Acórdão nº 11692/19.7T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-05-04

Data de Julgamento04 Maio 2022
Ano2022
Número Acordão11692/19.7T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 11692/19.7T8PRT.P1
Comarca do Porto
Juízo Central Cível do Porto (Juiz 3)

Acordam na 5.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório
1. Configuração da acção
Em 27 de Maio de 2019, AA intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra BB, CC e DD, “K..., L.da” e EE, pedindo que:
- seja declarada nula a escritura pública de compra e venda, realizada em 29/03/2019, dadas as falsas declarações prestadas pela primeira Ré com conhecimento das segunda e terceira Rés;
- Sejam declarados nulos todos os registos efectuados sobre o prédio objecto da escritura referida;
- Seja declarado nulo o negócio jurídico que a escritura corporiza, com as legais consequências;
- sejam os réus, solidariamente, condenados no pagamento dos danos resultantes para o autor da anulação da escritura, que vierem a apurar-se em liquidação de Sentença nomeadamente todas as despesas com o presente processo.
Tais pedidos assentam nos seguintes factos (síntese):
Autor e primeira ré contraíram casamento entre si no dia 30 de Junho de 1959, com convenção antenupcial em que estipularam o regime de separação de bens, que passaria a regime de comunhão geral de bens com a existência de filhos ou outros descendentes.
Em 30 de Setembro de 1960 nasceu o primeiro filho do casal, passando, então, a vigorar entre eles o regime de comunhão geral de bens.
Foi assim que todos os bens doados à primeira ré passaram a integrar o património comum do casal, por força da cláusula quinta da referida convenção antenupcial.
Em finais de Abril de 2019, tomou conhecimento de que o prédio urbano sito no Lugar ... em ..., inscrito na respectiva matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Gondomar sob o n.º ..., foi vendido pela primeira ré aos segundos réus e o negócio foi formalizado por escritura pública outorgada em 29 de Março de 2019, no Cartório Notarial da ré EE.
O prédio vendido era património comum do autor e da primeira ré, mas esta terá feito falsas declarações sobre a titularidade do prédio, dizendo que era bem próprio e que era casada sob o regime de separação de bens.
No negócio interveio, como mediadora, “M..., Lda.”.
A compra e venda é nula, «uma vez existe falsidade de documentos com base nos quais ele foi efectuado, falsidade essa que era conhecida das partes outorgantes e ainda da mediadora imobiliária».
Trata-se de venda de coisa alheia porque um dos cônjuges (a Ré) alienou bem próprio do casal, sem consentimento do outro (o Autor), que leva à nulidade do contrato.
A mediadora (terceira ré) sabia da «ilegitimidade da venda pela primeira Ré» porquanto tinha sido notificada, por notificação judicial avulsa, «da realidade que impedia o negócio».
Os segundos réus não são adquirentes de boa-fé, pois sabiam da ilegalidade da venda que lhes ia ser feita, mas ainda assim concretizaram o negócio dado o valor irrisório pelo qual o imóvel foi vendido.
A quarta Ré «é solidariamente responsável pelos danos causados ao Autor que se vieram a contabilizar da anulação do negócio a que aquela deu forma de escritura pública e que permitiu o registo indevido em nome dos segundos Réus».
Em 11.06.2019, na sequência de notificação que lhe foi feita de que «o contribuinte indicado não corresponde à Ré que se pretende citada», o autor apresentou requerimento em que afirma que a designação “...” não passa de uma marca que é usada por diversas empresas e concluiu requerendo que «em face desta estranha engenharia de denominações e registos comerciais», sejam citadas, “como terceiras rés”, as sociedades “M..., Lda.” e “D..., Lda.”».

2. Oposição
Devidamente citados, todos os réus apresentaram contestação.
Os réus DD e CC defendem-se impugnando a generalidade dos factos alegados pelo autor, já por não corresponderem à verdade, já porque os desconhecem e não têm obrigação de os conhecer.
Não pode, desde logo, corresponder à verdade a afirmação do autor de que foi em 30.06.1959 que contraiu casamento com a ré BB, visto que na convenção antenupcial que celebraram em 15.07.1959, pela qual foi estipulado que o regime de bens que entre ambos iria vigorar seria o da separação, ambos são identificados como sendo solteiros. E na escritura de doação que os seus pais lhe fizeram em 28.07.19959, a ré BB, também, é identificada como solteira.
Não resta dúvida de que o regime de bens do casamento do autor e da ré BB é, sempre foi, o da separação, como resulta do clausulado da convenção antenupcial, em especial da sua cláusula primeira.
Por isso os bens que a ré BB recebeu dos seus pais por doação que estes lhe fizeram em 28.07.1959, nos quais se inclui o prédio que lhe compraram em 29.03.2019, são bens próprios e não bens comuns do casal, pelo que o autor não tinha que intervir no negócio.
Imputam ao autor litigância de má-fé por ter alegado factos que sabe não corresponderem à verdade.
A ré BB defende-se por excepção e por impugnação.
Na defesa por excepção, invoca a existência de causa prejudicial e falta de interesse em agir do autor.
Em 08.04.2019, o autor intentou contra si uma outra ação em que pede seja “decretada a simples separação de bens do casal, passando a vigorar entre eles o regime da separação”, que corre termos no Juiz 1 do Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia, sob o nº 3190/19.5T8VNG.
Não há dúvida que as duas lides judiciais assentam na mesma questão controvertida, ou seja, no regime de bens do casamento do autor e da ré.
Por isso essa ação de simples separação de bens constitui causa prejudicial relativamente ao presente processo, pois o seu desenrolar e desfecho será suscetível de inutilizar os efeitos pretendidos neste, ou, pelo menos, (...) modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão de outro pleito.
Da convenção antenupcial celebrada em 15.07.1959 resulta bem claro que o regime de bens que vigoraria no casamento da autora e da ré seria o da separação e a comunhão geral, apenas, vigoraria no caso de haver filhos ou outros descendentes à morte de qualquer um deles.
Neste contexto, o prosseguimento da acção não conduz a qualquer efeito útil, desde logo, «relativamente à pertença nulidade da escritura pública, registos e negócio, pelo que, será forçoso concluir não existir qualquer necessidade justificada, razoável ou fundada, na manutenção da presente instância, faltando assim o interesse em agir por parte do Autor
Na defesa por impugnação, alega que, no essencial, não são verdadeiros os factos alegados pelo autor, a quem acusa de «faltar irreverentemente à verdade, desde logo porque bem sabe que o seu regime de casamento em vigor é a Separação de Bens, e não comunhão geral», além de que este «bem sabe, ou deveria de saber…. que é casado desde 30 de Julho de 1959, com convenção antinupcial de regime de separação de bens, regime esse que vigora até aos dias de hoje
Também atribui ao autor litigância de má-fé, com utilização de afirmações caluniosas.
Também a ré EE se defendeu por excepção e por
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