Acórdão nº 060/22.3BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2022-06-09

Ano2022
Número Acordão060/22.3BALSB
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (1 SECÇÃO)
1. A............, Magistrada do Ministério Público efetiva no TAC de ...... vem requerer a suspensão de eficácia da Deliberação do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) proferida em 9.02.2022, que indeferindo a sua reclamação das Deliberações da Secção Disciplinar do CSMP de 7.7.2021 e de 10.11.2021, manteve a decisão de lhe aplicar a sanção de suspensão de exercício de funções em 120 dias, requerendo ainda o decretamento provisório da mesma, invocando, para tal, o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 112.º, do n.º 1 in fine do artigo 113.º, da alínea a) do n.º 1 do artigo 114.º, dos artigos 120.º e 131.º, todos do CPTA.
2. Para tanto alega que na sequência de um processo disciplinar que lhe foi instaurado, em 10.11.2021 foi proferida decisão a aplicar-lhe a pena única de 120 (cento e vinte) dias de suspensão do exercício de funções, por violação dos deveres de zelo, prossecução do interesse público, de urbanidade e dos princípios gerais decorrentes do EMP.

E que, após reclamação para o Plenário do CSMP, este deliberou, em 9.2.2022, manter a decisão da Secção Disciplinar à qual imputa diversas ilegalidades sendo que a pendência do processo disciplinar acarretou a suspensão da sua promoção a Procuradora-Geral Adjunta, impossibilitando-a de tomar posse em 3.9.2021, com consequências profissionais, pessoais, sociais e económicas irreparáveis, o que implica o preenchimento dos requisitos previstos nos art.s 120º, nº 1 e 129º do CPTA.

3. Foi proferido despacho liminar a indeferir o decretamento provisório de suspensão de eficácia do ato punitivo em causa.

4. O CSMP opôs-se ao decretamento da providência requerida, juntou resolução fundamentada e conclui pela falta de preenchimento dos pressupostos da suspensão de eficácia.

5. A requerente respondeu à resolução fundamentada invocando que é a requerida que tem a obrigação de demonstrar que o deferimento da execução dos atos é gravemente prejudicial para o interesse público, o que não aconteceu já que não se mostra de que forma seria prejudicado o interesse público.

Na verdade, o alegado o prestígio da justiça e do Ministério Público não se coloca já que está em causa um problema inerente à distribuição de processos que constitui facto público e notório, sendo do conhecimento generalizado dos cidadãos, conforme evidenciam as notícias que vêm sendo veiculadas na comunicação social.

Conclui que seria gravemente prejudicial para o interesse público a continuação da produção de efeitos de uma deliberação ilegal do que a suspensão dos efeitos desta até à decisão final.

6. A requerente apresentou pedido de declaração de ineficácia dos atos de execução.

7. Sem vistos, dada a natureza urgente do processo (art. 36º, nºs 1, al. f) e 2 CPTA).


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II. Fundamentação

- Matéria de facto

Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão, tendo em atenção a prova documental produzida e as alegações das partes:

1- A Requerente é Magistrada do Ministério Público desde 1976, detendo a categoria de Procuradoria da República e completa 69 anos de idade em 02.05.2022 (RI, art.5 e 6 e Ac. Plenário CSMP 9.02.2022, 1º e 3º);

2- A Requerente exerceu funções na jurisdição comum em várias áreas (RI, art.7 e Ac. Plenário, 3º a 7º CSMP);

3- Em 2002 passou a desempenhar funções na jurisdição administrativa – TAC ......, TAF …… TAC ...... (RI, art.7 e Ac Plenário, 9º a 12º);

4- Foi classificada, tendo obtido, entre outras, a classificação, em 1981, de Bom com Distinção e em 2014 foi classificada com Muito Bom no TAF de …… (RI, art.9 e Ac Plenário, 15º e 17º);

5- Na sequência do processo disciplinar que lhe fora instaurado, a Secção Disciplinar do CSMP, por acórdão de 2.6.2020, aplicou à Requerente a pena única de 120 dias de suspensão de exercício, pela violação de deveres de zelo, prossecução do interesse público, lealdade e correção (Ac. Plenário CSMP 6.10.2020_Doc1PI);

6- Inconformada, a Requerente reclamou para o Plenário da mesma Secção, solicitando então a nulidade do processo disciplinar por indevida conversão do inquérito em processo disciplinar e violação dos direitos de audição e defesa e do acórdão da secção de 2.6.2020, e subsidiariamente, que fosse declarada a omissão de notificação do resultado das diligências de prova requeridas pela defesa, por si reputadas como essenciais para a descoberta da verdade material, o que consubstanciaria nulidade insuprível. (Acórdão Plenário 6.10.2020 – Doc1PI);

7- O Plenário da Secção Disciplinar do CSMP, por acórdão de 6.10.2020, considerou verificar-se “uma insuficiência do Inquérito por falta de audiência e defesa da magistrada arguida e a omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade. Consequentemente, o acórdão recorrido é nulo, ficando prejudicada a decisão sobre a parte restante da reclamação”, deliberando atender essa reclamação, anulando o acórdão da Secção Disciplinar, de 2.6.2020, que tinha aplicado a pena disciplinar única de 120 dias de suspensão de exercício, mais decidindo «determinar a remessa dos autos à instrução para suprir os vícios assinalados, completando a base instrutória e retomando os termos processuais» (RI, art. 42, Doc1 e Oposição 1º, 26º);

8- Uma vez efetuada a instrução do processo, em cumprimento dessa Deliberação, veio o Senhor Vice-Procurador-Geral da República, por despacho de 19.1.2021, converter o inquérito em processo disciplinar, passando aquele inquérito a constituir a parte instrutória do mesmo (RI Doc.2);

9- Foi deduzida acusação em 26.4.2021, tendo a Requerente, em 2.6.2021 apresentado a sua defesa, requerido produção de prova e arguido novamente a nulidade insuprível do procedimento disciplinar por violação do direito de audiência e de defesa e ainda, por indevida conversão do inquérito em processo disciplinar (RI art.50 e Oposição 2º);

10- A Secção Disciplinar do Conselho Superior do Ministério Público, por Acórdão de 7 de julho de 2021, deliberou inexistir nulidade dos presentes autos de procedimento disciplinar (Oposição 4º e RI art.52);

11- A mesma Secção proferiu o acórdão de 10.11.2021, deliberando aplicar à Requerente a pena única de 120 dias de suspensão do exercício de funções, por violação dos deveres de zelo, prossecução do interesse público, de urbanidade e dos princípios gerais decorrentes do EMP junto aos autos de onde se extrai:

“ (...) 81. Em Requerimento de 14.02.2019, remetido à Coordenação do TAC......, c. c. à Coordenação do TCA ......, tendo como assunto «redistribuição PC formação de contrato nº 45/09.5BE...... - 2a UO», a magistrado visada, para além do mais, que se dá por reproduzido, escreveu o seguinte: «Reclamação (MAIS UMA, a acrescentar a dezenas feitas!!) (...) A identificação do MºPº nas capas de Procs, feita pela UO, 'é-o após indicação da UA do MºPº, designadamente pela V/"protegida" Funcionário B…………, (encargo dado, pela coordenação). Ao dizer protegida sabe do que falo! Como sabe, a colega C………… quando vem ao TAC......, passa grande parte do tempo, na UA do MºPº. Digne-se A - Informar, a que título foi indicada à UO, a titularidade de D............, para depois reverter (como habitual) A............ (letra E) (...) Bem os comportamentos que se vêm enunciando, integram ilícitos, cuja natureza por ofício conhece, B - Corrigir, como cabe, a redistribuição, em regra, indicada pela V/ protegida Funcionário. (...) Ocorre perguntar: 1 - Por que indicação da sua titularidade (letra c) da própria C………… (F) e de demais colegas Delatores (sabe do que falo), raramente reveste fundamento para reclamação, relativamente a situações de indicação verbal da V/"protegida". Sabendo como sabemos a facilidade/leveza de substituição de capas neste TAC......, por mera cautela, foram extraídas fotocópias (em duplicado) de todas, ficando em nosso poder. 2 - Acha que, mediatamente, nos deve fazer passar o n/ tempo regulamentar, a fazer reclamações de distribuições de Procs, em detrimento dos serviços corretamente distribuídos'?? Seja célere! Também este processo espera. A sua coordenação dura há 10 anos. Tem cada vez menos serviço processual para despachar. Diligencie numa correta redistribuição - o que, salvo o devido respeito, não deveria ter descurado, em contextos sucessivamente relatados...», (cfr. fls. 883 a 885)

82. Por e-mails de 19.02.2019, às 15:47 e 20.02.2019, às 13:23, remetidos à Coordenação do TAC......, c. c. à Coordenação do TCA ......, que aqui se dão por reproduzidos, voltou a questionar aquela coordenação sobre o mapa de férias e lista de pareceres tendo no último, para além do mais, escrito o seguinte: «Situações desta natureza, têm dado lugar a "teatros", a que se seguem novas e novas delações, por parte dos PRs, cujo expediente é cumprido normalmente. - INFORME da repetida disparidade de cumprimento temporal, relativamente ao expediente letra E, por parte dos Funcionários, sob sua alçada. A sua não resposta e o atribuir culpas a outrem, não a exoneram de responder ao que é perguntado. Se não sabe, - por eventos passados, em tal não se crê, a documentar se necessário, - teria sido seu dever questionar os Funcionários, cumpridores tardios (letra E). Se não o fez, olhe as suposições são obvias e lícitas... Algo é certo. Enquanto não obtiver uma resposta inequívoca, não deixará de ser questionada, podendo, persistindo habituais evasivas, seguir-se outras vias», (cfr. fls. 833 a 835)

83. No dia 21.02.2019 dirigiu Requerimento à Coordenação do TAC......, c. c. à Coordenação do TCA ......, tendo como assunto «NÃO resposta a assuntos de e-mails (DIFERENÇA DE TRATAMENTO/despacho temporal DE EXPEDIENTE DA LETRA E, comparativamente com a sua letra C e dos demais PRs do TAC......», que aqui se dá por reproduzido, no qual, para além do mais, escreveu o seguinte: «-Insistentemente, continua a NÃO responder, a questões postas! É tão preferencial, que nenhuma das situações diferenciais foi respondida...! Há mais...

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