Acórdão nº 115/05.9BECTB de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-02-24

Ano2022
Número Acordão115/05.9BECTB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


I - Relatório

A FAZENDA PUBLICA, veio interpor recurso parcial da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela S…, Lda., contra o ato de liquidação adicional n.º 0… de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), e respetivos juros compensatórios, referente ao período de 2003, no valor global de € 6.936,10.

Nas alegações de recurso apresentadas, o Representante da Fazenda Pública, ora Recorrente, formula as seguintes conclusões:

a) A douta sentença violou os artigos 20/1 alínea a) do CIVA (e ainda do artigo 35/5 al. b) do CIVA).

b) A fazenda pública circunscreve o presente recurso ao IVA deduzido pela impugnante constante das facturas n° 4…, de 09/09/2003, 4… de 01/10/2003 e 4… de 03/11/2003, todas emitidas pela firma “T…, Lda.”, e apenas concernente às obras realizadas na “casa dos patrões” existente na exploração agrícola.

c) Nos termos do art° 20/1 al. a) do CIVA o sujeito passivo só tem direito à dedução do imposto suportado em aquisições de bens ou serviços que se destinem à realização de operações efectivamente tributadas e das operações isentas nele referidas.

d) Ora, no caso em apreço, o IVA suportado nas despesas com obra em imóveis destinados à “residência” do empresário agrícola, que de facto não é residência de ninguém, uma vez não ser aí residente nenhum dos sócios ou gerentes da impugnante, não é dedutível, visto que se trata de imposto suportado em despesas que não se destinam às operações previstas no art° 20° do CIVA, ainda que os imóveis estejam integrados na exploração e pertençam ao seu imobilizado.

e) Assim, pois, nenhum dos sócios da “S…, Lda.”, reside na exploração agrícola ora em causa, sendo referido pela testemunha R…, no que concerne à “casa dos patrões” que, “a casa estava degradada”, as obras foram “só para evitar uma maior degradação das casas”. Aliás, é por esta testemunha ainda referido que “a factura dizia casa dos patrões mas servia para utilidade agrícola”, a corroborar o facto das obras efectuadas na “casa dos patrões” nada terem a ver com a exploração agrícola, que a “casa dos patrões” não tem qualquer utilidade agrícola, “não é utilizada para nada”. E embora a testemunha A… refira que “a casa dos patrões seria para arrumação de material”, a testemunha J… refere também que “a quinta tem mais um armazém onde são guardadas as alfaias agrícolas e os adubos”.

f) Está, pois, em causa, relativamente às obras realizadas na “casa dos patrões”, a aquisição de bens e/ou serviços que não se destinam à realização de operações efectivamente tributadas, tendo apenas em vista “evitar uma maior degradação da casa”, uma vez que a esta casa não é dada qualquer utilidade agrícola, servindo apenas para lazer e uso pessoal esporádico dos sócios da impugnante.

g) Por outro lado ainda, no sentido de reforçar a não dedutibilidade do IVA suportado pela impugnante nas obras da “casa dos patrões”, nas três facturas ora em causa não é especificado de que tipo de obras se trata. Refere a ora impugnante nos n° 11, 15 e 16 da p.i. que estas obras se reportam “à maioria das obras de manutenção realizadas (obra orçamentada), referentes a todas as edificações existentes na Quinta. Enquanto que as restantes facturas se reportam a trabalhos mais específicos, não orçamentados, e, por isso mesmo, mais especificamente identificados no descritivo das facturas”. O que é certo é que a impugnante não junta qualquer orçamento ou auto de medição das obras a identificar os trabalhos realizados, de forma a comprovar o alegado.

h) Referindo as facturas n° 4…e 4... apenas “casa dos patrões” não satisfazem os requisitos do art° 35/5 al. b) CIVA, por não conterem qualquer referência à quantidade e à denominação dos serviços prestados, não conferindo direito à dedução do IVA nelas mencionado, independentemente da efectiva realização da operação a que as mesmas se referem. Aliás, tal facto é corroborado pelo técnico de contas da ora impugnante, R…, que reconhece que “não há discriminação das obras por culpa dos prestadores de serviços”. Prestador de serviços que, no entanto, por exemplo em relação às obras efectuadas no “wc da casa dos patrões” - factura n° 4… - discriminou os serviços feitos e materiais aplicados, estando em causa apenas o valor de 429,00€, nada discriminando em relação à “casa dos patrões”, apenas referindo, sem mais, o enorme valor de 18.750,00€.

i) No que se refere aos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, eles constam dos autos, tendo sido juntos quer pela impugnante/recorrida, quer pela fazenda.

Pelo que, com o mais que Vossas Excelências se dignarão suprir, deve ser dado provimento ao recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida.»



Nas contra-alegações, a Recorrida S…, Lda., formula as seguintes conclusões:

A. Como matéria central, o que nos presentes autos sub iudice se encontra em decisão é se, efectivamente, é permitido a dedução relativa ao IVA constante das facturas relativas às obras realizadas nas três edificações existentes na Quinta: a denominada “casa dos patrões”, a “casa dos caseiros” e “edifício destinado aos trabalhadores agrícolas”. E entronca na questão central se tal dedução de IVA deverá ser permitida em função do destino das despesas de investimento efectuadas, ou seja, se as despesas de conservação e melhoramento dos imóveis integradas na Quinta do V… são consideradas e integradas no âmbito do investimento e melhoramento da sua unidade de produção.

B. Em sentido contrário ao entendimento da IMPUGNANTE E DA DOUTA SENTENÇA PROFERIDA, a Administração Tributária considerou que estas mesmas despesas foram realizadas nos mesmos bens imóveis mas que se consideram destinados à habitação, originado o acto de liquidação adicional n.° 0…, relativo a Imposto sobre Valor Acrescentado (“IVA”) do ano de 2003, no montante de 6.815,11 euros, bem como da respectiva liquidação adicional de juros compensatórios, período de Dezembro de 2003, no montante de € 120,99.

C. A aqui IMPUGNANTE (e Recorrida) acompanha em absoluto e na íntegra tudo o que foi dado como provado pela Douta Sentença, toda a motivação bem sustentada por ampla prova documental e testemunhal, bem como a Douta Decisão proferida, considerando, aliás, absolutamente exemplar e perfeita a douta sentença em relação aos presentes autos, que considera aqui integralmente reproduzida.

D. O próprio Relatório da Inspecção Tributária notificado à sociedade, enquanto fundamentação dos actos aqui impugnados, cite-se, «constatou-se que nos anos objecto desta inspecção o sujeito passivo esteve numa fase de investimento e melhoramento da unidade de produção. De facto nos anos em causa o sujeito passivo efectuou diversos investimentos, nomeadamente: plantação de novas vinhas que, pelas características do terreno envolvem custos avultados (...)». Concluindo-se que foram «tais investimentos que justificam os sucessivos pedidos de reembolso que vem solicitando».

E. Ficou amplamente provado nos autos e reconhecido de forma clara e inequívoca por todas as testemunhas arroladas pela IMPUGNANTE que, no âmbito da sobredita política de investimentos, esta sociedade realizou vários investimentos, entre os quais obras de conservação e melhoramento nas instalações destinadas à habitação dos caseiros, destinado aos trabalhadores existentes na sua exploração agrícola, incluindo, também, na denominada “casa dos patrões”. De facto, foi amplamente comprovado nos autos e de forma detalhada todas as obras de investimento, incluindo as de conservação, realizadas nas três edificações existentes na Quinta: a denominada “casa dos patrões”, a “casa dos caseiros” e “edifício destinado aos trabalhadores agrícolas”;

F. No caso de explorações agrícolas complexas e com alguma dimensão, como a explorada pela sociedade V…, é óbvio - como é de conhecimento geral - que a exploração tem forçosamente de possuir a tempo inteiro um caseiro, pois só dessa forma todos os assuntas do dia-a-dia da Quinta - muitas das vezes tão imprevisíveis, como a própria natureza - são devidamente tratados. Neste sentido, as casas de caseiros só existem nas Quintas - como na Quinta explorada pela V…-, para que os caseiros possam, a tempo inteiro, encarregar-se de todos os assuntas práticos da Quinta. Ou seja, são instalações absolutamente necessárias para a “máquina produtiva”.

G. Ficou provado nos autos que a denominada “casa dos caseiros'’ sofreu obras de beneficiação ou manutenção geral, servindo esta habitação para a instalação do caseiro responsável pela Quinta;

H. O edifício dos trabalhadores agrícolas, apesar de servir de dormitório ocasional para os trabalhadores, o mesmo não tem obviamente uma função “habitacional” enquanto “casa de morada de família” dos mesmos. Por outras palavras, nenhum trabalhador vive/habita nesse edifício a tempo inteiro. Estes trabalhadores, tal como os caseiros, são elementos fundamentais na actividade produtiva de uma Quinta, como ficou, igualmente, provado pelos testemunhos apresentados nos autos.

I. A denominada “casa dos patrões” é uma habitação que não tem condições de habitabilidade e que, por isso mesmo, não está habitualmente a uso (mesmo depois das obras realizadas), servindo, esporadicamente, no primeiro andar como escritório da S…, e no rés-do-chão, para guarda e arrumação de material e máquinas destinadas à actividade produtiva e laboração da Quinta V….

J. Pelo que, por todo o decurso da prova documental e testemunhal efectuada, falece por completo toda a fundamentação e prova realizada em relação ao alegado pela Inspecção Tributária de que as obras de conservação foram realizadas em “casa que pelas suas características se consideram habitacionais.” Nem poderia comprovar tal facto,...

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