Acórdão nº 118/04.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 24-03-2022

Data de Julgamento24 Março 2022
Ano2022
Número Acordão118/04.0BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 13.10.2021, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação apresentada por T…, Lda (doravante Recorrida ou Impugnante, entretanto fundida na sociedade H…, Lda), que teve por objeto o indeferimento das reclamações graciosas deduzidas que versaram sobre os atos de liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), referentes aos exercícios de 1997 e 1998.

Apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

A. O presente recurso tem por objecto a douta sentença proferida nos autos identificados que julga parcialmente procedente, e quanto ao segmento julgado procedente, a impugnação deduzida pelo Impugnante T…, LDA. contra o indeferimento das reclamações graciosas deduzidas contra os actos de liquidação de IRC referentes aos exercícios de 1997 e 1998, com o valor a pagar, respectivamente, de € 26.271.49 e de € 7.499.40.

B. Discorda a Fazenda Pública, com o devido respeito, do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, na parte julgada procedente, porquanto procede a uma errónea apreciação dos factos pertinentes para efeitos de decisão, com consequente inadequado enquadramento jurídico, na parte julgada procedente e referente à provisão para créditos em contencioso constituída pela Impugnante quanto ao cliente S… Lda. (1998), pelo montante de € 4.516,33, e aos custos não dedutíveis referentes a encargos com seguros de automóveis (1997 e 1998). no montante de € 14.588.69 e de € 11.443.94.

C. Do disposto no da alínea a) do n.° 1 do artigo 33.°, dos n.°s 1 e 2 artigo 34.° e do artigo 37.° do Código do IRC, conjugados com o n.° 1 do artigo 18.° do Código do IRC, resulta que a constituição de provisões para cobertura de créditos de cobrança duvidosa é imputável ao exercício em que se verifica o risco de incobrabilidade e não ao exercício em que os créditos entraram em mora, ou em que a mora constituída ultrapassou os seis meses.

D. Mais resultando que o risco de incobrabilidade se considera devidamente justificado, elevando o encargo a custo dedutível, quando em causa créditos que tenham sido comprovadamente reclamados judicialmente, conforme transcrita alínea b) do n.° 1 do artigo 34.° do Código do IRC.

E. Do relatório de inspecção resultaram correcções à matéria colectável para o exercício de 1998 decorrentes da desconsideração como custo admissível fiscalmente de provisão constituída pela Impugnante quanto ao cliente S… LDA., no montante de € 4.516,33, a qual foi qualificada e contabilizada pela Impugnante como provisão para crédito em contencioso nos termos da alínea b) do artigo 34.° Código do IRC - cf. alínea k) do probatório da douta sentença.

F. Efectivamente, conforme consta do relatório de inspecção tributária, informou a Impugnante em sede de procedimento inspectivo que o crédito em questão se tratava de crédito em contencioso, de acordo com listagem elaborada pelo sujeito passivo, demitindo-se a Impugnante de comprovar que tinha sido o crédito em análise reclamado judicialmente, e mais invocando ter sido o crédito pago de acordo com cartas de advogado que apresentou - cf. alínea K) do probatório da douta sentença e anexo III do RIT;

G. E do anexo III do relatório, que a douta sentença parcialmente transcreve na alínea L) do probatório, decorre ter ocorrido regularização de dívida, contudo, não resulta quando tenham sido as diligências encetadas nesse sentido, bem como não resulta temporalmente situado o risco de incobrabilidade do crédito, pois que nos confrontamos tão só com missiva referente a dívida do cliente em análise datada de Março de 1999.

H. Deste modo, contabilizada a provisão como provisão para crédito em contencioso à luz do disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 34.° do Código do IRC, e pelo valor global do crédito, em conformidade com tal norma, verificamos que, como resulta do relatório de inspecção, não se mostravam reunidos os requisitos legalmente exigidos por não reclamado o crédito judicialmente.

I. Por outro lado, apelando ao disposto na alínea c) do n.° 1 do artigo 34.° do Código do IRC, constatamos exigir a norma que esteja demonstrado o risco da incobrabilidade, tendo por referência determinado período temporal, e que seja ademais determinado o período referente à constituição em mora do crédito em questão, de forma a determinar-se o montante anual acumulado permitido à luz do disposto em tal alínea c).

J. Estes requisitos não se mostram cumpridos no caso sub judice, nem do probatório resultam factos, que extravasem as referidas cartas de advogado, constantes da alínea L) do probatório, que permitam sustentar estarmos perante créditos em mora há mais de 24 meses, cujo risco de incobrabilidade materializado nas diligências encetadas com vista à recuperação do crédito ocorreu no exercício de 1998.

K. Deste modo, a provisão para crédito em contencioso constituída pela Impugnante em 1998 não se constitui à luz dos normativos legais aplicáveis como custo fiscalmente admissível: I) porquanto não é crédito reclamado judicialmente, e por isso não enquadrável na alínea a) do n.° 1 do artigo 34.° do Código do IRC, como reclamado pela Impugnante primeiramente; II) e não é igualmente crédito que se enquadre na alínea c) do n.° 1 do artigo 34.° do Código do IRC, por não demonstrados os pressupostos de facto em que assenta a sua consideração fiscal.

L. Ademais, se o risco de incobrabilidade tivesse decorrido em 1998, conforme alegado pela Impugnante, à Impugnante caberia demonstrar, nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 74.° da LGT, a efectividade em tal exercício do custo enquanto provisão para créditos de cobrança duvidosa, e não o tendo feito contra si terá de ser valorada a ausência de factos que permitam sustentar tal entendimento.

M. E, como referido, só são admissíveis para efeitos fiscais as provisões para créditos de cobrança duvidosa nas condições referidas no n.° 1 do artigo 33.° e n.° 1 do artigo 34.° do Código do IRC, nas percentagens previstas no n.° 2 do artigo 34.° do Código do IRC, precisamente em obediência ao princípio contabilístico da prudência conjugado com o princípio da especialização dos exercícios.

N. E é em tais termos que a alínea h) do n.° 1 do artigo 23.° do Código do IRC prevê que as provisões sejam consideradas custo do exercício: fiscalmente dedutíveis nos termos do artigo 34.° do mesmo diploma legal, e imputáveis ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios previsto no aludido artigo 18.° do Código do IRC.

O. Pelo que, incorreu o Tribunal a quo, no segmento em questão, em erro de julgamento de facto, com consequente violação do disposto no n.° 1 do artigo 33.° do Código do IRC e do n.° 1 e 2 do artigo 34.° do Código do IRC, bem como do artigo 37.° do Código do IRC, conjugado com a alínea h) do n.° 1 do artigo 23.° e o n.° 1 do artigo 18.° do mesmo diploma legal.

P. Mais considerou a douta sentença com referência a encargos contabilizados pela Impugnante referentes a seguros automóveis e aos exercícios de 1997 e de 1998 a impugnação procedente, admitindo-os como custos fiscalmente admissíveis à luz do artigo 23.° do Código do IRC, com fundamento nos factos constantes das alíneas S) e T) do probatório, os quais se configuram contraditórios face aos factos que decorrem do procedimento inspectivo patentes nos relatórios de inspecção tributária e documentos anexos, os quais porque constantes de informações oficiais prestadas pela inspecção tributária e constantes do probatório, fazem fé nos termos da lei, constituindo-se como meio de prova ao abrigo do disposto no n.° 1 do artigo 76.° da LGT e artigo 115.° do CPPT.

Q. Com efeito, decorre dos relatórios de inspecção tributária, conforme alíneas G) e H), K) e L) dos factos assentes, e com referência a tais custos relativos a encargos com seguros automóveis de que eram beneficiários trabalhadores da empresa que: i) nem todos os funcionários que necessitavam de se deslocar no âmbito do exercício das suas funções, como vendedores e técnicos que efectuavam assistência, tinham direito a um benefício que se destinava a pagar parte do seguro automóvel; ii) nem foi o benefício, com referência a cada um dos trabalhadores devidamente contextualizado, tendo em conta a alegada e não demonstrada variação entre 40% e 80% do pagamento do prémio do seguro decorrente de norma desconhecida da Administração, aplicável a apenas a parte dos funcionários e não todos, com pretenso fundamento no exercício de funções que outros exerciam do mesmo modo sem que lhes fosse atribuído benefício algum.

R. E, não sendo o benefício uniforme e não existindo um critério que permita determinar os factores em que assenta a atribuição do mesmo a uns trabalhadores e a sua não atribuição a outros, sendo certo que estes outros trabalhadores, fazem igualmente com o seu veículo próprio deslocações ao serviço da empresa, não pode tal custo referente a bens que não são imobilizado da Impugnante e cuja documentação de suporte se encontra titulada por terceiros, ser considerado como custo indispensável à obtenção dos proveitos.

S. Deste modo, ao facto assente constante da alínea S) do probatório não pode ser atribuída a relevância probatória atribuída pela douta sentença, porquanto manifestamente contraditado pelos documentos constantes dos autos, apresentados pela própria Impugnante, onde se incluem os registos contabilísticos pela mesma efectuados com referência à matéria em análise.

T. Atento o exposto, é entendimento da Fazenda Pública que, não estabelecido o nexo causal entre os custos em questão e os proveitos, directos ou indirectos, mediatos ou imediatos, tendo em conta a natureza das despesas em apreço nos autos, que permita afirmar a indispensabilidade do custo, não podem...

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