Acórdão nº 0927/20.3BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2022-06-30

Ano2022
Número Acordão0927/20.3BELRA
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (1 SECÇÃO)
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:

1. Estaleiros Navais de Peniche, SA, com sede no Molhe Leste, em Peniche, intentou acção administrativa de contencioso pré-contratual contra a A…………, SA (A…………), e em que eram contra-interessadas a B…………, SA (B…………), C…………, Lda. (C…………) e a D…………, Lda. (D…………), onde pediu a anulação da decisão de adjudicação à proposta apresentada pelo agrupamento “C………… – B…………”, bem como do contrato que tenha sido entretanto celebrado e a condenação da entidade demandada a excluir as propostas do aludido agrupamento e da “D…………”, admitindo a sua e adjudicando-lhe o contrato.

O TAF de Leiria, por sentença de 19/2/2021, decidiu o seguinte: ”a)Julgo improcedente o pedido de anulação do acto de adjudicação com fundamento na ilegalidade da exclusão da proposta da Autora, mais julgando improcedente o pedido de condenação da Entidade Demandada a admitir e adjudicar a proposta da Autora, absolvendo a Entidade Demandada dos referidos pedidos; b) julgo procedente a excepção dilatória de ilegitimidade activa quanto aos demais pedidos (anulação do acto de adjudicação com fundamento na ilegalidade da admissão das propostas das Contra-Interessadas e condenação da Entidade Demandada a excluir as mesmas) e, consequentemente, absolvida a Entidade Demandada da instância na parte que lhes corresponde”.

A A. interpôs recurso da sentença, na parte em que julgou procedente a excepção da ilegitimidade activa, para o TCA-Sul, o qual, por acórdão de 20/5/2021, concedeu-lhe provimento, decidindo revogar a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos ao TAF de Leiria, tendo em vista o seu prosseguimento nessa instância para produção de prova.

Deste acórdão, foram interpostos recursos de revista para o STA pela entidade demandada e pelas contra-interessadas “C…………” e “B…………”.

A “A…………”, na sua alegação de recurso, formulou as seguintes conclusões;
A. O presente recurso vem interposto do douto Acórdão do TCA Sul, de 20.05.2021, apenas no segmento que apreciou a exceção dilatória de ilegitimidade ativa quanto aos pedidos de anulação do ato de adjudicação com fundamento na alegada ilegalidade da admissão das propostas das contrainteressadas e de condenação da ora Recorrente a excluir essas propostas, no qual se concluiu em sentido diverso ao da Sentença de 1ª instância, proferida pelo TAF de Leiria.
B. No caso sub judice verificam-se os pressupostos previstos no art. 150.º do CPTA, para a admissibilidade do recurso de revista.
C. Atendendo ao âmbito do douto acórdão recorrido, estamos perante matéria que assume relevância jurídica e social, além de a admissão do recurso ser necessária para uma melhor aplicação do direito.
D. O julgamento recorrido viola regras assentes de processo, provocando uma manifesta insegurança jurídica e uma alteração fundamental no fixado na lei.
E. O presente Recurso centra-se no erro de julgamento relativo a questão jurídica de alcance geral e que se pode vir a verificar numa multiplicidade de situações.
F. A questão em causa – da legitimidade para a dedução de pedido de anulação do ato de adjudicação nos casos em que se considera legal a decisão de exclusão da proposta do concorrente impugnante -, é, claramente, suscetível de “ultrapassar os limites da situação singular e se repetir”.
G. Está em causa um entendimento (errado) do douto Acórdão recorrido que pode condicionar todos os processos de contencioso pré-contratual daqui para a frente.
H. Tal determina que se considere preenchido um dos requisitos (alternativos) do n.º 1 do art. 150.º do CPTA, da “relevância jurídica”.
I. A admissibilidade do Recurso de Revista nos termos do art. 150.º/1 do CPTA, resulta ainda, no caso em apreço, da sua relevância social, atendendo à natureza do contrato a celebrar e a sua importância atual, estando em causa um serviço público essencial do qual dependem cerca de 9 milhões de pessoas por ano para se deslocarem para o seu emprego e diversas atividades e necessidades.
J. Verifica-se, assim, no caso em apreço, o primeiro requisito (alternativo) previsto no n.º 1 do art. 150.º do CPTA: questão com relevância jurídica ou social.
K. O presente recurso é também claramente necessário para a justa decisão da causa, em concreto – e sempre com o devido respeito pelo douto Tribunal a quo – para uma melhor aplicação do direito.
L. Esta necessidade resulta da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes, de forma a permitir a estabilidade e segurança jurídica numa questão que tantas vezes se pode vir a verificar nos nossos tribunais.
M. O douto acórdão recorrido não tratou a presente matéria da forma que tem vindo jurídica e pacificamente a ser decidida nos nossos tribunais, sendo objetivamente útil a intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo.
N. Verificando-se, assim, igualmente, o requisito (alternativo) previsto na parte final do n.º 1 do art. 150.º do CPTA.
O. Face a tudo o exposto, estão reunidos os pressupostos do n.º 1 do art. 150.º do CPTA, para a admissão do presente Recurso, quer porque estão em causa questões com relevância jurídica ou social, quer porque a admissão do Recurso é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
P. Quanto aos fundamentos do Recurso, resulta evidente que o douto acórdão recorrido não pode ser mantido.
Q. A jurisprudência firmada e pacífica nos nossos tribunais entende que, improcedendo o pedido de anulação da decisão de exclusão da proposta do concorrente, sendo a sua proposta excluída no âmbito do procedimento, este perde qualquer legitimidade para impugnar a decisão de adjudicação com base noutros vícios que lhe aponte.
R. O concorrente que veja a sua proposta excluída no âmbito do procedimento concursal, deixa de poder obter qualquer benefício ou vantagem da anulação do ato de adjudicação, pois a sua proposta nunca poderia vir a ser escolhida naquele procedimento.
S. Por outro lado, sempre se diga que o interesse que o acórdão recorrido atribui à Recorrida de poder vir a participar em novo (e eventual futuro) concurso a ser (eventualmente) lançado pela Entidade Demandada por força de uma deserção a operar-se no presente procedimento com a exclusão das demais propostas das Contrainteressadas, não é suficiente para lhe conferir legitimidade ativa, por evidente falta de interesse/legitimidade processual.
T. Como é jurisprudência pacífica, tal interesse na anulação do ato impugnado não é um interesse direto, como exige o art. 55.º/1/b) do CPTA, mas antes um interesse meramente eventual, hipotético e indireto.
U. O alegado benefício que o Tribunal a quo invoca para a Recorrida assenta, pois, num juízo sobre uma utilidade da procedência do pedido que não resulta diretamente do efeito da sentença anulatória a proferir, mas sim de uma decisão autónoma, posterior e meramente eventual, da entidade adjudicante que pode, ou não, vir a verificar-se.
V. Aliás, ao abrigo do artigo 24.º, n.ºs 2 e 3 CCP, o Recorrido pode nem sequer ser convidado em futuro procedimento, podendo nunca vir a poder obter o contrato, não se vendo assim, onde possa estar sequer esse hipotético interesse.
W. Note-se que a jurisprudência do TJUE citada pelo Acórdão recorrido não é aplicável ao presente caso, pois o TJUE tem em conta o caso concreto em apreciação e os casos referidos não são assimiláveis, pois, por um lado tratam de um recurso subordinado versus um recurso principal, que aqui não existem e, por outro lado, trata de uma situação em que só existiam duas propostas, sendo que aqui existem três.
X. Mas mais, é que o TJUE já decidiu em sentido totalmente contrário ao pretendido pelo Acórdão recorrido, tendo admitido expressamente que um concorrente que viu a sua proposta definitivamente excluída, não pode impugnar a decisão de adjudicação.
Y. Assim, contrariamente ao pretendido, a jurisprudência do TJUE não é pacífica, nem unânime.
Z. Como também o não é a Doutrina, havendo quem defenda exatamente o oposto do que vem defendido pelo Acórdão recorrido.
AA. Ao contrário do plasmado no Acórdão recorrido, não se verifica interesse em agir, pois a Recorrida deixa de ter um interesse real e atual carecido de tutela jurídica.
BB. O Tribunal de 1ª instância, ao confirmar a decisão de exclusão da proposta a A., aqui Recorrida, bem andou ao julgar procedente a exceção dilatória de ilegitimidade ativa da A., absolvendo a Recorrente dos demais pedidos.
CC. Pelo que mal andou o Tribunal a quo ao entender que a Sentença do TAF de Leiria incorreu em erro ao considerar que a A. não tem legitimidade para deduzir os pedidos de anulação do ato de adjudicação, com fundamento na ilegalidade da admissão das propostas das contrainteressadas, e de condenação da A............ a excluir essas propostas.
DD. Perante tudo o supra exposto, deve o acórdão recorrido ser revogado por enfermar de patentes erros na aplicação do Direito.”

Por sua vez, as referidas contra-interessadas enunciaram, na sua alegação, as conclusões seguintes:

A - Do Enquadramento.

a) O ora Recorrido ENP decidiu impugnar a decisão de exclusão da respetiva proposta e impugnar a decisão de admissão das demais propostas e de adjudicação às ora Recorrentes;

b) O tribunal de primeira instância decidiu manter a exclusão da proposta do Recorrido, dado serem manifestas as respetivas ilegalidades, e absolver da instância a Entidade Demandada e as ora Recorrentes por o ora Recorrido, confirmada que foi a respetiva exclusão do concurso, não possuir legitimidade ativa para impugnar a decisão de admissão das propostas das demais concorrentes e a decisão de adjudicação às ora Recorrentes;

c) O Recorrido interpôs recurso jurisdicional para o TCA Sul, mas apenas do segmento decisório que determinou que o mesmo não...

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