Acórdão nº 0521/19.1BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18-05-2022

Data de Julgamento18 Maio 2022
Ano2022
Número Acordão0521/19.1BEPRT
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


I – RELATÓRIO

I.1 Alegações
A REN-PORTGÁS – DISTRIBUIÇÃO, SA, melhor identificada nos autos, vem recorrer da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, exarada a fls. 1676 a 1700 do SITAF, que julgou improcedente a presente impugnação judicial, por ela deduzida contra o indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a autoliquidação de Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético (CESE) n.º 27000001542, referente ao ano 2015, no montante de € 3 754 356,50.
Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 1711 a 1800 do SITAF;
A) O Requerimento de interposição de recurso, acompanhado das respetivas Alegações, apresentado nesta data, é tempestivo.
B) O objeto do Recurso é constituído pela Sentença proferida nos autos de Impugnação Judicial n.º 521/19.1BEPRT, em 29 de março de 2021, no segmento decisório dedicado à apreciação do mérito da causa e à consequente condenação da RECORRENTE em custas, concordando-se com a Sentença recorrida na parte em que o Tribunal a quo determina a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
C) A RECORRENTE entende que a Sentença recorrida incorre em vício de erro de julgamento no que tange:
(i) à apreciação da natureza jurídica da CESE, e, bem assim, do juízo de preclusão quanto à apreciação da violação do princípio da capacidade contributiva, na vertente de igualdade material, e da violação do princípio da tributação das empresas pelo lucro real, preconizada pelas normas constantes do disposto no artigo 5º n.º 1, al. a) b) e o), n.º 2, n.º 3 e nº 4, no artigo 5.°, nº 1 e 2 e no artigo 12º, todas disposições do Regime Jurídico da CESE, e, bem assim, no artigo 23.°-A, n.º 1, aI. q), do Código do IRC (CIRC):
(ii) à apreciação da alegada violação do princípio da proporcionalidade e da igualdade na repartição dos encargos públicos, pelas normas contidas no artigo 2.°, al. a) a m) e no artigo 3º, nº 1, al. a), b) e o), n.º 2, n.º3 e nº 4, todas disposições do Regime jurídico da CESE:
(iii) à apreciação da alegada violação dos princípios da confiança, da segurança jurídica e da não retroatividade da lei fiscal materializada na previsão e estatuição das normas constantes do disposto no artigo 237º da Lei nº 82-B/2014, de 31 de dezembro, e no artigo 3º, n.º 5 do Regime da CESE e bem assim;
(iv) à apreciação da alegada violação do princípio e regra da especificação orçamental, que inquiria as normas contidas no n° 1, 6 e 7 do artigo 11°, da Regime jurídico da CESE no artigo 280.º da Lei 83-C/2013, de 31 de dezembro e, na mesma medida, o artigo 237.º da Lei nº 82-B/2014, de 31 de dezembro.
D) A Sentença recorrida remete a sua fundamentação para o Acórdão do STA de 8 de janeiro de 2020, proferido no âmbito do processo 0386/17.8BEMDL onde o STA e portanto, também o Tribunal a quo, entendeu que a CESE tem natureza de contribuição financeira e não de imposto, aderindo ao entendimento sufragado pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 7/2019, de 8 de janeiro.
E) A Recorrente não concorda com tal entendimento, desde logo porque a jurisprudência que sustenta a Sentença recorrida aprecia a conformidade constitucional de um ato de liquidação da CESE do ano 2014, o que tem largo impacto nos pressupostos daquela decisão, que se circunscrevem exclusivamente à factualidade verificada naquele período e não ao período em causa nos presentes autos: 2015.
F) A RECORRENTE insiste que a CESE se trata de um verdadeiro imposto, porque (1) se destina ao financiamento de fins gerais do Estado, e (ii) carece da bilateralidade característica das contribuições financeiras.
G) A CESE foi criada, não só como objetivo de garantir a sustentabilidade sistémica do sector energético, mas, também, com o objetivo de angariar receita para o cumprimento das metas traçadas no programa de assistência financeira, assim onerando, especialmente, o sector energético.
H) Esta segunda finalidade da CESE a da contribuição para a consolidação orçamenta], que parece ser ignorada pela jurisprudência invocada na Sentença recorrida, é a única finalidade a que tem sido, efetivamente alocada a receita da CESE ao longo destes sete anos, e retira à CESE o caráter bilateral cuja existência é defendida pelo Tribunal a quo.
I) Depois contrariamente ao pugnado pela Sentença recorrida, entende a RECORRENTE que os benefícios/custos presumidos advenientes do financiamento de mecanismos que promovam a sustentabilidade do setor energético, através da redução da dívida tarifária e da adoção de medidas de caráter social e ambiental do setor energético, não permitem isolar os sujeitos passivos de CESE dos demais contribuintes, mas, pelo contrário, permitem alargar o escopo de presumíveis beneficiários à generalidade dos contribuintes, já que traduz uma tarefa fundamental do Estado, cabendo no elenco do artigo 9º al. d), da CRP.
J) A RECORRENTE insiste que não existe, com efeito, nenhuma bilateralidade quando as finalidades que se pretendem alcançar beneficiam da mesma forma a generalidade dos contribuintes e não, em específico, um determinado grupo dentro destes.
K) O Tribunal a quo não logra clarificar, cabalmente que essas compensações são diferentes, distintas e especiais relativamente àquelas que resultarão para a generalidade dos contribuintes não sujeitos a CESE.
L) A finalidade de promoção da sustentabilidade do setor energético mantém, tanto uma “suficiente proximidade” (para utilizar a expressão exata da jurisprudência citada pelo Tribunal a quo) com a atividade do sujeito passivo, como com as acima identificadas tarefas fundamentais do Estado.
M) Largando a análise do carácter genérico ou particular dos pretensos benefícios que a CESE visa custear, a RECORRENTE logrou comprovar, por recurso a documentos e declarações oficiais, que a receita da CESE tem custeado fins gerais do Estado, não respeitando a consignação aos fins a que se destina.
N) Não pode, senão, concluir-se que a CESE não consubstancia, de modo algum, uma contribuição, especial ou financeira, porquanto não preenche os requisitos exigidos para que estejamos perante tal figura tributária.
O) Entende a RECORRENTE ter mal andado a Sentença recorrida ao reconduzir a CESE à figura da contribuição financeira, constituindo a mesma um verdadeiro imposto, e ao considerar precludida a análise dos argumentos que sustentavam a inconstitucionalidade das normas que a criaram e estabelecerem o Regime da CESE, como a violação do princípio da capacidade contributiva na vertente de igualdade material, ou a violação do princípio da tributação pelo lucro real.
P) Considerando que os autos dispõem de todos os elementos necessários à apreciação das questões cuja análise foi precludida uma vez que as mesmas se tratam de mera questão de Direito que não carece de qualquer instrução, requer-se ao Tribunal ad quem que, caso assim o entenda, faça uso da prerrogativa concedida pelo disposto no artigo 665º, nº 2, do CPC.
Q) Reitera a RECORRENTE que as normas contidas no artigo 3.º, n.º 1, al. a), b e e), n.º 2, nº 3 e nº 4, no artigo 5º, nº 1 e nº 2 e no artigo 12.º todas disposições do Regime jurídico da CESE, e bem assim, no artigo 23.°- A, nº 1, al. q) do CIRC, são inconstitucionais, porque violadoras do princípio da capacidade contributiva e da tributação pelo rendimento real, porquanto o legislador parte do pressuposto — errado — de que todos os ativos financeiros das entidades sujeitas a CESE constituem um critério apto a determinar a sua capacidade contributiva, sem consideração de qualquer custo associado à concreta atividade dos sujeitos passivos.
R) A RECORRENTE entende não ser verdade que os montantes arrecadados com a CESE tenham sido efetivamente canalizados para a criação de um património autónomo, não sendo também verdade que a RECORRENTE beneficia na exata proporção da e económica do grupo em que se enquadra.
S) O que é, sim, verdade é que a RECORRENTE contribui na medida do seu ativo, porém não logra alcançar de onde decorre que o seu presumível retorno será também ele na medida do seu ativo, já que tal não resulta de nenhum dispositivo legal, mas apenas do entendimento do Tribunal a quo.
T) A REQUERENTE, ao negar que as finalidades a que a CESE se propõe tenham uma relação, com os seus sujeitos passivos, especial o diferente da que tem com a universalidade dos contribuintes, imputando-se, assim, o seu custo apenas a um grupo determinado de contribuintes, entende, logicamente, e contrariamente ao pugnado na Sentença recorrida, que se encontra violado o princípio da igualdade material na repartição dos encargos públicos.
U) A Sentença recorrida mal andou ao julgar que as normas constantes do artigo 2.°, al. a) a m) não afrontam o princípio da igualdade na...

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