Acórdão nº 065/23.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28-09-2023

Data de Julgamento28 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão065/23.7BALSB
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
Processo n.º 65/23.7BALSB (Recurso para Uniformização de Jurisprudência)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

“A..., S.A.”, devidamente identificada nos autos, inconformada com a decisão proferida nos autos de processo arbitral - Proc. nº 41/2022-T - que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral pela mesma deduzido tendo em vista a declaração de ilegalidade de actos de determinação da matéria colectável, em IRC, reportados ao exercício de 2017, sendo que tais correcções meramente aritméticas na origem do acto em crise resultaram de acção inspectiva da Administração Tributária e Aduaneira - credenciada pela Ordem de Serviço n.º ...25, incidente sobre o exercício de 2017 - e totalizam, no que ora se coloca em crise, um valor de € 1.344.804,59, veio interpor Recurso para Uniformização de Jurisprudência ao abrigo do disposto nos artigos 25º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) e no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável ex vi do artigo 25.º, n.º 3 do RJAT, com base em oposição de acórdãos, apontando como decisão fundamento, a decisão Arbitral proferida no Proc. nº 282/2021-T.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

(a) O presente recurso, interposto ao abrigo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 25.º do RJAT, com fundamento na oposição entre decisões arbitrais, a que se aplica o regime do recurso para uniformização de jurisprudência constante do CPTA (cf. o artigo 152.º), tem por objecto a decisão arbitral em matéria tributária proferida no âmbito do processo n.º 41/2022-T, em que o Tribunal Arbitral julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela ora Recorrente, deduzido com vista a ver anuladas correções em sede de IRC, levadas a cabo na sequência de ação inspetiva realizada com referência ao período de tributação de 2017;

(b) A referida decisão arbitral colide frontalmente com anterior decisão, também arbitral, proferida no processo n.º 282/2021-T, estando inquinada de ilegalidade do ponto de vista material, por consubstanciar uma errada interpretação e aplicação do disposto na alínea r) do n.º 1 do artigo 23.º-A do Código do IRC à realidade factual subjacente, a qual foi, note-se, também erroneamente apreendida pelo Tribunal Arbitral no âmbito do acórdão impugnado;

(c) A contradição verificada entre as decisões arbitrais em confronto verifica-se quanto à mesma questão fundamental de direito, mormente a interpretação e aplicação à factualidade relevante (que, de resto, é idêntica em ambas as situações escrutinadas) do disposto na alínea r) do n.º 1 do artigo 23.º-A do Código do IRC, mormente a respeito da efectiva realização das operações levadas a cabo pela Recorrente, na senda da qual a mesma deduziu correspondentes despesas, bem como a respeito da (a)normalidade dos pagamentos realizados e caráter exagerado (ou não) do respetivo montante;

(d) Além de o sujeito passivo ser o mesmo nas decisões arbitrais em confronto, também as operações escrutinadas e os montantes nesse âmbito deduzidos são idênticos, apenas diferindo (sem relevância) o período de tributação a que se referem, sem que tal permita pôr em causa a verificação da relevante identidade factual e jurídica exigida para admissão do expediente de recurso ora desencadeado;

(e) A decisão arbitral impugnada decidiu contra a pretensão da Recorrente, bem como contra o entendimento perfilhado na decisão arbitral fundamento, assim recusando, em contextos manifestamente idênticos (e, em parte, justapostos), a dedutibilidade de gastos oriundos de operações idênticas: a prestação de serviços de promoção, intermediação e angariação de clientes ao nível da celebração de contratos imobiliários relativos à comercialização de unidades de negócio sitas nos empreendimentos turísticos do B... Resort, com o consequente pagamento de fees de promoção e marketing, se concretizados os negócios prospetados, quando na mencionada decisão arbitral fundamento o Tribunal Arbitral constituído havia, perante prova (documental e testemunhal) idêntica, alcançado conclusão diferente, desde logo, a respeito da efetiva realização das operações (mas também quanto à (a) normalidade da realização dos pagamentos e exagero dos montantes praticados);

(f) Além de um evidente erro judiciário, localizado quer numa dimensão factual, quer na dimensão da aplicação do direito (i.e., da norma jurídica convocável no caso concreto), está-se perante uma transgressão inaceitável do princípio da segurança jurídica, com assento constitucional (cf. o artigo 2.º da CRP), na medida em que o Tribunal Arbitral constituído, no âmbito do acórdão impugnado, ignora frontalmente que a decisão arbitral proferida no processo n.º 282/2021-T adquiriu força (ou, em rigor, autoridade) de caso julgado - posição que já se antevia que pudesse suceder em face das afirmações proferidas pelo coletivo de árbitros designado no processo n.º 41/2022-T, em sede da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, no sentido de que aquele não enveredaria por um “seguidismo”, no sentido de antever e frisar a futura ignoração do teor da decisão arbitral ora indicada como decisão arbitral fundamento;

(g) No processo n.º 282/2021-T, no âmbito do qual foi proferida a decisão arbitral fundamento, as testemunhas inquiridas foram precisamente as mesmas que no processo (n.º 41/2022-T) no âmbito do qual foi proferida a decisão arbitral impugnada, tendo, nesta última, o Tribunal optado por desconsiderar a mesma, por considerar, infundadamente, que as testemunhas não eram isentas, e assim atribuindo à referida prova um desvalor inaceitável, quando, tal como assumido pelo Tribunal Arbitral que julgou o processo n.º 282/2021-T, tal prova se afigura (ou afigurou) essencial para comprovar, desde logo, a efetividade das operações levadas a cabo pela Recorrente e entidade angariadoras, além dos demais aspetos relevantes (normalidade do(s) pagamento(s) e exagero (ou não) dos montantes praticados);

(h) O Tribunal Arbitral está, no âmbito da decisão arbitral impugnada, a impor a determinação de exigências, ao nível da prova a produzir pela Recorrente, verdadeiramente desproporcionadas, particularmente em face da jurisprudência na matéria - em especial, daquela produzida em sede arbitral, onde se inclui a decisão arbitral fundamento;

(i) Não só a globalidade da jurisprudência lavrada no âmbito de processos em que se discute a mesma problemática sob escrutínio nestes autos conclui, maioritariamente e ao contrário da posição assumida pelo acórdão impugnado, pela desproporcionalidade da prova usualmente exigida pela Autoridade Tributária (entendimento adotado também pelo Tribunal Arbitral no acórdão fundamento) no que respeita à efetiva prestação dos serviços em crise, como no acórdão fundamento, em que estavam parcialmente em causa as mesmas entidades (sendo uma delas, precisamente, a C...) e foram exigidos elementos de prova que, com toda a probabilidade, estariam apenas e só na posse da própria entidade angariadora, o Tribunal Arbitral concluiu pela desproporcionalidade e injustificação de tais exigências;

(j) No caso da D... está em causa uma transacção global, indiciadora da continuidade subjacente às operações praticadas, não podendo admitir-se que, na ordem jurídica, subsistam decisões que plasmem entendimentos contrários perante uma idêntica realidade, que, reitere-se, se justapõe;

(k) No caso da E... Ltd. está-se perante o erro judiciário clamoroso de aplicação do regime de inversão do ónus da prova a que alude a alínea r) do n.º 1 do artigo 23.º-A do Código do IRC a uma entidade que é sedeada num país que não consta da lista que consta da Portaria n.º 292/2011, de 8 de novembro;

(l) Também não pode ignorar-se que no âmbito da decisão arbitral impugnada há que atender-se à autoridade de caso julgado que passou a revestir a decisão arbitral fundamento, no contexto de uma mesma transação (contínua, como esclarecido), assim surgindo limitada a liberdade que assiste ao Tribunal no contexto da apreciação das provas carreadas para o processo, nos termos do CPC;

(m) A decisão arbitral fundamento passa assim a revestir força vinculativa fora do processo, em virtude do disposto nos artigos 619.º e 621.º do CPC, aplicáveis ex vi do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT (portanto, em sede arbitral, o que foi ignorado pelo Tribunal em sede da decisão arbitral impugnada), mas também por força do disposto na alínea e) do artigo 2.º do CPPT;

(n) A solução a dar ao processo n.º 41/2022-T teria de ser idêntica àquela plasmada na decisão arbitral fundamento, proferida no processo arbitral n.º 282/2021-T, em respeito pelo disposto no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil, no n.º 1 do artigo 6.º da CEDH, no artigo 8.º da CRP e, bem assim, do n.º 4 do artigo 20.º da CRP;

(o) Perante todo o exposto, deve este Supremo Tribunal revogar tal decisão e substituí-la por outra, nos termos legalmente devidos, na medida em que, in casu, é forçoso concluir que as operações levadas a cabo, correspondentes aos custos deduzidos, foram efectivamente realizadas, além de os pagamentos não revestirem caráter anormal, nem os montantes envolvidos serem exagerados, nos termos propugnados pelo Tribunal Arbitral no âmbito do acórdão fundamento, tudo com as legais consequências.

Nestes termos, e nos mais de direito que Vossas Excelências suprirão, deverá o presente recurso ser dado como procedente, por provado, e em consequência ser revogada a decisão recorrida, por ilegal, e substituída por outra que determine a ilegalidade da decisão perfilhada pelo Tribunal Arbitral no âmbito do processo n.º 41/2022-T e a sua consequente anulação, dando-se provimento ao peticionado pela ora Recorrente, uniformizando-se a Jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo no sentido...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT