Acórdão nº 0410/22.2BEALM-S2-A de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2024-04-18

Data de Julgamento18 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão0410/22.2BEALM-S2-A
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (PLENO DA SECÇÃO DO CA)
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I - Relatório

1 – AA, com os sinais dos autos, instaurou no TAF de Almada, contra a Ordem dos Contabilistas Certificados, providência cautelar para suspensão de eficácia da deliberação do Conselho Jurisdicional da referida Ordem de ... que lhe aplicou a sanção disciplinar de suspensão do exercício da atividade profissional de contabilista certificado pelo período de 8 meses.

2 - No âmbito da referida providência a Requerente deduziu em 22/06/2022 incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida, ao abrigo do disposto no n.º 4, do artigo 128.º, do CPTA, pedindo a condenação da Requerida “a não prosseguir com a execução de tais actos, assim como a eliminá-los ou a neutralizar os efeitos entretanto produzidos pelos mesmos, tal como supra aduzido e de molde a reconstituir-se a situação anterior à do início da execução do acto suspendendo e, ainda, por forma a impedir-se a formação ou cristalização de uma situação de facto consumado.”

3 - Em 23/09/2022, foi proferida sentença pelo TAF de Almada que julgou improcedente o incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida, decisão que veio a ser confirmada pelo TCA Sul por acórdão proferido em 29/06/2023.

4 – Deste acórdão interpôs a Recorrente, em 31/07/2023, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, invocando que o acórdão recorrido se encontra em contradição com os seguintes arestos do TCA Norte e do TCA Sul:
a) Proferido em 19/11/2021, no processo n.º 00321/21.9BEPNF-S1;
b) Proferido em 10/03/2023, no processo n.º 00370/22.0BEAVR-S1;
c) Proferido em 04/05/2017, no processo nº 799/16.2BEALM

5 – Formulou a recorrente na sua alegação as seguintes conclusões:

“1.º Constitui fundamento do presente recurso o facto de o Tribunal Central Administrativo Sul ter decidido o presente processo através de um acórdão que está em flagrante contradição com não apenas um mas vários arestos anteriormente proferidos por outro Tribunal Central Administrativo, e isto no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.
2.º A questão fundamental, de direito, aqui em causa, consiste em saber se pode ou não ter-se por indevida a execução de acto administrativo impugnado se os respectivos actos (de execução) tiverem sido praticados, ou a sua realização tiver sido iniciada, em data prévia à da citação da entidade requerida para a providência cautelar.
3.º Segundo o acórdão ora recorrido a tese a sufragar, e pois a correcta interpretação a dar ao disposto no artigo 128.º do C.P.T.A., corresponde à segunda hipótese aventada. Considera-se, pois, em tal aresto, o seguinte: caso, na altura da citação da entidade requerida, os actos de execução, de acto administrativo impugnado, já tiverem sido praticados, ou a sua realização já tiver sido iniciada, então tal execução não pode ser tida por indevida.
4.º Segundo esta tese, e tal qual se demonstrou em sede da fundamentação desta alegação, a obtenção da suspensão da eficácia de um acto administrativo é uma pura quimera, pois, di-lo bem o acórdão recorrido, a mesma está sempre longe demais… Ou melhor: ou é demasiado cedo para se avançar com uma providência cautelar destinada à suspensão da eficácia de acto administrativo, pois não há ainda actos de execução e, como tal, nada contra o que reagir, ou é já demasiado tarde para o fazer, por a execução do mesmo já se ter dado ou já ter sido iniciada…
5.º Já segundo a tese que se julga, indubitavelmente, dever merecer aprovação, a correcta interpretação a dar ao estatuído no dito artigo 128.º do C.P.T.A. corresponde à primeira hipótese supra aventada, ou seja, deve ter-se por indevida a execução de acto administrativo impugnado mesmo que os respectivos actos (de execução) tenham sido praticados, ou a sua realização tiver sido iniciada, em data prévia à da citação da entidade requerida para a providência cautelar. Portanto, o direito, expressamente consagrado, e tanto na lei como na nossa Constituição, de se obter a suspensão da eficácia de um acto administrativo, implica, inexoravelmente, não só a proibição da prática de actos de execução do mesmo como a obrigação, a recair tanto sobre a entidade administrativa com sobre os seus beneficiários, de interromper essa prática (se tais actos forem de natureza continuada) ou de proceder à eliminação, paralisação ou neutralização dos seus efeitos.
6.º Esta tese, e a qual está, pois, em total contradição com a perfilhada no acórdão recorrido, é acolhida no seguinte aresto: acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte proferido, em 19/11/2021, no processo n.º 00321/21.9BEPNF-S1.
Este aresto pode ser compulsado no seguinte endereço web: http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/
89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/81d55c323e0cb4cc802587a4003f349a?OpenDocument
7.º Tal com sucede nos autos sub judice, também na situação julgada por este acórdão estava em causa uma sanção disciplinar, no caso de interdição definitiva da actividade profissional, sendo que, no âmbito da providência cautelar intentada com o fito de obter a suspensão da eficácia de tal acto administrativo, havia sido deduzido incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida, incidente este que foi logo julgado procedente em primeira instância, e depois também em segunda instância, tendo-se determinado, em consequência, a eliminação do acto, de resto percebe-se que anterior ao da citação da entidade requerida, que consistia no bloqueio ao requerente (agente de execução), do acesso ao sistema informático que permite a tramitação electrónica dos processos judiciais.
8.º No caso julgado por este acórdão do T.C.A.N., portanto, e ainda por cima, estava em causa um acto de execução indevida absolutamente idêntico aos dois actos de execução indevida, de índole mais gravosa e atentatória, praticados pela demandada O.C.C, e cuja declaração de ineficácia foi sendo, repetidamente, requerida pela recorrente nos presentes autos: interdição de acesso às áreas reservadas a contabilistas certificados do website da Ordem dos Contabilistas Certificados; impedimento de acesso à área reservada a contabilistas certificados do portal de Internet da Autoridade Tributária e Aduaneira.
9.º Para cabal esclarecimento do alegado, procedemos à transcrição das partes mais relevantes do dito aresto, isto é, as que melhor demonstram a total consonância com a tese por nós defendida nos presentes autos e, concomitantemente, a sua clara oposição à tese sufragada no acórdão ora impugnado, citação essa que damos aqui por reproduzida.
10.º A tese que propugnamos é também perfilhada pelo seguinte aresto: acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte proferido, em 10/03/2023, no processo n.º 00370/22.0BEAVR-S1. Relativamente à questão fundamental de direito em apreço, este aresto está pois, também ele, em total contradição com a tese defendida no acórdão ora impugnado. Este aresto pode ser consultado no seguinte endereço web:
http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/
89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/9dd873f0684af3a2802589710045e835?OpenDocument
11.º Tal com sucede nos autos sub judice, também na situação julgada por este acórdão estava em causa uma sanção disciplinar, no caso de suspensão do exercício da advocacia, sendo que, no âmbito da providência cautelar intentada com o escopo de obter a suspensão da eficácia de tal acto administrativo, e perante a prolação, por parte da entidade requerida, de resolução fundamentada (por forma a habilitá-la à prática ou ao prosseguimento de actos de execução), deduziu o requerente incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida.
12.º No caso julgado por este acórdão do T.C.A.N. estavam em causa os seguintes actos executórios: bloqueio às plataformas electrónicas Citius e Sitaf; bloqueio ao certificado digital Multicert. Trata-se, pois, de actos de execução indevida absolutamente idênticos aos dois actos de execução indevida, de índole mais gravosa e atentatória, praticados pela demandada O.C.C, e cuja declaração de ineficácia foi sendo, repetidamente, requerida pela recorrente nos presentes autos: interdição de acesso às áreas reservadas a contabilistas certificados do website da Ordem dos Contabilistas Certificados; impedimento de acesso à área reservada a contabilistas certificados do portal de Internet da Autoridade Tributária e Aduaneira.
13.º A fim de demonstrar a plena concordância entre a tese acolhida neste aresto de 10/03/2023 e a por nós próprios sufragada nos presentes autos, assim como a sua total oposição à perfilhada no acórdão de que se recorre, procedemos à transcrição das partes mais elucidativas de tal aresto, de que reproduzimos aqui o seguinte lapidar excerto: «Portanto, na sequência da citação da providência cautelar, a Recorrente Ordem dos Advogados ficou impedida, nos termos da primeira parte do n.º 1 do artigo 128.º do CPTA, de “iniciar ou prosseguir a execução” do acto cuja suspensão foi requerida pelo Requerente. Ou seja, a Ordem dos Advogados ficou impedida de prosseguir com a suspensão da inscrição do Requerente como Advogado. Tendo praticado os actos necessários para que a suspensão não continuasse, designadamente com o acesso pelo Recorrido às plataformas CITIUS, SITAF e certificado MULTICERT.».
14.º As infracções imputadas ao acórdão de que ora se recorre, e que os dois arestos supra citados não cometem, pois, como se viu, e muito bem, interpretam a lei de forma contrária à daquele (e portanto em total consonância com a tese sufragada pela ora impetrante), são pois claras e evidentes.
15.º Desde logo, e primacialmente, o tribunal a quo, em sede do acórdão impugnado, escudou-se, para negar provimento ao recurso, e com isso confirmar a improcedência do incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida, numa interpretação do artigo 128.º do...

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