Acórdão nº 0369/10.9BEPNF de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23-03-2022

Data de Julgamento23 Março 2022
Ano2022
Número Acordão0369/10.9BEPNF
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A…………, S.A., Autora nos autos à margem referenciados, em que é Ré a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, inconformada com o teor do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte (“TCAN”), tendo interposto recurso de revista para o STA, apresenta as seguintes conclusões:

1. As questões em causa nestes autos revestem-se de particular relevância jurídica e social, pelo que a admissão do presente recurso é imprescindível para uma melhor aplicação do direito.
2. Com efeito, atento o seu interesse prático e objetivo, bem como o facto de as referidas questões serem passíveis de repetição no futuro, justifica-se a pronúncia deste STA para que se dissipe em definitivo a controvérsia em análise e se alcance maior certeza e estabilidade na resolução deste tipo de litígios.
3. Do mesmo modo, as questões em apreço são de complexidade jurídica superior ao comum, fruto de um também complexo enquadramento normativo (normas jurídicas provenientes de regulamentação comunitária), bem como do facto de assentarem na interpretação e análise de conceitos indeterminados e juízos técnicos da administração.
4. Nos autos, está em causa um ato de liquidação de direitos antidumping praticado pelo Conselho Técnico Aduaneiro da Direção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, em que se decidiu que as tampas de saneamento importadas pela aqui Recorrente tinham origem chinesa e não sul coreana, tal como a mesma havia declarado às autoridades aduaneiras no contexto da referida importação, e tal como bem atestava toda a documentação que acompanhou aquela operação (certificados de origem e demais documentação emitida pelas autoridades aduaneiras competentes no país de exportação), ignorando-se a respetiva força e relevância probatórias.
5. Ademais, por entender que a Recorrente havia praticado atos suscetíveis de recondução a infração criminal (crime de Contrabando, previsto e punível pelo art. 92.º do RGIT), a Direção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (com a posterior concordância das instâncias judiciais antecedentes) deu início a um procedimento de inquérito criminal em que, de modo inaceitável, a acusou de ter pretendido “iludir” as autoridades aduaneiras, com isso se evadindo do pagamento dos direitos antidumping alegadamente devidos.
6. O Acórdão recorrido ignora jurisprudência relevante do TJUE sobre a questão técnica em apreço nos autos (origem não preferencial de mercadorias importadas no território aduaneiro da União Europeia), assim permitindo que a administração tributária continue a desconsiderar a prova plena que decorre da apresentação da documentação relevante neste tipo de casos,
7. Postura essa, aliás, em que a referida administração é “useira e vezeira”.
8. Assim, pelo forte impacto ablativo que este tipo de casos tem na esfera jurídica, económica e social dos operadores económicos importadores, é notória e ostensiva a relevância e pertinência das questões em debate, pelo que deverá este STA admitir o presente Recurso de Revista nos termos do art. 150.º do CPTA.
9. Ora, a primeira questão a tratar (“que pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”) é a que respeita à determinação da origem das mercadorias importadas pela aqui Recorrente.
10. Estamos, pois, no domínio das regras de origem não preferencial, cujo tratamento normativo consta do art. 24.º do CAC (aplicável à data dos factos).
11. Movemo-nos, como se disse, no quadro de conceitos indeterminados, amplamente analisados pelo TJUE na jurisprudência referida supra.
12. Ora, não restam dúvidas de que todos os critérios previstos na citada norma se encontram cumulativamente preenchidos.
13. Desde logo, e conforme se demonstrou, é na Coreia do Sul que têm lugar as operações produtivas suscetíveis de configurar operações de transformação e complemento de fabrico substanciais.
14. A jurisprudência do TJUE tem ajudado na tarefa de densificação deste requisito, dizendo que uma operação de transformação ou complemento será substancial se o produto resultante apresentar propriedades e uma composição específica próprias, que não possuía antes dessa transformação ou operação de complemento de fabrico.
15. Este é, evidentemente, o caso dos autos: os produtos, expedidos da China com destino à Coreia, apresentam-se num estado bruto, rudimentar e tosco, sendo depois submetidos nesse último país a operações de transformação e complemento de fabrico que lhe conferem as propriedades e a composição específica próprias que, seguramente, não possuía até então.
16. Assim, e em função da substancialidade daquelas operações ocorridas na Coreia do Sul, não se poderá duvidar do que se acaba de referir.
17. E, se dúvidas restassem quanto a isto, o INEGI, no seu parecer técnico e verdadeiramente imparcial, tratou de as dissipar, pois que enfatizou, e bem, a relevância das operações ocorridas na Coreia do Sul (em especial a granalhagem, a rebarbagem, a sujeição a controle dimensionais e resistência mecânica e a pintura à base de resinas de poliuretano).
18. Do mesmo modo, no caso em apreço, é possível descortinar, em termos claros e inequívocos, a existência de uma “distinção real e objetiva”, nos termos referidos pelo TJUE,
19. Bem como do aumento sensível do valor comercial à saída da fábrica.
20. Com efeito, o contributo produtivo ocorrido na Coreia do Sul representa, no preço final à saída da fábrica, um valor acrescentado situado entre os 30% e os 40% (facto confirmado pelo fornecedor das mercadorias, posteriormente reconhecido pelas autoridades aduaneiras portuguesas).
21. Por outro lado, também não se pode duvidar da verificação, no caso concreto, do requisito da operação economicamente justificada, tese essa também alegada pela aqui Recorrida.
22. Muito se estranha este tipo de entendimento quando é o Manual das Regras de origem da Direção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo que afirma que “na prática, todos os processos de fabrico são economicamente justificados”.
23. Adicionalmente, o alegado intuito da Recorrente em iludir as autoridades aduaneiras tendo em vista o não pagamento dos direitos anti dumping sempre constitui uma leviana e inaceitável imputação por parte da aqui Recorrida.
24. Tal presunção sempre decairia pelo facto de estar preenchido o pressuposto da operação economicamente justificada, mas também nunca faria sentido aquela imputação por força das informações obtidas junto das autoridades sul coreanas a respeito da atividade levada a cabo pelo fornecedor da aqui Recorrente.
25. Mas, mais grave do que isso, é o facto de a Recorrida não provar as infundadas afirmações a este respeito e o facto de o Tribunal recorrido ignorar em toda a linha a justificação técnica e económica das operações ocorridas na Coreia do Sul (largamente explicitadas no parecer do INEGI junto aos autos).
26. Por fim, também não se ousará duvidar de que o requisito “resulte na obtenção de um produto novo ou represente uma fase importante do fabrico” está devidamente preenchido.
27. Com efeito, e sem prejuízo do reconhecimento de que das etapas produtivas...

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