Acórdão nº 105/22.7BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-09-08

Ano2022
Número Acordão105/22.7BCLSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO
1. A Federação Portuguesa de Futebol, inconformada com a decisão arbitral proferida pelo TAD, que julgou procedente o recurso apresentado pela demandante Sporting Clube de Braga – Futebol SAD no âmbito do processo nº 5/2021, veio, ao abrigo do disposto no artigo 8º, nºs 1, 2 e 5 da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto, interpor recurso jurisdicional para este Tribunal Central Administrativo Sul, tendo para o efeito formulado as seguintes conclusões:
“1. O presente recurso tem por objecto o Acórdão Arbitral proferido pelo Colégio Arbitral constituído junto do Tribunal Arbitral do Desporto, notificado em 20 de Abril de 2021, que julgou procedente o recurso apresentado pela ora recorrida, que correu termos sob o nº 5/2021.
2. Em concreto, o presente recurso versa sobre a decisão do Colégio Arbitral em revogar o Acórdão proferido pela Secção Profissional do Conselho de Disciplina da ora recorrente, absolvendo a recorrida da prática da infracção disciplinar prevista e sancionada pelo artigo 87º-A, nº 4 e nº 5, do RD da LPFP19, que lhe tinha sido aplicada por aquele órgão no âmbito do processo disciplinar nº 84 – 2019/2020;
3. Em causa nos presentes autos está a violação dos deveres a que a recorrida se encontra adstrita, por ser promotora do espectáculo desportivo sub judice, de instalar e a manter em perfeitas condições e em funcionamento, um sistema de videovigilância, que permitisse o controlo visual de todo o recinto desportivo, e respectivo anel ou perímetro de segurança, dotado de câmaras fixas ou móveis com gravação de imagem e som e impressão de fotogramas, nos termos conjugados da alínea t) do nº 1 do artigo 35º do RCLPFP19, alínea u) do artigo 6º do Anexo VI ao sobredito RCLPFP19 [Regulamento de Prevenção da Violência], bem como nos nºs 1 e 2 do artigo 18º da Lei nº 39/2009 de 30 de Julho;
4. O Colégio de Árbitros entendeu que “Atenta a matéria de facto dada como assente e provada, emerge do confronto do acervo probatório existente, e em particular da ausência de relato de factos que as regras de experiência ditariam como normal terem sido relatados no concreto local e momento em que ocorreu o jogo ou, não o sendo, permitirem uma determinada e lógica conclusão, que afasta senão com certeza absoluta pelo menos acolhida por uma razoável dúvida atestada pelo princípio in dúbio pro reo a impossibilidade de condenação da demandante, arguida, impondo-se assim a sua absolvição”.
5. Sem razão, pois vejamos,
6. Desde logo, o acórdão recorrido, salvo o devido respeito, desconsidera, em sede de matéria de facto provada, diversa factualidade que resultou provada, nomeadamente em face dos documentos juntos aos autos e não impugnados pela recorrida.
7. Atentos os elementos probatórios melhor identificados em sede de alegações, resultam provados os seguintes factos:
“1. A recorrida, nos jogos disputados antes da realização da Final Four da Taça da Liga (Allianz Cup), época desportiva 2019/2020, com excepção do jogo disputado com a Clube Desportivo de Tondela – isto é, nos jogos oficialmente identificados sob os nºs 10102, 10406, 30301 e 11406 – manteve instalado o sistema de videovigilância, no Estádio Municipal de Braga, que permitia o controlo visual de todo o recinto desportivo, pois encontrava-se dotado de câmaras de videovigilância que permitia a captação e gravação de imagens, desde a abertura até ao encerramento do recinto desportivo, todavia apenas era captado e gravado som no túnel de acesso aos balneários, não permitindo a gravação de som nas restantes zonas do Estádio;
2. A recorrida agiu de forma livre, consciente e voluntária, sabendo que o seu comportamento (omissivo), designadamente o de não instalar e manter em perfeitas condições um sistema de videovigilância que permita o controlo visual de todo o recinto desportivo, e respectivo anel ou perímetro de segurança, dotado de câmaras fixas ou móveis com gravação de imagem e som e impressão de fotogramas (as quais visam a protecção de pessoas e bens), consubstancia conduta prevista e punível pelo ordenamento jusdisciplinar desportivo, não se abstendo, porém, de a realizar;
3. À data dos factos a recorrida tinha antecedentes disciplinares na época desportiva 2019/2020, tendo ainda sido punida pelos ilícitos disciplinares p. p. pelos artigos 86º-A, nº 1 e 87º-A, nº 4, ambos do RDLPFP, numa das três épocas desportivas anteriores àquela em que ocorreram os factos objecto destes autos, nomeadamente na época 2018/2019 [decisões proferidas no âmbito dos Processos Disciplinares nºs 06-18/19 e 50-18/19 – que condenaram a SC Braga, respectivamente, na multa de € 2.677,50, pela prática da infracção disciplinar p. e p pelo artigo 86º-A, nº 1, do RDLPFP e na multa de € 5.740,00, pela prática da infracção prevista no artigo 87º-A, nº 4 do RDLPFP, já transitadas em julgado]”.
8. Por outro lado, atendendo ao supra exposto em sede de alegações, deverá ser considerada não provada a seguinte factualidade:
« Ponto 44: “Não tendo o Exmº Superintendente-Chefe, ao contrário dos identificados Delegados da Liga, qualquer conhecimento directo acerca dos factos objecto destes autos – cf. Lista das presenças constantes da Actas elaboradas nas Reuniões Preparatórias dos jogos aqui em apreço ora juntas sob os doc. 1, 2 e 3” (matéria de facto alegada, não controvertida, dada como assente e provada e atento o Processo Disciplinar nº 84 – 2019/2020 e Apenso correspondente ao Processo Disciplinar nº 95 – 2019/20 de fl.)”.».
Sem prescindir,
9. O acórdão recorrido é nulo, nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea c) do CPC, porquanto ao considerar provados os Pontos 86, 87, 88 e 89 entra numa grave contradição ao decidir pela impossibilidade de condenação da demandante, ora recorrida, porquanto o tipo objectivo do ilícito disciplinar pelo qual foi sancionada se preenche, precisamente, com aquela factualidade que foi, sublinhe-se, considerada provada pelo Colégio de Árbitros.
10. Ora, não temos qualquer dúvida que o CD da recorrente carreou e coligiu prova mais do que suficiente para sustentar a condenação da recorrida, senão vejamos,
11. De toda a prova junta aos presentes autos resulta, de forma clara, que a recorrida não dispunha de um sistema de videovigilância que permitisse o controlo visual de todo o recinto desportivo, e respectivo anel ou perímetro de segurança, dotado de câmaras fixas ou móveis com gravação de imagem e som e impressão de fotogramas, conforme exigidos pelos RC da LPFP e pela Lei nº 39/2009.
12. E não se diga, como entendeu o Colégio Arbitral, que os esclarecimentos prestados pela PSP consubstanciam pedido de esclarecimentos prestados por terceiros porquanto, consabidamente, a PSP era a força de segurança presente em todos os jogos dos autos;
13. Por outro lado, os Delegados da LPFP não tiveram qualquer intervenção em termos de operacionalização do sistema de videovigilância e, de acordo com os esclarecimentos complementares que prestaram, apenas reportaram aquilo que, agora sim, lhes terá sido dito por terceiros;
14. Pelo que, consabidamente, por se referirem a factos de que não tiveram conhecimento directo, os mesmo não podem beneficiar da presunção de veracidade constante do artigo 13º, alínea f) do RD da LPFP;
15. Por outro lado, também não concebemos que se atribua, como fez o Colégio Arbitral, a omissões constantes dos relatórios dos delegados da LPFP e da força de segurança a presunção de veracidade, regulamentar e legalmente prevista respectivamente, para os factos directamente percepcionados por aquelas entidades;
16. E, não se diga que no “Relatório do auto de vistoria e categorização de estádio de Sporting Clube de Braga – Futebol SAD” da época desportiva 2019-2020, foi pela Comissão Técnica de Vistorias da Liga Portugal aprovado o Estádio Municipal de Braga, por cumprir com todas as exigências legais.
17. Como bem sublinha o Conselho de Disciplina no acórdão recorrido «Debalde esta argumentação, compulsado o Relatório do auto de vistoria e categorização de estádio da SC Braga, datado de 18/03/2019, resulta que a aprovação nessa vistoria foi feita com reservas e precisamente quanto ao som do sistema de videovigilância. De facto, no Relatório de auto de vistoria em causa, junto pela própria defesa, no item Não Conformidades / Descrição, consta como não conformidades que: “A SD encontra-se a requalificar o sistema de som CCTV com as indicações transmitidas na vistoria”, “Prazo de Execução 30/05/2019”; “No Sistema de videovigilância tem que ser instaladas 2 câmaras na saída do elevador com acesso ao C. presidencial e no C. Presidencial – assim como melhorar todas as existentes”, “Prazo de Execução 30/05/2019”; “A SD tem que pedir nova vistoria para verificar os itens acima referidos com prazos” (apud p. 237).».
18. Com efeito, parece-nos claro que, se na data da vistoria, a recorrida não tinha o sistema de videovigilância em conformidade com as normas a que se encontra adstrita, tal facto corrobora, obviamente, os factos trazidos ao processo pela PSP, e não o contrário, como entendeu o Tribunal a quo.
19. De facto, é irrefutável que qualquer dúvida em matéria de prova se resolve a favor do arguido, por aplicação dos princípios da presunção da inocência e do in dúbio pro reo.
20. Contudo, nos presentes autos, não existe qualquer dúvida relativamente aos factos que motivaram a condenação da recorrida.
21. Muito pelo contrário, toda a prova produzida nos autos está harmoniza entre si, tendo sido analisada de forma crítica e conjugada, desse modo permitindo concluir a que a recorrida, nos jogos sub judice, não manteve, como lhe competia, uma sistema de videovigilância que permita o controlo visual de todo o recinto desportivo, e respectivo anel ou perímetro de segurança, dotado de câmaras fixas ou móveis com gravação de imagem e som e...

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