Acórdão nº 1184/14.6T8VFR.P3 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-07-12

Data de Julgamento12 Julho 2023
Ano2023
Número Acordão1184/14.6T8VFR.P3
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. Nº 1184/14.6T8VFR.P3
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, S.M. Feira – Juízo do Trabalho – Juiz 1

Recorrente: AA
Recorrido: Centro Nacional de Protecção Contra Riscos Profissionais



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto


I – RELATÓRIO
A A., AA, com o patrocínio do Ministério Público, instaurou a presente acção emergente de doença profissional contra o R., Centro Nacional de Protecção Contra Riscos Profissionais, alegando, em síntese, que padece de dores na zona cervical e falta de força nos membros superiores, directamente provocados pelo exercício da sua profissão de escolhedora de rolhas, que a obriga a estar constantemente de joelhos e debruçada para a frente, apoiada nos braços para escolher as rolhas que eram despejadas no chão.
Pede que deve a acção ser julgada provada e, por via dela, o R. condenado no mínimo a:
- Reconhecer que a A. é portadora de síndrome vertebral doloroso e com irradiação para os membros superiores, associado a rectilinização cervical e discopatia cervical marcada de C3 a C7, sintomática, com protusões evidentes e estenose em alguns dos buracos de conjugação e com hiperreflexia acentuada de C5 e C6 à direita e de tendinopatia da coifa dos rotadores do ombro direito, associada a bursite acromial homóloga ou seja, doença profissional, bem como a incapacidade para o trabalho que mesma acarreta, e consequentemente, condenado a:
1 - Pagar-lhe uma pensão anual e vitalícia calculada com base no valor de 10.629,79€ e no grau de incapacidade permanente que lhe for fixado.
2 - Pagar-lhe as prestações adicionais nos meses de Julho e Dezembro de cada ano.
3 - Fornecer-lhe as prestações em espécie que a Autora ainda necessita, designadamente assistência médica em geral e especializada, incluindo os elementos de diagnóstico e de tratamentos que forem necessários e a assistência medicamentosa e farmacêutica.
Mais, requereu a realização de Junta médica e juntou quesitos a fls. 13 e 14.
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Citado, o R. veio contestar, nos termos que constam a fls. 79 e ss., discordando da pretensão da A., em querer ser reconhecida como portadora de doença profissional, alegando, em suma, não existir nexo de causalidade entre as queixas e o exercício da actividade profissional da A. e, ainda, que a A., foi observada nos serviços médicos do R., tendo sido considerada portadora de doença natural.
Conclui que deve a acção ser julgada improcedente, não se reconhecendo à A. a existência de doença profissional, com as devidas e legais consequências.
Concordou com a realização de exame por Junta Médica, aceitou os quesitos formulados pela A. e acrescentou, ainda, os que constam a fls. 83.
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Nos termos que constam a fls. 97 e ss., foi proferido despacho, que fixou à acção o valor de €30.000,01, saneador tabelar e organizou-se a matéria de facto assente e a base instrutória, sem que tivesse havido quaisquer reclamações.
Foi ordenado o desdobramento do processo.
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Organizado o apenso para fixação de incapacidade, no mesmo, após a realização do exame por Junta Médica, foi proferida em 27.04.2017, a seguinte decisão:
No presente apenso para Fixação da Incapacidade para o Trabalho da acção em que é A. AA e R. CENTRO NACIONAL DE PROTECÇÃO CONTRA RISCO, tendo em conta o parecer, por unanimidade, da Junta Médica, que não merece qualquer reparo e atento o disposto no art. 132º, nº 1 do C. Proc. Trabalho, decido que a A. não se encontra afectada de qualquer incapacidade permanente parcial em virtude de Doença Profissional.
Notifique.”.
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Conforme decorre do despacho de fls. 133 e do documento de fls. 134, dado ter sido nomeado patrono à A., no âmbito do apoio judiciário, cessou o patrocínio do Ministério Público.
Os autos prosseguiram para julgamento e realizada a audiência, nos termos que constam da acta de fls. 138 e 139, foram conclusos e proferida sentença que terminou com a seguinte decisão:
Em face do exposto, julgo a acção improcedente e absolvo a R. do pedido.
Custas pela A., sem prejuízo de decisão do apoio judiciário.”.
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Inconformada a A. interpôs recurso, nos termos das alegações juntas a fls. 158 e ss., cujas conclusões terminou pedindo que, “deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-a por outra que reconheça a doença da Autora como doença profissional, ainda que, apenas pelo concurso autónomo dos efeitos directamente oriundos e causados pelo desempenho das suas funções laborais na doença natural que a Autora eventualmente padeça, -- Ordenando a realização de nova junta médica, com vista a fixação da incapacidade para o trabalho pela Apelante, seguindo-se restantes termos até final.”.
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O Réu apresentou contra-alegações cujas conclusões terminou, pedindo que “deverá ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se na integra a sentença ora recorrida”.
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O recurso foi devidamente admitido e nesta Relação, atentas as questões colocadas de “saber se deve: - reconhecer-se a doença da Autora como doença profissional; - ordenar-se a realização de nova junta médica, com vista a fixação da incapacidade para o trabalho pela recorrente” após, apreciação, foi proferido acórdão, em 11 de Abril de 2018, no qual se concluiu: “a matéria de facto é insuficiente para se conhecer do objecto do presente recurso, a determinar o uso por este Tribunal do disposto no artigo 662º, nº2, al. c) do CPC.
Importa apurar a seguinte factualidade, a qual deve constar da base instrutória:
A) A Autora sofre de síndrome vertebral doloroso e com irradiação para os membros superiores, associado a rectilinização cervical e discopatia cervical marcada de C3 a C7, sintomática, com protusões evidentes e estenose em alguns dos buracos de conjugação e com hiperreflexia acentuada de C5 e C6 à direita e de tendinopatia da coifa dos rotadores do ombro direito, associada a bursite acromial homóloga?
B) Esta doença foi provocada pelo facto de a A., durante mais de 20 anos, ter trabalhado quase sempre de joelhos no chão e debruçada para a frente, apoiada nos braços, para escolher as rolhas que eram despejadas à sua frente (cerca de 40.000 por dia) e que ela, sempre na mesma posição, tinha que escolher, recolher com as mãos e colocá-las em cestos que estavam à sua volta, também no chão?
Após a formulação de tais quesitos – e outros que a Mmª. Juiz “a quo” entenda formular com vista ao apuramento da existência/ou não, de doença profissional – deve aquela Magistrada notificar as partes, para querendo, indicarem prova a tais quesitos, e seguidamente proceder a audiência de discussão e julgamento para apuramento dessa factualidade.
Ainda, por estar em causa doença, alegadamente, tipificada importa ter em consideração o alegado pela A. quanto ao seu exercício profissional (exposição ao risco tipificado e tempos de exposição) podendo, previamente, ser efectuada análise do posto de trabalho, com caracterização dos riscos profissionais e sua quantificação, o que permitirá melhor percepção da situação.
E porque a matéria a apurar exige conhecimentos médicos, sugere-se que a Mmª. Juiz “a quo” convoque para a audiência – artigo 134º do CPT – os peritos que intervieram na Junta Médica para que aí prestem esclarecimentos relativamente à existência/não existência de doença profissional.
Se o Tribunal “a quo” concluir – em face das respostas aos quesitos “aditados” pela existência de doença profissional sugere-se que então ordene a realização de exame por Junta Médica – no apenso – tendo em vista o apuramento da natureza e grau de incapacidade.
Em face do referido fica prejudicado por ora o conhecimento das demais questões suscitadas no presente recurso”, e terminou com a seguinte Decisão:
Termos em que, ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº1, e nº2, al. c) do CPC, acordam as Juízas desta secção, em anular a decisão recorrida, devendo o Tribunal “a quo” formular quesitos adicionais, e realizar todas as diligências que tiver por necessárias, e atrás sugeridas, tendo em vista decidir se a Autora padece de doença profissional.”.
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Em cumprimento deste, os autos foram remetidos ao Tribunal “a quo” e, aí, após notificação para o efeito, veio a A., nos termos que constam a fls. 220 vº e 221, formular novos quesitos e requerer diligências, nos seguintes termos:
“• Considerando-se a verificação da doença (síndrome vertebral doloroso e com irradiação para os membros superiores, associado a rectilinização cervical e discopatia cervical marcada de C3 a C7, sintomática, com protusões evidentes e estenose em alguns dos buracos de conjugação e com hiperreflexia acentuada de C5 e C6 à direita e de tendinopatia da coifa dos rotadores do ombro direito, associada a bursite acromial homóloga), (verificação do quesito A)), mas que a mesma não é provocada por via das condições em que a Autora prestou o seu trabalho (não verificação do quesito B)), se é possível, para além de não ter sido a causa, afirmar que aquela prestação, não teve qualquer tipo de implicação ou concurso, no surgimento da mesma?
• Considerando a doença da Autora, se é possível constatar que o grau/gravidade das lesões e sintomas apresentados são os normais, habituais e os vulgarmente visíveis, para similares manifestações da doença (cfr. quesito A) ou similar), noutros sujeitos, considerados saudáveis, com as mesmas características da Autora (idade, género, fisionomia)?
• Considerando o lapso temporal desde momento do surgimento da doença na autora, (finais de 2012), e o actual momento, analisando os resultados dos exames de RMN na altura, com os mais recentes, bem como, todos os restantes elementos juntos ao processo, se é possível verificar uma evolução degenerativa da coluna cervical e consequente agravamento dos sintomas apresentados pela Autora, ou, se, de alguma forma, houve alguma estagnação?
Com vista ao apuramento dos quesitos agora formulados e descoberta da verdade, para além da análise do posto de trabalho
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