Acórdão nº 03545/14.1BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29-11-2023

Data de Julgamento29 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão03545/14.1BEPRT
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1.1. A Fazenda Pública interpõe recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A..., Lda., e determinou a anulação das liquidações de IRC e juros compensatórios dos exercícios de 2010 e 2011, no valor global de € 37.756,40, bem como reconheceu à Impugnante o direito ao reembolso do imposto já pago acrescido de juros indemnizatórios devidos, concluindo da seguinte forma as suas alegações de recurso:
«A- Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial e determinou a anulação das liquidações de IRC e juros compensatórios dos exercícios de 2010 e 2011 no valor global de € 37.756,40, bem como reconhecer à impugnante o direito ao reembolso do imposto já pago acrescido de juros indemnizatórios devidos.
B- Salvaguardando melhor e mais visado entendimento, a matéria do presente recurso, o thema decidendum de que depende o respetivo mérito, é exclusivamente jurídica e reconduz-se à concreta questão da interpretação e aplicação do regime consagrado no artigo 69º do CIRC (na redação em vigor à data dos factos) a saber: Se pelo facto de uma sociedade incluída pela sociedade dominante no perímetro de tributação através do regime especial de tributação dos grupos de sociedades não reunir os requisitos necessários para tal inclusão, tal determinará automaticamente a cessação de aplicação desse regime de tributação relativamente às restantes sociedades incluídas no perímetro de tributação, e ainda que se verifiquem os pressupostos de aplicação desse regime especial de tributação quanto às demais sociedades.
C- Os atos de liquidação adicional de IRC que constituem o objeto dos presentes autos, foram emitidos no seguimento de inspeção tributária, interna e parcial com incidência em IRC, credenciada pelas ordens de serviço nºs ...19 e ...20, com referência aos exercícios de 2010 e 2011, que culminou com a elaboração dos respetivos documentos de correção única (DUC) para efeitos de emissão das competentes declarações de rendimentos de IRC, Modelo 22.
D- O fundamento prende-se com a determinação da cessação da aplicação do RETGS a todas as empresas que integram o perímetro fiscal do grupo B..., com efeitos a partir de 31/12/2009, nos termos da alínea a) do nº 8 e alínea c) do nº 9, ambos do artigo 69º do CIRC.
E- Este entendimento encontra-se vertido nas informações nº ...12 (processo nº 2189/12) de 21/06/2012 e nº 2313/13 (processo nº 39/2013) de 04/11/2013, proferidas pela Divisão de Conceção da Direção de Serviços de IRC, nas quais foi decidido que a inclusão indevida, nos exercícios de 2010 e 2011, da sociedade C..., S.A. (de ora em diante designada de C...) no perímetro fiscal do grupo de sociedades, dominado pela B..., S.A. (em diante designada por B...), abrangido pelo RETGS, determinava a cessação da aplicação daquele regime especial a todas as empresas que integravam o grupo, com referência aos períodos em causa, assim como no Parecer do Centro de Estudos Fiscais (CEF).
F- A sociedade C... fez parte do perímetro do Grupo em 2010 e 2011, mas de forma indevida, uma vez que à data de 01/01/2010 a participação da sociedade dominante B..., no capital daquela sociedade, era inferior a 90%, sendo 59,60% e, cumulativamente, não detinha, na sociedade dominada a sua participação há mais de um ano, com referência à data em que fez iniciar a aplicação do RETGS.
G- A B... (sociedade dominante) apenas passou a deter mais de 90% do capital social da C... (91,92%) em 19/02/2010, pelo que a detenção da participação por mais de um ano ocorreria em 19/02/2011, sendo de aplicar o regime a partir de 01/01/2012.
H- De acordo com a alínea a) do nº 8 do artigo 69º do CIRC, sem prejuízo do estipulado suas alíneas d) e e) o RETGS cessa a sua aplicação ao grupo quando deixe de se verificar algum dos requisitos referidos nos nºs 2 e 3 desse normativo legal pelo que, a impugnante, inserida no perímetro fiscal do Grupo B..., viu cessada a aplicação do RETGS a partir de 31/12/2009. I- A aplicação do RETGS inicia-se no primeiro dia de tributação, que, no caso em apreço, coincide com ao ano civil ou seja 01/01/2012, primeiro período de tributação após 19/02/2011, pelo que só a partir deste exercício é que a C... poderia integrar o Grupo B..., com a aplicação do referido regime para efeitos de determinação da matéria coletável em relação a todas as sociedades do Grupo
J- A fusão, por incorporação da E… na C..., em 14/01/2010, com efeitos jurídicos a retroagir a 01/01/2010 não altera a data a partir da qual esta última sociedade pode passar a integrar o perímetro do Grupo para efeitos de tributação pelo regime especial de tributação definido no artigo 69º do CIRC.
K- As condições de acesso ao RETGS são rigorosas e exigentes, pois trata-se de um regime optativo (conforme resulta do nº 1 do artigo 69º e artigos 70º e 71º do CIRC), que tem como finalidade simplificar, e até beneficiar os grupos de sociedade.
L- O RETGS tem como finalidade a tributação dos grupos como se tratando de uma unidade económica, contudo, nos termos do nº 2 do artigo 69º do CIRC dita como condições de acesso, que para que exista um grupo de sociedades é necessário que a sociedade dominante detenha direta ou indiretamente, pelo menos, 90% do capital social de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira 50% dos direitos de voto.
M- O nº 3 do artigo 69º do CIRC estabelece requisitos cumulativos para a existência de um grupo de sociedades que pretenda beneficiar do RETGS, destacando-se a alínea b) que impõe que a sociedade dominante detenha participação na sociedade dominada há mais de um ano com referência à data em que se inicia a aplicação do regime, não podendo fazer parte do grupo as sociedades que no inicio ou durante a aplicação do regime não se encontrem nas situações aí elencadas.
N- O nº 5 do artigo 69º do CIRC dita que “o requisito temporal referido na alínea b) do nº 3 não é aplicável quando se trate de sociedades constituídas pela sociedade dominante há menos de um ano, sendo irrelevante para a contagem daquele prazo, bem como do previsto na alínea c) do nº 4, nos casos em que a participação tiver sido adquirida no âmbito de processo de fusão, cisão ou entrada de activos, o período durante o qual a participação tiver permanecido na titularidade das sociedades fundidas, cindidas ou da sociedade contribuidora, respetivamente.”
O- Contudo, a segunda parte do nº 5 do artigo 69º do CIRC consagra ainda outra regra para o caso das sociedades em que a participação tiver sido adquirida no âmbito de um processo de cisão, fusão ou entrada de ativos, sendo nestes casos relevante para o prazo referido na alínea c) do nº 3 o período durante o qual a participação tiver permanecido na titularidade das sociedades fundidas, cindidas ou sociedade contribuidora.
P- O nº 8 do artigo 69º do CIRC estatuí as condições de cessação de aplicação do RETGS ao grupo, realçando-se as alíneas d) e e) quando ocorram alterações na composição do grupo, respetivamente, por entradas e saídas de sociedades, sem que tenha sido efetuada a respetiva comunicação nos termos e prazos previstos no nº 7 do mesmo normativo legal.
Q- A expressão “deixe de se verificar alguns dos requisitos referidos nos números 2 e 3” utilizada na alínea a) do nº 8 do artigo 69º do CIRC deve ser interpretada como respeitando ao grupo de sociedades no seu conjunto, ou seja, o legislador terá pretendido estabelecer a cessação do grupo sempre que este grupo deixe de verificar alguma das condições previstas nos nºs 2 e 3.
R- Caso assim não fosse o legislador teria previsto a consequência de cessação do grupo naos casos em que, por exemplo, não se verifique a inclusão de uma sociedade que satisfizesse os requisitos para integra o grupo (cfr. alínea d) do nº 8) ou a exclusão de uma sociedade que deixasse de verificar algum dos requisitos (cfr. alínea e) do nº 8) mas não no caso em que se verifique a inclusão de uma sociedade que ab initio não satisfizesse alguns dos requisitos exigidos para pertencer ao grupo.
S- No caso dos presentes autos, com a inclusão da C... o grupo deixou de verificar, relativamente a uma das entidades nele incluídas a condição estabelecida na alínea b) do nº 3 do artigo 69º do CIRC.
T- As normas previstas no CIRC, aqui em apreço, têm caráter imperativo pelo que encontrando se a AT sujeita ao princípio da legalidade, nos termos dos artigos 266º, nº 2 da CRP, 8º da LGT e 3º, nº 1 do CPPT, no que tange à aplicação das normas imperativas, está-lhe vedada qualquer aplicação discricionária, o que implica que verifique, objetivamente, os requisitos de aplicação da norma, o que fez in casu pois aplicou cabalmente a lei e decidiu em conformidade com a mesma. (neste sentido decisões do CAAD nº 10/2017-T e nº 439/2017-T)
U- Não se encontrando verificados os requisitos legais, não se poderia conceber, contra normas imperativas, a desaplicação da respetiva sanção (cessação do grupo), pois o legislador fiscal determinou regras claras e objetivas para a cessação da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, como as que constam do artigo 69º, nºs 4, 8 e 9 do CIRC.
V- A Sociedade C... foi efetivamente integrada no perímetro fiscal do grupo pela Sociedade dominante B..., por opção, desde logo para o exercício de 2010, apesar de não reunir as condições exigidas para tal inclusão, beneficiou nos exercícios de 2010 e 2011 da vantagem da tributação conjunta em detrimento do regime geral, e só após a sua inclusão é que a Sociedade dominante B... solicitou esclarecimentos à DSIRC a fim de aferir se tal inclusão se afigurava, ou não, correta.
W- Destarte, a Sociedade B... ao incluir no seu...

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