seu tutor «B», notificada do despacho proferido em 27 de junho de 2023, que admitiu um documento contendo declarações prestadas na Polícia Judiciária por pessoa que é testemunha nos presentes autos e que, nos dois locais, fez afirmações contraditórias, e com esse despacho não se conformando, interpôs o presente recurso.

«A», representada em juízo pelo seu tutor, «B», propôs a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A. E BANCO SANTANDER TOTTA, S.A., formulando os seguintes pedidos:
a) condenação da 1ª Ré no pagamento de uma indemnização à Autora pelos danos patrimoniais causados, no montante integral de 285.969,72€;
b) condenação da 2ª Ré no pagamento de uma indemnização à Autora pelos danos patrimoniais causados, no montante integral de 14.510,93€;
c) condenação de ambas as Rés no pagamento de uma indemnização pelos danos não patrimoniais que as suas inaceitáveis e ilícitas condutas causaram, em virtude da grave violação da confiança depositada, relegando-se para execução de sentença a necessária quantificação que se impõe fazer a este título;
d) pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, na base que doutamente for entendida ser a mais curial;
e) condenação das Rés no pagamento de juros de mora à taxa comercial em vigor, contados desde a data da citação para a presente ação até efetivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese, que as rés tinham permitido movimentos a débito nas contas bancárias da autora não autorizados por esta.

A ação foi contestada.

O processo seguiu os regulares termos e, no decurso do julgamento, entre duas sessões, a autora requereu a junção de um documento consistente no auto de inquirição efetuado em 05/03/2020 pela Polícia Judiciária a «C», testemunha nos presentes autos e que tinha sido inquirida em anterior sessão.
É o seguinte o teor do requerimento de junção do documento em causa:
«1. Aquando da inquirição da testemunha arrolada pela Ré C.G.D., «C», o que se verificou na 2ª Sessão de julgamento do dia 5 de Junho, pela 14:23h,
2. Por esta testemunha foi dito e redito, afirmado e reiterado por diversas vezes, que a A. «A» tinha estado presente nas instalações da Agência da …, sita na Av. …, no Porto, também nos dias 26 e 27 de Outubro de 2017, datas em que cada uma das transferências de 130 mil euros foram ordenadas – presencialmente pela própria Autora, segundo referiu esta testemunha da Ré C.G.D., que, para tal efeito se terá deslocado para o efeito àquela agencia da Ré C.G.D.
3. Sucede que, esta mesma testemunha, «C» – inquirida também no âmbito do já conhecido destes autos processo crime nº …T9PRT,
4. Cujo inquérito decorreu no DIAP do Porto, na sequência do qual foi deduzida acusação contra «D» e «E» (encontrando-se a aguardar a marcação de julgamento no Juízo Local Criminal do Porto - Juiz 3),
5. Relativamente a essa mesmíssima questão referiu no depoimento que prestou em 05/03/2020, ou seja, há mais de três anos atrás e, por isso, com a memória mais fresca relativamente aos acontecimentos verificados em setembro de 2017, o seguinte:
Relatou que pelo que se recorda, quem foi ao banco para realizar essas transações, as duas transferências, terá sido «D» e «E», e «A» não terá estado presente. "Até, porque não tinha que estar, pois «D» tinha plenos poderes para movimentar a conta." (sic) – conforme tudo melhor consta do teor integral da sua inquirição que se anexa sob o Doc. nº1, cujo teor deve ter-se por integralmente reproduzido,
6. Tendo em conta este depoimento diametralmente oposto ao prestado nesta sede, constante do Doc. nº1 que vai junto,
7. Requer-se a V. Exa se digne admitir, ao abrigo do nº 3 do artigo 423º do CPC, a junção aos presentes autos da cópia do referido depoimento,
8. Porquanto, salvo o devido respeito, se revela essencial para a descoberta da verdade material, tendo em conta os princípios contidos nos artigos 411º, 413º e 417º, todos do CPC.
9. Sendo que, ao abrigo do nº3 do artigo 423º do CPC, só agora, nesta fase e perante este testemunho – que nunca se julgou ser diametralmente oposto ao já conhecido nos autos de processo crime supra citado – se justifica a sua apresentação,
10.Estando perfeitamente enquadrado nos temas da prova enunciados e, em todo o caso, nos factos necessitados da prova.
11. Sendo que, apesar da rigidez para que o contido no artigo 423º do CPC parece apontar, em parte associada ao princípio da autorresponsabilidade das partes, o mesmo não pode deixar de ser compatibilizado com outros preceitos ou com outros princípios que justificam a iniciativa oficiosa do Tribunal na determinação dá junção ou requisição de documentos que, estando, embora, fora daquelas condições, sejam tidos como relevantes para a justa composição do litígio, à luz de um critério de justiça material (STJ 30-6-20, 10831/16), cabendo realçar em especial o princípio do inquisitório consagrado no art.º 411º e concretizado ainda no art.º 436º (acerca do necessário equilíbrio entre a autorresponsabilidades das partes e a oficiosidade do inquisitório, cf. Paulo Pimenta, ob. cit., pp. 372-373, RL 25-9-18, 744/11, RP 2-7-20, 2854/14)

A ré opôs-se à junção do dito documento, nos seguintes termos:
«II – Quanto ao requerimento entrado em 07.07.2023 com a refª citius nº 45800148:
7 Este requerimento para junção de “documento” é agora apresentado pela A. na sequência de, na pretérita audiência de julgamento, a A. ter expressamente referido – estando, aliás, em pleno curso as instâncias da Il. Mandª do A. à testemunha Srª «C» – que não pretendia requerer a sua junção, facto este que não pode deixar de aqui ser devidamente sublinhado.
8 Constata-se, assim, que à A. pareceu “melhor” deixar concluir o depoimento prestado pela testemunha «C» para só agora vir apresentar este “documento”, o que revela que pretende a qualquer custo influenciar a convicção do Tribunal.
9 Relativamente a este “documento” a R. dá aqui por reproduzidas as considerações que realizou supra nos nºs 2 e 3 desta peça processual quanto à tempestividade da respetiva apresentação, atendendo a que o mesmo desde há muito se encontra no poder da A. sendo aliás do seu conhecimento desde a contestação que a testemunha em causa se encontrava arrolada pela R.
10 Pelo que deverá ser tal documento ser mandado desentranhar dos autos, sem prejuízo de, a assim não ser entendido, ir desde já o mesmo impugnado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 374º nº 2 do C.C. ignorando a R. sem qualquer obrigação de conhecimento a autenticidade da sua autoria letra e assinaturas.
11 Isto sem embargo de nos termos consignados no nº 1 do art.º 422º do CPC a contrario os depoimentos produzidos num processo sem audiência contraditória da parte não poderem ser invocados noutro processo contra a mesma parte,
12 o que é o caso atendendo a que a CGD não é parte nem interveniente processual no processo indicado pela A. (processo crime nº …T9PRT).
13 E, ainda, sem embargo de, nos próprios termos consignados no denominado “auto de inquirição” não decorrer o que a A. pretende fazer inculcar.
Pelo que deverão os documentos e
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