Acórdão nº 03041/19.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13-04-2023

Data de Julgamento13 Abril 2023
Ano2023
Número Acordão03041/19.9BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório
«AA», inconformado com a sentença proferida em 2021-05-04 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a impugnação judicial que interpôs tendo por objeto do indeferimento do recurso hierárquico interposto do indeferimento do pedido de revisão oficiosa da liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) referente ao ano de 2006, no montante de EUR 37.567,46, vem dela interpor o presente recurso.
O Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES:
A) O presente recurso tem por objeto a sentença proferida pelo Tribunal a quo, da qual as Recorrentes foram notificadas em 07.05.2021, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida do ato tributário de IRS, relativo ao ano de 2006, no valor de € 5.881,92;
B) O recurso é tempestivo, porquanto o prazo de 30 dias previsto no artigo 282.º, n.ºs 1 e 2 do CPPT suspendeu-se, nos termos do artigo 270.º, n.º 1 do CPC aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, com o requerimento de habilitação de herdeiros apresentado em 04.06.2021, o qual foi admitido por despacho notificado às Recorrentes em 17.09.2021;
C) Entendeu o Tribunal a quo que não merece censura a decisão da AT, uma vez que a situação do contribuinte não preencherá um dos requisitos de que depende a revisão oficiosa dos atos tributários nos termos do artigo 78.º, n.º 4 da LGT, dado que o lapso se terá ficado a dever a negligência do contribuinte, o que afastaria a revisão excecional do ato com tal fundamento;
D) Andou mal o Tribunal a quo ao ter decidido nesse sentido;
E) Mesmo entendendo o Tribunal a quo, como entendeu, não estarem verificados os requisitos de que dependia a revisão do ato tributário por injustiça grave e notória, nos termos do artigo 78.º, n.ºs 4 e 5 da LGT, deveria ter anulado o ato tributário de IRS de 2006 nos termos do artigo 78.º, n.º 1 da LGT, por não ter o mesmo considerado a condição de incapacidade permanente do Impugnante, o que resultou na liquidação de imposto a mais no valor de € 5.881,92;
F) A incapacidade permanente do Impugnante à data dos factos, bem como a circunstância de a mesma ter sido declarada para efeitos de IRS em anos anteriores, constam provadas nos autos e não foram contestadas pela Fazenda Pública;
G) Realce-se: estando a atividade da AT, de liquidação de impostos, subordinada ao princípio da legalidade nos termos do artigo 266.º, n.º 2 da CRP, o facto de a norma de incidência de IRS que previa especificamente os termos da tributação de rendimentos auferidos sujeitos passivos deficientes com incapacidade permanente, como era o caso do Impugnante, não ter sido aplicada, configura uma situação ilegal, ferindo de ilegalidade o ato tributário que a concretiza e que se discute nos presentes autos;
H) Manter o ato tributário sob discussão significa manter um entendimento materialmente inconstitucional por violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 266.º, n.º 2 da CRP;
I) Significa, ainda, manter um entendimento contrário ao disposto no artigo 1.º, 1.º parágrafo do Protocolo Adicional à CEDH, de acordo com o qual qualquer pessoa singular ou coletiva tem direito ao respeito dos seus bens e ninguém pode ser privado do que é sua propriedade a não ser por utilidade pública e nas condições previstas pela lei e pelos princípios gerais do direito internacional;
J) Deveria a AT ter anulado o ato tributário sob discussão nos presentes autos porquanto, (i) estando em causa uma incapacidade permanente, (ii) da qual a AT tinha já conhecimento, (iii) por ter sido a mesma declarada para efeitos de IRS pelo Impugnante, a única forma de sanar a violação do princípio da colaboração consagrados no artigo 59.º, n.ºs 1 e 3, alínea c) da LGT resultante da ausência de um alerta para a ausência de indicação daquela condição aquando da submissão da declaração Modelo 3 de IRS, seria através da anulação do ato em causa por erro imputável aos serviços nos termos do artigo 78.º, n.º 1 da LGT;
K) Não tendo a AT anulado o ato com esse fundamento, deveria o Tribunal a quo ter determinado a anulação do ato tributário sob discussão nos termos do artigo 78.º, n.º 1 da LGT, porquanto, não obstante ter sido o pedido de revisão oficiosa formulado com base na existência de injustiça grave e notória nos termos do artigo 78.º, n.ºs 4 e 5 da LGT, o Tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cfr. artigo 5.º, n.º 3 do CPC aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT);
L) Não tendo sido esse o sentido da decisão do Tribunal a quo, incorreu o mesmo em erro de julgamento que inquina a Sentença recorrida, a qual deve ser revogada e substituída por Acórdão que anule o ato tributário em discussão, com as demais consequências legais;
M) Há alguns factos que resultam comprovados nos autos, documentalmente, que não foram contestados pela Fazenda Pública e que são fundamentais para que o Tribunal a quo pudesse ter decidido e o Tribunal de recurso possa ainda decidir no sentido da anulação do ato tributário sob discussão, à luz do disposto no artigo 78.º, n.º 1 da LGT;
N) Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) e b) do CPC aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, deve o Tribunal de recurso aditar à matéria de facto dada como provada, os seguintes factos com base nos meios probatórios indicados quanto a cada um:
(i) o Impugnante era, em 2006, deficiente, possuindo uma incapacidade permanente de 60% – cfr. documentos juntos ao pedido de revisão oficiosa e decisão de indeferimento do referido pedido, ambos integrando o processo administrativo;
(ii) O Impugnante apresentava, desde pelo 2001, deficiência, possuindo atestado médico emitido em 2004 que confirmava uma situação de incapacidade permanente – cfr. documentos juntos ao pedido de revisão oficiosa que integra o processo administrativo;
(iii) Essa incapacidade permanente havia sido já declarada pelo Impugnante na declaração modelo 3 de IRS dos anos e 2004 e 2005 – facto invocado no artigo 11.º da petição inicial e não contestado pela Fazenda nos autos;
(iv) O sistema informático da AT não emitia, em 2006, qualquer alerta relativamente a situações de incapacidade permanente que tivessem já sido declaradas em anos anteriores – facto invocado no artigo 14.º da petição inicial e não contestado pela Fazenda Pública.
O) A aplicação da lei aos factos acima descritos, considerados conjuntamente com aqueles já constantes da matéria de facto dada como provada, terá de passar pela anulação do ato tributário sob discussão por erro imputável aos serviços, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 78.º, n.º 1 da LGT, porquanto:
a. em causa está um ato tributário de IRS de 2006 que desconsiderou, para efeitos de incidência de imposto e determinação da base tributável, a condição de incapacidade permanente do Impugnante;
b. tal incapacidade havia já ido declarada e, por conseguinte, era do conhecimento da AT;
c. não obstante, no momento em que o Impugnante submeteu a declaração modelo 3 de IRS, nenhum alerta foi emitido pelo sistema informático da AT (diferentemente do que sucedia, por exemplo, quanto a valores de rendimentos declarados por contraponto aos rendimentos conhecidos da AT), em desrespeito pelo princípio da colaboração consagrado no artigo 59.º, n.ºs 1 e 3, alínea c) da LGT.

Termina pedindo:
Nestes termos e nos mais de Direito, se requer a V. Exa. se digne admitir o presente recurso e julgá-lo procedente, por provado, revogando a sentença recorrida e substituindo-a por Acórdão que anule o ato tributário de IRS de 2006, nos termos e com os fundamentos acima mais bem identificados, com as demais consequências legais.
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M.º Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso
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Os vistos foram dispensados com a prévia concordância dos Ex.mos Juízes Desembargadores-Adjuntos, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 657.º do CPC, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT.
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Questões a decidir no recurso
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações de recurso.
Assim sendo, importa apreciar se a sentença sob recurso padece dos erros de julgamento de facto e de direito que lhe são imputados pelo Recorrente, por não ter fixado factos pertinentes para a solução do litígio, e por não ter feito uma correta interpretação e aplicação ao caso concreto do disposto no art. 78.º da LGT.

II. Fundamentação
II.1. Fundamentação de facto
Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz:
III. FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – De facto
Dos elementos existentes nos autos, apurou-se a seguinte factualidade:
1. O Impugnante apresentou em 23/05/2007, a declaração de rendimentos anual Modelo 3 referente ao IRS do ano de 2006 – cfr. o doc. 1 junto com a p.i..
2. Nessa declaração, o Impugnante não assinalou no quadro 3-A do rosto da declaração, a sua condição de deficiente – cfr. o doc. 1 junto com a p.i..
3. Tal declaração de rendimentos teve como consequência a liquidação de IRS n.º ...33, de 26/07/2007, da mesma resultando o valor a pagar de € 37.567,46 – cfr. o doc. 4 junto com a p.i..
4. O Impugnante apenas veio a constatar a omissão referida em 2), quando a AT lhe exigiu o comprovativo da deficiência declarada para o ano fiscal de 2007 – facto admitido por acordo.
5. De acordo com a simulação efetuada no Portal das Finanças, se o Impugnante tivesse assinalado no campo próprio da declaração de rendimentos, a sua condição de...

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