Acórdão nº 02580/18.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 10-02-2023

Data de Julgamento10 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão02580/18.5BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:

AA (Rua ..., ..., ... ...), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto – Juízo Administrativo Social, o qual julgou improcedente acção administrativa intentada contra o Ministério de Justiça (Praça ..., ... ...), reagindo contra despacho da Senhora Ministra da Justiça, de 10-07-2018, que confirmou despacho do Diretor Nacional Adjunto da Polícia Judiciária que considerou cessado o procedimento concursal, aberto em 2009, para 10 lugares de coordenador de investigação criminal, peticionando a final que “em consequência da invalidade do despacho impugnado, deve o Ministério demandado ser condenado, reconhecendo tal invalidade, e em consequência desse reconhecimento, na prática de acto administrativo que defira a pretensão do autor de modo a este poder retomar o procedimento concursal em referência, por forma a preencher a final uma das vagas submetidas a seleção”.

Conclui:

1. O Autor, que integra a carreira de investigação criminal desde 16 de novembro de 1996, veio a juízo enquanto Inspetor da Polícia Judiciária e concorrente no procedimento concursal aberto em 07/12/2009 para Coordenador de Investigação Criminal (CIC), onde se havia submetido com sucesso à prova escrita de conhecimentos.
2. Ficou a aguardar a aplicação dos métodos de seleção seguintes, a saber, a prova oral e avaliação curricular, que não chegaram a acontecer em virtude de o Ministério das Finanças e da Administração Pública ter publicado o Despacho n.º ...10, de 7 de outubro, onde se determinava que os procedimentos em curso deveriam “cessar”, “nos termos legais aplicáveis, designadamente quando ainda não tenha havido lugar à notificação dos interessados do ato de homologação da lista de classificação ou ordenação final...”.
3. Meros dois meses depois, em 31/12/2010 foi publicada a Lei n.º 55-A/2010, que aprovou o Orçamento de Estado para 2011, lei de valor reforçado, na qual se estabelece que “são suspensos todos os procedimentos concursais ou concursos pendentes ... desde que ainda não tenha havido lugar à notificação dos interessados do ato de homologação da lista de classificação ou ordenação final...”.
4. Como se percebe, exatamente a mesma ratio e a mesma ponderação dos interesses públicos económicos e financeiros e os direitos adquiridos com a homologação da lista de classificação final.
5. Dois anos depois, os procedimentos deixaram de estar “suspensos”, a partir da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro (LOE 2013), que veio possibilitar a abertura de procedimentos concursais em determinadas situações (da PJ, por exemplo), mediante prévio despacho favorável conjunto do Ministro das Finanças e do Ministro da Justiça.
6. Esta sucessão normativa obrigava a uma interpretação consentânea, designadamente do Despacho n.º ...10, de 7 de outubro, pois a LOE 2011 determinava apenas a suspensão, e não cessação, dos procedimentos.
7. Daí que o Autor, aqui recorrente, tenha vindo a juízo pugnar pela correta interpretação normativa e, em consequência, ser declarada a invalidade do despacho impugnado e, por conseguinte, ser condenado o Réu à prática do ato administrativo que defira a pretensão do autor de modo a retomar o procedimento concursal e preencher a final uma das vagas submetidas a seleção.
8. São estas as pretensões formuladas na P.I. e, como tal, é este o objeto do processo.
9. Porém, s.m.o., a sentença recorrida não se pronuncia propriamente sobre tais pretensões, para além de aplicar erroneamente a Lei, numa Injustiça que se pretende corrigir.
10. Efetivamente, compulsada a douta sentença judicial, parece não ter sido propriamente esta a causa decidida, subvertendo as precedências de análise, num claro erro de apreciação que a inquina.
11. Na verdade, a sentença não se pronuncia sobre a invalidade do ato recorrido, optando antes, como expressamente nela identificado nas “Questões a Decidir”, por “aferir do direito do Autor à reabertura do procedimento concursal interno de acesso limitado para preenchimento de 10 postos de trabalho do mapa de pessoal da Polícia Judiciária, da categoria de coordenador de investigação criminal, escalão 1, da carreira de investigação criminal...
12. Contudo, a providência a conceder pelo Juiz era, por um lado, a invalidade do ato impugnado e, apenas como consequência, a condenação à prática do ato administrativo que defira a pretensão do autor de modo a retomar o procedimento concursal e preencher a final uma das vagas submetidas a seleção.
13. Nos termos legais, o Senhor Juiz deve conhecer de todos os vícios alegados, pode identificar novos vícios que determinem a anulação ou nulidade do ato, e pode, ainda, à luz do artigo 5.º do CPC, ex vi artigo 1.º do CPTA, efetuar uma qualificação jurídica diversa dos factos que foram alegados.
14. É que, conforme o n.º 3 deste artigo 5.º do CPC, “O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito”, mas foi exatamente o que fez, subvertendo a análise que lhe foi solicitada no caso concreto, num claro erro de apreciação que inquina a douta sentença recorrida.
15. A pretensão do Autor era claramente impugnatória - invalidade do despacho impugnado – e, em função dessa invalidade, deveria considerar-se o “seu procedimento” apenas suspenso, em função do que se pedia a condenação à prática do ato administrativo que defira a pretensão do autor de modo a retomar o procedimento concursal e preencher a final uma das vagas submetidas a seleção.
16. É esta a pretensão formulada pelo Autor, pelo que, era absolutamente fundamental atender ao Despacho n.º ...10, de 7 de outubro, e à Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro que aprovou o Orçamento de Estado para 2011, para se perceber se os procedimentos concursais ou concursos pendentes se encontravam suspensos ou, antes, cessados.
17. São meros 2 meses de diferença entre estes normativos, o que demonstra, como referido, que naquele Despacho e Lei está subjacente, exatamente, a mesma ratio, pelo que o ato impugnado deveria ter contrariado o Parecer da DGAEP, que é facultativo e não obrigatório, considerando que, efetivamente, a interpretação correta era a da suspensão do procedimento de 2009.
18. Daí a invalidade do ato impugnado.
19. Estranhamente a sentença recorrida nem sequer analise este trajeto cognitivo da pretensão do Autor, o que, não chegando propriamente a consubstanciar uma nulidade da sentença por omissão de pronúncia (prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC), não pode deixar de configurar manifesto erro de apreciação.
20. Desta forma, o que a sentença recorrida deveria ter aferido, não era o direito do autor, mas sim a invalidade do ato, o que passava obrigatoriamente pela interpretação normativa, nos termos expostos, o que significa que a principal questão ficou por analisar: interpretar o Despacho e a Lei, que distam 2 meses entre si, e perceber se o procedimento de 2009 se deve considerar “cessado” ou apenas “suspenso”.
21. Para além deste erro de apreciação, com todo o respeito, julga-se, ainda, que a sentença recorrida também aplica mal o Direito.
22. Lançando mão do princípio da razoabilidade e da ideia de Direito e de Justiça que estão sempre subjacentes a uma correta interpretação normativa, deve afastar-se uma primeira interpretação: se pelo Despacho n.º ...10, de 7 de outubro, deveriam estar cessados os procedimentos concursais, 2 meses depois, à data da publicação da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro não deveriam existir procedimentos concursais abertos e em curso...
23. Portanto, nesta medida, a norma da LOE 2011 era inócua, desnecessária e um non sense jurídico, pelo que, obviamente, não pode ser esta a interpretação normativa.
24. Então, uma segunda hipótese: os procedimentos que se mantiveram por incumprimento do Despacho n.º ...10, de 7 de outubro, casos em que as entidades competentes não determinaram a “cessação” dos mesmos, conforme aí imposto, teriam agora, antes, de ser suspensos à luz da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, o que, obviamente, é uma solução claramente afastada pelo Direito, porquanto consubstanciaria um intolerável benefício do infrator, para além de tratar diferente aquilo que é ou deveria ser igual.
25. Resta uma terceira hipótese: os procedimentos em curso aquando do Despacho n.º ...10, de 7 de outubro teriam de se considerar suspensos, nos termos (eram os mesmos, recorde-se) da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, para que todos os atos de seleção que tivessem sido praticados (e havia a prova escrita com notação) pudessem mais tarde, quando houvesse condições económico-financeiras, ser aproveitados e os concursos pudessem ser reativados, para preenchimento das necessidades públicas, salvo se o dirigente máximo os cessasse, o que nunca ocorreu após a publicação da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro.
26. Esta a única interpretação plausível e consentânea com uma ideia de Direito, Justiça, razoabilidade e tratamento igual.
27. Como tal, o ato impugnado fez errada interpretação da Lei, com a consequência requerida expressamente pelo Autor: invalidade do despacho impugnado, reconhecimento de que o procedimento se encontra suspenso e, em consequência, condenação à prática do ato administrativo que defira a pretensão do autor de modo a retomar o procedimento concursal e preencher a final uma das vagas submetidas a seleção.
28. Era este o caminho crítico que o Exmo. Senhor a quo teria de seguir, se se permite a ousadia, pelo que a sentença recorrida está ferida erro de apreciação e, ao não interpretar “a lei” como tendo previsto apenas a mera suspensão do procedimento concursal (in casu, aberto em 2009), erro de julgamento, na modalidade de errada aplicação do Direito.
29. Termos em que deve ser “corrigida”.

Contra-alegou o réu, concluindo:

A. Bem...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT