Acórdão nº 047/23.9BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25-10-2023

Data de Julgamento25 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão047/23.9BALSB
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (PLENO DA SECÇÃO DO CT)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) vem, ao abrigo do disposto nos artigos 152.º, n. º 1, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) e 25.º, n. ºs 2 a 4, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no processo n.º 280/2022-T, datada de 14/03/2023, invocando contradição com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23/02/2023 proferido no processo n.º 102/22.2BALSB (transitado em julgado no dia 09/03/2023, conforme informação prestada a fls. 561 do processo 50/23.9BALSB).

Com a interposição do recurso apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões:
«A. O Recurso Para Uniformização de Jurisprudência previsto e regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o STA, no caso concreto, proceder à anulação da decisão recorrida e realizar nova apreciação da questão em litígio quando suscitada e demonstrada tal contradição, firmando e consolidando o sentido do julgamento acertado desta matéria.
B. Para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos suscetível de recurso por oposição, é necessário que: i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas; ii) haja identidade na questão fundamental de direito; iii) se tenha perfilhado nos dois arestos uma solução oposta; e iv) a oposição decorra de decisões expressas e não apenas implícitas e v) que a orientação perfilhada na decisão recorrida não esteja de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo

C. No caso vertente encontram-se reunidos os supra elencados requisitos para que se tenha por verificada a alegada oposição entre a Decisão arbitral n.º 280/2022-T, de 16.03.2023 e o Acórdão fundamento nº 102/22.2BALSB, de 23.02.2023

D. Entre a Decisão Recorrida e o Acórdão fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto.
E.

F. Em ambas as decisões está em causa:

i. Uma decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado pelo contribuinte;
ii. Em ambas as decisões está em causa o ato de liquidação do Adicional ao IMI de (no Acórdão fundamento dos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020 e na decisão recorrida as liquidações de AIMI de 2018, 2019, 2020 e 2021).
Pese embora os períodos de tributação não sejam totalmente coincidentes não há alterações substanciais entre ambos que justifiquem uma divergência suficiente para ser afastada a identidade das situações em apreço;
iii. As ilegalidades das liquidações impugnadas foram sustentadas na ilegalidade da fixação do valor patrimonial tributário (VPT) de terrenos para construção;
iv. Em ambos os casos o contribuinte não requereu, aquando da notificação do resultado da 1.ª avaliação, a 2.ª avaliação.
G. Entre a Decisão Recorrida e o Acórdão fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto, ou seja, em ambas as situações os vícios do VPT foram arguidos na impugnação da legalidade do ato de liquidação.
H. Ou seja, ambas as decisões versam sobre situações fáticas que preenchem a mesma hipótese normativa, isto é, concretizem a mesma fattispécie legal, conforme entendimento veiculado pelo acórdão do STA proferido a 2010.12.07 no âmbito do processo n.º 0511/06,
l. Por outro lado, as decisões em confronto pronunciam-se sobre a mesma questão fundamental de direito.
J. Enquanto que no Acórdão fundamento se considera que os eventuais vícios do valor patrimonial tributário apenas podem ser invocados na sua impugnação e já não na impugnação da liquidação que com base no valor resultante da avaliação vier a ser efetuada.
K. A decisão recorrida decidiu que pode ser apreciada a ilegalidade de ato de que fixou o VPT na impugnação dos atos de liquidação ou na decisão de indeferimento do pedido de revisão daqueles atos.
L. Ou seja, analisando a mesma questão, a de saber se no ato de liquidação podem ser impugnados vícios próprios do valor patrimonial tributário, a decisão recorrida responde de forma afirmativa, em contradição com o acórdão fundamento que sobre a mesma questão responde de forma negativa e uniformiza a jurisprudência sobre esta matéria.
M. Como bem refere o Acórdão Uniformizador de jurisprudência: "Não tendo sido impugnado judicialmente o resultado da segunda avaliação, nos termos previstos na lei, forma-se caso decidido ou resolvido sobre o valor da avaliação, pelo que esta não pode voltar a ser discutida".
N. A jurisprudência foi especificamente uniformizada no sentido de estar excluída a apreciação da legalidade do ato que fixa o VPT em sede de discussão da legalidade do ato de liquidação, incluindo os casos em que mesma seja despoletada por um pedido de revisão oficiosa.
O. No caso em apreço, não tendo a Recorrida colocado em causa o valor patrimonial obtido pela 1.ª avaliação, requerendo uma 2.ª avaliação, o mesmo fixou-se, não sendo possível conhecer na posterior liquidação, de eventuais erros ou vícios cometidos nessa avaliação.
P. Em face de todo o exposto fácil é de concluir que, por estar consolidada a fixação do valor patrimonial tributário, não podem os atos de liquidação impugnado nos presentes autos serem anulados com fundamento em erros no cálculo do VPT.
Q. Em suma, entre a decisão recorrida e o Acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição sobre as mesmas questões fundamentais de direito que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo acórdão que decida definitivamente a questão controvertida nos termos do entendimento e fundamentação propugnada no Acórdão fundamento que uniformizou a jurisprudência.


Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outra consentânea com o quadro jurídico vigente como é de Direito e Justiça.»

1.2. Admitido o recurso foi cumprido o disposto no artigo 25.º, n.º 5, do RJAT.

1.3. A Recorrida A... S.A., identificada nos autos, contra-alegou, concluindo do seguinte modo:
«A. A Recorrente vem, nos presentes autos, requerer a revogação da Decisão Arbitral proferida no processo n.º 280/2022-T em virtude de a mesma, alegadamente, se encontrar em oposição com "o Acórdão de uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA), proferido no processo n.º 102/22.2BALSB, de 23.02.2023", o Acórdão Fundamento.
B. Neste sentido, alega a Recorrente que, verificando-se uma identidade substancial da situação fáctica em causa em ambas as decisões, há, contudo, uma "contradição sobre a mesma questão fundamental de direito, o que, naturalmente, leva à adoção de soluções opostas expressas".
C. Contudo, não deve o presente recurso merecer provimento, não podendo proceder a pretensão da Recorrente.
D. Nos termos do regime legal aplicável (n.º 2 do artigo 25.º do RJAMT e artigo 152.º do CPTA), verifica-se uma efetiva oposição de acórdãos, passível de recurso, sempre que se encontrem preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:
i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas,
ii) haja identidade na questão fundamental de direito,
iii) se tenha perfilhado nos dois arestos uma solução oposta.
E. Contudo, ao contrário do quanto foi alegado pela Recorrente, não se verifica uma identidade da questão fundamental de direito em causa nos arestos aqui convocados.
F. Nos termos alegados pela aqui Recorrente, "[t]anto na Decisão recorrida, como no Acórdão fundamento a questão relevante de direito para a prolação das respetivas decisões situa-se em igual plano".
G. Nestes termos, o Acórdão Fundamento pronunciou-se no seguinte sentido: “[...] De qualquer forma, quer o ato de avaliação direta se insira no procedimento de liquidação do imposto (aplicando-se neste caso a exceção ao princípio da impugnação unitária, quer, como é o caso, finalize um procedimento de avaliação direta autónomo, os vícios que afetem o valor encontrado apenas podem ser invocados na sua impugnação e já não na impugnação da liquidação que com base no valor resultante da avaliação vier a ser efetuada”.
O mesmo é dizer que para além de a impugnação judicial do ato de fixação do valor patrimonial depender do esgotamento dos meios graciosos, a não impugnação do ato preclude que, em sede de impugnação judicial do ato de liquidação do imposto, possa ser questionada a quantificação do valor fixado. Não tendo sido impugnado judicialmente o resultado da segunda avaliação, nos termos previstos na lei, forma-se caso decidido ou resolvido sobre o valor da avaliação, pelo que esta não pode voltar a ser discutida (cf. acórdão do Suprem Tribunal Administrativo de 12/01/2011, proferido no processo 0758/10)".
H. Por seu turno, a Decisão Arbitral recorrida pronunciou-se no sentido de que: [...] Assim, ao contrário do que conclui a Requerida, e na esteira das decisões ora reproduzidas, considera o Tribunal que é sua competência a apreciação da legalidade dos atos de liquidação, neste caso, do AIMI, quando a impugnação/pedido tenha como fundamento o erróneo apuramento do VPT dos prédios que lhe deram origem.
Pelo que não deve ser dado provimento à exceção invocada pela Requerida da "inimpugnabilidade" do ato liquidado com base em vícios de fixação do valor patrimonial tributário”.
I. Perante esta exposição, a AT conclui, no seu recurso, sem mais, pela verificação da identidade...

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