Acórdão nº 1064/20..6BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-10-04

Data de Julgamento04 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão1064/20..6BELRA
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SUBSECÇÃO TRIBUTÁRIA COMUM DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I – RELATÓRIO

Vem a S....... – S..........., S.A, interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação da denominada Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM), relativo ao ano de 2020 efectuado pela Direcção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), do Ministério da Agricultura e do Mar, no montante de € 13.986,00.


A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“1. No que diz respeito ao regime de isenção, dúvidas subsistiam à MMa Juiz, qual foi a razão pela qual não determinou a notificação da Recorrente nos termos do disposto nos artigos 99°, n° 1 da LGT e 13° e 114° do CPPT?

2. Ao invés disso, a MMa Juiz limitou-se a referira aplicabilidade do art. 74°, n° 1 da LGT, e de forma muito sintética promoveu o afastamento do art. 100°, n° 1 do CPPT, com base no entendimento de que o “facto tributário está estabilizado através do funcionamento das normas de incidência da TSAM..., subsistindo a dúvida em relação à existência do direito da Impugnante à isenção do tributo...”

3. Portanto, neste particular, a sentença proferida viola expressamente os artigos 99°, n° 1 da LGT e 13° e 114° do CPPT.

4. Não obstante, a Recorrente entende que do quadro factual dado como provado, resultam os pressupostos para considerar que encontra-se isenta do pagamento da TSAM nos termos em que tal isenção é definida pelos n° 2 do artigo 9° do DL 119/2012 de 15 de Junho e n° 1, 2, 3 e 5 do artigo 3° da Portaria n° 215/2012 de 17 de Julho,

5. Pois, o estabelecimento de que a Recorrente é titular apenas possui uma área de comércio alimentar de 1998m2, inferior, portanto, à área de 2.000m2 exigida por aquelas normas.

6. Assim como, a Recorrente não está integrada num grupo nos termos definidos na alínea b) do n° 3 e no n° 5 do artigo 3° da Portaria 215/2012 de 17 de Julho, já que, entre esta e as outras empresas fazem parte da COOPLECNORTE e utilizam a insígnia "E........ ”, não existe qualquer relação jurídica, comercial, financeira ou outra, isto é,

7. A Recorrente e aquelas restantes empresas não mantêm quaisquer laços de interdependência ou de subordinação entre si, apesar de utilizarem a mesma insígnia.

8. E a lei é clara ao exigir que, no conceito de grupo, estejam integradas empresas que, apesar de juridicamente distintas, utilizem a mesma insígnia e que desta utilização, mantenham laços de interdependência ou subordinação jurídica ou de direitos ou poderes. Isto é, não basta a existência de empresas juridicamente distintas e que utilizem a mesma insígnia.

9. E no caso dos presentes autos, a única relação jurídica e económica a que a Recorrente está sujeita é a que decorre do facto de ser uma das cooperantes da COOPLECNORTE, não tendo qualquer relação com mais nenhuma empresa que eventualmente, utilize a mesma insígnia “E........ ”.

10. Logo, não se encontra abrangida pelo conceito de grupo conforme definido na lei.

11. Salvo o devido respeito, a intenção do legislador é aplicar a taxa a empresas detentoras de estabelecimentos com grandes áreas (cfr. n° 1 e n° 3 do artigo 3º da Portaria nº 215/2012 de 17 de Julho) e não a pequenas empresas com as características da empresa titulada pela Recorrente!

12. Na verdade, seguindo a perspectiva da douta sentença, quem deveria ser sujeita à aplicação da TSAM seria a detentora da insígnia, pois, o somatório das áreas dos estabelecimentos que utilizam tal insígnia ultrapassa os 6.000m2 de área acumulada,

13. E nunca a Recorrente, cuja área de estabelecimento não pode servir como base para liquidação de duas taxas.

14. Por outro lado, o Tribunal a quo deveria ter aplicado o disposto no n° 1 do artigo 100° do CPPT. Trata-se de norma que se reporta à questão do ónus da prova.

15. A norma presente destrói claramente essa presunção legal a favor da AF (in dubio pro Fisco), e estabelece uma verdadeira repartição do ónus da prova (que se coloca apenas em relação a questões de facto), de acordo com os princípios da legalidade e da igualdade, e em termos de que a incerteza sobre a realidade dos factos tributários reverte, em regra, contra a AF, não devendo ela efectuar a liquidação se não existirem indícios consistentes da existência daqueles, isto é, se o conhecimento desses factos for baseado em meras aparências desacompanhadas da expressão factual de verdadeiros elementos probatórios.

16. Acresce que esta prova produzida há-de ser não só a prova aduzida pelas partes, como também a prova que ao juiz se impõe diligenciar (art. 13°, n° 1 do CPT).

17. A causa da dúvida no caso concreto não derivou do comportamento da Recorrente não tendo sido por incumprimento dos seus deveres de cooperação, que se inviabilizou a descoberta e apuramento dos factos tributários, não podendo a dúvida reverter contra ele.

18. No caso dos autos, a prova produzida pela Recorrente logrou infirmar os factos em que assentou o acto tributário.

19. No art° 100° do CPPT (e já o mesmo acontecia no art° 121° do CPT) acolhe-se claramente o princípio da verdade material, vinculante para a própria AF que só deverá praticar o acto tributário quando «formar convicção da existência e conteúdo do facto tributável» devendo, em caso de subsistência de dúvida «acerca do objecto do processo(..) abster-se de praticar o acto tributário, dando assim cumprimento ao princípio in dubio contra fiscum»(Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 150, 158e 169).

20. Em suma, é a indubitável consagração do princípio de que a dúvida reverte a favor do contribuinte, em substituição do princípio «in dubio pro fisco» que vigorou anteriormente à Reforma Fiscal.

21. A prova para o efeito relevante será não apenas a aduzida pelas partes, mas também e especialmente a prova que ao juiz se impõe diligenciar.

22. Assim sendo, cabia à MMa Juiz a quo realizar ou ordenar todas as diligências que considerasse úteis ao apuramento da verdade pois não pode considerar-se fundada a dúvida que implica a anulação do acto impugnado se assentar na ausência ou na inércia probatória das partes, especialmente da Impugnante.

23. É que esta não pode limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida «a existência e quantificação do facto tributário», incumbindo-lhe o «ónus probandi» de tais factos sem prejuízo de o Juiz, no uso do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também pela sua comprovação só sendo possível concluir-se pelo fundamento da dúvida mediante a prova concludente dos mesmos.

24. A este enquadramento do regime do art° 100° do CPPT há um «prius» que é a conceituação de facto tributário.

25. O juiz fazer uma apreciação crítica das provas, o que equivale a dizer que terá necessariamente de valorar e interpretar os factos apurados no julgamento à luz dos interesses e finalidades que o legislador quis defender, presentes nas normas jurídicas aplicáveis a cada hipótese.

26. Assim sendo, face ao quadro factual desenhado pela MMa Juiz a quo, torna-se necessário recorrer à regra do art° 100° do CPPT, pois que resulta do probatório exarado na sentença sob recurso fundada dúvida quanto à verificação das condições do regime de isenção legalmente previsto, pelo que deveria ter aplicado esta norma e não procedido ao seu sumário afastamento, como fez.

27. Ora, a «área de venda do estabelecimento» vem definido, como vimos, no artigo 2.° n.° 2 alínea b) da Portaria n.° 215/2012, de 17 de julho, aí se circunscrevendo «área de venda do estabelecimento» à «área destinada a venda, onde os compradores têm acesso ou os produtos se encontram expostos ou são preparados para entrega imediata».

28. Efetivamente, e desde logo, importa não confundir os conceitos de área do
estabelecimento em si considerado, a que corresponde a área total do estabelecimento, a área total do seu espaço físico em si considerado, e a «área de venda do estabelecimento», a que corresponde, nos termos do citado normativo, a área destinada à venda dos produtos aos compradores pelo estabelecimento em causa,

29. Quer isto significar que na área do estabelecimento há de apurar-se a «área de venda do estabelecimento», isto é, a área do estabelecimento onde há de efetuar-se a venda dos produtos aos compradores, entendendo-se como tal toda a área de comércio alimentar, apurada de acordo com determinados coeficientes de ponderação.

30. Tanto assim que no artigo 1º da Portaria n.° 200/2013, de 31 de maio, o qual define os coeficientes de ponderação da «área de venda do estabelecimento», vem referido: «Para efeitos do disposto na alínea b) do n.° 2 do Artigo 2.° da Portaria n° 215/2012, de 17 de julho, entende-se por «área de venda do estabelecimento» toda a área de comércio alimentar apurada de acordo com os seguintes coeficientes de ponderação: [...]».

31. Nesse pressuposto, a Recorrente regularmente informou a entidade Impugnada que a sua «área física de vendas de produtos alimentares» é 1,998m2.

32. E tal releva, porque: a «área física de vendas de produtos alimentares» é sinónimo de «toda a área destinada a venda, onde os compradores têm acesso ou os produtos se encontram expostos ou são preparados para entrega imediata», correspondendo, consequentemente, à noção «área de venda do estabelecimento» definida no artigo 2.° n.° 2 alínea b) da Portaria n.° 215/2012, de 17 de julho.

33. E isto porque, resulta de meridiana evidência que é, justamente, na «área física de vendas» que se concretizam as operações comerciais, correspondendo aquela exatamente à área «onde os compradores têm acesso ou os produtos se encontram expostos ou são preparados para entrega imediata».

34. Conforme resultou provado nos autos, o estabelecimento da Recorrente é do tipo misto (tem uma área destinada à venda de bens...

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