Acórdão nº 1138/10.1BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-11-16

Ano2023
Número Acordão1138/10.1BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I – RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença proferida no Tribunal Tributário (TT) de Lisboa que julgou procedente a oposição deduzida por M …………………………, relativamente à execução fiscal nº …………………………640 e apensos, do Serviço de Finanças de Loures-1, que contra si reverteu, depois de originariamente instaurada contra a sociedade “J …………. & Filhos, Lda.”, com vista à cobrança coerciva de dívidas de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) dos anos de 2001 e 2002, no valor total de €28.629,90.

A recorrente apresentou alegações, rematadas com as seguintes conclusões:

1. In casu, com o devido respeito, que é muito, não foi alcançado pelo Tribunal a quo. Pelo que, deveria ter sido dada uma maior acuidade ao escopo do vertido nos arts. 24.º, n.º 1, a) e 74.º da LGT; aos princípios (antiformalistas), "pro actione" e "in dubio pro favoritate instanciae" tudo assim, devidamente valorado e considerado o teor do vertido nos documentos de fls. 42 e 46 do PEF junto aos autos;

2. Tudo devidamente condimentado com a mais recente jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores para que, se pudesse aquilatar pela improcedência da Oposição à execução fiscal aduzida pelo Recorrido/Oponente.

3. Maxime, para que melhor se pudesse aferir pela improcedência da alegada ilegitimidade do Oponente na execução nos termos do n.º 1 do art. 24.º da LGT e consequente decisão de extinção da execução ora revertida contra o Oponente.

4. Pelo que, a Recorrente, com o devido respeito, conclui não ter razão o Tribunal a quo, que julgou num determinado sentido que perante a matéria de facto dada como assente, com os demais elementos comprovantes constantes dos autos, não tem a devida correspondência com o modo como as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão a quo deveriam ter sido interpretadas e aplicadas.

5. A predita vicissitude, preconizada pelo respeitoso Tribunal a quo, a qual, humildosamente, se pretende que seja devidamente sindicada pelo respeitoso Areópago ad quem, foi, mutatis mutandis, causa adequada, para que fosse alvitrada pelo Tribunal recorrido, uma errada valoração do acervo probatório constante dos autos, no que concerne a alguma prova documental, a mesma, não foi, sequer, valorada pelo Tribunal a quo pelo menos nos moldes minimamente exigíveis, e consequentemente, a errada interpretação e aplicação do direito aos factos do caso vertente, culminando em erro de julgamento.

6. A MATÉRIA FACTUAL DADA COMO ASSENTE, consta dos itens 1) ao 25) do segmento fáctico do douto aresto recorrido, mormente de fls. 5 a fls. 9, F/Verso, do mesmo, para os quais se remete, dando-se aqui por integralmente vertidos por imperiosa razão de economia processual. Sendo que, no que em concreto diz respeito à temática recorrida e a sindicar pelo respeitoso Areópago ad quem, tem particular relevância a factualidade dada como provada e constante das alíneas 4) a 6), 7), 8) e 9) do acervo factual dado como assente, os quais, salvaguardado o devido respeito, e que é muito, não foram devidamente valorados e considerados pelo respeitoso Tribunal a quo na subsunção que foi preconizada quanto ao direito aplicável.

7. Como é sabido e consabido e resulta, também, do segmento de direito do douto aresto a quo, consta que a responsabilidade subsidiária é, no regime da LGT, atribuída em função do exercício efectivo do cargo de gerente.

8. Em bom rigor, sabe-se que o despacho de reversão apenas tem que alegar os pressupostos da reversão, e a extensão da responsabilidade subsidiária a ser efectuada (tal como o manifesta o despacho de reversão do caso vertente).

9. Não tendo de constar do despacho de reversão os actos concretos de gerência, se houver reacção do revertido, a Recorrente terá de alegar (na contestação à oposição) elementos factuais próprios da gerência permitindo que sobre eles recaia actividade probatória quer da exequente, quer do revertido (sobre esta questão, cfr. o ac. do TCAN n.º 01210/07.5BEPRT de 30-04-2014 (Relator: Pedro Nuno Pinto Vergueiro):

10. Temos então que Exequente não tem de fundamentar o despacho de reversão com a alegação de factos concretos de gerência bastando a indicação dos pressupostos e referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada.

11. Ora, são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT) bem como os factos relevantes para apreciação da culpa, in casu, porquanto a reversão se consubstanciou na al. a) do art. 24.º da LGT.

12. Ora também quanto a este conhecimento, resulta da petição inicial que o oponente não teve dúvidas quanto à natureza e extensão da responsabilidade que lhe estava a ser imputada e exerceu os seus direitos processuais sem qualquer limitação.

13. Em face do exposto, salvo o devido respeito, que é muito., não se pode de forma alguma concordar com o vaticinado pelo respeitoso Tribunal a quo, quanto à crítica sindicada pelo mesmo, relativamente ao despacho de reversão em referência.

14. No caso em apreço, (cfr. o auto de diligências de fls. 42 e fls. 46, ambas do PEF), efectivamente no que respeita ao alegado não exercício da gerência, a oponente veio alegar que “apenas constava como gerente pelo simples facto de ser casada com a única pessoa que foi gerente de direito e de facto, o Sr. J ………………….. (…), nunca tendo tomado qualquer deliberação ou acto;”.

15. Todavia, é a própria oponente quem diz “ter forçado a negociação para a venda da sociedade”, ou seja, não resulta líquido que a oponente não tivesse poder decisório, sendo certo que a sociedade devedora originária obrigava-se com a assinatura de um gerente.

16. Outrossim, a gerência de facto também ocorre “quando alguém – ainda que de modo esporádico e apenas em relação a um único pelouro da empresa – exterioriza de algum modo a representação da vontade social por meio de actos substantivos e materiais, vinculando a sociedade perante terceiros”.

17. Ainda que, por mera hipótese de raciocínio, se possa configurar a conjectura de a oponente não ter exercido de facto a gerência da devedora originária, tal facto não afastaria a sua responsabilidade!

18. Nesta senda, acresce que, ainda que a reversão em causa tenha sido efectuada sob a égide da al. a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT, cabendo à AT a demonstração da culpa do revertido, a verdade indelével que se verifica no caso dos autos, é que a questão controvertida, o objecto da lide, tinha que ver com dívidas de IVA relativas ao ano de 2001 e do ano de 2002, melhor identificadas nos autos e em que era devedora originária a Sociedade “J………………e Filhos, Lda”.

19. Ora, neste caso concreto, atenta a natureza da divida exequenda, é inexorável que caberia à oponente diligenciar no cumprimento das obrigações fiscais da devedora originária. Maxime, procedendo à entrega dos respectivos impostos, que se reportam a quantias que foram feitas repercutir em terceiros (IVA).

20. Trata-se de imposto legalmente repercutido na esfera patrimonial de terceiros, pelo que são quantias que pertencem ao ESTADO, das quais, a Oponente ficou responsável como fiel depositária.

21. Todavia, para que, nos prazos legais, procedesse à sua entrega ao ESTADO.

22. E não o tendo feito, ad aeterno, até aos dias de hoje, constituiu e constitui uma agravante que se repercutiu e repercute, em primeira linha, de forma cada vez mais negativa, na esfera jurídica e patrimonial da devedora originária!

23. Imputabilidade que mais ainda é assacada da Oponente (como administradora da devedora originária e titular da gestão e da panóplia de opções que, de facto, foram preconizadas) atenta a particular natureza dos impostos que estão na génese da quantia exequenda, sendo que a devedora originária não procedeu à entrega ao Estado, dos referidos impostos relativos a períodos dos exercícios supra referenciados.

24. Tal factualidade denuncia, de per si, um comportamento do sujeito passivo revelador da sua indiferença no que concerne ao cumprimento escrupuloso das suas obrigações fiscais.

25. Mesmo que, por mera hipótese de raciocínio, admitindo dificuldades financeiras sociais, mas sem conceder, porque tal prova não foi, de forma para tanto exigível, objetiva e concretamente obtida pela oponente, não estava na disponibilidade da gerência/administração decidir e optar pela preferência de um qualquer outro crédito face ao crédito tributário, uma vez que tal decisão não pode nunca configurar-se como justificada ou isenta de culpa, tanto mais que se tratam de valores liquidados a outrem ( clientes...).

26. E tal decisão não pode nunca configurar-se como justificada ou isenta de culpa.

27. Efectivamente, e no melhor rigor, estando em causa dívidas de IVA, atendendo ao mecanismo a que obedece este imposto - uma vez que o IVA arrecadado e entregue por terceiros não é receita própria da sociedade, havendo a obrigação de ser entregue ao Estado.

28. Pelo que a culpa da Oponente, aqui revertida, está mais que presumida e, condimentada com as regras da experiência e da lógica das coisas, resulta mais do que provada nos presentes autos.

29. De salientar que, da matéria dada como assente pelo Tribunal a quo, mormente a que consta dos itens 4.º a 6º, 7.º, 8.º e 9.º do acervo factual dado como assente no aresto a quo, não se vislumbra acervo probatório que pudesse desvirtuar o considerado pela Administração Tributária quanto a esta ...

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