Acórdão nº 1152/04.6 BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 04-10-2023

Data de Julgamento04 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão1152/04.6 BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACÓRDÃO


I-RELATÓRIO


A DIGNA REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (doravante Recorrente), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por G. A.-A. H., LDA., tendo por objeto os atos de liquidação n.ºs 03361010, 03367338 e 03372851 respeitantes a Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), dos anos de 1999, 2000 e 2001, respetivamente, bem como das correspondentes liquidações de juros compensatórios (JC), no valor global de €37.974,89.

A Recorrente, veio apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem:

“I. O presente Recurso vem reagir contra a Sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente procedente a impugnação, anulando a liquidação de IVA e respetivos juros compensatórios referentes a 1999, mantendo na ordem jurídica as liquidações de IVA e respetivos juros compensatórios referentes a 2000 e 2001.

II. A douta sentença recorrida julgou a impugnação procedente relativamente ao exercício de 1999 por considerar que a AT não demonstrou a verificação dos pressupostos legais para recurso a métodos indiretos de determinação da matéria tributável, considerando que a maioria das irregularidades detetadas pela inspeção tributária são referentes a 2000 e 2001, tendo ainda relevado a afirmação da AT de que a impugnante possuía contabilidade regularmente organizada.

III. Contudo, como refere a douta sentença, a afirmação da regularidade da contabilidade não implica, por si só qualquer contradição com a impossibilidade de quantificação direta e exata da matéria tributável. E, no caso concreto assim é, como ficou demostrado, quer no relatório de inspeção tributária (RIT), quer no ato de fixação da matéria tributária em sede de procedimento de revisão.

IV. Importa ainda salientar que a verificação dos pressupostos para aplicação de métodos indiretos não pode aferir-se pela maior ou menor quantidade de irregularidades detetadas relativamente a um exercício. Concretamente, ficou demonstrado e é indiscutível que não foram apresentadas fitas de máquina dos meses de dezembro de 1999. Verificaram ainda os serviços de inspeção que o valor das vendas declaradas pela impugnante à AT e o valor das vendas declaras pela mesma à sociedade gestora do centro comercial V. G. eram diferentes, tendo-se registado uma diferença de € 17.537,08, bem como diferenças de valores em dias concretos.

V. A douta sentença recorrida não aceita como válidos os valores fornecidos à sociedade V. G., considerando irrelevante a diferença de valores, com o argumento de que haveria um litígio entre sócios e ainda o argumento de a AT havia afirmado que a contabilidade estaria organizada. Contudo, a douta sentença recorrida considera igualmente que a falta das fitas de máquina referentes a agosto de 1999 não impediria o apuramento direto da matéria tributável, argumentando que a AT obter os elementos em falta através de meios alternativos, como os talões de caixa, as vendas a dinheiro e as relações diárias das vendas fornecidas à sociedade V. G..

VI. Sugerindo assim, contraditoriamente, a douta sentença, que a AT poderia ter recorrido aos mesmos dados que anteriormente havia rejeitado aquando da análise das divergências da contabilidade que justificam o recurso a métodos indiretos.

VII. Acresce ainda referir que a mesma sentença, relativamente aos anos 2000 e 2001, admite como válidos os valores fornecidos pela sociedade V.G., que lhe haviam sido fornecidos pelo sócio, para justificar a aplicação de métodos indiretos, bem como para a quantificação da matéria tributável (seguindo o acórdão do TCA no processo 667/05.3BELSB).

VIII. A Fazenda não se conforma com a decisão contraditória de considerar verificados os pressupostos para aplicar métodos indiretos e admitir como credíveis os valores que estavam na posse da sociedade V.G. e, simultaneamente, declarar os valores declarados à V.G. como não credíveis.

IX. Relativamente à existência de conflito entre os sócios e à possibilidade de esse conflito poder influenciar os valores declarados, considera a douta sentença na sua fundamentação referente a 2000 e 2001, que o argumento da retaliação em si é falacioso já que as consequências desse ato teriam efeitos ao nível empresarial, designadamente aumento de custos da empresa da qual o mesmo era sócio e da qual esperaria obter mais lucros quando, com essa atitude iria acontecer o contrário.

X. A douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento de facto e de direito, por considerar que a AT não demonstrou a existência de pressupostos para aplicação de métodos indiretos, bem como contradição nos fundamentos na mesma sentença.

XI. Acresce ainda referir que o critério de quantificação se revela perfeitamente adequado ao caso concreto, encontrando o mesmo pleno enquadramento na enumeração (não taxativa) do artigo 90º, nº 1 da LGT, designadamente na alínea d) que prevê expressamente a possibilidade de a AT considerar os elementos e informações declaradas a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte, como é o caso da sociedade que gere o centro comercial V.G..

XII. Importa ainda salientar que, demonstrados os pressupostos e a validade do critério de quantificação, caberia ao sujeito passivo o ónus de demonstrar o eventual excesso de quantificação.

XIII. A douta sentença incorre assim em erro de julgamento de facto e de direito, infringindo as normas do artigo 87º, nº 1, alínea b) e do artigo 88º, al a) da LGT, bem como do artigo 74º da LGT. Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente.

Porém, V. Exªas decidindo, farão a costumada JUSTIÇA.”


***


A Recorrida devidamente notificada, optou por não apresentar contra-alegações.

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O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul proferiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

***


Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A decisão recorrida fixou a factualidade que infra se descreve:

“Com relevo para a apreciação do mérito da pretensão da Impugnante, consideram-se provados os seguintes factos:

1) A ora Impugnante foi alvo de uma acção inspectiva por parte da Administração Fiscal relativamente ao IRC e IVA dos anos de 1999 a 2001:

Imagens: Originais nos autos






Imagens: Originais nos autos





- cfr. doc. a fls. 432 a 447 do processo físico;

2) A ora Impugnante foi notificada, através do Ofício n.º010731 da Direcção Distrital de Finanças de Lisboa, dos atos de fixação da matéria coletável de IVA relativos aos exercícios de 1999, 2000 e 2001 efetuados com recurso a métodos indirectos - cfr. doc. n.º1, junto com a petição inicial;

3) Não se conformando com tal decisão, a ora Impugnante solicitou, em 12.08.2003, a revisão da matéria coletável e do imposto fixado - cfr. doc. n.º2, junto com a petição inicial;

4)Foi a ora Impugnante notificada das liquidações de IVA e juros compensatórios supra identificados, cujos prazos limites para pagamento voluntário terminaram em 29 de Fevereiro de 2004 - cfr. docs.4 a 15 juntos com a petição inicial;

5) No que concerne à quantificação da matéria colectável em questão nos presentes autos, o laudo do perito da Fazenda Pública tem o seguinte teor: «5.Por outro lado, o Perito da Fazenda Pública entende que, para reconstituição da matéria tributável os Serviços de Inspecção consideraram, para cálculo das prestações de serviços presumidas, os dados obtidos através de controlo cruzado com uma entidade com quem o sujeito passivo tem relações económicas (V.G. D. G.).

Este indicador vem enumerado na alínea d) do n.º1 do art.90.º da L.G.T. Em face do exposto, e uma vez que o perito do sujeito passivo não apresentou, no decurso desta reunião, elementos que permitam legitimar a alteração dos valores propostos, nem demonstrou que os resultados efectivamente obtidos são inferiores aos fixados, serão de manter os mesmos valores com referência aos exercícios de 1999, 2000 e 2001 relativamente a IRC e IVA » - cfr. fls.42 do processo físico;

6) O perito da Impugnante, sustentou, a sua discordância com os critérios de quantificação da matéria tributável, considerando, relativamente ao que aqui importa, que as margens imputadas pela Administração Tributária ao negócio da Impugnante «(…) são manifesta e indelevelmente superiores àquelas que o sector tem», por serem «(…) perfeitamente desproporcionados, por exagerados, à realidade económica do sujeito passivo (…) mesmo quando comparada com aquela que se apura relativamente a todas as entidades inseridas no mesmo sector de actividade em que se encontra a contribuinte.» - cfr. fls.43 a 45 do processo físico;

7) O perito independente, por seu turno, e com suporte no debate resultante da reunião entre peritos e nos documentos que consubstanciam o requerimento de pedido de revisão e relatório da acção inspectiva, lavrou, ao que aqui releva, laudo do seguinte teor: «(…) tendo em conta que: - considera existir uma dúvida razoável sobre a veracidade dos principais documentos considerados para efeitos de revisão e que determinaram o apuramento da matéria colectável de IRC e IVA corrigido, ou seja, ou seja, sobre os talões de venda correspondentes à facturação do contribuinte e entregues por um dos sócios ao Centro Comercial V.G., uma vez que tais talões, os que foram exibidos, têm todos a mesma data embora respeitem a períodos diferentes; - não foram exibidos outros talões que pudessem ser confrontados com os exibidos na reunião; - tecnicamente parece ser muito discutível a aceitação dos talões como «bons» para efeitos de revisão; - parece que poderia ter sido aprofundada a análise para efeitos...

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