Acórdão nº 11/22.5BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-04-28

Ano2022
Número Acordão11/22.5BCLSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I. RELATÓRIO

A Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante Impugnante ou AT) veio apresentar impugnação da decisão arbitral proferida a 23.12.2021, pelo tribunal arbitral coletivo constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no processo a que aí foi atribuído o n.º 491/2021-T, ao abrigo dos art.ºs 27.º e 28.º do DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – RJAT).

Nesse seguimento, apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“1ª) A decisão arbitral ora impugnada ao ter deliberado julgar totalmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, ao entender:

“ A - Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

B - Anular a liquidação adicional de IRC n.º 20188510003672 e as correspondentes liquidações de juros compensatórios com os n.s 201800000221981 e 201800000221982, na parte ainda subsistente após o deferimento parcial de recurso hierárquico, que ascende ao montante, de juros compensatórios incluídos, de €1.179.164,95, relativo ao exercício de 2014 do Grupo Fiscal REN;

C) Julgar procedente o pedido de indemnização por garantia indevida e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar à Requerente a esse título a quantia de €16.765,67, bem como despesas com a prestação de garantia bancária n.º 00125 - 02 - 2129714 suportadas após 11-07-2021 e até ao seu levantamento”

cometeu, pronúncia indevida , uma vez que excedeu a competência, em razão da matéria, do Tribunal Arbitral.

2ª) Na verdade, a competência dos tribunais arbitrais é, desde logo, circunscrita às matérias indicadas no n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.

Estabelece aquela norma que:

«1 - A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:

a) A declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;

b) A declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais.» (sublinhados nossos).

3ª) Por outro lado, a competência dos tribunais arbitrais também depende dos termos da vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais constituídos nos termos do RJAT, cfr. art. 4º do RJAT.

4ª) Nos termos das als. a) e b) da Portaria nº 112 - A/2011, ficam excluídas do âmbito da vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais as “ pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131º a 133º do Código de Procedimento e de Processo tributária ”, bem como, “pretensões relativas a atos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão”.

5ª) Inexiste, pois, qualquer suporte legal que permita que sejam proferidas pelos tribunais arbitrais condenações de outra natureza que não as decorrentes dos poderes fixados no RJAT.

6ª) Como resulta do pedido de pronúncia arbitral, vem este interposto contra o indeferimento parcial do recurso hierárquico e da precedente reclamação graciosa e (em termos finais ou últimos), o acto de liquidação adicional de IRC n.º 2018 8510003672 na parte ainda subsistente (após o deferimento parcial do recurso hierárquico) e correspondentes juros compensatórios , relativos ao exercício de 2014.

7ª) Requerendo-se, a final a declaração de ilegalidade do ato de liquidação adicional de IRC n.º 2018 8510003672 e correspondentes juros compensatórios, na parte ainda subsistente após o deferimento parcial do recurso hierárquico.

8ª) São estes, efectivamente, os atos que a Requerente identifica e fixa como objecto e matéria a apreciar pelo tribunal arbitral.

9ª) Entendeu o tribunal arbitral que aos atos impugnados são imputados vários vícios, designadamente um vício procedimental por duplicação ilegal de procedimentos de inspecção externa, e vícios de violação de lei relativos a correções em matéria de preços de transferência, dedução fiscal de donativos, dedução fiscal majorada de quotizações par a associações empresariais e apuramento de tributação autónoma sobre remuneração variável.

10ª) Para assim, optar por, ao abrigo do n.º 1 do artigo 22.º do RJAT, decompor a decisão em pronúncias parciais, sendo uma sobre a questão da duplicação de procedimentos de inspeção e outra sobre as restantes questões de legitimidade das liquidações, caso o seu conhecimento não ficasse prejudicado pela solução da primeira questão.

Assim,

11ª) No ponto B) dos factos dados como provados, o tribunal arbitral deu como provado que:

«B) Foram efectuadas à Requerente, relativamente ao exercício de 2014, em sede de IRC, duas inspeções externas, ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI 201700110 e OI201700169, e uma inspeção interna, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º 02018000 31».

12ª) Pois bem, os atos impugnados no processo arbitral n.º 491/2021T, decorrem da procedimento de inspeção realizado a coberto da OI201800031, à ora impugnada, na qualidade de sociedade dominante, para refletir na declaração de rendimentos do grupo, as correções levadas a cabo na sua esfera individual, na qualidade de sociedade dominada, pelo procedimento de inspeção credenciado pela OI 201700169.

13ª) Efectivamente conforme consta da matéria de facto dada como provada :

14ª) Sucede que, ao determinar apreciar uma eventual duplicação de procedimentos de inspeção, com a agravante de o procedimento de inspeção OI 201700110, ser completamente alheio à liquidação de imposto e atos em matéria tributária daí resultantes e identificados pela então Requerente como o acto tributário objecto do pedido de pronúncia arbitral, acabou o acórdão arbitral ora impugnado por, em alternativa à acção administrativa, apreciar o âmbito e extensão dos procedimentos de inspeção.

15ª) Como se refere no Acórdão arbitral, a pág .14:


«Imagem no original»

15ª) Para, concluir que:

«Pelo exposto, o pedido de pronúncia arbitral procede quanto ao vício de violação dos princípio da irrepetibilidade das inspeções externas, que emana do n.º 4 do artigo 63.º da LGT, que constitui vício de violação de le i, com potencialidade para anular a inspeção ao abrigo da Ordem de Serviço OI201700169, bem como os actos subsequentes que a tiveram por pressuposto, designadamente as liquidações de IRC e juros compensatórios impugnadas.»

17ª) Assim, o Acórdão arbitral analisou não qualquer acto de liquidação e sua (i)legalidade, mas antes, o âmbito e extensão das acções de inspeção. Aliás, note-se e repita-se que a OI 201700110 e os seus efeitos, não integram o objecto do pedido de pronúncia arbitral.

18 ª) Por isso, o pedido de pronúncia arbitral não consubstancia o meio próprio, o que, no caso, redunda na própria incompetência do Tribunal Arbitral, para apreciar a (i)legalidade de uma eventual duplicação de procedimentos de inspeção.

19ª) A condenação da AT nos termos em que foi feita pelo Tribunal arbitral, encontra-se, portanto, excluída do âmbito da competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD.

20ª) Assim, porque não cabe no art. 2º do RJAT e atenta a Portaria de Vinculação, a apreciação de atos administrativos em matéria tributária que não comportam a apreciação da legalidade da liquidação, deveria o Tribunal Arbitral ter concluído pela sua (in)competência.

V - Do pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça:

Atendendo ao facto de o valor do recurso ser superior a €275.000,00 requer-se que esse Venerando Tribunal se pronuncie e decida, a final, pela dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atendendo a que estamos em sede de impugnação de decisão arbitral, que não há lugar à produção de prova testemunhal e que ao Tribunal se pede que analise e decida sobre questão que não se afigura revestir grande complexidade, cfr. art. 6º nº 7 do RCP.

Termos pelos quais e, como o douto suprimento de V. Ex.as, incorrendo a decisão arbitral ora impugnada no vício de pronúncia indevida deve a mesma ser julgada nul a ou anulada, com todas as legais consequências”.

Foi ordenada a notificação de REN - Rede Eléctrica Nacional, S.A. (doravante Impugnada) para alegar, nos termos consignados no art.º 144.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi art.º 27.º, n.º 2, do RJAT, tendo sido apresentadas contra-alegações, nas quais foram formuladas as seguintes conclusões:

“A) O acórdão arbitral recorrido apreciou e julgou ilegalidade do acto de liquidação de IRC n.° 2018 8510003672, cujo vício se reconduzia a ilegalidade invalidante do mesmo do procedimento de inspecção tributária efectuada ao abrigo da ordem de serviço 01201700169, procedimento este que estava e está na base daquele acto de liquidação, procedimento inspectivo este que efectuou a correcção e produziu a fundamentação das quais brotou aquele acto de liquidação.

B) E tendo julgado verificada violação por este procedimento inspectivo da norma de proibição de repetição de inspecções externas (artigo 63.°, n.° 4, da LGT), anulou o acto de liquidação que inteiramente dele dependia, cujo vício daquele nele se projectava, conforme princípio estruturante do contencioso tributário dito da impugnação unitária, previsto no artigo 54.° do CPPT, aplicável à arbitragem tributária ex. vi. artigo 29.°, n.° 1, alínea a), do RJAT.

C) Não se verifica, pois, isso é uma evidência, incompetência alguma do Tribunal arbitral que proferiu o acórdão arbitral recorrido, não se verifica, pois, pronúncia indevida alguma do mesmo, porquanto a sua primeira e principal competência é justamente a apreciação de pretensões relativas a ilegalidade de actos de liquidação de tributos.

D) A AT faz afirmações falsas e maliciosas nas suas...

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