Acórdão nº 1025/22.0T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07-03-2024

Data de Julgamento07 Março 2024
Ano2024
Número Acordão1025/22.0T8FAR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
P. 1025/22.0T8FAR.E1

Acordam no Tribunal da Relação de Évora:

AA intentou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra BB, peticionando a declaração de nulidade do contrato de arrendamento celebrado em 1 de dezembro de 2016, entre CC e BB, aqui R., relativo ao primeiro andar do prédio denominado “...”, sito em ..., no concelho ..., por simulação absoluta e, ainda, a respetiva comunicação à Autoridade Tributária, com vista ao cancelamento desse contrato.
Para tanto, alegou, em síntese, que CC, falecida em ../../2018, deixou duas únicas herdeiras, as suas filhas, aqui A. e R., as quais são herdeiras legitimárias e testamentárias, constando do respetivo acervo hereditário, o prédio denominado “...”. Alega, igualmente, a A. que, em 1 de dezembro de 2016, CC celebrou com a R. um contrato de arrendamento, que tem por objeto o primeiro andar daquele prédio. Todavia, segundo a A., o mencionado prédio não é habitado desde há aproximadamente quarenta anos, que se encontra degradado, abandonado, em ruínas e sem condições de habitabilidade. Acrescenta, ainda, a A. que a R. não apresenta qualquer prova do pagamento da renda mensal, no valor de € 250,00, apesar de a inscrever na conta corrente das receitas da herança. Neste contexto, considera a A. que a celebração do aludido contrato de arrendamento teve, unicamente, o intuito de condicionar a partilha quanto ao prédio denominado “...” e, ainda, de enganar a Autoridade Tributária, através da apresentação de uma despesa – no montante de € 19.929,69, para a colocação de janelas em alumínio, que alega que não foi executada o imóvel – com o propósito de aumentar as despesas da herança, em virtude dos rendimentos obtidos no ano de 2016.
Regularmente citada, a R. contestou por impugnação, pugnando pela improcedência da ação e, consequentemente, pela sua absolvição. Neste âmbito, alegou que o contrato de arrendamento que celebrou com a sua mãe, CC, teve o duplo objetivo de a R. poder habitar no local arrendado e de neste poder fazer obras de conservação e melhoramentos, sendo os respetivos gastos lançados como despesas na contabilidade da herança. Ademais, alega a R. que o prédio denominado “...” se encontra em condições de habitar, embora não tenha as comodidades atuais, pois é uma casa senhorial agrícola, já com cerca de 200 anos de construída. Alega a R., ainda, que paga as rendas, os respetivos impostos e que se desloca ao local arrendado muitas vezes, não tendo realizado quaisquer obras de reparação, nem retirado à herança o valor de € 19.929,26. Desta forma, entende a Ré que o contrato de arrendamento em causa é real e não simulado.
Por requerimento, datado de 17.06.2022, veio a A. deduzir o incidente de litigância de má fé contra a R., exercer o contraditório quanto ao documento junto com a contestação e, ainda, proceder à retificação de lapso de escrita cometido na petição inicial, o que foi admitido pelo despacho de 03.10.2022.
Findos os articulados, veio a ser realizada a audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador, no qual se fixou o valor da causa, procedeu-se à identificação do objeto do litígio, à enunciação dos temas da prova e admitiram-se os requerimentos probatórios das partes.
De seguida, realizou-se a audiência de julgamento, com observância das formalidades legais, tendo sido proferida sentença pela M.ma Juiz a quo, a qual julgou a presente acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência, declarou a nulidade do contrato de arrendamento, celebrado em 1 de dezembro de 2016, entre a falecida, CC, e a R., por simulação absoluta, relativo ao primeiro andar do prédio misto, denominado “...”, sito em ..., inscrito na matriz predial sob o artigo n.º ...48, da união de freguesias ... (... e ...), concelho ... e descrito na Conservatória do Registo Predial ... com o n.º ...10, mais se absolvendo a R. do demais peticionado pela A.

Inconformada com tal decisão dela apelou a R. tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões:
1-Foram temas da prova nestes autos:
A - Se o contrato de arrendamento foi celebrado para condicionar os termos da partilha quanto ao prédio objecto do contrato;
B- Das circunstâncias que rodearam a outorga do contrato;
C- Do estado em que se encontra o prédio;
D- Se o contrato foi celebrado com o intuito de enganar a Autoridade Tributária;
E- Do pagamento de renda à herança.
2- O Tribunal a quo veio a considerar provada a seguinte factualidade:
1- CC faleceu em ../../2018, no estado de viúva de DD, o qual faleceu em ../../2007;
2- Por escritura pú8blica de habilitação, datada de 31 de Julho de 2018, foram habilitadas como herdeiras de CC, as filhas, AA e BB;
3- Do acervo hereditário de CC consta, entre o mais, o prédio misto, denominado “...”, sito em ..., inscrito na matriz predial sob o artigo nº ...48 (actual artigo nº ...09), da união de freguesias ... (... e ...), concelho ..., e descrito na Conservatória do Registo Predial ... com o nº ...10, composto por horta e casas de moradia de dois pavimentos, logradouro, e seis divisões no primeiro andar e quatro no rés de chão;
4- Por escrito, datado de 1 de dezembro de 2016, denominado “contrato de Arrendamento para fins habitacionais com prazo certo”, no qual figura como primeira outorgante ou senhoria, CC, e como segunda outorgante ou arrendatária, BB, a primeira outorgante declarou dar de arrendamento à segunda outorgante, que aceitou tomar de arrendamento, o primeiro andar do prédio misto, denominado “...”, identificado em 3., pelo prazo de 1(um) ano, automaticamente renovável por iguais períodos, com início em 1 de dezembro de 2016, pela quantia mensal de € 250,00 (duzentos cinquenta euros);
5- No escrito referido em 4. consta, entre o mais, que “a segunda outorgante declara reconhecer, por prévia vistoria feita ao local, que o locado, objecto do presente contrato de arrendamento, se encontra em condições de habitabilidade”.
6- No dia 29 de dezembro de 2016, a pedido da Ré, a empresa “A..., Lda.”, emitiu a fatura nº ...75, no montante de € 19.929,69 (dezanove mil, novecentos e vinte e nove euros e sessenta e nove cêntimos), para a realização de obras de reparação e remodelação no primeiro andar do imóvel referido em 3 (designadamente, para a colocação de janelas de alumínio), as quais não foram executadas até à presente data;
7- Parte do montante referido em 6, no valor de € 13.285,13 (treze mil, duzentos e oitenta e cinco euros e treze cêntimos) foi declarado no IRS relativo ao ano de 2016 como “despesas de manutenção e conservação” do primeiro andar do imóvel referido em 3;
8- Desde dezembro de 2016, a Ré inscreve na conta corrente da herança a receita mensal de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros), denominada de “art 8509 1º”, sem demonstrar o pagamento desse montante;
9- O primeiro andar do imóvel referido em 3 não é habitado desde há cerca de quarenta anos e encontra-se abandonado e degradado (em particular, a escada de pedra de acesso, a porta de entrada em madeira e as janelas em madeira, todos referentes ao primeiro andar, necessitam de manutenção e limpeza).
3- E considerando não provado que, “O escrito referido em 4, denominado “Contrato de Arrendamento para fins habitacionais com prazo certo”, tivesse o objectivo de condicionar os termos da partilha relativamente ao imóvel, denominado “...”, sobre o qual o mesmo incidiu.”
4- A presente acção foi intentada pela A./Recorrida invocando esta a simulação absoluta do contrato de arrendamento celebrado em 01/12/2016 (vide o respectivo contrato de arrendamento que se encontra nos autos na certidão judicial doc. 12 anexo à p.i.) e pedindo a A./recorrida a declaração de nulidade desse contrato.
5- Atento o artigo 240.º do C.C., para que se esteja perante um negócio simulado é necessário que, simultaneamente, se verifiquem os três requisitos seguintes:
- a intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração;
- o acordo simulatório (pactum simulationis);
- e o intuito de enganar terceiros.
6- O ónus da prova desses três requisitos cabe a quem invocar a simulação e por os ditos requisitos serem constitutivos do respectivo direito invocado.
7- Quanto ao 1º requisito – a intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração – não existe no contrato de arrendamento a que estes autos se reportam uma divergência entre a vontade das partes e a declaração consubstanciada nesse contrato de arrendamento, tendo sido vontade da já falecida CC, e na sua qualidade de Cabeça de Casal por óbito de seu marido DD, dar de arrendamento á ora Ré Recorrente (sua filha) o 1º andar do prédio misto denominado “...” e foi vontade da ora Ré/Recorrente tomar de arrendamento esse 1º andar.
8- Da factualidade provada nos autos não há quaisquer indícios que levassem a inferir a divergência, entre, as vontades de senhoria e inquilina, e o contrato de
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