Acórdão nº 0301/23.0BEFUN de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10-04-2024

Data de Julgamento10 Abril 2024
Número Acordão0301/23.0BEFUN
Ano2024
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
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Processo n.º 301/23.0BEFUN (Recurso Jurisdicional)



Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

“A... LDA ZONA FRANCA DA MADEIRA”, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, datada de 21-12-2023, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida no presente processo de RECLAMAÇÃO relacionado com o acto de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

A. O presente recurso tem por objeto a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, que decidiu pela improcedência da reclamação judicial deduzida pela ora Recorrente, nos termos e para os efeitos do artigo 276.º e seguintes do CPPT, da decisão do órgão de execução fiscal, de não aplicação in totum das regras de natureza processual tributária aplicáveis no âmbito do processo de execução fiscal, em razão da natureza da dívida em causa no processo de execução fiscal n.º ...69, de 2014, no montante de € 1.161.584,46, acrescido de custas processuais e encargos no montante de € 3.937,78, totalizando a quantia de € 1.165.522,24, no âmbito do processo de recuperação dos auxílios de Estado concedidos a empresas da Zona Franca da Madeira,
B. e deve ter subida imediata nos próprios autos para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, por respeitar exclusivamente a matéria de direito (artigos 280.º, n.º 1 e 286.º, n.º 1 do CPPT) e com efeito suspensivo (artigos 278.º, n.º 3 e 6 e 286.º, n.º 2 do CPPT).
C. A Sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto à identificação do objeto e das questões ou causas de pedir;
D. De facto, entendeu a Sentença recorrida que o objeto da reclamação judicial deduzida pela Recorrente é o teor do ato de citação para o processo de execução fiscal acima identificado, e os respetivos vícios que lhe são imputáveis.
E. Em função de tal perceção (errónea) do objeto da reclamação, concluiu pela improcedência da presente reclamação (ainda que não com fundamento na procedência da exceção do erro na forma do processo).
F. Contudo, salvo o devido respeito, que é muito, o ato de citação (e a violação das respetivas formalidades legais) não é o objeto da reclamação judicial aqui em causa.
G. O objeto da reclamação judicial em causa é a decisão administrativa em matéria fiscal - de aplicação apenas parcial das regras de processo tributário a um procedimento de recuperação de auxílios, em razão da alegada natureza da dívida exequenda - decisão que se encontra exteriorizada na citação para o referido processo de execução fiscal
H. Com efeito, do conteúdo da citação é possível inferir que o órgão de execução fiscal tomou a decisão deliberada de aplicar o processo de execução fiscal à recuperação de auxílios de Estado (de resto, sem habilitação legal) de modo fragmentado, desaplicando, em concreto, as regras que prevêem a possibilidade de pagamento da dívida em prestações e suspensão do processo mediante a constituição de garantia idónea ou a sua dispensa -, alegando, sem concretizar, a natureza e as características da dívida.
I. A indicação de que a supressão de determinadas garantias decorre “da natureza e características da dívida” corresponde a uma fundamentação manifestamente insuficiente de um ato administrativo, como é defendido pelo Exmo. Representante do Ministério Público.
J. Não está, assim, em causa a sindicância do ato de citação enquanto ato eminentemente informativo, mas antes do ato administrativo prévio que determinou a elaboração dos atos de citação nos termos em que o foram.
K. No caso concreto, os vícios formais da citação mais não são do que a decorrência da execução da decisão administrativa que lhes serve de base: a não concessão de possibilidade de suspensão da execução não decorre de um lapso ou incorreção da citação, que, pela sua incompletude ponha em causa o direito à informação do contribuinte sobre os seus direitos e garantias processuais, mas sim o resultado da convicção da AT de que as regras do processo tributário são aplicáveis à recuperação do auxílio mas apenas na medida em que, na sua interpretação, não ponham em causa o principio da efetividade da decisão de recuperação do auxilio, revelando assim todo um esforço hermenêutico que necessita ser escrutinado.
L. Ao contrário do que entende o Tribunal a quo, no requerimento de arguição de nulidades da citação apenas podem ser invocados os vícios formais da citação, decorrentes da falta dos requisitos prescritos pela lei, mas não o mérito das decisões administrativas que lhe subjazem, sendo essa a razão que conduziu a Recorrente a apresentar a reclamação judicial em apreço.
M. No presente caso, dúvidas não subsistem que não está apenas em causa a violação das formalidades da citação, mas antes a execução de uma decisão da AT tomada em função da natureza e características da dívida, decisão essa que não pode deixar de ser escrutinada pelo Tribunal.
N. Na verdade, ou a AT considera que está a executar um imposto e tem de o fazer nos termos das normas de processo tributário aplicáveis in totum,
O. ou entende que a dívida em execução não tem a natureza de imposto e aplica as regras que se mostrem apropriadas a esse efeito e que legitimam a sua atuação, identificando-as para que o contribuinte possa exercer, de forma efetiva, os seus direitos.
P. O que a AT não pode fazer é aplicar parcialmente um regime processual, que foi concebido como um conjunto coerente de direitos e deveres, com base em critérios que não se conhecem e sem indicação de qualquer base legal.
Q. Deste modo, a Recorrente não pode concordar com tal decisão administrativa, pois - tal como mais bem explicitado na reclamação judicial deduzida -, a mesma padece de (i) vício de falta de fundamentação, não sendo inteligível qual a motivação e base legal para considerar derrogadas as disposições legais constantes dos artigos 163.º, 169.º, 189.º, 190.º, 196.º, 200.º do CPPT e artigo 52.º da LGT, e, ainda, de (ii) ilegalidade por violação de lei, em concreto, dos mencionados artigos.
R. Ora, esta decisão de desaplicação de parte da legislação processual tributária não se confunde com a citação, sendo antes a citação, nos termos em que foi efetuada, o mero ato informativo que atesta a existência de uma decisão administrativa previamente tomada e não notificada ou fundamentada.
S. Assim sendo, estamos perante uma decisão da AT, proferida no âmbito de um processo de execução fiscal, que é contestável por meio da reclamação judicial prevista no artigo 276.º e seguintes do CPPT.
T. Nos termos do artigo 276.º do CPPT, as decisões proferidas pelo órgão de execução fiscal que, no processo, afetem os direitos e interesses legítimos do executado ou de...

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