Acórdão nº 11/19.2T8ALD.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 08-03-2022

Data de Julgamento08 Março 2022
Ano2022
Número Acordão11/19.2T8ALD.C1
Órgão Tribunal da Relação de Coimbra

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I.

AA e mulher BB, residentes em ... instauraram acção, com processo comum, contra A. G..., Unipessoal, Ld.ª, com sede na Rua..., ..., ...; CC, residente, quando em Portugal, na Rua..., ..., ...; DD, residente, quando em Portugal, na mesma morada; EE, residente em ... e FF, residente, quando em Portugal, no ..., ....

Tendo chegado aos autos a informação do óbito do Réu CC, foi proferido despacho – em 07/10/2020 – que declarou a suspensão da instância até à notificação da decisão que julgasse habilitados os sucessores do falecido.

Tal despacho foi notificado aos Autores mediante notificação elaborada em 07/10/2020.

Em 21/06/2021, foi proferido despacho onde se fez constar que os autos estavam parados a aguardar impulso processual há mais de seis meses (desde 07/10/2020) e onde se determinou a notificação dos Autores para se pronunciarem sobre a situação no prazo de dez dias.

Tal notificação foi efectuada por notificação elaborada em 21/06/2021.

Não houve resposta a tal notificação, mas, em 01/07/2021, veio a ser deduzido o incidente de habilitação de herdeiros.

Na sequência desses factos – por decisão proferida em 10/09/2021 – foi proferida decisão que declarou “…extinta a instância, por deserção, desde o dia 10 de Junho de 2021, nos termos conjugados dos artigos 277.º, al. c) e 281.º, n.ºs 1 e 4, do Código de Processo Civil”.

Inconformados com essa decisão, os Autores vieram interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:

(…)

II.

Questões a apreciar:

Atendendo às conclusões das alegações dos Apelantes – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir:

· Saber se a sentença padece da nulidade que lhe é apontada pelos Apelantes, pelo facto, designadamente, de não discriminar os factos provados e não provados e de não indicar factos que preencham dois dos pressupostos da deserção da instância: a negligência e a existência de despacho prévio de advertência à parte para a necessidade de exercício do seu impulso processual;

· Saber se estão (ou não) verificados os pressupostos de que depende a deserção da instância, analisando a questão de saber se tal deserção pressupõe (ou não) um despacho prévio de advertência à parte para a necessidade de exercício do seu impulso processual;

· Saber se o facto de ter sido deduzido, entretanto, o incidente de habilitação de herdeiros – onde já foi ordenada a citação dos Requeridos – obsta (ou não) à declaração da deserção da instância com fundamento na “paragem” do processo por mais de seis meses que se havia verificado antes da dedução desse incidente.

(…)


/////

Analisemos, então, a questão de saber se estão (ou não) reunidos os pressupostos necessários para a deserção da instância, tendo em conta os factos acima referidos, ao qual apenas acrescentamos o seguinte (que também resulta dos autos):

5. O despacho referido no ponto 2 – que declarou a suspensão da instância – foi notificado aos Autores por notificação elaborada em 07/10/2020.

Dispõe o art.º 281.º, n.º 1, do CPC que “Sem prejuízo do disposto no n.º 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses”.

A deserção da instância supõe, portanto, que o processo se encontre sem movimento processual há mais de seis meses e que essa situação se deva a uma falta de impulso processual que possa ser imputada a negligência das partes.

Não há dúvida que o processo esteve sem movimento processual durante mais de seis meses a aguardar impulso processual das partes.

Com efeito, tendo sido declarada a suspensão da instância em 07/10/2010, por força do óbito de uma das partes – suspensão que se mantinha, nos termos da lei e como expressamente referido no despacho, até à decisão que julgasse habilitados os sucessores do falecido –, o prosseguimento dos autos estava dependente da dedução do incidente de habilitação de herdeiros (incidente que, naturalmente, tinha que ser deduzido pelas partes, sem prejuízo de também poder ser promovido pelos sucessores da parte falecida) e durante os seis meses subsequentes à notificação daquele despacho o incidente não foi deduzido.

Sustentam, no entanto, os Apelantes que não existem – e não foram indicados na decisão recorrida – quaisquer factos que permitam integrar dois dos pressupostos necessários para a deserção da instância: a negligência e a existência de despacho prévio de advertência à parte para a necessidade de exercício do seu impulso processual.

Entendemos, no entanto, e salvo o devido respeito, que a existência de despacho prévio de advertência à parte para a necessidade de exercício do seu impulso processual não é um requisito autónomo da deserção da instância (e tanto é assim que ele não se encontra expresso no texto legal); o que pode acontecer, em determinadas situações, é que a existência desse despacho seja necessária para configurar uma efectiva falta de impulso processual que possa ser imputada a negligência das partes, designadamente, quando, na situação concreta, não seja claro e líquido que o prosseguimento dos autos esteja dependente de um acto a praticar pelas partes ou quando o prosseguimento do processo está dependente de acto a praticar por outra pessoa que não as partes (por exemplo, o agente de execução, no âmbito do processo executivo; um perito, no caso de estar em curso uma perícia ou qualquer outra entidade a quem se solicite um documento ou uma diligência), casos em que será necessária a existência de uma notificação que transfira para as partes (ou para uma delas) o ónus de reagir e tomar posição sobre a inércia e o incumprimento da entidade que deverá praticar o acto de que depende o andamento do processo (neste sentido se decidiu, aliás, no Acórdão desta Relação de 14/06/2016, proferido no processo n.º 500/12.0TBAGN.C1[1], relatado pela aqui relatora).

Não é essa, no entanto, a situação dos autos.

No caso dos autos, era evidente e indiscutível – pelo teor do despacho que havia declarado a suspensão da instância – que o prosseguimento dos autos estava dependente da habilitação dos sucessores da parte falecida e é indiscutível que, em face da lei, as partes podiam deduzir o incidente de habilitação.

Não havia, portanto, qualquer necessidade de nova notificação para expressar aquilo que já estava claro em face do despacho e da lei (art.º 351.º, n.º 1, do CPC): o prosseguimento dos autos estava dependente de um acto que tinha que ser praticado por qualquer das partes sobrevivas ou pelos sucessores da parte falecida e, portanto, os Autores (com interesse no prosseguimento dos autos) sabiam – não podiam deixar de saber (sendo certo que estavam representados por advogado) – que, se nenhum outro legitimado o fizesse, tinham o ónus de deduzir esse incidente, caso pretendessem o normal prosseguimento da acção que haviam instaurado.

Entendemos, por outro lado, que, nas...

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