Acórdão nº 10737/20.2T8LRS.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 08-06-2022

Data de Julgamento08 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão10737/20.2T8LRS.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa


IRelatório


Nos presentes autos emergentes de acidente de trabalho em que é sinistrada AAA, foi proferida a seguinte decisão pelo Exmº Juiz a quo:

«A Conciliação frustrou-se pela única razão de a “BBB (à data ainda com a denominação “… não ter aceitado a avaliação da incapacidade feita pelo perito médico.
Nos termos dos art.os 117.º, n.º 1, al. b) e 138.º, n.º 1, primeira parte, do CPT, a seguradora deveria apresentar requerimento para junta médica.
Tal apresentação deve ocorrer no prazo de 20 dias a contar da tentativa de conciliação – cf. n.º 1 do art.º 119.º do CPT, aplicável por força da remissão do n.º 1 do art.º 138.º do mesmo código.
A tentativa de conciliação ocorreu no dia 26-04-2021, pelo que o prazo para apresentação do requerimento para Junta Médica terminou no dia 17-05-2021.
Dentro do prazo, não foi apresentado qualquer requerimento por parte da Seguradora.
No dia seguinte, 18-05-2021, deu entrada nos Serviços do Ministério Público um email dirigido ao Juiz do Trabalho de Loures, alegadamente remetido pela “BBB.”, que trazia em anexo um requerimento com uma assinatura ilegível, em nome da mesma seguradora, em que se requeria que “o sinistrado” fosse submetido a exame por Junta Médica.
O requerimento indicava o valor da ação, vinha acompanhado de quesitos e do comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e da multa pela apresentação fora de prazo (1.º dia útil).
Vejamos.
O requerimento a que aludem os art.os 117.º, n.º 1, al. b) e 138.º, n.º 1, primeira parte, do CPT, foi apresentado por email.
A lei processual, quer civil, quer laboral[1], não prevê a possibilidade de as peças processuais serem remetidas aos autos por correio eletrónico, quer a parte esteja ou não representada por advogado[2] – cf. art.º 144.º do CPC.
Assim, considera-se inadmissível o email alegadamente remetido pela Seguradora e, consequentemente, será proferida a sentença a que aludem os art.ºs 138.º, n.º 2, parte final, e 73.º, n.º 3 do CPT.
SENTENÇA
(art.ºs73.º, n.º 3 e 138.º, n.º 2 CPT)
Sinistrada AAA, nascida a 17-12-1968, com …;
Entidade Responsável -- “…”, NIPC …, com sede na … em Lisboa.
Ao abrigo do disposto no art.º 138.º, n.º 2, 2.ª parte, do Código de Processo do Trabalho, não tendo a seguradora requerido a realização de exame por Junta Médica, consideramos a sinistrada afetada com uma IPP de 7,3806% a partir de 22-11-2020, gozando do direito a receber o capital de remição correspondente à pensão anual e obrigatoriamente remível no valor de € 595,61 (quinhentos e noventa e cinco euros e sessenta e um cêntimos), devida desde o dia posterior ao da alta, ou seja, desde 23-11-2020, acrescida de juros de mora à taxa legal e da quantia de € 25,00 (vinte e cinco euros) por despesas de deslocação.
Custas pela Seguradora.
Fixo o valor da ação em € 7.882,29.»

A entidade seguradora recorreu e formulou as seguintes conclusões:

A.No requerimento apresentado pela Recorrente em 17-05-2021 não se levantava qualquer questão de direito, mas sim uma questão exclusivamente técnica e médica.

B.Deste modo, é evidente que a situação se subsume à previsão da norma contida no artigo 40.º, n.º 2, do CPC, podendo a Recorrente dirigir diretamente aos autos este requerimento a que aludem os artigos 117.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, e 138.º, do CPT, sem estar representada por advogado.

C.Por outro lado, precisamente por não estar (nem ter de estar) representada por advogado, parece evidente que a Recorrente podia apresentar o requerimento via correio eletrónico, nos termos do artigo 144.º, n.º 7, do CPC.

D.Face ao exposto, uma vez que na tentativa de conciliação apenas existiu discordância quanto à questão da incapacidade e o requerimento de realização de junta médica apresentado pela Recorrente foi tempestivamente apresentado e se mostra acompanhado de quesitos, deveria o douto Tribunal ter admitido e determinado a realização de perícia por junta médica, nos termos dos artigos 117.º, n.º 1, al. b), e n.º 2, 119.º, n.º 1, 138.º, n.º 2, e 139.º, todos do CPT.

E.Ainda que assim não se entendesse, a verdade é que a entrega do requerimento via correio eletrónico não tem como consequência a rejeição deste ato processual, pois não estamos perante uma nulidade processual, mas sim de uma mera irregularidade.

F.Esta irregularidade não influi, por sua vez, no exame e discussão da causa, e para além disso podia e devia ter sido sanada através de convite do Tribunal para a Recorrente vir regularizar a sua intervenção mediante a apresentação do ato através de uma das formas legalmente previstas no CPC, como decorre dos artigos 195.º, n.º 1, 411.º e 590.º, n.º 3, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º, n.º 2, al. a), do CPT.

G. Motivo pelo qual deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que notifique a Recorrente para vir praticar o ato por alguma das formas então legalmente admissíveis, seguindo o processo os seus termos até final.

H.Mas ainda que assim não se entendesse, e se considerasse que a Recorrente carecia, efetivamente, de estar representada por advogado por levantar “questões de direito” (o que apenas se refere por mera cautela e dever de patrocínio), sempre deveria o Mmo. Juiz, oficiosamente, ter dado cumprimento ao disposto no artigo 40.º, n.º 3, do CPC, mandando notificar a Recorrente para constituir advogado e apresentar o seu requerimento.

I.Não o tendo feito, não resta senão concluir que a sentença é nula, nos termos do artigo 195.º, n.º 1, do CPC, uma vez que esta omissão influi necessariamente no exame ou na decisão da causa, nulidade que aqui se argui para os devidos efeitos legais.

Termos em que se requer a V. Exas. se dignem dar provimento ao presente recurso, sendo a sentença recorrida substituída por outra que admitia e determine a realização de perícia por junta médica OU notifique a Recorrente para vir apresentar a peça processual através de uma das formas legalmente previstas na lei OU para se fazer representar por advogado, apresentando o seu requerimento, e seguindo o processo os termos normais até final.

O Ministério Público contra-alegou e formulou as seguintes conclusões:

1-O Ministério Público concorda com a decisão recorrida, não merecendo a mesma qualquer reparo, não assistindo assim qualquer razão à Recorrente pois, o Tribunal a quo procedeu a uma adequada valoração jurídica e, em consequência, procedeu a uma correcta decisão.

2-Alega a Recorrente que no requerimento por si apresentado em 17-05-2021 “não se levantava
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