Acórdão nº 1217/23.5YLPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29-02-2024

Data de Julgamento29 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão1217/23.5YLPRT.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I- RELATÓRIO

AA, residente na Rua ..., ... ..., instaurou procedimento especial de despejo contra EMP01..., Lda., com sede na Rua ..., ... ..., pedindo que esta lhe entregasse o locado, devoluto e em adequado estado de conservação, e, bem assim, fosse condenada a pagar-lhe a indemnização prevista pelo atraso na restituição daquele, no montante de 694,50 euros por cada mês de mora, até efetiva entrega do locado.
Para tanto alegou, em suma, que: em 18/06/1948 foi celebrado contrato de arrendamento entre a então proprietária, BB, e a requerida, EMP01..., Lda., tendo por objeto um armazém sito na Rua ..., ..., então inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...16º da freguesia ..., concelho ..., correspondente ao atual art. ...66º da União das Freguesias ... (..., ... e ...); na posição contratual da então senhoria sucedeu CC, como proprietária do imóvel e, posteriormente, a sua filha, a requerente AA, a quem a sua progenitora doou o prédio em causa; por carta de 04/02/2014, a requerente comunicou à requerida a transição do contrato de arrendamento para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), o que foi aceite e reconhecido por ambas as partes nos termos da carta da requerida datada de 14/04/2014, com efeitos a 01/05/2014, nos seguintes termos: contrato de arrendamento para fins não habitacionais, com prazo certo de 5 anos, renovável por períodos de 1 ano e com a renda mensal de €347,25; entretanto, a requerente, por carta de 28/11/2018, rececionada pela requerida em 17/12/2018, comunicou a sua oposição à renovação do contrato, com efeitos a 30/04/2019, data do termo do contrato; em virtude de a requerida se ter mantido por mais de um ano no local que lhe fora arrendado considerou a requerente que o contrato de arrendamento se renovou por períodos sucessivos de um ano e, por carta de 05/12/2022, comunicou à requerida a sua oposição à renovação do contrato iniciado no dia 01/05/2014, que, assim, terminou no dia 30/04/2023; acontece que, apesar da oposição à renovação do contrato de arrendamento pela requerente, da obrigação da requerida de lhe restituir o locado e das diversas insistências para que aquela lho restituísse, a requerida não o fez.
A requerida, EMP02..., Lda., deduziu oposição alegando, em síntese, que: a requerida admite a celebração do contrato de arrendamento, bem como a sucessão na posição contratual da requerente; contudo, na missiva datada de 04/02/2014, a requerente propôs à requerida condições que esta não aceitou fosse em que medida fosse, motivando da parte desta uma contraproposta feita por carta registada com aviso de receção, datada de 14/04/2014, em que aceitou a transição do contrato de arrendamento para o NRAU, bem como o valor da renda proposta, no montante de €347,25 mensais, mas não aceitou o prazo certo de três anos de vigência do contrato proposto e contrapropôs um prazo de duração de cinco anos, o que foi aceite pela requerente; impugnou o alegado pela requerente quanto à invocada oposição à renovação do contrato de arrendamento nos anos de 2018 e 2019, e alegou que, ainda que a requerente tivesse tentado opor-se à renovação do contrato, essa oposição era-lhe vedada por lei, pelo que, a carta de 2018, jamais produziu quaisquer efeitos jurídicos; apesar da requerente lhe ter remetido a carta opondo-se à renovação do contrato de arrendamento junta em anexo ao requerimento inicial como doc. n.º ..., face ao tipo de contrato em causa (de arrendamento não habitacional) e a sua longevidade, não pode a requerente opor-se à renovação do contrato, muito menos nos moldes em que o fez, uma vez que nada tendo ficado estipulado entre as partes quanto à renovação do contrato de arrendamento, este considera-se renovado por períodos sucessivos de cinco anos, pelo que, tendo o contrato de arrendamento transitado para o NRAU em 01/04/2014, manteve-se em vigor durante cinco anos (conforme fora acordado entre as partes), isto é, até ../../2019, data em que se renovou por mais cinco anos, mantendo-se, por isso, a sua vigência até ../../2024.
Concluiu pedindo que, por via da procedência da matéria de exceção que alegou, fosse absolvida da instância ou do pedido; e que, em todo o caso, se julgasse a ação improcedente e fosse absolvida do pedido.
Remetidos os autos à distribuição, em 16/10/2023, a 1ª Instância proferiu despacho no sentido de que: “Atenta a documentação junta e os fundamentos de oposição à execução aventados, o tribunal entende prima facie que esta constitui essencialmente uma questão de direito (sem prejuízo de ponderação posterior), pelo que poderá eventualmente conhecer imediatamente do mérito da causa, nos termos previstos no art. 15º-H, n.º 4 do NRAU” e, em observância do princípio do contraditório, ordenou a notificação das partes para se pronunciarem, querendo.
A requerida pronunciou-se no sentido de nada ter a opor a que se conhecesse imediatamente do mérito da causa.
Após o decurso do prazo de suspensão da instância, requerido pelas partes, com vista a alcançarem um acordo que lhes permitisse a resolução amigável do presente litígio, também a requerente declarou nada ter a opor que se conhecesse imediatamente do mérito da causa.
Em 20/11/2013, proferiu-se saneador-sentença, em que se fixou o valor da causa em 10.417,50 euros, e em que se julgou a ação improcedente e se absolveu a requerida do pedido, constando esse saneador-sentença da seguinte parte dispositiva:
“Termos em que o tribunal julga a presente ação totalmente improcedente, absolvendo a requerida do peticionado.
Custas pela requerente (art. 527º, n.º 2 do Cód. Proc. Civil”.

Inconformada com o decidido, a requerente, AA, interpôs recurso, em que formulou as conclusões que se seguem:
1) Por carta registada de 4 de fevereiro de 2014, a requerente/senhoria dirigiu-se à requerida/inquilina para – nos termos do art.º 50º da Lei 6/2006 de 27/2 – promover a transição para o NRAU de um contrato de arrendamento para fins não habitacionais celebrado por escritura pública em 18/6/1948. Propôs uma renda de € 347,25 e contrato de arrendamento com termo certo (três anos) renovável por períodos iguais e sucessivos de um ano cada, tudo com efeitos a 1 de abril de 2014.
2) Respondeu a inquilina aceitando a transição do arrendamento para o NRAU, aceitando também a renda proposta, e pronunciando-se sobre o tipo e duração do contrato, no sentido de este ser a termo certo de 5 anos.
3) Aceitou a senhoria o proposto pela inquilina, nada se tendo estipulado sobre renovações e/ou prorrogações do contrato pelo que, em tal matéria, se aplicam os art.ºs 1096º e 1097º do Código Civil, ex vi do art.º 1110º, 1 do mesmo diploma.
4) Por carta registada de 28/11/2018, para produzir efeitos em 30/4/2019, a requerente senhoria, deduziu a sua oposição à renovação/prorrogação do contrato por mais cinco anos. A antecedência observada foi de mais de 150 dias, excedendo assim a exigida na alínea b) do n.º 1 do art.º 1097º do Código Civil, aplicável ex vi do n.º 1 do art.º 1110º do mesmo diploma – 120 dias.
5) Decorrido o dia 30/4/2019, a inquilina não deu qualquer indicação de que acatava a entrega do locado, nele se mantendo, aproveitando, é certo, uma certa inércia da senhoria.
6) Nesta situação, apesar de a oposição à renovação do contrato por parte da senhoria nos termos expostos na cláusula 4) supra, desencadear uma sequência causal, culminando na caducidade do contrato de arrendamento de que se trata, o facto da inquilina se manter no locado importa – nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 1056º e 1054º do Código Civil (ambas com as redações que lhes foram dadas pela Lei 6/2006 de 27/2) – na renovação do contrato por períodos sucessivos e iguais de um ano.
7) Em consequência a requerente e senhoria dirigiu à inquilina e requerida carta registada de 5 de dezembro de 2022 (que está no processo como, aliás, todas as que vêm sendo aqui citadas) opondo-se a qualquer renovação que se perspetivasse, nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 1056º e 1054º do Código Civil.
8) A decisão recorrida decorre de um manifesto equívoco da 1ª instância: Assim: no parágrafo da sua respetiva pág. 6 afirma-se: “…tratando-se de uma oposição à renovação, pelo senhorio, a mesma tem de ter a antecedência de 240 dias visto que se trata de um contrato com a duração inicial de 6 anos (data de 1948, cfr. ponto 2).
9) Ora – compulsando a escritura pública lavrada nas notas do então ... Cartório Notarial ... em 18 de junho de 1948 – constata-se que o mencionado (na sentença recorrida) “ponto 2”, respeita à renda e não ao prazo contratual;
10) Já o Ponto 1 (“Primeiro”) se refere ao prazo, nos seguintes termos – “o prazo é por um período de um ano prorrogável e tem o seu início em um de maio do corrente ano”.
11) De qualquer modo, atendendo a que – como se poderá constatar compulsando a matéria de facto assente - por carta da inquilina datada de 14/4/2014 (em resposta a comunicação da senhoria datada de 4/2/2014) consumou-se a transição do contrato em causa para o NRAU, com a renda proposta pela senhoria e pelo prazo de cinco anos, não tendo havido objeções da senhoria.
12) Assim, havendo acordo das partes quanto ao prazo certo (embora nada se tenha expressamente estipulado sobre renovações) não se vê a que propósito se há-de, por assim dizer, repristinar o, assim chamado, “prazo inicial” por ser o constante da versão de 1948 do contrato de arrendamento, o qual é bom lembrar, transitou para o NRAU, com acordo das partes.
13) Visto o que antecede, dir-se-á que a requerente não consegue vislumbrar qualquer estipulação escrita arcaica (de 1948) ou mais moderna de um soi disant prazo de 6 anos de “duração inicial”, para o arrendamento de que se trata.
14) Como assim, o prazo (antecedência) para a senhoria se opor à renovação do contrato, com prazo certo de 5 anos, tal como, resultou da...

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