Acórdão nº 0631/13.9BELRS 0934/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10-04-2024

Data de Julgamento10 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão0631/13.9BELRS 0934/15
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório –

1 – A..., SA., com os sinais dos autos, vem, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 30 de março de 2023 que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que, com fundamento na existência de casos julgados contraditórios, indeferiu a pretensão executiva.

A recorrente conclui a sua alegação de recurso nos seguintes termos:

1.ª Entende o Recorrente que estão verificados os requisitos de que depende a admissão do presente recurso de revista;

2.ª Em face do decidido em segundo grau de jurisdição, considera o Recorrente verificar-se violação grosseira de lei processual e de lei substantiva na interpretação dos artigos 625.º do CPC e 163.º e 175.º do CPTA, bem como dos artigos 79.º, n.º 1, da LGT e 44.º, n.º 1, alínea d), do CPPT, conjugados com os artigos 138.º a 146.º do CPA, na redação à data, o que justifica a interposição do presente recurso de revista nos termos do artigo 150.º do CPTA, colocando-se as seguintes questões:

 no âmbito de uma ação de execução de julgados, referente a questões tributárias e regulada pelo CPTA, admite-se a aplicação do disposto no artigo 625.º do CPC?

 admitindo-se a aplicação do disposto no artigo 625.º do CPC qual a amplitude do conceito “pretensão”? Deve entender-se que dois atos tributários, emitidos sequencialmente pela administração tributária e com números de identificação distintos podem ter subjacente a mesma “pretensão”, ainda para mais quando existem duas decisões judiciais que trataram aqueles atos de forma autónoma, tendo considerado que o segundo revogou o primeiro?

 numa situação como a do Recorrente, em que existe uma sucessão de atos tributários, o segundo ato é autónomo do primeiro, substituindo-o e ao qual deve ser concedido o regime jurídico da revogação de atos administrativos, como entende o Recorrente e como entendeu o Tribunal no processo principal, ou, como entenderam os Tribunais em sede de execução de julgados, o segundo ato não substitui o primeiro, que se mantém na ordem jurídica?

3.ª Resulta evidente a necessidade de intervenção do Supremo Tribunal Administrativo no caso em apreço, impondo-se a revista para uma melhor aplicação do Direito e por se tratar de uma questão de importância jurídica e social fundamental;

4.ª No caso sub judice, a necessidade da revista para uma melhor aplicação do Direito assenta, desde logo, no facto de estar em causa uma decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo Sul que manteve a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que indeferiu a execução de julgados no âmbito da qual se peticionou o reembolso do imposto indevidamente pago no valor de € 480.497,96, referente ao IRC de 1990, acrescido dos respetivos juros indemnizatórios e de mora, em que os Tribunais, com o devido respeito, interpretaram de modo incorreto os artigos 625.º do CPC e 163.º e 175.º do CPTA, bem como dos artigos 79.º, n.º 1, da LGT e 44.º, n.º 1, alínea d), do CPPT, conjugados com os artigo 138.º a 146.º do CPA, na redação, em função da situação concretamente determinada;

5.ª Não está em causa um simples erro de julgamento, mas um erro manifestamente ostensivo e grosseiro, aqui consubstanciado no facto de o Tribunal considerar aplicável o disposto no artigo 625.º do CPC em detrimento dos artigos 163.º e 175.º do CPTA e ainda no facto de o Tribunal não considerar aplicável o regime legal da revogação de atos administrativos, previsto nos artigos 79.º, n.º 1, da LGT, 44.º, n.º 1, alínea d), do CPPT, e 138.º a 146.º, do CPA;

6.ª É claramente necessária a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo para evitar que está má interpretação das normas jurídicas referidas se consolide na ordem jurídica e que seja aplicável em todas as situações similares, criando uma disparidade de tratamento entre contribuintes;

7.ª No que se refere à relevância jurídica fundamental, que se manifesta, por um lado, na complexidade das operações jurídicas indispensáveis à resolução do caso e, por outro lado, na capacidade de expansão da controvérsia, impõe-se ao Tribunal a interpretação de um conjunto de preceitos, recorrendo aos vários elementos interpretativos das normas;

8.ª Não se trata de uma mera operação de interpretação de determinada norma jurídica, mas de uma interpretação integrada que, até à data e com o devido respeito, os tribunais superiores não efetuaram de forma completa e consistente;

9.ª Atendendo aos conceitos em presença e às disposições normativas aplicáveis, é inequívoco para o Recorrente a existência de uma complexidade jurídica superior à comum que justifica a admissão do presente recurso de revista;

10.ª Para além disso, saliente-se que não vigora até esta data uma corrente uniforme de jurisprudência proferida pelos tribunais superiores quanto a esta questão;

11.ª Atendendo a que a questão em apreço tem passado e é suscetível de passar pela jurisprudência dos tribunais superiores, entende o Recorrente que é evidente a possibilidade de repetição da questão em casos futuros, em termos de expansão da controvérsia;

12.ª A decisão sobre a questão não é meramente teórica e tem inerentes efeitos práticos, com claro reflexo para o contribuinte;

13.ª Estando em causa a interpretação de normas que poderão ter como efeito a não consideração de uma decisão judicial, o entendimento acolhido irá inquestionavelmente bulir com o património dos contribuintes, na medida em que se permite ou não a restituição de valores tal como determinado por uma decisão judicial proferida relativamente a um ato tributário que considerou vigente e autónomo;

14.ª A firmar-se o entendimento do Tribunal Central Administrativo Sul:

i) o Recorrente verá o seu património afetado uma vez que não lhe será restituído o montante de € 480.497,96, acrescido dos respetivos juros, em anulação da liquidação, conforme determinado pelo Tribunal Tributário de Lisboa na sentença proferida em 29.06.2012, no âmbito do processo n.º 102/01.3.1, e

ii) manter-se-á na ordem jurídica um ato tributário ilegal, contrariamente a uma decisão judicial;

15.ª Atendendo a que esta é uma questão que não se encontra resolvida na jurisprudência considera o Recorrente que o risco de persistirem e ocorrerem diversas situações deste tipo é bastante elevado;

16.ª É por forma a evitar esta situação com relevante impacto ao nível da situação tributária dos contribuintes que se impõe a revista;

17.ª A questão interpretativa coloca-se, assim, numa abundância de situações e ao longo dos tempos, com referência a diversos contribuintes, pelo que se afigura inequívoca também a relevância social de importância fundamental (cf. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21.11.2014, proferido no processo n.º 141/14-30);

18.ª Considera o Recorrente que a interpretação proferida nos presentes autos, em clara violação da lei, por perfilhar aceção contrária ao próprio espírito do legislador tributário, é suscetível de se aplicar em numerosos novos litígios administrativos e judiciais, e inclusivamente originá-los, gerando uma avultada incerteza e instabilidade e fazendo antever como objetivamente útil a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo;

19.ª Estão, assim, preenchidos os requisitos necessários à admissibilidade do recurso previsto no artigo 285.º do CPPT (anterior artigo 150.º do CPTA);

20.ª Salvo o devido respeito, entende o Recorrente que o douto acórdão recorrido decidiu em violação grosseira do disposto nos artigos 163.º e 175.º do CPTA;

21.ª Prevendo o CPTA específicas causas legítimas de inexecução, não existe caso omisso que justifique o recurso ao CPC e, por conseguinte, não há que proceder à convocação das suas normas, nomeadamente do artigo 625.º do CPC;

22.ª O artigo 1.º do CPTA deve interpretar-se, pois, no sentido de somente permitir a aplicação das normas processuais civis nas situações em que as normas processuais administrativas se afiguram insuficientes, ou seja, o recurso ao disposto no CPC pressupõe uma prévia demonstração de que o CPTA e o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais não se revelam bastantes para dirimir o litígio em causa;

23.ª No CPTA o legislador do processo nos tribunais administrativos previu especificamente as causas legítimas de inexecução (cf. artigos 163.º e 175.º, do CPTA), pelo que apenas se poderá invocar como fundamento para a não execução de julgados administrativos duas causas, a saber (i) a impossibilidade absoluta da execução e/ou (ii) o grave prejuízo para o interesse público;

24.ª Resulta evidente que encontrando-se previstas causas legítimas de inexecução no CPTA, as quais não se encontram preenchidas no caso em apreço, não será concebível o recurso aos fundamentos de oposição previstos no CPC, pelo que não subsistem, em situações como a sub judice, fundamentos atendíveis que viabilizem a inexecução da sentença proferida no processo n.º 102/01.3.1;

25.ª Caso assim não se entenda, invoca-se, desde já para os devidos efeitos, a violação do princípio da confiança e da tutela das expectativas, decorrente do artigo 2.º da CRP, na interpretação segundo a qual o artigo 625.º do CPC é aplicável numa ação de execução de julgados em matéria tributária, regulada pelo CPTA, em que a sentença que constitui título executivo não considerou verificada a exceção do caso julgado;

26.ª Sem prejuízo do exposto, e mesmo admitindo-se que se reputa aplicável no caso vertente o CPC, o que apenas por dever de patrocínio se concebe, sem conceder, sempre se dirá, ainda assim, que aquele alegado caso julgado contraditório não constitui facto suscetível de conduzir à inexecução da sentença, porquanto, numa interpretação conjugada das diversas...

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