Acórdão nº 114485/20.9YPRT.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 12-07-2022
Data de Julgamento | 12 Julho 2022 |
Ano | 2022 |
Número Acordão | 114485/20.9YPRT.C1 |
Órgão | Tribunal da Relação de Coimbra |
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Juiz relator…………....Alberto Augusto Vicente Ruço
1.º Juiz adjunto………José Vítor dos Santos Amaral
2.º Juiz adjunto……….Luís Filipe Dias Cravo
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(…)*
Recorrentes…………………..AA; e
………………………………….BB, contribuintes fiscais n.º ...64 e ...00, residentes Rua ... - ..., ... ....
Recorrida……………………..U..., Lda., pessoa colectiva n.º ..., com sede na Avenida ..., ... – ... ... ....
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I. Relatório
a) A autora U..., Lda instaurou a presente ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias com o fim de obter a condenação dos Réus a pagarem-lhe a quantia de €12.915,00 de capital, mais juros de mora vencidos no montante de €781,27 e ainda €150,00 a título de «outras quantias».
Invocou a celebração entre si e os Réus de um contrato de mediação em regime de exclusividade, pelo período de seis meses, automaticamente renovável por igual período, nos termos do qual os Réus se obrigaram a pagar à Autora a quantia de 5% calculada sobre o preço de venda do imóvel que colocaram à venda, caso fosse vendido, acrescido de IVA à taxa legal em vigor.
O contrato outorgado foi objeto de alteração (2.ª cláusula), em 4 de março de 2018 relativamente ao preço de venda.
Argumenta que promoveu o imóvel em plataformas online e angariou clientes e que o imóvel foi vendido pelos Réus na vigência do contrato, pelo preço de €210.000,00, sem que tivesse sido paga a comissão devida à Autora, muito embora já tenha remetido a fatura aos Réus.
Os Réus deduziram oposição.
Alegam que em 18 de maio de 2018 rescindiram o acordo de mediação com a Autora e contrataram outra mediadora, a V..., e logo surgiram vários interessados e celebraram a escritura de compra e venda em junho de 2019, pelo preço de 210.000,00 euros.
Durante a vigência do contrato com a Autora não lhes foi apresentado qualquer interessado na aquisição do imóvel, agendada visita ou apresentado interessado no imóvel.
Concluíram pela absolvição do pedido.
No final foi proferida a seguinte decisão:
«Pelo exposto, ao abrigo das disposições legais supra citadas, decide este Tribunal:
I. Condenar os Réus a pagar à Autora a quantia de €12.915,00 (doze mil novecentos e quinze euros), a que acresce €781,27 de juros de mora calculados desde 28/6/2019 até 30-12-2020, a que acrescem juros de mora calculados sobre o capital, à taxa legal de 4%, desde 1-01-2021, até integral pagamento;
II. Absolver os Réus do pagamento de €150,00, a título de outras despesas;
III. Condenar os Réus nas custas da ação;
IV. Absolver a Autora do pedido de condenação em litigância de má-fé;
V. Condenar os Réus nas custas do incidente, em quantia que se fixa em 0,5UC. Notifique.»
b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte dos Réus, cujas conclusões são as seguintes:
«– A sentença de que se recorre, padece de nulidade por violação clara do direito processual, faz uma errada interpretação da lei, julgou incorretamente, a matéria dada como provada e não provada;
– A sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia e uma vez reapreciada e valorada a prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente os documentos e os depoimentos prestados pelas testemunhas, a sentença deverá ser revogada e, em consequência serem os Réus/Recorrentes, absolvidos do pedido;
– Na presente ação a Autora/Recorrida, mediadora de imóveis, reclama o pagamento de uma comissão fundada num contrato de mediação para venda de um imóvel propriedade dos AA. Recorrentes, celebrado a 11.06.2017, em que alega ter sido convencionado o regime de exclusividade para a mediação, venda que foi feita por terceiro (outra mediadora) a quem os AA pagaram a comissão respetiva.
– Os Réus/Recorrentes, reconheceram que celebraram um contrato com a A., alegaram que o rescindiram em 19 de maio de 2018, por não terem conhecimento de qualquer efeito útil da prometida angariação (volvidos cerca de um ano estavam sem visitas e sem qualquer interessado no negócio), por mera carta entregue em mão, rescisão essa que foi aceite pela autora;
– Após a rescisão celebraram um contrato com outra mediadora e lograram obter interessados na compra, tendo-se concretizado o negócio de venda em 28 de junho de 2019;
– Ademais, os Réus/Recorrentes alegaram que desconheciam que o contrato de mediação era em regime de exclusividade, já que não lhes foi explicado o seu conteúdo e consequências, tratando-se de um clausulado previamente estabelecido e no qual os Réus/Recorrentes se limitaram a aderir ao mesmo – artigo 26º da oposição;
– Que a concretização do negócio da qual a Autora reclama a comissão pela venda, ocorreu após a rescisão do contrato de mediação por parte dos Réus/Recorrentes e que o negócio não se deveu a qualquer ato ou diligência da Requerente/Recorrida;
– Ademais, a prova produzida em audiência de julgamento impõe necessariamente um desfecho diverso do litígio contido na sentença, devendo ser reapreciados os factos conforme veremos;
– A sentença de que se recorre é nula por omissão de pronuncia porquanto os Recorrentes na sua oposição suscitara a questão de que o contrato que funda a causa de pedir da Autora, é um contrato de adesão, em que aqueles se limitaram a aderir a um clausulado previamente estabelecido e que lhes foi apresentado pronto pela Autora/Recorrida, sem que tenha sido discutido o mesmo e lhes tenha sido explicado o seu conteúdo e consequências, nomeadamente, quanto ao regime de exclusividade;
– Suscitaram esta questão na oposição, questão que não constitui apenas um fundamento ou argumento da parte, mas trata-se de uma questão essencial ou fundamental que pode influir na decisão da causa e cuja apreciação pode determinar uma diferente resolução da lide;
– O contrato em que a Autora/Recorrida radica o seu pedido é um contrato de adesão, elaborado pela Autora, sem prévia negociação individual, destinando-se todas as suas cláusulas a tornarem-se vinculativas quem os subscreve ou aceita, não tendo possibilidade de modelar o seu conteúdo, introduzindo neles alterações, os seus destinatários limitam-se a aceitar ou assinar esse contrato, pelo que está sujeito ao regime das cláusulas contratuais gerais, competindo à Autora demonstrar e provar que informou os Réus/Recorrentes das cláusulas contratuais gerais de modo a que estes ficassem conscientes, pelo menos, das consequências do ali contratado;
– O contrato de mediação objeto dos presentes autos foi previamente elaborado pela Autora/Recorrida antes da entrada em negociações com os RR/Recorrentes e aplica-se a todos os seus contraentes, sem que lhes seja dada outra possibilidade que não seja a da sua aceitação ou rejeição, estando-lhe vedada a possibilidade de discutir o seu conteúdo;
– Incumbia à Autora/Recorrida, provar que comunicou aos Réus/Recorrentes as cláusulas que estes se limitaram a subscrever ou aceitar, comunicação que não se basta com uma mera assinatura de contrato, devendo esta ser realizada de modo adequado para que se torne possível ao aderente tomar conhecimento e apreender o seu conteúdo e bem assim, as consequências das ditas cláusulas – artigo 5º, n.º 2 do Decreto-Lei 446/85 de 25 de outubro.
– E ainda nos termos do n.º 3 do artigo 5º do citado decreto-lei, o ónus da prova da comunicação adequada e efetiva cabe ao contratante determinado que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais e nos termos do artigo 6º, o contratante determinado que recorra a cláusulas gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspetos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique;
– No caso dos autos, o regime de exclusividade previsto no contrato de mediação é elemento essencial do contrato que impõe uma pesada obrigação sobre os Réus/Recorrentes;
– E este clausulado do regime de exclusividade constitui uma cláusula contratual geral em que não houve prévia negociação individual com vista a lograr o acordo das partes, e tornou-se vinculativa quando os Réus/Recorrentes que se limitaram a subscrevê-la e/ou a aceitá-la;
– E, resultou provado, nomeadamente da prova testemunhal – nesta, especialmente os depoimentos de CC e DD acima reproduzidos - produzida em audiência de julgamento que estas cláusulas não foram explicadas aos Réus/Recorrentes;
– Pelo que deve ser dado acrescentado aos factos dados como provado que: “O clausulado predefinido pela Autora constante do contrato de mediação imobiliária em causa, não foi comunicado previamente nem explicado o seu conteúdo aos Réus/Recorrentes, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente – Nos termos do artigo 8º, alínea a) do mesmo diploma, consideram-se excluídas dos contratos singulares as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5º atrás referido, sendo assim a consequência do incumprimento do dever de comunicação e informação por parte do predisponente implica a exclusão do clausulado do contrato, com não atendimento do mesmo;
– O dever de comunicação deve abranger a totalidade do clausulado e deve ser feita com a antecedência necessária a uma cabal apreensão, interiorização e possibilidade de reponderação, normalmente na fase pré-negocial e efetivada de modo adequado, tendo-se em conta designadamente, a importância do contrato, a sua extensão e complexidade das suas cláusulas;
– Tratando-se de um contrato cujo conteúdo são cláusulas contratuais gerais, sujeitas à LCCG, e tendo esta questão sido deduzida pelos RR., em tempo e e sede própria, este tipo de contrato exigia que a Autora provasse que fez a comunicação aos Réus/Recorrentes de modo adequado para que se tornasse possível o seu conhecimento, por quem use de diligência comum;
– Não o tendo feito, tem que se dar como provada que tal informação não foi dada e, em consequência deve ser excluído este clausulado, conforme dispõe o artigo 8º, alínea a do decreto-lei citado;
– A sentença recorrida não faz qualquer menção ou alusão a...
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