Acórdão nº 0947/07.3BEALM-A de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14-12-2023

Data de Julgamento14 Dezembro 2023
Ano2023
Número Acordão0947/07.3BEALM-A
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (1 SECÇÃO)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO

1. A..., Ld.a interpôs no TAC de Lisboa recurso contencioso de anulação da deliberação, de 2.10.96, da Câmara Municipal de Almada, que deferiu, sob determinadas condições [exigindo nomeadamente, a permuta com outros proprietários de algumas das parcelas, estabelecendo que as áreas cedidas podiam ter qualquer outro fim] o seu pedido de licenciamento de uma operação de loteamento (Proc. no ...6).

2. Por sentença daquele Tribunal de 12.4.2003, confirmada pelo acórdão do STA de 7.4.2005 (Proc. no 1339/03), a deliberação recorrida foi anulada.

3. Em 14.9.2005 a Recorrente requereu a execução do julgado no TAC Lisboa.

4. Entretanto, a CMA, por deliberação de 18.1.2006 declarou a nulidade da deliberação de 2.10.96.

5. O TAC de Lisboa proferiu a sentença de 23.9.2006, decidindo que a Administração não executara o julgado, anulou a deliberação de 2.10.96, e determinando a requerida execução, com a prolação, no prazo de 30 dias, de novo acto e sob cominação de sanção compulsória por incumprimento da sentença.

6. A exequente foi notificada em 12.6.2007 da deliberação da CMA de 6.6.2007, que indeferiu a proposta de loteamento por a área de construção proposta ser muito superior ao permitido no Plano Parcial de Almada.

7. Em 11.2.2007 a Exequente intentou acção no TAF de Almada da deliberação de 6.6.2007 (Proc. 947/07), que proferiu sentença em 24.3.2010, anulando essa deliberação, e condenou o município a licenciar, no prazo de 60 dias, o loteamento e a construção nos termos constantes da deliberação de 2.10.1996, com as contrapartidas a definir, desde que cumprindo os normativos e limites legais exigíveis, sob pena de aplicação de sanção compulsória [título executivo na presente acção]. Esta sentença transitou em julgado, pois em 5.5.2010, foi interposto recurso pela CMA para o TCAS, que, por acórdão de 10.7.2014 não admitiu o recurso por inimpugnabilidade da decisão recorrida (Proc. no 6710/10). Foi então interposto recurso de revista para o STA, que, por acórdão de 15.1.2015, não foi admitido.

8. Em 11.11.2015 foi a exequente notificada da aprovação da proposta no ...15, aprovada pela CMA, em 23.9.2015.

9. A ora Recorrente requereu então a execução da sentença proferida em 24.3.2010, no TAF de Almada, Proc. 947/07.3BEALM-A, que proferiu sentença em 22.2.2018 tendo o TCAS, em 2.7.2020 indeferido a reclamação para a conferência da decisão sumária de 8.4.2020, que havia negado provimento ao recurso interposto da sentença do TAF de Almada, de 22.02.2018.

10. A recorre1. A..., Ld.a interpõe recurso jurisdicional de revista para este STA, nos termos do art. 150º CPTA, do acórdão do TCAS, proferido em 2.7.2020, revista essa admitida por acórdão de 3.12.2020.

11. Para tanto, alegou em conclusão:

“(…) B - DAS QUESTÕES JURÍDICAS
BA - DA FORÇA VINCULATIVA, EFICÁCIA, AUTORIDADE E INTANGIBILIDADE DO CASO JULGADO

5a. A deliberação da CMA, de 1996.10.02, condicionou o licenciamento da operação de loteamento da ora recorrente à realização de cedências ilegais e foi objecto de apreciação e decisão, além do mais, nos seguintes arestos, todos já transitados em julgado:

a) Sentença do TAFL, de 2003.04.12, que anulou a referida deliberação, com o fundamento de que "do referido acto não consta a motivação das condições impostas ao licenciamento em análise (...), não (sendo) possível ao destinatário comum apreender, designadamente, as razões de facto e de direito que impõe(m) a cedência de superfícies, a determinação das respectivas áreas e seus fins e a execução de obras de infra-estruturas em valor estabelecido pela CMA" (v. alínea E) dos FP);

b) Acórdão do STA, de 2005.04.07, no qual se decidiu que, "ao estabelecer (no respectivo ponto n. º 3) que «às áreas cedidas pode ser dado qualquer outro fim», a deliberação impugnada (da CMA, de 1996.10.02) contraria também o disposto no n. º 2 do referido art. 16º (do DL 448/91), nos termos do qual as áreas em causa «não podem ser afectas a fim distinto do previsto» no alvará de loteamento" (v. alínea E) dos FP); e

c) Sentença do TAFL, de 2006.09.23, que “fix(ou) a execução da sentença anulatória (sentença do TAFL, de 2003.04.12, e AC. do STA de 2005.04.07) na prolação de novo acto administrativo devidamente fundamentado nos moldes supra escalpelizados, a proferir no prazo de 30 dias" (v. alínea H) dos FP) — cfr. texto nºs. 7 e 8;


6a. A douta sentença exequenda do TAF Almada, de 2010.03.24, já transitada em julgado, decidiu que, face aos referidos arestos transitados em julgado, "a parte a renovar do acto controvertido (deliberação da CMA de 1996.10.02) se prende exclusivamente com as contrapartidas exigidas à Autora", tendo condenado o Município de Almada "a licenciar o loteamento e a construção aprovada pela deliberação camarária de 1996.10.02, emitindo o respectivo Alvará, condicionado à satisfação das contrapartidas que venham a ser definidas, em cumprimento dos normativos e limites legalmente estabelecidos" (v. Proc. 947/07.3BEALM, da Unidade Orgânica 1 do TAF Almada) — cfr. texto nºs. 9 e 10;

7a. Na presente execução de sentença não podem ser reapreciadas as questões já decididas, com trânsito em julgado, nas referidas decisões judiciais (v. arts. 613º e 619º e segs. do NCPC) — como sucedeu no douto acórdão recorrido -, concluindo - se agora que, afinal, foi dado cumprimento aos julgados anulatórios pela deliberação da CMA, de 2015.09.23, que condicionou inovatoriamente o licenciamento do loteamento e a emissão do correspondente alvará a novos trabalhos, obrigações, condicionamentos e exigências de valores elevadíssimos e injustificados, e ao pagamento de novos encargos urbanísticos, sem alterar o n.º 3 da deliberação da CMA, de 1996.10.02 — "às áreas cedidas pode ser dado qualquer outro fim" -, que, como se decidiu no douto acórdão deste Venerando STA, de 2005.04.07, "contraria (...) o disposto no n.º 2 do (...) art. 16º" do DL 448/91, de 29 de Novembro - cfr. texto nº 11;

8a. O douto acórdão recorrido, ao decidir que a deliberação da CMA, de 2015.09.23, cumpriu integralmente os julgados anulatórios, violou assim clara e frontalmente a força vinculativa, eficácia, autoridade e intangibilidade do caso julgado da douta sentença do TAF Almada, de 2010.03.24, das anteriores sentenças do TAFL, de 2003.04.12 e de 2006.09.23, e do douto acórdão deste Venerando STA, de 2005.04.07, bem como o disposto no art. 205º/2 da CRP e nos arts. 613º e 619º e segs. do NCPC (v. art. 1 º do CPTA) — cfr. texto nos. 7 a 12;

BB - DA VIOLAÇÃO DE DIREITOS E PRINCÍPlOS CONSTITUCIONALMENTE CONSAGRADOS

9a. No cumprimento e execução dos julgados proferidos no caso sub judice, incumbia ao Município de Almada reconstituir a situação em que a ora recorrente se encontraria caso os actos anulados nunca tivessem sido praticados, repondo a legalidade e removendo da ordem jurídica as consequências lesivas de tais actos, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado (v. arts. 205º e 268º/4 da CRP, art. 619º e segs. do NCPC e arts. 173º e 176º/5 do CPTA) — cfr. texto nºs. 13 a 15;

10ª. A sentença exequenda, de 2010.03.24, e os doutos arestos, de 2003.04.12, de 2005.04.07 e de 2006.09.23, fixaram o âmbito da presente execução de julgados, que tem de ser cumprido pelo executado e ora recorrido, não podendo o Tribunal a quo considerar integralmente executados os referidos julgados anulatórios pela deliberação da CMA, de 2015.09.23, que condicionou o licenciamento do loteamento e a emissão do correspondente alvará para o prédio da ora recorrente, a novos trabalhos, obrigações, condicionamentos e exigências de valores elevadíssimos e injustificados, e ao pagamento de inovatórios encargos urbanísticos, sem alterar o n. º 3 da deliberação da CMA, de 1996.10.02, que, como se decidiu no douto AC. STA de 2005.04.07, "contraria (...) o disposto no n.º 2 do (...) art. 16º do DL 448/91, de 29 de Novembro, violando frontalmente direitos fundamentais da ora recorrente (v. arts. 205º/2, 266º e 268º/4 da CRP), bem como o disposto nos arts. 203 º e segs. da CRP, nos arts. 619º e segs. do NCPC e nos arts. 173º e segs. do CPTA - cfr. texto n ºs. 16 a 18.

NESTES TERMOS,

Deve ser admitido e julgado procedente o presente recurso excepcional de revista, revogando-se o acórdão recorrido, com as legais consequências. SÓ ASSIM SE DECIDINDO SERÁ CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA."

12. O Recorrido Município apresentou as suas contra-alegações, concluindo:

"I. Nos presentes autos, o que a Recorrente traz a debate é a questão de saber se, ao cumprir a sentença judicial anulatória de uma sua decisão, o Município de Almada podia praticar um a.a. com fundamentos e segmentos decisórios distintos dos do a.a. anulado.

II. O Município de Almada cumpriu com o julgado, satisfazendo a pretensão urbanística e decidindo pela obrigatoriedade de satisfação de determinadas contrapartidas e pela liquidação, porque devidas, das respectivas taxas.

III. O facto de os fundamentos da decisão que deferiu a pretensão urbanística deduzida pelo A e a cuja prática o Município de Almada foi judicialmente condenado por sentença transitada em julgado, terem sido distintos dos utilizados no a.a. anulado, não sujeita o novo a.a. à formalidade de audiência prévia, pela razão simples de que o seu conteúdo foi favorável, com aliás não podia deixar de ser, à pretensão deduzida pela ora Recorrente.

IV. A par do deferimento da pretensão, a satisfação de contrapartidas e a liquidação de taxas resultam da mera aplicação de normas legais imperativas, a saber o DL nº 555/99, de 16 de dezembro (RJUE), a Lei n º 59-E/2006, de 29 de dezembro e o Regulamento e Tabelas de Taxas do Município de Almada.

V. Os tributos liquidados pelo Recorrido constituem não um imposto mas uma taxa, porque bilateral e provida do sinalagma que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT