Acórdão nº 0498/21.3BECBR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23-03-2022
Data de Julgamento | 23 Março 2022 |
Ano | 2022 |
Número Acordão | 0498/21.3BECBR |
Órgão | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO
A…….. e B…….., devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datada de 14-01-2022, que julgou improcedente a pretensão deduzida no presente processo de RECLAMAÇÃO relacionado com o “despacho do Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Tábua que não reconheceu a prescrição das dívidas exequendas”.
Formularam nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
a) Antes de mais, importa deixar registado que os recorrentes aceitam a bondade dos juízos de facto expressos no probatório da sentença recorrida, declaração esta que, todavia, não inclui o reconhecimento da correcção da determinação judicial que foi efectuada em sede de direito, mas apenas que, sempre que a mesma existiu, ela corresponde àquela que aí está transcrita (sendo esse teor escrito um facto);
b) O que os recorrentes não aceitam é que se verifique a excepção de caso julgado, sustentada pela sentença, por referência aos elementos da acção de reclamação suportada no art.º 276.º do CPPT, que está agora em causa, por referência às sentenças proferidas, nos processos de reclamação n.ºs 168/16.4BECBR, transitada em julgado em 26 de Maio de 2016, e 559/16.0BECBR, transitada em julgado em 28 de Novembro de 2016, a que aludem, respectivamente, os pontos 27 e 37 do probatório, e que a dívida exequenda não deva considerar-se prescrita à face do direito aplicável, nos termos que se defenderão, e dos factos fixados no probatório;
c) Aceitamos que, conquanto se trate de dívidas liquidadas na vigência do CPT, o prazo de prescrição das obrigações tributárias exequendas, a que aludem os pontos 1), 3) e 4) do probatório está sujeito à regra constante do art.º 48.º, n.º 1 da LGT, por mor do disposto no Decreto-lei n.º 472/99, de 8 de Novembro, entrado em vigor em 13 de novembro de 1999, e tendo em conta o disposto nos art.ºs 3.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro (que aprovou a Lei Geral Tributária), sendo de 8 anos;
d) Do que discordamos inteiramente - sendo a posição assumida na sentença recorrida e nas referidas sentenças anteriores, a que aludem os pontos 27) e 37) do probatório, cuja doutrina aquela recupera, produto de uma atitude pura de imobilismo intelectual judicativo de reponderação da respectiva matéria de direito relativa à prescrição perante as regras introduzidas no art.º 49.º da LGT por parte da Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 (revogação do seu n.º 2 e aditamento e alteração dos n.ºs 2 e 3) - é do entendimento que foi sufragado na decisão recorrida, de que a interrupção da prescrição prevista no art.º 49.º, n.º 1 da LGT continua a ter um efeito próprio instantâneo, anulando todo o prazo decorrido desde a data da notificação da liquidação dos impostos até ao facto interruptivo previsto no art.º 49.º, n.º 1 da LGT, na versão saída do Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de Novembro (entrado em vigor em 13 de Novembro), e, concomitantemente, também, um efeito próprio duradouro que perdura por todo o tempo em que esteja pendente o processo em que ela se tenha produzido;
e) No caso de dívidas tributárias, a previsão da prescrição não se fundamenta, ao contrário do afirmado na sentença recorrida, em qualquer fundamento de punição de extinção da obrigação de pagamento, a aplicar ao credor pela sua inação ou negligência na execução das dívidas, dado o dever de procedimento ou de execução coerciva ter natureza institucional e não ser disponível, ao contrário do que se passa nas dívidas privadas, em que, de facto o fundamento da prescrição se baseia, axiologicamente, nesse desinteresse do credor, mas nos princípios da dignidade humana consagrado no art.º 1.º da CRP e da certeza e da segurança jurídicas ínsitos no princípio do Estado de Direito material, reconhecido entre nós no art.º 2.º da mesma Constituição da República Portuguesa;
f) A sentença recorrida considerou, também, que as dívidas exequendas não estavam prescritas por a prescrição se haver interrompido, por duas vias sucessivas, ambas previstas no art.º 49.º, n.º 1 da LGT: por um lado, pela apresentação da impugnação judicial deduzida pelos ora recorrentes em 11 de Maio de 2006 (cf. ponto 2 do probatório) e, por outro, pela citação dos reclamantes para o processo de execução em 7 de Junho de 2006 (cf. pontos 5 e 37 do probatório, este recuperado pela decisão recorrida) e tal implicar a inutilização de todo o prazo já decorrido desde a data do início do prazo determinado segundo o disposto no art.º 48.º, n.º 1 da LGT, bem como a manutenção de um efeito interruptivo duradouro até ao termo desses processos, pelo que, conquanto houvesse terminado o processo de impugnação judicial com o trânsito em julgado, em 28/09/2015 do Acórdão do STA que lhe pôs termo (julgando-a improcedente), não havia, todavia, ainda cessado (independentemente de ainda, nem sequer, se ter completado o prazo de 8 anos quando considerada a interrupção apenas em função da impugnação judicial - juízo implícito na sentença), o mesmo efeito interruptivo duradouro da prescrição se mantinha em vigor quando referido à para o processo de execução, pois que este ainda não havia terminado, e donde não poder sequer computar-se qualquer tempo do prazo, para efeitos de prescrição com base neste fundamento;
g) Salvo o muito e devido respeito pela construção normativa acolhida na sentença, entendemos que a mesma se apoia nas reflexões do Conselheiro Jorge de Sousa tecidas na sua obra Sobre a prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Lisboa, Áreas Editora, 2.ª edição, 2010) e em certa jurisprudência que a acolheu, acriticamente, como o Ac. do STA de 23 de Abril de 2013, no Proc. n.º 431/13, estendendo o sentido normativo dos efeitos próprios do instituto da interrupção previstos na lei civil (art.ºs 326.º e 327.º, n.ºs 1 3 do Código Civil-CC).
h) Ao contrário do pressuposto neste entendimento, a inutilização de todo o tempo decorrido anteriormente até ao acto interruptivo previsto na lei, dito de efeito instantâneo, para efeitos de prescrição, não é uma vassoura que esteja a varrer sempre todo o decurso do tempo que decorre posteriormente para efeitos de prescrição;
i) Na verdade, o efeito normal e próprio da interrupção, previsto no art.º 326.º, n.º 1 do CC - disposição que é aplicável complementarmente às relações jurídico-tributárias, por mor do disposto no art.º 2.º, alínea d) da LGT - é a inutilização do tempo já decorrido anteriormente do prazo de prescrição previsto na lei: o que se designa por efeito duradouro não é um efeito próprio imediato do acto interruptivo, mas antes um efeito jurídico específico que a lei associa a certos modos ou factos através dos quais essa interrupção se verificou, em razão da força demandatória e demonstrativa da vontade do credor de exigir o cumprimento da obrigação consubstanciada na suspensão do prazo de prescrição.
j) Trata-se, assim, de um efeito específico e excepcional que só acontece relativamente aos factos que a lei menciona como importando esse efeito, sendo que este efeito se traduz apenas em o novo prazo não começar a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo, no qual se encontra traduzida legalmente aquela vontade do credor de exigir o cumprimento do devido. É o que resulta com insofismável clareza do disposto nos art.º 326.º, n.º 1 e 327.º, n.ºs 1 e 3 do CC, aplicáveis complementarmente às relações jurídico-tributárias;
k) Acentue-se, no entanto, que, a menos que se admita, neste domínio do direito, a legitimidade da fraude à lei, a interrupção apenas pode verificar-se uma vez por força da ocorrência do acto ou facto interruptivo que primeiro ocorrer. Na verdade, tendo a interrupção o efeito de inutilizar todo o tempo decorrido anteriormente por força da ocorrência do acto ou facto ao qual a lei atribui esse efeito inutilizador total do tempo decorrido anteriormente e, nos casos excepcionais previstos na lei, impedindo, também, o recomeço de contagem do decurso do mesmo prazo, por mor da suspensão, não tem o mínimo sentido que, à luz dos princípios da justiça material e da segurança jurídica, que a um efeito inutilizador, e mormente se a sua eficácia se mantiver por mor do efeito excepcional atribuído ao acto ao facto com efeito interruptivo, se venha a conferir a um novo facto posterior, previsto na lei também como causa abstracta de interrupção – um efeito jurídico de inutilização do tempo decorrido, quando nada, então, há a inutilizar, por esse resultado jurídico já haver sido alcançado pelo primeiro acto ou facto jurídico com eficácia interruptiva. A admissibilidade de um entendimento contrário é uma pura irracionalidade ou impossibilidade racional e contaria frontalmente aqueles princípios e a inadmissibilidade da fraude à lei e só poderia ser admitida se existisse lei expressa que contemplasse a possibilidade de à inutilização do prazo de prescrição por interrupção derivada de uma causa com tal efeito, se poder aplicar uma nova causa sucessiva de interrupção abstractamente prevista, decorrente de outra causa, quando o prazo de prescrição estava suspenso por decorrência da primeira causa interruptiva e da verificação dos pressupostos que determinam que à inutilização do tempo do prazo de prescrição já decorrido fica o mesmo prazo suspenso até ao fim do processo;
l) Dir-se-á que, não obstante nada haver a inutilizar por força da ocorrência do segundo facto interruptivo - aqui nos autos por mor da citação para o processo de execução fiscal -, o mesmo poderá tornar-se actuante e eficaz caso soçobre ou se esgote a eficácia do primeiro facto ao acto jurídicos com efeito interruptivo. Mas esse seria um entendimento aberrante, porquanto acarretaria o sobrestar ou o deferir da respectiva...
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