Acórdão nº 0772/15.8BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10-05-2023

Data de Julgamento10 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão0772/15.8BEBRG
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. O REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga interpôs recurso jurisdicional da sentença daquele Tribunal que julgou totalmente procedente a impugnação judicial da liquidação adicional de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas n.º ...46, referente ao exercício de 2011, no valor de € 63.231,06.

Impugnação esta que tinha sido interposta por A..., LDA., NIF ..., com sede no lugar ..., freguesia de ..., concelho ....

O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Notificada da sua admissão, a Recorrente apresentou alegações, que rematou com as seguintes conclusões: «(...)


A- A presente impugnação tem por objeto a liquidação adicional de IRC e respetivos juros compensatórios do ano de 2011 no valor global de € 92.482,91, e valor a pagar (após compensação) de € 63.231,06.

B- Na douta sentença recorrida julgou-se procedente a impugnação judicial deduzida pela Impugnante, com a consequente anulação da liquidação efetuada.

C- A Fazenda Pública, não se conformando com o deferimento total do pedido da Impugnante, entende que a douta sentença ora recorrida sofre de errada interpretação e aplicação da lei, vejamos;

D- Para a prolação desta decisão, na sentença recorrida fez-se constar a seguinte fundamentação:

“Na verdade, não sendo controverso, nos autos, os factos que originaram a desvalorização excecional e o abate físico, desmantelamento, o abandono ou inutilização dos bens (……) impõe-se, atendendo aos referidos princípios, fazer-se uma interpretação restritiva da al. c), do n.º 3, do artigo 38.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletiva, no sentido de a falta da comunicação aí referida, não implicar, por si só, a desconsideração da desvalorização excecional como gasto, pois é esta interpretação, partindo daquele pressuposto, que melhor permite alcançar a verdade material e a tributação do lucro real da empresa.

Pelo exposto, assiste razão ao Impugnante devendo considerar-se a liquidação adicional de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas ilegal, por padecer de erro nos pressupostos de direito (vício de violação de lei), devendo, pois, ser anulada, nos termos do artigo 135.º do Código de Procedimento Administrativo, em vigor à data dos factos (aprovado pelo decreto-lei n.º 442/91, de 15 de novembro, revogado pelo decreto-lei n.º 4/2015 de 7 de janeiro), atual artigo 163.º do Código de Procedimento Administrativo, aplicável ex vi artigo 4.º, al. d) do Código de Procedimento e Processo Tributário.

E- Determinava o artigo 38º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) na redação em vigor à data dos factos, na parte que para os presentes autos importa, o seguinte:

“c) Seja comunicado ao serviço de finanças da área do local onde aqueles bens se encontrem, com a antecedência mínima de 15 dias, o local, a data e a hora do abate físico, o desmantelamento, o abandono ou a inutilização e o total do valor líquido fiscal dos mesmos.

F- Ora, o regime previsto no artigo 38.º, n.º 3, do CIRC obriga à apresentação de uma comunicação ao serviço de finanças onde se encontram os bens, do local da data e da hora do abate físico, o desmantelamento, o abandono ou a inutilização e o total do valor líquido fiscal dos mesmos, sendo que os requisitos elencados na referida norma são cumulativos.

G- Tal conclusão resulta, aliás, da redação do preceito em causa, a qual refere que o auto comprovativo do abate, desmantelamento, abandono ou inutilização – referido na alínea a) – deve ser acompanhado de relação discriminativa dos elementos em causa – referida na alínea b) – devendo, ainda, haver comunicação ao serviço de finanças – conforme expressa a alínea c) da referida norma legal.

H- Neste sentido, veja-se, ainda, que o n.º 4 do normativo em causa refere que as condições previstas nas alíneas a) a c) do n.º 3 devem cumulativamente verificar-se na situação prevista no n.º 2 da referida norma.

I- Ou seja, é notório, assim, a necessidade de verificação cumulativa das condições previstas no n.º 3 do artigo 38º do CIRC.

J- Mais, da leitura do artigo 38º do CIRC dúvidas também não existem que resulta inequivocamente a possibilidade das desvalorizações excecionais serem aceites como gastos do período.

K- Ora, a necessidade de efetivação da comunicação ao serviço de finanças da área do local onde os bens se encontram, com a antecedência mínima de 15 dias, do local, data e hora do abate físico, do desmantelamento, do abandono ou da inutilização e o total do valor líquido fiscal dos mesmos, constitui, no entender da Fazenda Pública, condição sine qua non para a consideração de determinada desvalorização excecional como gasto do período.

L- Porquanto, são essas condições formais que, devem constar do processo de documentação fiscal – n.º 6 do artigo 38º do CIRC – que possibilitam a sua aceitação como gasto do período.

M- Posto isto, e tendo sido dado como provado que não ocorreu qualquer comunicação ao serviço de finanças da área do local onde os bens se encontram, a questão que se coloca é da de saber se, ainda assim, poderia ou não a desvalorização excecional contabilizada pela impugnante ser considerada fiscalmente aceite como gasto.

N- Salvo o devido respeito por melhor entendimento, a Fazenda Pública entende que não estavam reunidos todos os pressupostos legalmente exigidos para que a desvalorização excecional no valor de € 232.326,75, registado como gasto na conta 6873 – abates, fosse fiscalmente aceite como gasto.

O- No entanto, tendo a douta sentença decidido de forma diferente, incorreu em errada interpretação e aplicação da lei.

P- Desde logo porque, ainda que tendo a douta decisão considerado que os requisitos previstos no n.º 3 do artigo 38º do CIRC têm natureza cumulativa, entendeu fazer uma interpretação restritiva e, consequentemente, considerar que o requisito previsto na alínea c) da referida norma não implica automaticamente a desconsideração do gasto.

Q- Ora, salvo o devido respeito por diferente opinião, não concorda a Fazenda Pública com tal entendimento.

R- Porquanto, sendo a comunicação um dos requisitos legalmente exigidos, apenas a verificação cumulativa de todos os requisitos permitiria a consideração da desvalorização excecional como custo fiscal.

S- Mais, quer se trate ou não de uma questão de prova, o legislador considerou, atenta a excecionalidade do custo, ser necessário a verificação cumulativa de vários requisitos.

T- Acresce que, não teria sido por mero acaso que o legislador foi particularmente exigente ao instituir as condições necessárias para que determinados gastos sejam aceites fiscalmente.

U- É que, ao contrário dos gastos resultantes da atividade normal de uma sociedade, os gastos que a impugnante quer ver aceites fiscalmente resultam de desvalorizações excecionais, provenientes de causas anormais, designadamente, desastres, fenómenos naturais, inovações técnicas excecionalmente rápidas ou alterações significativas, com efeito adverso.

V- Ou seja, atenta a excecionalidade dos gastos, o legislador determinou um enquadramento legal (artigo 38º do CIRC) mais exigente, sendo que, só com a verificação cumulativa de todos os requisitos é que o gasto poderá ser aceite fiscalmente.

W- Assim, não tendo ocorrido a comunicação, da qual dependia, nos termos da lei, a aceitação da desvalorização excecional como custo fiscal, andou bem a AT ao ter desconsiderado o referido gasto.

X- Destarte, a atuação da Administração Tributária foi conforme à lei, não se verificando o vício que é imputado ao ato tributário, sendo que este por ser legal, deverá manter-se.

Y- Tendo na douta sentença ora recorrida se decidido de forma diversa é inevitável que se conclua que foi violado o disposto no art. 38º nº3 do CIRC em vigor à data dos factos.

Z- Nestes termos, deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por douto Acórdão que considere a impugnação improcedente.».

Pediu fosse concedido provimento ao recurso.

A Recorrida apresentou contra-alegações e formulou as seguintes conclusões:

1 - A impugnação da recorrida tem por objeto a liquidação adicional de imposto sobre o Rendimento das pessoas coletivas n.º ...15 relativa ao ano de 2011.

2 - A questão do presente recurso prende-se com uma questão de direito, mais propriamente com a interpretação do artigo 38 n.º3 do CIRC.

3 - Discorda por completo a Autoridade Tributária em sede de recurso com a sentença proferida pela meritíssima juiz “a quo”, na sequência da interpretação restritiva efetuada ao artigo 38 n.º 3 do CIRC.

4 - Entendeu a Meritíssima Juiz e bem, que a falta de cumprimento da obrigação de comunicação referida na Alínea C), do n.º 3 do artigo 38.º do Código do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, por si só não implicava uma desconsideração do gasto, como pretendia a recorrente operar.

5 - A correção da recorrente/apelante fundamenta-se apenas na não consideração de desvalorizações excecionais provenientes de abates de valores registados nas contas de edifícios e outras construções e respetivas depreciações, por falta de cumprimento da obrigação de comunicação referida na Alínea C), do n.º 3 do artigo 38.º do Código do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, referindo que este artigo é uma condição sine qua non na determinação da desvalorização excecional como gasto do período e que os seus requisitos são cumulativos.

6 - Por sua vez a recorrida sempre discordou da posição da Autoridade tributária entendendo que o incumprimento da formalidade de comunicação (artigo 38.º n.º 3 C)) invocada pela apelante/recorrente não justifica a redução dos prejuízos dedutíveis ao resultado fiscal do ano de 2011 e consequentemente, as correções aritméticas efetuadas e que estiveram na...

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