Acórdão nº 02574/15.2BEALM de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10-11-2022

Data de Julgamento10 Novembro 2022
Ano2022
Número Acordão02574/15.2BEALM
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (1 SECÇÃO)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:





A……………….., devidamente identificada nos autos, intentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada, contra o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas – IP (doravante IFAP), acção administrativa especial para impugnação do despacho, de 20/4/2015, do Presidente do Conselho Directivo deste Instituto, que determinou que ele procedesse à reposição da quantia de € 2.839,81, relativa ao “prémio por ovelha e cabra” do ano de 2010 que recebera indevidamente.

Por sentença datada de 27 de Junho de 2018, foi essa acção julgada procedente, anulando-se o despacho impugnado.

O IFAP recorreu desta decisão para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) que concedeu provimento ao recurso e revogou a sentença recorrida.

Do acórdão do TCAS o A. interpôs, para este STA, recurso de revista, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões:
I - É entendimento do A. que o presente recurso de revista excepcional está a coberto dos pressupostos para a sua admissão, como impõe o n.º 1 do artigo 150.º do CPTA.
II - O Tribunal de primeira instância aplicou aos factos constantes do probatório o artigo 3.º do Regulamento n.º 2988/95, do Conselho, de 18 de Dezembro, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidade Europeias que dispõe:
«1. O prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no n.º 1 do artigo 1.º. Todavia, as regulamentações sectoriais podem prever um prazo mais reduzido, que não pode ser inferior a 3 anos.
O prazo de prescrição relativo às irregularidades continuadas ou repetidas corre desde o dia em que cessou a irregularidade. O prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa.
A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção.
Todavia, a prescrição tem lugar o mais tardar na data em que termina um prazo igual ao do dobro de prescrição sem que a autoridade competente tenha aplicado uma sanção, exceto nos casos em que o procedimento administrativo tenha sido suspenso em conformidade com o n.º 1 do artigo 6.º
2. O prazo de execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este prazo corre desde o dia em que a decisão se torna definitiva. Os casos de interrupção e suspensão são regidos pelas disposições pertinentes do direito nacional.
3. Os estados membros conservam a possibilidade de aplicar um prazo mais longo que os previstos respectivamente nos n.ºs 1 e 2»
III - O Tribunal de primeira instância considerou que se encontra prescrito o direito do IFAP de solicitar do A. A devolução das ajudas pagas no ano de 2010, considerando que a quantia exigida ao Autor diz respeito ao prémio por ovelha e cabra do ano de 2010 e que a infracção se reporta à falta de RED referente àquele ano, concluindo-se que quando o Autor foi notificado pela Entidade Demandada para exercer o direito de audiência prévia, em 06/04/2015, já se encontrava prescrito o direito da entidade Demandada exigir a restituição/reposição da ajuda, uma vez que já tinha terminado o prazo de 4 anos previsto no artigo 3.º n.º 1 do Regulamento (CE Euratom), nº 2988/95, do Conselho.“ (negrito nosso).
IV - Ademais, entendeu o Tribunal de primeira instância que o conhecimento do relatório de controlo sem que do mesmo se extraia a intenção de instruir ou instaurar procedimento por irregularidade não tem a virtualidade de interromper a contagem do referido prazo de prescrição de 4 anos.”
V - O douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul entendeu que o acto de transmitir ao autor o teor do relatório de controlo no qual se constata a existência de irregularidades, deve ser entendido para efeitos do parágrafo 2.º do n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento 2988/95, como um acto emanado da autoridade competente que tem em vista a instrução do procedimento por irregularidade e, com a faculdade de interromper a prescrição.
VI - Donde resulta, segundo a interpretação do TCAS, uma acção de controlo, nos moldes fixados em E) e F) do probatório tem efeito interruptor da prescrição, por entender ser um acto emanado da autoridade competente que tem em vista a instrução do procedimento por irregularidade, ao contrário do decidido em primeira instância que entendeu inexistir facto interruptor da prescrição porque do teor do referido relatório não se extrai que era intenção da Entidade Demandada instruir ou instaurar qualquer procedimento por se verifica uma irregularidade
VII - A matéria do controlo in loco em causa nos autos encontra-se materializada no REGULAMENTO (CE) N.º 1122/2009 DA COMISSÃO de 30 de Novembro de 2009, e veja-se a título exemplificativo o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo 0912/15 de 07/06/2018 do qual não resultou, salvo melhor opinião, que a acção de controlo tenha efeito interruptivo da prescrição.
VIII - Resulta do probatório em G) que só esta data – 06/04/2015 – foi dado cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo REGULAMENTO (CE) N.º 1122/2009 DA COMISSÃO de 30 de Novembro de 2009, não resultando data ou acto anterior, como susceptível de se considerar como “acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade, nos termos e para os efeitos previstos no parágrafo 2.º do n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento 2988/95.
IX - Ademais, não deve ser dado como provado o constante em F) do probatório por não constar do Relatório de Controlo menção a poderes de representação do Autor para que se dê como provado “…foi assinado pelo representante legal do Autor em 14/07/2011”.
X - O douto Acórdão do TCA/ SUL incorre em erro de julgamento quanto à interpretação e aplicação das normas comunitárias aplicáveis.
XI - Desaplica o direito, pois, não obstante referir que " o acto de transmitir ao autor o teor do relatório de controlo no qual se constata a existência de irregularidades, deve ser entendido para efeitos do parágrafo 2.º do n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento 2988/95, como um acto emanado da autoridade competente que tem em vista a instrução do procedimento por irregularidade e, teve a faculdade de interromper a prescrição, ignora o segmento da norma que determina “… tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade». (sublinhado nosso).”
XII - Enferma, assim, o douto acórdão em erro grosseiro de interpretação da norma e de não adequação dos factos ao plano abstrato da norma porque não aplica o 2.º parágrafo do artigo que cita, ignorando-o.
XIII - Com efeito, o Tribunal ao concluir pela interrupção da prescrição do procedimento nos termos do disposto no parágrafo 2.º do art. 3.º, n.º do Regulamento (CE, EURATOM) n.º 2988/95, não ponderou e não valorou o respetivo regime jurídico aplicável, pelo que o acórdão do TCA/SUL no que a esta questão se refere não pode ser mantido, justificando-se o presente recurso.
XIV - Por outro lado, a admissão do presente recurso assume a maior relevância jurídica, pois, a controvérsia e a decisão a tomar, é suscetível de extravasar os limites da situação singular em apreço, como aliás já sucede, pois, tem-se assistido a uma aplicação indiscriminada pelos Tribunais, da mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) sem atender à natureza concreta dos factos interruptivos da prescrição das ajudas bem como à circunstância de não se pronunciarem quanto ao regime a aplicar e ao que possa ser entendido como “ acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade»
XV – Com efeito, o Tribunal ao concluir pela não prescrição do procedimento nos termos do disposto no parágrafo 2.º do art. 3.º, do Regulamento (CE, EURATOM) n.º 2988/95, não ponderou e não valorou o respetivo regime jurídico aplicável, tendo o Tribunal feito uma interpretação errada e contra legem da legislação comunitária aplicável, verificando-se ter existido uma violação clara tanto de lei substantiva, nomeadamente, violação do disposto no referido parágrafo 2.º do art. 3.º do Regulamento (CE, EURATOM) n.º 2988/95, do n.º 2 do artigo 54.º do REGULAMENTO (CE) nº 1122/2009 DA COMISSÃO de 30 de Novembro de 2009 e 8.º e 9.º, n.º 2, do Código Civil, cumprindo-se a necessidade, salvo o devido respeito, de ancorar a admissão da revista na necessidade de melhor aplicação do direito comunitário.
XVI - Nestes termos o acórdão ora recorrido é suscetível de recurso, com vista a uma melhor aplicação de direito, com fundamento no facto de nos presentes autos estarmos perante uma irregularidade cujo facto “ alegadamente “ interruptivo da prescrição (Relatório de Controlo) não se encontrar previsto na legislação comunitária, como, de per si, ser idóneo à interrupção da prescrição, sem que da notificação do mesmo, ao interessado, seja acompanhado da comunicação da intenção de o mesmo servir para instruir ou instaurar qualquer procedimento por irregularidade.
XVII - O presente recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça preenche os requisitos de admissibilidade previstos e instituídos no n.º 1 do art. 150.º do CPTA.
XVIII - Entende o ora Recorrente que a questão trazida a juízo se apresenta de fundamental relevância jurídica e social já que esta abrange questões que têm impacto no ordenamento jurídico nacional, tendo uma incontroversa aplicabilidade a um universo alargado de outros casos, sendo consabido, que são na ordem dos milhares os...

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