Acórdão nº 1203/22.2T8GRD-C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2023-11-07

Ano2023
Número Acordão1203/22.2T8GRD-C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO CENTRAL CÍVEL E CRIMINAL DA GUARDA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA)

SUMÁRIO ELABORADO E DA RESPONSABILIDADE DO RELATOR (ARTº 663, Nº7 DO C.P.C.)

(…).


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Proc. Nº 1203/22.2T8GRD-C1 - Apelação

Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial da Comarca da Guarda -Juízo Central Cível e Criminal da ... – J....

Recorrentes: AA e BB

Recorrida: Z... plc – Sucursal em Portugal

Juiz Desembargador Relator: Cristina Neves

Juízes Desembargadores Adjuntos: Pires de Robalo

Falcão de Magalhães


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Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

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RELATÓRIO

AA e BB, interpuseram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra a Ré Z...., peticionando a sua condenação no pagamento aos AA. da quantia de 135.000,00 euros, acrescida de juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, sendo 40.000,00 €, pelo direito à vida (dano morte); 25.000,00€, pelo dano moral sofrido pela vítima; 35.000,00€, pelo dano moral sofrido pelo Autor e 35.000,00€, pelo dano moral sofrido pela Autora, perfazendo o montante total de 70.000,00€.

Para o efeito alegam, em síntese, que no dia 30 de Outubro de 2020, quando o seu filho CC, conduzindo o motociclo marca ... com matrícula ..-..1-TT,se encontrava em ultrapassagem de veículos que seguiam à sua frente, foi surpreendido pelo veículo de matrícula ..-NU-.., propriedade de M..., S.A. e seguro na R., que iniciou igualmente a ultrapassagem sem verificar que o A. já se encontrava na via, ocasionando o embate do motociclo na sua traseira lateral esquerda e provocando sofreu ferimentos graves e irreversíveis ao filho dos AA., dos quais veio a falecer.


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Citada, a R. Z... contestou imputando a culpa na produção do acidente ao condutor do ciclomotor, que iniciou a ultrapassagem em local proibido, em excesso de velocidade e distraído.

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Procedeu-se elaboração de despacho saneador com fixação do objecto do litígio e dos temas de prova.

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Após, realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu os AA. dos pedidos formulados.

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Não conformado com esta decisão, interpuseram os AA. recurso da mesma, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:

“CONCLUSÕES:

1 – Vem o presente recurso interposto da decisão recorrida que absolveu a R. Companhia de Seguros do pedido formulado pelos A.A. aqui recorrentes, já devidamente identificados;

2 – Ao invés o tribunal “aquo” e, quanto a nós mal, entendeu que a infeliz vitima por ter sido o único causador do acidente veio absolver o pedido formulado por estes contra a Companhia de Seguros Z... Plc – Sucursal em Portugal;

3 - Aceita-se, portanto, a matéria de facto dada como provada quanto à descrição e dinâmica do acidente relativamente aos pontos 1 a 52 inclusive, apenas também com o esclarecimento de que no ponto 37 da matéria dada como provada deverá constar que “ainda não tinha ultrapassado o terceiro veículo, ou seja, o veículo que seguia à frente do NU”;

4 - Deverá ainda dar-se como provada que pelo facto de o veículo NU estar a fazer uma ultrapassagem irregular tal condutor também contribuiu decisivamente para a ocorrência do acidente;

5 - Resulta assim claramente que ambos os condutores (vítima e condutor do veículo NU) ambos violaram preceitos regulamentares do transito, pelo que, por conseguinte, não podem ambos deixar de ser civilmente responsabilizados a título de culpa pelo mesmo acidente;

6 - Pelo que assim e sem quaisquer outras considerações deverá considerar-se adequada a repartição de culpas com a proporção de 50% para cada um dos condutores;

7 - Ou seja, para a vítima e para o condutor do NU;

8 - Ora a manobra efetuada pelo automobilista que conduzia o veículo NU seguro na recorrida violou também o dever de cuidado e de prudência que era exigido a quem circulava naquelas circunstâncias de modo e lugar;

9 - Pelo que por conseguinte e tomando em conta o acima alegado e relativamente a matéria de facto dada como provada nos pontos 33 e 52 ser dada como não provado com o referido esclarecimento referido no artigo 5 bem como quanto aos danos morais sofridos e a que se faz referência nos pontos 56 a 75 da P.I. e tomando em conta toda a argumentação jurídica constante na P.I., o valor da indemnização peticionada de 135.000,00 € (cento e trinta e cinco mil euros) deverá ser objeto de redução de 50% entendendo-se conforme a equidade;

10 - Pelo que se deverá considerar adequada a proporção de 50% para cada um dos intervenientes (vítima e condutor do veículo NU);

11 - Ora na sequência do alegado no artigo 64 e sem conceder e caso se entenda que a vítima tivesse culpa na ocorrência do acidente, de acordo com as novas normas comunitárias a doutrina admite a concorrência de culpa do lesado e o risco de utilização do veículo com a matrícula NU seguro na companhia de seguros aqui recorrida;

12 - O que de acordo com a interpretação dada no artigo 505 do C.C. impõe a subsunção desta situação de concorrência de causas do dano à norma de repartição do mesmo previsto no artigo 506 do C.C. aplicável à situação de risco também na mesma proporção de 50% para cada um dos intervenientes, sendo que neste caso a responsabilidade seria também na proporção de 50% para cada um dos condutores, ou seja para a infeliz vitima e para o condutor do veículo NU;

13 - Mesmo que em tese teórica se venha a demonstrar que o acidente não se deu pelo facto de o condutor do veículo NU se não ter apercebido da moto a efetuar a manobra de ultrapassagem e de ultrapassar em local não permitido e de se vir a entender que o acidente ocorreu pela circunstância de a infeliz vitima conduzir com excesso de velocidade e de ter feito uma manobra de ultrapassagem em local proibido e que esteve assim na origem do acidente;

14- Mesmo assim deverá ser atribuída alguma culpabilidade ao condutor desse veículo embora a menos grave do que a da vítima, culpabilidade essa que terá de ser forçosamente reduzida não superior a uma percentagem de 30%;

15 - Assim e atendendo à contribuição de cada uma das partes para a produção dos danos poderá ser adequado fixar tais contribuições em 70% para a infeliz vitima e de 30% para o condutor do veículo NU seguro na companhia de seguros aqui recorrida, devendo assim os A.A. aqui recorrentes terem direito a receber a quantia de 40.500,00 € (quarenta mil e quinhentos euros), tomando em conta os danos morais alegados na P.I.;

16 - É do senso comum que o condutor que efetua uma manobra de ultrapassagem em local que não lhe é permitido, designadamente onde existe uma linha longitudinal continua não pode seguir com atenção – ponto 33 da matéria de facto dada como provada - e deste modo não conduz com atenção, diligência e zelo, concorrendo assim para a ocorrência do sinistro – ponto 52 da matéria de facto dada como provada;

17 - Está em causa o erro de julgamento, quer quanto aos factos, quer quanto ao direito aplicável, mas antes a estrutura lógica da sentença, ou seja, quando a decisão proferida seguiu um caminho diverso daquele que apontava os fundamentos que era no sentido de haver uma concorrência de culpa de ambos na proporção de 50% para o condutor do motociclo (infeliz vítima) bem como para o condutor do veículo NU seguro na companhia de seguros ora recorrida;

18 - Já que de acordo com o princípio da coerência lógica de tomando em conta a matéria de facto dada como provada no ponto 24 implica necessariamente que se dê como não provados os factos dados como provados nos pontos 33 e 52, o que a acontecer implica uma decisão jurídica diferente.

19 - A sentença recorrida violou ou não fez uma apreciação correta do disposto nos artigos, 35.º, n.º1, 38.º n.1 e 2, 41.º nº.1 todos do CE, artigo 483.º, 487.º n.2, 503, 505, 506 e 513 do CC, 613 nº.1 alínea d), 615 nº.1, 666 nº.1 do CPC, 60.º n.º1 do Regulamento Sinalização de Trânsito.

Nestes termos e nos melhores de Direito, que V.Exªs. doutamente suprirão deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta decisão recorrida no sentido de se declarar que houve concorrência de culpas na ocorrência do acidente entre a infeliz vitima e o condutor do veículo NU seguro na companhia de Seguros recorrida na proporção de 50% e consequentemente esta seja condenada a pagar aos A.A. a quantia de 67.500,00 € (sessenta e sete mil e quinhentos euros) acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até efetivo e integral pagamento de acordo com as regras da concorrência de culpas na proporção de 50% ou caso assim se não venha a entender de acordo com as novas normas comunitárias a doutrina admite a concorrência de culpas do lesado e o risco de utilização do veículo seguro na recorrida, devendo neste caso manter-se a culpa de 50%.

Sem embargo do acima alegado e caso seja outra opinião de V.Exas. e tomando em conta os fundamentos invocados nos artigos 77 a 82, e não obstante a maior responsabilidade pelo acidente venha a ser imputado à infeliz vitima, mesmo assim deverá ser atribuída uma culpabilidade menos grave de pelo menos 30% ao condutor do veículo NU seguro na Companhia de Seguros ora recorrida e assim esta venha a ser condenada a pagar aos A.A. a quantia de 40.500,00 € (quarenta mil e quinhentos euros) acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até efetivo e integral pagamento pela contribuição por si causada

pela ocorrência dos danos.

Caso assim não se entenda a sentença recorrida é nula ao abrigo do disposto no artigo 615 nº.1 alínea c) do C.P.C., já que a matéria de facto dada como provada no ponto 23 está em total contradição com a matéria de facto dada como provada nos pontos 33 e 52, nulidade essa que desde já se invoca para os devidos e legais efeitos.

Decidindo-se em tal conformidade será feita Justiça!”


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A R. seguradora contra-alegou, sustentando a manutenção da decisão recorrida e requerendo a ampliação do objecto do recurso, não constando
...

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