Acórdão nº 1093/20.0T9PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 22-11-2023

Data de Julgamento22 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão1093/20.0T9PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 1093/20.0T9PRT.P1
Tribunal de origem: Juízo de Instrução Criminal Do Porto – J5 – Tribunal Judicial da Comarca do Porto

Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:
No âmbito do Processo de Instrução n.º 1093/20.0T9PRT a correr termos no Juízo de Instrução Criminal do Porto (J5), em que é arguido AA, foi indeferida a abertura de instrução requerida pelo assistente BB por inadmissibilidade legal.

Desta decisão veio o assistente BB interpor o presente recurso, nos termos e com os fundamentos que constam dos autos, que agora aqui se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos, terminando com a formulação das seguintes conclusões:
1. Refere o Despacho recorrido que o requerimento de abertura de instrução formulado pelo Assistente não enumera os factos concretos e objetivos que considera terem sido praticados pelos denunciados, bem como enuncia ainda ser completamente omisso quanto ao elemento subjetivo referente ao crime e à conduta imputada ao denunciado.
2. Pugna pela falta da imputação objetiva e subjetiva dos factos ao seu autor, pelo que a realização da instrução constituiria um ato inútil, o que é proibido por lei, bem como fundamenta mediante o Ac. Uniformizador de Jurisprudência n.º 7/2005, não haver sequer lugar a despacho convite de aperfeiçoamento.
3. Contudo, não pode a Assistente concordar com tal juízo.
4. É que o requerimento para abertura da instrução por si formulado, independentemente dos estilos, cumpre todos os requisitos legais, quer formais quer substantivos.
5. Aliás, o que nem por motivos esquemáticos foge ao quadro geral comum deste tipo de atos.
6. Independentemente disso, estabelece a lei, no art.º 287.º, n.º 2 do C.P.P., que o requerimento para abertura da instrução não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como sempre que disso for o caso, a indicação dos atos de instrução que o requerente pretende que o juiz leve a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e de outros, se espera provar, sendo ainda aplicável no requerimento do assistente o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 3 do art.º 283.º.
7. Certo é que o requerimento para abertura da instrução só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução, conforme giza o n.º 3 do art.º 287.º do C.P.P.
8. Não ocorrendo no caso concreto nenhuma dessas situações.
9. Nem tão pouco se pode concordar com a imputação das deficiências do requerimento para abertura de instrução, maxime a não enumeração de factos concretos e objetivos que se considere terem sido praticados pela arguida, nem a omissão completa quanto ao elemento subjetivo.
10. A douta decisão do JIC, não tem fundamentação concreta no seu despacho que permita percecionar em concreto em que falha o requerimento de abertura de instrução, antes, porém assim generalisticamente assim se conclui.
11. O Tribunal a quo não se preocupou minimamente em justificar (fundamentar) essas afirmações, conforme dever legal (identificando esses que elementos subjetivos e objetivos que estão em falta e que teriam de estar esclarecidos e não estão e aduzindo as razões pelas quais os mesmos por estar em falta prejudicam a continuidade do processo com vista a completar o crime de denuncia caluniosa ou eventualmente o crime de simulação de crime), pelo que, nessa parte, a decisão se mostra inquinada pelo vício de falta de fundamentação (falta a premissa menor do silogismo judiciário) - vide art.º 97.º, 5, do CPP - e, por isso, é, nula.
12. Os elementos subjetivo, objetivo e enunciação dos crimes previstos na lei estão amplamente e exaustivamente descritos, quer na queixa, quer no requerimento de abertura de instrução;
13. Não podemos desde logo aceitar que se afirme que estão em falta as disposições legais dos alegados crimes, pois basta ver o artigo 7 e 8 do requerimento de abertura de instrução, onde constam os artigos legais dos 2 crimes que se visam apurar e transcritos, a saber a simulação de crime a denuncia caluniosa;
14. Também não podemos aceitar a falta de elementos objetivos dos crimes no RAI, nomeadamente, quando naquele e desde o artigo 42 em diante, o assistente, avalia os factos constantes das declarações dos aqui arguidos no inquérito 194/19.1PWPRT da 2 Secção do DIAP do Porto, que são os factos objetivos do atual processo-crime em discussão como numa verdadeira acusação alternativa.
15. Por isso se enuncia prova e conjuga-se a mesma com os factos objetivos dos crimes, ao demonstrar as incongruências das declarações e o tempo de prestação das mesmas as quais evidenciam a nítida simulação de um crime, com o objetivo caluniar o aqui assistente.
16. O elemento subjetivo – exige que o agente atue com consciência da falsidade da imputação e com intenção de que contra o denunciado se instaure procedimento
17. Assim, no inquérito deveria apurar-se e investigar mediante a queixa do aqui assistente a consciência da falsidade da imputação, apurando se o agente representou a instauração do procedimento como consequência necessária (segura) da sua conduta.
18. As dificuldades e as vicissitudes da prova da intenção são comuns à generalidade dos crimes, resultando os factos relativos ao elemento subjetivo do tipo de crime, por regra, dos factos objetivos que resultarem provados.
19. Na verdade, quanto ao elemento subjetivo da infração, não havendo confissão do agente, sempre terá de se fazer uso das regras da experiência comum, pois tratando-se de factos do foro psicológico, da vida interior do agente, por isso, impossíveis de apreender diretamente, indemonstráveis de forma naturalística, podem deduzir-se ou inferir-se de factos materiais comuns que, com muita probabilidade, o revelem.
20. Vendo o RAI, nos seus artigos 3 a 6 e de 9 a 29 e 122 a 161 e ainda 171 a 181 do RAI podem a nosso ver-se pela experiência comum a motivação subjetiva do arguido AA em conjugação de esforços com o arguido CC seu amigo, face à amizade existente entre os dois, querem atingir e amedrontar o assistente;
21. Pode perceber-se que o arguido AA, sabe que a queixa de ameaça com arma de fogo é falsa dado que, apercebendo-se no início do inquérito, e estando certamente assessorado, que pelas suas simples declarações na queixa/ denuncia não atingiria o seu objetivo de ver acusado o aqui assistente, dois meses depois enxerta uma testemunha no inquérito que alega estar a circular com ele no carro em que seguiam, vivenciando na primeira pessoa tal situação, contudo no ato da queixa do arguido AA, a testemunha e aqui segundo arguido CC, não aparece, não é mencionada e os factos são relatados de maneira diferente das declarações complementares.
22. Por isso discorda o recorrente que o RAI possa ser inadmissível face ao que supra se expôs.
23. O requerimento de abertura de instrução foi instaurado precisamente porque não se aceitou o arquivamento com os motivos explanados pela Sr.ª Procuradora, tendo a assistente indicando os factos que pretendia ser investigados, os meios de prova que considerou não terem sido relevados no inquérito, tudo com vista à comprovação judicial daquela decisão do M.P. e que só por si justificam a sua admissibilidade, conforme possibilita o no 2 do art. 287.
24. Os factos foram concretamente identificados e descritos pela assistente, têm um desencadeamento lógico, no espaço e tempo e foram identificadas as disposições legais que considera terem sido violadas.
25. Pelo que jamais se pode concordar com a fundamentação do despacho recorrido e no qual rejeitou assim o requerimento formulado pela Assistente.
26. Os elementos objetivos e subjetivos do tipo incriminador constam claramente do requerimento de abertura de instrução, pelo que fenece de sentido o que decidiu o Meritíssimo Juiz de Instrução.
27. O douto despacho de rejeição mostra-se ilegal. Em seu lugar, deveria ter havido deferimento da instrução, ou seja, deveria ter-se proferido despacho no sentido de se investigarem os factos constantes na douta participação e, nesse seguimento, seguir-se-ia despacho de pronúncia contra a denunciada pela. prática dos crimes em questão.
28. O despacho recorrido não considerou que, ao rejeitar o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente, está a negar que a assistente possa intervir ativamente na fase de instrução, coartando irremediavelmente a sua ação no processo e ofendendo com isso um imperativo constitucional de proteção da vítima, de forma incompreensível no ordenamento jurídico português.
29. Ao não se admitir o requerimento de abertura, de instrução foram violados, entre outros, o disposto nos artºs 286.º, nº 1 e 287.º do C.P.P.
30. A decisão recorrida é ilegal, violando assim as disposições dos arts. 69.º, n.º 2, alínea a); 287.º, n.º 2, n.º 3; 286.º, ambos do C.P.P., e bem assim o disposto no art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa.
Termina pedindo seja dado provimento ao recurso e, em consequência seja revogada a decisão recorrida e substituída por outra que admita a abertura de instrução e ordene a realização dos atos instrutórios por forma a aferir da pronúncia, ou não, do arguido.

A este recurso respondeu o Ministério Público, conforme consta dos autos, formulando as seguintes conclusões:
1- Vem o queixoso interpor recurso do despacho judicial que rejeitou o requerimento de abertura de instrução, por inadmissibilidade legal do mesmo, nomeadamente por não terem sido indicados factos, circunstanciados no tempo e no espaço, integradores dos elementos subjetivos do tipo de crime cuja pronuncia se pretendia, apresentados com a estrutura de uma acusação, como se exigia.
2- O recorrente apresentou nas suas conclusões, essencialmente, discordância
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