Acórdão nº 11588/18.0T8LSB.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-11-22

Ano2022
Número Acordão11588/18.0T8LSB.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes da 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I. RELATÓRIO
1. Da Acção
MB, com os sinais dos autos, impetrou acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra, CTT – Correios de Portugal, SA.
Alegou em fundamento síntese, que devido à conduta ilícita e culposa da R., não recebeu uma carta registada remetida pelos Serviços de Segurança Social para a sua residência; em consequência da falta de recepção dessa carta, o Autor não se apresentou junto do Centro de Emprego de Sintra na data agendada, perdendo o rendimento social de inserção que vinha recebendo. Pedindo a final que : a) a Ré venha juntar a folha de registo relativo à zona de residência do Autor, datada do dia 18 de Abril de 2017, para comprovar junto do centro de emprego, que a falta convoca não lhe foi imputável, e recuperando o rendimento social que lhe deveria ter sido pago entre Junho de 2017 e Março de 2018; b) a Ré seja condenada ao pagamento ao Autor de uma indemnização pelos danos pelo mesmo sofridos em valor nunca inferior a €5.000,00 (cinco mil euros); c) em alternativa ao primeiro pedido, a Ré condenada ao pagamento ao Autor das prestações sociais que lhe deveriam ter sido pagas pelo Instituto de Segurança Social, IP., acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal de 4%, na quantia de €1.895,20 (mil oitocentos e noventa e cinco euros e vinte cêntimos).
A Ré contestou. Alegou, em síntese, que o objeto postal em causa é uma carta registada simples, que não inclui folha de assinatura do destinatário e a qual foi depositada na morada do Autor; mais alegou, que a distribuição postal na zona foi realizada pela Divulgângulo – Distribuidor Unipessoal, Lda.”, com a qual celebrou contrato de prestação de serviço, cuja intervenção principal requereu. Concluiu pela improcedência da acção e a absolvição do pedido.
Foi admitida a intervenção da identificada empresa na qualidade de assistente da Ré e a qual não apresentou articulado.
Prosseguindo a instância os demais termos , realizou-se a audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção , conforme dispositivo que se transcreve Em face do exposto, vistas as já indicadas normas jurídicas e os princípios expostos, o Tribunal julga a ação parcialmente procedente, por provada, e consequentemente: 1. Condena-se a R. a pagar ao A. a quantia de e €1.895,20 (mil oitocentos e noventa e cinco euros e vinte cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento; 2. Condena-se a R. a pagar ao A. a quantia de €2.000,00 (dois mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento. Custas por A. e R. na proporção do respetivo decaimento – art.º 527º do C.P.C.»
2. Do Recurso
Inconformada, a Ré interpôs recurso, finalizando as alegações com as conclusões seguintes:
I. Por sentença de 03 de janeiro de 2022 foi a ora Recorrente CTT – Correios de Portugal, S.A. condenada a pagar ao Autor a quantia de €1.895,20 (mil, oitocentos e noventa e cinco euros e vinte cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento; e ainda a pagar ao Autor a quantia de €2.000,00 (dois mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros demora, à taxa legal, contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
II. Entendeu, de facto, o Tribunal a quo que os CTT – Correios de Portugal, S.A. depositaram “de forma imprevidente, correspondência registada em caixa do correio cujo titular desconhece, como se de correspondência simples se tratasse”.
III. Tendo causado a ausência do Recorrido em diligência obrigatória que levou ao corte do seu único rendimento por parte o Instituto da Segurança Social, IP.
IV. Ocorrendo o “evento danoso pelo comportamento proibido/ilícito da Recorrente.”
V. Ora, não pode a ora recorrente conformar-se com tal decisão.
VI. Entende a Recorrente que decisão diferente se impunha, designadamente, por não ter sido feita uma correta subsunção dos factos ao direito.
VII. A Recorrente CTT – Correios de Portugal, S.A., é uma sociedade que, nos termos legalmente consagrados no Decreto-Lei n.º 448/99, de 4 de novembro, é concessionária do serviço postal universal.
VIII. A Recorrente tem como objeto a exploração dos serviços públicos de correios, nos termos do Decreto-Lei n.º 87/92, de 14 de maio.
IX. Sucede que, o objeto postal em discussão nos presentes autos não foi distribuído por nenhum funcionário da Recorrente, antes sim, conforme resulta dos factos provados, por um carteiro de uma empresa colaboradora de “agenciamento a Terceiros”: a empresa DIVULGÂNGULO – Distribuidor Unipessoal, Lda. ao abrigo do contrato de prestação de serviços de distribuição celebrado entre esta e a Recorrente, a 14 de junho de 2016, tendo vindo a ser o mesmo objeto de sucessivos aditamentos, cujo último data de 05 de junho de 2018.
X. Do referido contrato resulta que a empresa DIVULGÂNGULO – Distribuidor Unipessoal, Lda. obrigou-se “a prestar à Primeira Contratante serviços de recolha e distribuição diária de envios postais de correio urgente e não urgente, (…) nas áreas de distribuição identificadas no Anexo VI (…)”, conforme resulta da cláusula segunda, n.º 1.
XI. No que respeita à responsabilidade por eventuais danos causados, no âmbito do objeto e das obrigações decorrentes do Contrato de Prestação de Serviços de Distribuição em apreço, vem previsto, na cláusula sétima, com especial relevância para o exposto no n.º 3, que “A Segunda Contratante responde por quaisquer danos que possam resultar para a Primeira Contratante ou para terceiros, decorrentes de atos ou omissões imputáveis aos seus colaboradores”.
XII. Assim, tendo sido, in casu, um colaborador da empresa DIVULGÂNGULO – Distribuidor Unipessoal, Lda., cuja intervenção provocada foi requerida nos autos, a distribuir a correspondência postal, na data em questão e na zona indicada, não se compreende a decisão do Tribunal a quo em condenar a Recorrente por alegada conduta proibida/ilícita na sua distribuição. De facto, reitere-se, não foi a Recorrente quem distribuiu o objeto postal em crise.
XIII. Pelo que, a existir condenação, sempre teria de ser condenada a empresa DIVULGÂNGULO – Distribuidor Unipessoal, Lda., cuja intervenção provocada foi devidamente requerida nos autos, e nunca a Recorrente CTT – Correios de Portugal, S.A.
XIV. Ainda que assim não se entendesse, sempre se dirá que, na hipótese de ter sido um funcionário da Recorrente a distribuir o objeto postal em apreço nos autos, importaria ter em atenção que existem dois tipos de serviços de registo postal, a saber: o registado e o registado simples.
XV. Conforme resulta dos factos provados, o objeto postal que aqui se discute trata-se de uma carta registada simples, identificada com o n.º RN063876978PT.
XVI. A missiva foi recebida pelo seu destinatário em 18 de abril de 2017, conforme Docs. 4 e 6 juntos com a petição inicial.
XVII. O correio registado simples trata-se de um serviço que apenas se executa no Serviço Nacional, caracterizando-se pelo facto de a entrega ao destinatário ser feita com o depósito do envio no seu recetáculo domiciliário, cfr. dispõe o ponto 2.2.1.1 do Boletim Oficial n.º 51-2004, de 30 de março de 2004, dos CTT – Correios de Portugal, S.A.
XVIII. Ou seja, por via de carta registada simples, apenas se confirma o depósito do objeto postal na caixa de correio do destinatário, considerando-se, nesse momento, a entrega como conseguida.
XIX. Não é, pois, neste tipo de objeto postal, recolhida qualquer assinatura do destinatário ou de quem recebe em nome do destinatário, porquanto esta opção é exclusiva do correio registado com aviso de receção.
XX. Neste sentido vai também a jurisprudência nacional, nomeadamente o Tribunal Central Administrativo do Norte, no acórdão de 15 de abril de 2021, no qual afirma que: “Efectivamente, o Tribunal a quo deu como provado que a notificação da decisão de aplicação da coima foi expedida por carta registada simples, a qual foi expedida e entregue na morada da Recorrente, motivo que o levou a concluir que a notificação de tal decisão foi perfeita. […] deve considerar-se ter operado a presunção de notificação, uma vez que existe prova do registo e remessa da carta para a morada da Recorrente, constando dos autos informação dos correios comprovativa da data em que ocorreu o registo dos CTT e da efectiva entrega da notificação na morada da Recorrente”.”.
XXI. E, bem assim, o Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 08 de janeiro de 2020: “O registo simples, em que a única certeza que existe é que a expedição terá ocorrido em determinada data […]”
XXII. Resulta da própria decisão a quo que “Todas as testemunhas da R. disseram tratar-se de ‘registo simples’, no âmbito do qual garantiram não ser necessária qualquer assinatura do destinatário ou de qualquer outra pessoa: ‘ninguém tem de assinar’, disseram, mas apenas ‘picado na lista de distribuição ou PDA’ e depositado na correspondente caixa do correio”.
XXIII. Motivo pelo qual não se conforma a Recorrente com o facto de ter sido dado como provado na decisão que ora se recorre que “Ora, o Autor não recebeu qualquer carta e desconhece quem o poderá ter feito por si, porquanto a Recorrente nunca lho permitiu saber”.
XXIV. Reitere-se, nem a Recorrente nem ninguém poderia informar o Autor de quem terá ficado com a sua carta porquanto a mesma, tratando-se de uma carta registada simples, é simplesmente depositada na caixa de correio do destinatário. Não tem a Recorrente, obviamente, qualquer possibilidade de saber quem terá
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