Acórdão nº 10540/22.5T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão10540/22.5T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. nº 10540/22.5T8PRT.P1 (apelação)
Comarca do Porto - Juízo de Execução do Porto – J 1

Relator: Filipe Caroço
Adjuntos: Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida
Desemb. Francisca Mota Vieira

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I.
No processo de execução de sentença para pagamento de quantia certa, em que são exequentes AA e BB, residentes na Rua ..., ..., ... ..., Gondomar, sendo executado CC, residente na Avenida ..., ..., 3º, ... Póvoa do Varzim, após algumas vicissitudes processuais, também relacionadas com a fixação da competência do tribunal em razão da matéria, com remessa dos autos do Juízo de Comércio de Santo Tirso (onde tiveram o nº 799/12.1TBPVZ) para o Juízo de Execução do Porto (onde foram redistribuídos com o nº 10540/22.5T8PRT), logo este tribunal, por despacho fundamentado de 13.6.2022, concluiu pela rejeição oficiosa da execução, por manifesta falta de título executivo, determinando a sua extinção, “ao abrigo do disposto nos art.ºs 726º, nº 2, al. a), 734º, nº 1, todos do CPC.
Inconformados com esta decisão, dela interpuseram recurso os exequentes, produzindo alegações que culminaram com as seguintes CONCLUSÕES:
«A) Da nulidade da Sentença:
I. Ao proferir decisão de Indeferimento Liminar do requerimento executivo sem conceder previamente aos Exequentes a possibilidade de se pronunciarem, violou o Tribunal a quo o princípio do contraditório, previsto no nº 3 do art. 3º do CPC.
II. A referida decisão pôs fim à causa, verificando-se assim a nulidade prescrita no nº 1 do art. 195º do CPC,
III. Sendo que a nulidade por violação da formalidade legalmente prevista implica a nulidade da decisão proferida pelo Tribunal a quo, por violação de um princípio estruturante do processo civil.
B) Da Decisão proferida pelo Tribunal a quo:
IV. Não podem os Recorrentes conformar-se com a Decisão que indeferiu liminarmente o requerimento executivo, desde logo porque os fundamentos que a sustentam se encontram em manifesta contradição com as disposições legais aplicáveis.
V. A referida Decisão conclui pela falta de título executivo, invocando como fundamento que a Sentença de Verificação e Graduação de Créditos não aprecia de mérito o crédito exequendo, limitando-se o Tribunal a homologar a lista que lhe é apresentada pelo Administrador de Insolvência apenas e tão só para efeitos de graduação e pagamento dos créditos pelo produto dos bens apreendidos para a massa.
Vejamos,
VI. Da Sentença de Verificação e Graduação de Créditos, proferida no apenso G, dada como título à execução, resulta que o crédito dos ora Recorrentes foi devidamente reclamado e reconhecido pelo Administrador de Insolvência,
VII. Que analisou a Reclamação de Créditos apresentada, fundamentada em transacção judicialmente homologada no proc. nº 69/10.0TBPVZ-B, que correu termos no 3º Juízo de Competência Cível do Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim, que consta nos autos como anexo à referida Reclamação.
VIII. É ao Administrador de Insolvência que incumbe, como resulta desde logo do disposto nos arts. 128º e 129º do CIRE, analisar as reclamações de créditos apresentadas, bem como os créditos que resultem da contabilidade do devedor, e estabelecer a lista dos credores reconhecidos, com a identificação de cada credor, a natureza do crédito, o montante de capital e juros à data do termo do prazo das reclamações, as garantias pessoais e reais, os privilégios, a taxa de juros moratórios aplicável, as eventuais condições suspensivas ou resolutivas e o valor dos bens integrantes da massa insolvente sobre os quais incidem garantias reais de créditos pelos quais o devedor não responda pessoalmente.
IX. O crédito reclamado pelos Exequentes, ora Recorrentes, depois de reconhecido pelo Administrador de Insolvência, foi então graduado e homologado pelo Tribunal, no âmbito do processo de insolvência do Executado, que correu termos no Tribunal de Comércio de Santo Tirso, Juiz 7, sob o nº 799/12.1TBPVZ.
X. A mencionada Decisão transitou em julgado em 06-04-2015, conforme resulta da respectiva Certidão (Cfr. Doc. 2 anexo ao requerimento executivo).
XI. Como resulta da alínea c) do nº1 do art. 233º do CIRE, a Sentença de Verificação e Graduação de Créditos constitui título executivo suscetível de ser utilizado pelos credores,
XII. E o mesmo pode ser utilizado após o encerramento do processo de insolvência, no qual não foi satisfeito o direito do credor.
XIII. A sentença de verificação e graduação de créditos constitui uma verdadeira sentença condenatória,
XIV. E, ao contrário do que resulta da sentença proferida pelo Tribunal a quo, aprecia de mérito o crédito,
XV. Desde logo porque sobre o Juiz não recai uma tarefa de homologação automática, mas antes o desempenho da função de, no exercício das funções de controlo da legalidade, verificar a conformidade substancial e formal do crédito reclamado,
XVI. Tendo para o efeito ao seu dispor todos os elementos disponíveis e sindicados pelo Administrador de Insolvência no exercício das funções que lhe são legalmente acometidas.
Em suma,
XVII. A Decisão de Indeferimento Liminar violou, pois, as disposições legais aplicáveis, designadamente o art. 3º, nº 3 e 195º, 1 do CPC, encontrando-se consequentemente ferida de nulidade, que aqui se argui.
XVIII. A referida decisão violou o disposto no art. 233º, nº1 alínea c), do CIRE, bem como os arts. 128º e 129º do referido normativo e o art. 703º, nº 1, al. a) do CPC, dos quais resulta a força executiva conferida à sentença de verificação e graduação de créditos, bem como as especiais funções de sindicância dos créditos que legalmente acometidas ao Administrador de Insolvência e servem de base à actuação do Tribunal.
XIX. Violou igualmente o art. art. 703º, nº 1, al. a) do CPC ao desconsiderar o outro título executivo constante dos autos – a Sentença que homologou a Transacção no Processo nº 69/10.0TBPVZ-B, que correu termos no 3º Juízo de Competência Cível do Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim.» (sic)
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Notificado o executado para a execução e para os termos do recurso, não ofereceu contra-alegações.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II.
O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do ato recorrido e não sobre matéria nova, exceção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º do Código de Processo Civil).
Com efeito, está para apreciar e decidir:
1. Se ocorre nulidade processual, por violação do contraditório, quando o tribunal indefere liminarmente um requerimento executivo sem ouvir o exequente sobre a causa jurídica desse indeferimento;
2. Se o documento dado à execução é um título executivo.
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III.
Relevam aqui os factos do relatório que antecede e ainda o que mais vier a ser considerado relativamente à decisão de cada uma das duas questões a resolver nesta sede de recurso.
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IV.
Conhecendo…
1- Nulidade processual por preterição do contraditório
Os apelantes alegam que o tribunal rejeitou a execução, por falta de título executivo sem que os tivesse ouvido previamente sobre a matéria, assim tendo violado princípio do contraditório e cometido uma nulidade processual nos termos dos art.ºs 3º, nº 3 e 195º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Pois bem..., aconteceu efetivamente o tribunal competente ter indeferido o requerimento executivo e julgado extinta a execução antes de ter tomado qualquer diligência executiva e sem que tivesse ouvido os exequentes/recorrentes sobre aquela possibilidade. Fê-lo por considerar manifesta a falta de título executivo, com base nos art.ºs 726º, nº 2, al. a) e 734º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Note-se que já anteriormente, a 8.3.2022, o Juízo de Comércio de Santo Tirso (proc. 799/12.1TBPVZ) proferira despacho liminar de indeferimento do requerimento executivo, mas, por decisão posterior, de 21.4.2022, declarou tal despacho nulo e sem efeito. Daí que, para todos os efeitos, a decisão agora recorrida corresponde a um despacho liminar de indeferimento em que a execução seguiu no traslado, em separado, no juízo de execução, tudo se passando, designadamente para efeito da forma de processo executivo (art.º 550º, nº 2, al. a), do Código de Processo Civil), como se a execução seguisse no próprio processo[1].
Dispõe o art.º 3º, nº 3, que “o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o
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