Acórdão nº 0399/18.2BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28-02-2024
Data de Julgamento | 28 Fevereiro 2024 |
Ano | 2024 |
Número Acordão | 0399/18.2BESNT |
Órgão | Supremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO) |
1.1 A sociedade acima identificada recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra a Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM) que lhe foi liquidada pela Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) relativamente ao ano de 2017, tendo apresentado a respectiva motivação, com conclusões do seguinte teor:
«A. O presente recurso é interposto contra a Sentença proferida no dia 15 de Julho de 2022, no âmbito dos autos de Impugnação Judicial que correram termos junto da Unidade Orgânica 1 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra sob o n.º 399/18.2BESNT, que julgou improcedente a pretensão da ora RECORRENTE e, em consequência, determinou a manutenção na ordem jurídica do acto tributário impugnado, atinente à TSAM do ano de 2017.
B. Ora, não pode a RECORRENTE conformar-se com o entendimento perfilhado na Sentença recorrida, na exacta medida em que manteve na ordem jurídica o acto tributário impugnado, o qual, como se demonstrará, padece de ilegalidade e inconstitucionalidade, devendo ser revogada e substituída por outra conforme com as normas e princípios jurídicos aplicáveis.
C. Conforme melhor demonstrado na Petição Inicial que deu origem aos presentes autos, não tendo a ora RECORRENTE sido notificada, nos termos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º, da LGT, em momento anterior ao da liquidação aqui em causa, para exercer o seu direito de audição sobre a mesma, verificou-se a violação do citado preceito legal, que, por si só, implica a anulação do acto de liquidação em causa, por preterição de formalidade legal essencial.
D. Perante a matéria de facto dada como provada, o Tribunal a quo entende que “(…) é possível verificar que em 2017, e para liquidação da TSAM, foi remetida declaração da impugnante, à DGV, onde declarou a área dos estabelecimentos, sendo também possível verificar, dos factos provados, que foi com base nesta declaração que foi emitida a liquidação”, para, de seguida, “(…) concluir que não ocorreu a omissão, ilegal, da notificação da impugnante para participar no procedimento administrativo tendente à liquidação, ora impugnada, pois aquela participação ocorreu na chamada da impugnante àquele procedimento, através do ofício de 21/02/2017, ao qual a impugnante respondeu”, concluindo pela improcedência do mencionado vício de preterição de formalidade essencial por omissão para o exercício do direito de audição prévia.
E. Não pode, no entanto, a RECORRENTE aceitar tal argumentação, por a mesma ser contrária à lei e, bem assim, contrária à actuação, desde 2020, da própria DGAV, entidade responsável pela liquidação e cobrança da taxa, nos termos do artigo 9.º, n.º 1 da Portaria n.º 215/2012, de 17 de Julho, como, de seguida, se demonstrará.
F. Antes de mais, refira-se que o n.º 4 do artigo 5.º da Portaria n.º 215/2012, de 17 de Julho, impõe a obrigação declarativa aos sujeitos passivos da TSAM de comunicar à DGAV os elementos elencados no n.º 2 do mesmo artigo atinentes aos respectivos estabelecimentos comerciais, no prazo de 30 (trinta) dias a contar do início da actividade ou de qualquer alteração que se verifique em relação aos elementos comunicados anteriormente.
G. Por seu turno, a liquidação da TSAM é efectuada, oficiosamente, pela DGAV e notificada aos sujeitos passivos, por via electrónica, para a caixa postal electrónica ou por carta registada, até ao final do mês de Março de cada ano, contendo a indicação do montante de taxa a pagar por cada sujeito passivo, atendendo à situação e às características dos respectivos estabelecimentos, verificadas a 31 de Dezembro do ano precedente (cfr. artigo 5.º, n.ºs 1 e 3 da Portaria n.º 215/2012, de 17 de Julho).
H. Na verdade, o direito de audição previsto no artigo 60.º, n.º 1, alínea a), da LGT, é, assim, uma concretização do princípio do contraditório, consagrado no artigo 45.º do CPPT, que estabelece que “O procedimento tributário segue o princípio do contraditório, participando o contribuinte, nos termos da lei, na formação da decisão”, decorrendo, também, da consagração constitucional do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões que lhe digam respeito (cfr. artigo 267.º, n.º 5 da CRP).
I. Assim, a consequência para a preterição de tais formalidades legais, que conduz ao vício de forma e à anulação do acto tributário, não pode deixar de ser a ilegalidade do próprio acto de liquidação, porquanto estamos perante a preterição de formalidades anteriores à prática do acto, essenciais à sua formação e descoberta da verdade material.
J. Com efeito, para que se dê integral e pleno cumprimento ao princípio do contraditório ínsito no artigo 45.º do CPPT, ao contribuinte tem que ser concedida a possibilidade de se pronunciar sobre todos os aspectos relevantes, razão pela qual, caso a DGAV pretenda promover a liquidação da TSAM, está obrigada a, em momento prévio a essa mesma liquidação, ouvir o contribuinte sobre os pressupostos da mesma.
K. Ora, de acordo com o referido na petição inicial, no caso vertente, a DGAV emitiu o acto de liquidação impugnado, sem que, em momento anterior, fosse concedida à RECORRENTE qualquer oportunidade de se pronunciar sobre a verificação dos pressupostos do mesmo.
L. Por esta razão, deveria a RECORRENTE ter sido notificada para se pronunciar sobre a liquidação em causa no momento previsto na alínea a) do n.º 1 do citado artigo 60.º da LGT, ou seja, antes da liquidação.
M. E não se diga, como se pode ler na Sentença objecto de recurso, que a DGAV se encontrava dispensada, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 60.º da LGT, de notificar a RECORRENTE em momento prévio à liquidação, por a mesma ter sido efectuada com base na declaração do contribuinte.
N. Com efeito, lendo-se o Ofício acima reproduzido, constante do ponto a) da matéria de facto dada como provada, constata-se que o mesmo foi enviado para a aqui RECORRENTE pelo facto de a “(…) lista elaborada pela DGAV, até ao dia ../../.... de cada ano, a partir dos elementos disponibilizados, entre outros pelas autoridades competentes”, na sequência de protocolo celebrado entre a DGAV e a Direcção-Geral das Actividades Económicas, “(…) apresenta algumas insuficiências com reflexos directos na liquidação, causando constrangimentos vários que nos obrigam, de forma reiterada a proceder à anulação da liquidação e emissão da respectiva nota de crédito.” (sublinhado e negrito da RECORRENTE).
O. Conclui, então, a DGAV, no sobredito Ofício, que “Apresentando-se esta metodologia de apuramento dos dados mais vantajosa para todos, esperamos o bom acolhimento de V. Exa(s), aguardando-se que nos enviem, até ao próximo dia 3 de Março, as informações em apreço (…), de modo a que estas possam ser consideradas para efeitos da liquidação da TSAM de 2017.
P. Nessa sequência, a 3 de Março de 2017, veio a RECORRENTE, “(…) em resposta ao V/ Ofício supra referenciado, dando cumprimento à obrigação declarativa que resulta do disposto das disposições conjugadas da Portaria n.º 215/2012, de 17 de Julho e da Portaria n.º 200/2013, de 31 de Maio (…)”, remeter à DGAV a lista dos seus estabelecimentos em funcionamento a 31 de Dezembro de 2016 (cfr. ponto b) da matéria de facto dada como provada).
Q. Assim, entende a RECORRENTE que o mero envio de uma lista, a pedido da DGAV e ao abrigo do princípio da colaboração, não pode ser entendido como um acto que conduz à dispensa, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 60.º da LGT, da audição do contribuinte antes da emissão da liquidação, uma vez que, por um lado, os elementos patentes na lista enviada pelo contribuinte podem não ser, pelas mais diversas razões, aceites pela DGAV e, por outro, porque só com base na referida lista, o contribuinte não consegue saber, à partida, qual o valor da TSAM que terá que pagar nesse ano em particular.
R. Ademais, no caso concreto, aquando do envio da lista solicitada pela DGAV, que ocorreu a 3 de Março de 2017 (cfr. ponto b) da matéria de facto dada como provada), nem tão-pouco se sabia qual o valor da taxa que, nesse ano, seria fixada para o metro quadrado, e a partir da qual seria liquidada a TSAM, pois a Portaria através da qual esta é fixada só foi publicada no Diário da República de 14 de Março de 2017, in casu a Portaria n.º 107-A/2017, de 14 de Março, que fixou a taxa, para o ano de 2017, em € 7 por metro quadrado.
S. E tanto assim é que, desde 2020, a DGAV sempre notificou a RECORRENTE para se pronunciar sobre o projecto de liquidação da TSAM, mesmo após já ter recebido uma lista idêntica à que a RECORRENTE enviou para a DGAV, em 3 de Março de 2017, para efeito de cálculo da liquidação da TSAM de 2017.
T. Com efeito, desde 2020 até hoje, o procedimento seguido pela DGAV para proceder à emissão anual da liquidação da TSAM inicia-se com o envio pela RECORRENTE para a DGAV da lista com os elementos actualizados dos seus estabelecimentos em funcionamento a 31 de Dezembro do ano anterior.
U. Subsequentemente, e não obstante o envio da sobredita lista para a DGAV, no cumprimento da obrigação declarativa que resulta do n.º 4 do artigo 5.º da Portaria n.º 215/2012, de 17 de Julho, a RECORRENTE é sempre notificada do projecto de liquidação da TSAM e, bem assim, para, querendo, no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição prévia, relativamente à liquidação da referida taxa.
V. Notificada do projecto de liquidação, a RECORRENTE exerce, normalmente, o seu direito de audição, vindo a ser posteriormente notificada da liquidação definitiva da TSAM.
W. Perante tal actuação consolidada e reiterada da entidade administrativa responsável pela liquidação e cobrança da TSAM, não pode a RECORRENTE considerar que a mesma não deriva da preocupação da DGAV em agir de acordo com a lei, em particular no que respeita às normas...
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