Acórdão nº 1109/22.5T8PBL-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 30-05-2023
Data de Julgamento | 30 Maio 2023 |
Ano | 2023 |
Número Acordão | 1109/22.5T8PBL-A.C1 |
Órgão | Tribunal da Relação de Coimbra |
Relator: Emídio Francisco Santos
1.ª Adjunta: Catarina Gonçalves
2.ª Adjunta: Maria João Areias
Processo n.º 1109/22.5T8PBL-A.C1
Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra
AA, residente na Rua ..., lugar de ..., freguesia e concelho ..., ... ++, requereu a regulação do exercício das responsabilidades parentais de BB, nascido em .../.../2019, filho do requerente e da requerida, CC.
Na conferência de pais, o requerente e a requerida estiveram presentes, mas não chegaram a acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais do seu filho.
A Meritíssima juíza do tribunal a quo suspendeu a conferência e remeteu os pais para a audição técnica especializada.
Após a audição dos pais, os técnicos informaram o tribunal de que o requerente e a requerida não chegavam a acordo quanto ao o exercício das responsabilidades parentais do seu filho.
Retomada a conferência, a Meritíssima juíza fez consignar em acta o seguinte:
· Não existe acordo quanto à residência/guarda do menor uma vez que o pai pugna pela residência alternada, com carácter semanal, enquanto a mãe entende que o menor deverá ficar à sua guarda e passar fins de semana alternados com o pai;
· Face à posição estremada dos progenitores e à circunstância de viverem habitualmente a uma distância de cerca de 150 Kms um do outro, impõe-se decidir provisoriamente, face à ausência de acordo, sobre as responsabilidades parentais, desde logo quanto à residência do menor;
· De forma a habilitar o tribunal a decidir qual o melhor regime que salvaguarda o superior interesse da criança, notificam-se os Exmos técnicos que presidiram à ATE e que se encontram aqui presentes, para procederem à emissão de parecer sobre a residência do menor, com enfoque no impacto que uma eventual guarda alternada, atenta a distância a que os pais residem, poderá trazer para o bem-estar e estabilidade da criança;
· Logo que junto o referido parecer, notifique os progenitores para, querendo, se pronunciarem no prazo de cinco dias, abrindo após vista para emissão de parecer e conclusão para decisão.
Os técnicos emitiram parecer no sentido de que a residência alternada era o regime que melhor acautelava o superior interesse do menor. O requerente e o Ministério Público também se pronunciaram neste sentido. A requerida declarou-se contra o regime da residência alternada da criança.
De seguida, a Meritíssima juíza do tribunal a quo fixou o seguinte regime provisório de regulação do exercício das responsabilidades parentais do menor BB:
· O menor residirá alternada e quinzenalmente com ambos os pais, em ++ e em **, concelho ..., com inicio à sexta feira, no final das suas actividades;
· O pai recolherá a criança em ** e a mãe em ++;
· O exercício das responsabilidades parentais relativamente às questões de particular importância e da vida corrente do menor caberá a ambos os pais;
· Sempre que a criança esteja a residir com um dos pais deve o respetivo progenitor promover os contactos da criança com o outro, por qualquer meio de comunicação áudio e video à distância, no período das 19h às 20.00h, sem prejuízo das respectivas actividades e de descanso;
· No dia de aniversário da criança o progenitor residente deve especialmente favorecer os contactos da mesma com o outro;
· Cada um dos pais pagará a título de alimentos a pensão de 120€, até ao final de cada mês, por qualquer meio idóneo;
· As respetivas despesas com equipamentos educativos e de saúde serão pagas equitativamente por ambos os pais, contra a entrega de documento idóneo comprovativo da sua realização.
A requerida não se conformou com a decisão e interpôs o presente recurso de apelação, pedindo:
1. Se julgasse o tribunal a quo incompetente em razão do território para regular o exercício das responsabilidades parentais do menor BB;
2. Caso se entendesse não existir incompetência territorial do tribunal a quo, se revogasse a decisão recorrida e se fixasse a residência e guarda do menor a favor da progenitora, com a fixação do regime de visitas do progenitor, de 15 em 15 dias, por forma a, por um lado, acautelar e não quebrar a relação entre pai-filho e, por outro, garantir a estabilidade e superior interesse do menor BB.
Os fundamentos do recurso expostos nas conclusões foram em síntese os seguintes:
1. O tribunal competente para dirimir este conflito é o tribunal judicial ...;
2. Não deviam ter sido dados como indiciados os pontos 5, 6, 7, 8, 11, 15, 16, 19 e 20;
3. A decisão ora recorrida alicerçou-se, apenas no Requerimento inicial apresentado pelo aqui recorrido, nas declarações dos progenitores proferidas nas várias sessões de Conferência de pais, nas declarações da Técnica (relatório), sendo a mesma atentatória da defesa do superior interesse do menor, na medida em que sanciona a progenitora, afastando-a do menor, quando foi esta que sempre tratou (e bem) do menor e o acompanhou em tudo, funções à aqui Recorrente;
4. Parece-nos que deveria o tribunal a quo antes de tal decisão, proceder a uma averiguação, ainda que sumária, sobre a situação que, provisoriamente, regulou, o que não se verificou;
5. A recorrente entende existir falta de fundamentação na aplicação do regime provisório fixado pelo tribunal ad quo, porquanto,
6. De acordo com o artigo 28º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível “Em qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, a requerimento ou oficiosamente, o tribunal pode decidir, provisoriamente questões que devam ser apreciadas a final, bem como ordenar as diligências que se tornem indispensáveis para assegurar a execução efetiva da decisão.”;
7. A estas ditas decisões provisórias proferidas em processo tutelar cível aplica-se o princípio geral decorrente do art.º 158.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ou seja, um dever geral de fundamentação de todas as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo, acrescentando no n.º 2 que a justificação não pode consistir na mera adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição.
8. Em igual sentido o artigo 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, refere-nos que “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.”
9. Entende a recorrente que tal não ocorreu in casu;
10.A decisão recorrida limitou-se a fixar um regime provisório, no pressuposto meramente implícito da necessidade/oportunidade da sua fixação.
11.Não se fixou naquela decisão, qualquer factualidade, nem se apreciou do ponto de vista jurídico a necessidade de fixação daquele regime provisório e o porquê do conteúdo do mesmo.
12.Assim entende o recorrente que o douto despacho recorrido não cumpre a exigência legal (artigo 154° do CPC) e constitucional (artigo 205º da CRP) de fundamentação das decisões judiciais.
13.Consequência da inobservância deste dever de fundamentação será então a nulidade do despacho recorrido, que não especificou os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão – arts. 668.º, n.º 1, al. b) e 666.º, n.º 3 do C. P. Civil.
14.Para mais, não teve em atenção a distância de 150 KM, com grave e sérios prejuízos para o menor que jamais terá uma "casa", um "espaço", andando sempre com as malas de um lado para o outro e em viagens sucessivas, sedimentando a instabilidade, o cansaço e o desenraizamento do menor.
15.O poder paternal, enquanto meio de suprir a incapacidade de exercício de direitos pelo menor (artigo 124.º do Código Civil), é automaticamente atribuído aos pais, independentemente da sua vontade e por efeito da filiação, não podendo ser por eles renunciado (cfr. artigo 1882.º do Código Civil).
16.Basilar nesta matéria é o princípio da igualdade dos progenitores, ínsito no artigo 36.º, n.ºs 3 e 5 da C. R. P., nos termos do qual incumbe a ambos os pais prover pela manutenção e educação dos filhos.
17.Também a Convenção sobre os Direitos da Criança, no seu artigo 18º, n.º 1 prevê a responsabilidade comum dos pais na educação e desenvolvimento da criança;
18.Do art.º 1878.º do Código Civil resulta que o poder paternal é um complexo de poderes-deveres funcionais que abrange os poderes-deveres de administração, cujo exercício está vinculado à salvaguarda, promoção, e realização do interesse do menor, pois são atribuídos para a prossecução dos interesses pessoais e patrimoniais de que aquele titular.
19.A fixação da guarda conjunta (de exercício das responsabilidades parentais) com residências alternadas é admissível desde que se faça um juízo de prognose favorável quanto ao que será a vida do menor, suportada em elementos de facto evidenciados no processo, afigurando-se-nos que, em regra, a fixação desse regime só é compatível com uma situação em que se verifica uma particular interacção entre os progenitores, um relacionamento amistoso entre ambos, bem como uma razoável proximidade entre os locais onde os progenitores habitam, o que claramente não se verifica.
20.O regime da residência alternada é compatível quando verificados vários pressupostos, incluindo o factor DISTÂNCIA e ESTABILIDADE DO MENOR, o que, parece-nos, que no presente caso não ocorre, com graves e sérios prejuízos para o menor que terá, se assim continuar, duas casas, duas cidades, duas escolas, dois (ou mais) professores, duas vidas,
21.A distância de residência entre progenitores é de 300kms ida e volta, 1h50m para cada lado, resumindo-se uma opção de residência alternada em adiar o inadiável, sendo de soçobrar que aquando o menor entrar para a escola primária, ai terá de se decidir por um dos progenitores, já havendo entretanto relatórios que possam ao tribunal conferir ferramentas para exequível decisão, sendo incomportável e de uma agressividade sem par para o menor, diga-se logisticamente e legalmente inviável inclusive, frequentar uma semana a escola primária em ** e outra semana escola primária em ++,...
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