Acórdão nº 042/20.0BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2023-11-08

Ano2023
Número Acordão042/20.0BEAVR
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)

ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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"A..., SGPS, S.A.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. de Aveiro, constante a fls.33 a 38 do processo físico, a qual julgou improcedente a presente impugnação pela sociedade recorrente intentada e tendo por objecto actos de liquidação de Imposto de Selo e juros compensatórios, relativos ao ano fiscal de 2015 e no montante total de € 38.695,47.
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.40 a 49 do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
a) A questão decidenda
I-O presente recurso pretende contestar a decisão do Tribunal a quo, por erro de julgamento na matéria de Direito, quanto à não aplicação da isenção de IS, prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS, com redação à data dos factos, aos empréstimos concedidos, no ano de 2015, pela A... às sociedades por si indiretamente detidas.
b) O Direito
O campo de aplicação da isenção do Imposto do Selo prevista na alínea i) do artigo 7º do Código do Imposto do Selo
II-Digno de ressalva introdutória será referir que no caso concreto, conforme defendido em sede de petição inicial e aceite pela decisão do Tribunal a quo, a redação da norma a interpretar – alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS – é a vigente à data dos factos, i.e., no ano de 2015 e, portanto, será a redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro.
III-A este respeito, o Tribunal a quo entendeu que a isenção do Imposto do Selo prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS “depende da verificação cumulativa de dois requisitos: i) que estejam em causa empréstimos com características de suprimentos; ii) efetuados pelos sócios à sociedade”.
IV-Relativamente ao primeiro requisito anunciado pelo Tribunal a quo e que terá alegadamente abrigo na primeira parte do preceito legal aqui em causa, resta-nos modestamente observar a literalidade da norma para facilmente compreender que o legislador quando escreve “empréstimos com características de suprimentos” não se quer referir única e simplesmente ao conceito stricto sensu de contrato de suprimentos que encontra a sua consagração no artigo 243º do CSC.
V-Se o legislador tivesse a intenção de adotar um conceito puramente restritivo de contrato de suprimento, previsto no artigo 243º da CSC, tê-lo-ia consagrado, como o fez, por exemplo, na alínea h) do n.º 1 do artigo 97º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas onde refere expressamente e tão só “contratos de suprimento”.
VI-Relativamente ao segundo requisito anunciado pelo Tribunal a quo e que terá alegadamente abrigo na segunda parte do preceito legal aqui em causa pela sua literalidade – 2º requisito referido pelo Tribunal a quo “efetuados pelo sócio à sociedade” e 2ª parte da norma “incluindo os respetivos juros efetuados por sócios à sociedade” –, entendemos que, observando a norma como um todo, é evidente que nesta segunda parte o legislador apenas teve a intenção de também incluir nesta isenção de IS os juros obtidos (e não efetuados, segundo cremos) pelo sócio à sociedade.
VII-A verdade é que não se almejam quaisquer requisitos para a aplicação da isenção prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS, sem ser a necessidade de estar em causa empréstimos com características de suprimentos, como é o caso em concreto da Recorrente.
VIII-A este propósito, interessa ainda atentar na atual redação da alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS dada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março.
IX-O artigo 154º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, sob a epígrafe “disposição interpretativa no âmbito do Código do Imposto do Selo”, apenas considerou que: “As redações dadas ao n.º 1, n.º 3 e alínea b) do n.º 5, todos do artigo 2.º, ao n.º 8 do artigo 4.º, ao n.º 7 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo e à verba 17.3.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo têm carácter interpretativo”, excluindo, assim, a alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS.
X-E, portanto, a redação dada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, à alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS, apenas tem aplicação para os factos que ocorrerem após a sua entrada em vigor, isto é, após 31 de março de 2016 (Artigo 218º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março), relembrando que os factos aqui em causa se remetem ao ano de 2015.
XI-Tal significa que a anterior redação aqui aplicável aos factos em apreço, dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, não limitava a isenção aqui em apreço aos suprimentos concedidos por sócios que detivessem direta ou indiretamente a sociedade financiada.
XII-A interpretação de acordo com a unidade e a coerência do sistema fiscal e dos elementos de interpretação (literal, histórico, racional e teleológico), conforme acima exposto, determina que a norma aqui aplicável, com a redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, tem o sentido de atribuir a isenção de IS aos empréstimos com as características de suprimentos concedidos pela sociedade que detenha, direta ou indiretamente, a maioria do capital da sociedade financiada e não como entende o Tribunal a quo de aplicar a isenção aos empréstimos concedidos pela sociedade que detenha apenas diretamente a maioria do capital da sociedade financiada.
A interpretação das normas fiscais
XIII-O Tribunal a quo para concluir que a isenção do IS não se aplica aos empréstimos concedidos pela A... às sociedades por si indiretamente detidas socorreu-se do n.º 2 do artigo 11º da LGT para interpretar a norma prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS.
XIV-O Tribunal a quo, com base nos alegados requisitos acima mencionados previstos na alínea i) do n.º 1 do artigo 7º do Código do IS, recorreu então ao CSC para interpretar o conceito de “empréstimos com características de suprimentos” [alegado primeiro requisito] e o conceito de sócio [previsto no alegado segundo requisito que não alcançamos].
XV-Contudo, como é claro, por vezes, a interpretação e consequente aplicação das normas fiscais com base em remissões puramente mecanicistas e formalistas para outros conceitos e/ou termos de outros ramos do Direito (artigo 11º, n.º 2 da LGT) – in casu Direito Comercial – conduz a realidades jurídicas completamente desadequadas do sistema fiscal, consagrando-se como um atentado para a segurança jurídica e unidade do sistema jurídico-fiscal, como é o caso presente.
XVI-A adotar-se a solução interpretativa do Tribunal a quo cairíamos na situação incompreensível e desajustada de o empréstimo concedido da sociedade-avó à sociedade-filha se encontrar isento de IS e «o mesmo empréstimo» desta feita concedido pela sociedade-filha à sociedade-neta também se encontrar isento de IS.
XVII-Nestes casos em que a remissão e aplicação literal e mecanicista de conceitos de outros ramos do Direito conduza a desequilíbrios na unidade e coerência do sistema jurídico-fiscal, o julgador deverá socorrer-se do n.º 3 do artigo 11º da LGT, que refere que, em caso de dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.
XVIII-O Tribunal a quo, por análise ao caso concreto e tendo em consideração a unidade e coerência do sistema fiscal, deveria ter-se socorrido do n.º 3 do artigo 11º da LGT e concluído que a isenção do IS se aplica aos empréstimos concedidos a sociedades detidas indiretamente pelas sociedades mutuantes uma vez que do ponto de vista económico as relações de grupo no caso concreto traduzem-se numa unidade económica.
XIX-No entanto, mesmo que o Tribunal a quo recorresse a termos e/ou conceitos de Direito Comercial deveria ter chegado à conclusão que são conceitos mutáveis, que evoluem no tempo e que se têm de ajustar à realidade jurídica.
XX-Assim, também se devem qualificar como suprimentos, para todos os efeitos legais, os empréstimos concedidos por sociedades que detenham indiretamente a sociedade financiada, através da detenção da maioria do capital da sociedade que detém diretamente a sociedade financiada, como é o presente caso, sob pena de se adulterar o regime legal dos suprimentos e prejudicar a proteção dos credores que tal regime pretendeu acautelar.
XXI-Atualmente quando...

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