Acórdão nº 024/22.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24-04-2024

Data de Julgamento24 Abril 2024
Número Acordão024/22.7BALSB
Ano2024
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (PLENO DA SECÇÃO DO CT)
Recurso para uniformização de jurisprudência

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida em 31 de Dezembro de 2021 no processo n.º 444/2021-T (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?id=6025.) pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), por oposição com a decisão do mesmo CAAD proferida em 6 de Novembro de 2020, no processo n.º 819/2019-T do mesmo CAAD ( Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?id=5052.), transitada em julgado, tendo apresentado alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«I. Nos termos do artigo 25.º n.º 2 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária e do artigo 152.º do CPTA interpõe-se recurso da Decisão Arbitral de 31 de Dezembro de 2021 adoptada pelo CAAD no Processo 444/2021-T por oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com a Decisão Arbitral de 6 de Novembro de 2020 emitida no Processo 819/2019-T (já transitada em julgado).

II. Tanto na decisão arbitral recorrida como na decisão arbitral fundamento estavam em causa situações em que as respectivas Requerentes (i) têm natureza de SGPS (ii) recorreram a financiamentos junto de instituições de crédito (iii) suportaram, mediante repercussão legal, imposto de selo liquidado pelas instituições de crédito nos termos da Verba 17.3 TGIS sobre operações de crédito, respectivos juros e comissões de que foram beneficiárias (iv) vieram peticionar a anulação dos actos de liquidação de imposto de selo invocando que, atenta a sua natureza de SGPS, integravam o conceito de instituição financeira nos termos e para os efeitos do artigo 7.º n.º 1 al. e) do CIS.

III. Nas duas decisões arbitrais a questão a decidir foi identificada como a de saber se as respectivas Requerentes, atenta a sua natureza de SGPS, integram ou não o conceito de “instituição financeira” previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS e beneficiam da isenção de imposto ali prevista.

IV. As duas decisões arbitrais foram proferidas no domínio da mesma legislação, já que em ambos os casos está em causa a apreciação da legalidade de actos de liquidação emitidos nos anos de 2016, 2017 e 2018 ao abrigo do disposto no artigo 7.º n.º 1 al. e) do CIS, na Directiva 2013/36/EU, no Regulamento (UE) n.º 575/2013, no RGICSF e no Decreto-Lei n.º 495/88.

V. Na decisão arbitral recorrida considerou-se que as SGPS não integram o conceito de “instituição financeira” para efeitos do disposto na alínea e) do n.ºs 1 do artigo 7.º do CIS, pelo que não é possível ser atribuída a qualquer SGPS a isenção de Imposto de Selo prevista em tal normativo (juízo que conduziu à improcedência dos pedidos arbitrais) e na decisão arbitral fundamento considerou-se que uma SGPS constitui uma instituição financeira para efeitos da isenção prevista no artigo 7.º, n.º 1, al. e), do CIS (juízo que fundamentou a procedência dos pedidos arbitrais).

VI. Conforme resulta das conclusões anteriores, estão verificados os requisitos estabelecidos no artigo 25.º n.º 2 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária e no artigo 152.º do CPTA, pelo que o presente recurso deve ser admitido.

VII. Ao contrário do decidido na decisão arbitral recorrida, os elementos objectivos e subjectivos da alínea e) do n.º1 do artigo 7.º do CIS, por constituírem pressupostos de uma isenção fiscal, não têm uma delimitação fechada já que podem ser objecto de interpretação extensiva nos termos do artigo 10.º do EBF.

VIII. De qualquer forma, para que se possa considerar que as SGPS integram o conceito de “instituição financeira” nos termos e para os efeitos do artigo 7.º n.º 1 al. e) do CIS não é necessário efectuar qualquer interpretação extensiva já que tal entendimento resulta de uma interpretação literal, sistemática e teleológica dos preceitos legais aplicáveis.

IX. Na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS é claramente estatuído que a isenção é aplicável a “sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária”, pelo que o conceito de instituição financeira a que se deve ater para efeito de verificação do preenchimento da previsão da norma é o resultante da legislação comunitária.

X. Resulta da Directiva 2013/36/EU, no seu artigo 3.º, n.º 1, ponto 22) e do Regulamento (UE) n.º 575/2013 no seu artigo 4.º 26) que uma instituição financeira (i) é uma empresa que não seja uma “instituição” (isto é, que não seja uma instituição de crédito ou empresa de investimento – artigo 4.º, n.º1, 3) e (ii) cuja actividade principal seja a gestão de participações sociais ou o exercício de uma ou mais actividades enumeradas no Anexo I, pontos 2 a 12 e 15 da Directiva 2013/36/EU e(iii) que não seja uma sociedade gestoras de participações no sector dos seguros ou uma sociedades gestoras de participações de seguros mistas.

XI. No que diz respeito ao elemento literal da interpretação, o que resulta de forma expressa da letra do artigo 4.º 26) Regulamento (UE) n.º 575/2013 é que decisivo para a qualificação como instituição financeira é o desenvolvimento de actividade de gestão de participações sociais OU o desenvolvimento de uma das actividades enumeradas no Anexo I, pontos 2 a 12 e 15 da Directiva 2013/36/EU, não sendo tais requisitos cumulativos.

XII. O entendimento exarado na decisão arbitral recorrida de que ambos os requisitos têm de estar preenchidos não tem qualquer apoio na letra da lei.

XIII. Note-se que mesmo após a revisão efectuada pelo Regulamento (UE) n.º 2019/876, o ponto 26 do artigo 4.º do Regulamento (UE) n.º 5785/2013 continua a ter natureza disjuntiva, pelo que continua a resultar da letra da lei que integra tal definição qualquer outra empresa cuja actividade principal seja a aquisição de participações OU o exercício de uma ou mais das actividades enumeradas no anexo I, pontos 2 a 12 e 15 da Directiva 2013/36/EU.

XIV. Mais se diga que o conceito de “participações” estabelecido no Regulamento 575/2013 (ponto 35.º do n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento (UE) n.º 575/2013 e artigo 2.º n.º 2 da Directiva 2013/34/EU), reporta-se aos direitos no capital de outras empresas, representados ou não por títulos, pelo que também nesse preceito não se exige que tais direitos sejam detidos em empresas que desenvolvem actividades no sector bancário e financeiro (neste sentido decidiu-se na decisão arbitral fundamento).

XV. No que concerne os elementos sistemático e teleológico é de referir que o regime de supervisão previsto no Regulamento n.º 575/2013 e na Directiva 2013/367UE aplica-se a instituições de crédito e a empresas de investimento (artigos 1.º, 4.º n.º 1, ponto 3, do Regulamento, artigos 2.º n.º1 e 3.º ponto 3 da Directiva 2013/36/EU, artigo 4.º n.º 1 ponto 1 da Directiva 2014/65/EU) pelo que os requisitos prudenciais estabelecidos no Regulamento (UE) n.º 575/2013 também apenas se aplicam a tais entidades (vejam-se também os considerandos 5, 6 e 7 do Regulamento n.º 575/2013/UE).

XVI. Uma instituição financeira não está sujeita aos requisitos prudenciais fixados no Regulamento (UE) n. º 575/2013 nem ao regime de supervisão fixado na Directiva 2013/36/EU.

XVII. As instituições financeiras apenas estão sujeitas às concretas normas da Directiva 2013/36/EU que a elas se reportam especificamente como sejam, por exemplo, as dos art. 5.º, 56.º/f), 59.º/1, 117.º/1/§4, 118.º, e 124.º/3 (nesse sentido veja-se a decisão do CAAD de 4 de Novembro de 2020 proferida no processo n.º 836/2019-T).

XVIII. Pelo que improcede o argumento aduzido na decisão arbitral recorrida de que as simples SGPS não podem ser consideradas instituições financeiras por força de uma pretensa sujeição destas últimas aos requisitos prudenciais e regime de supervisão fixado no Regulamento n.º 575/2013/UE e na Directiva 2013/36/EU e, consequentemente, o entendimento de que os elementos sistemático e teleológico da interpretação dos preceitos em causa determinam que as SGPS não podem ser consideradas instituições financeiras.

XIX. Conclui-se que à luz da legislação comunitária uma empresa cuja actividade principal seja a gestão de participações sociais integra o conceito de instituição financeira.

XX. Na transposição da Directiva 2013/36/EU para o direito interno, o legislador nacional adoptou um conceito mais restritivo de “instituição financeira”, caracterizando como tal “as sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Banco de Portugal”.

XXI. Porém, para efeitos da aplicação da isenção do imposto de selo, no artigo 7.º, n.º 1, alínea e) do CIS não se remete para o direito interno mas para o direito da União Europeia, o que significa que a definição constante do artigo 2.º-A do RGICSF não releva para este específico aspecto (nesse sentido decidiu-se na decisão arbitral fundamento).

XXII. Tal prevalência da definição constante do direito europeu também sempre resultaria do princípio do primado do direito comunitário (artigo 8.º n.º 4 da CRP).

XXIII. Mais se diga que a aplicação do conceito constante da legislação nacional também significaria uma discriminação negativa das empresas nacionais face às demais empresas europeias (porquanto, para efeitos da aplicação do artigo 7.º n.º 1 al. e) do CIS, as SGSP domiciliadas em Portugal estariam sujeitas ao conceito da legislação nacional e apenas poderiam ser consideradas instituições financeiras se estivessem sujeitas à sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, ao passo que, para efeitos da aplicação do artigo 7.º n.º 1 al. e) do CIS, as SGPS domiciliadas em qualquer outro Estado Membro estariam sujeitas ao conceito da legislação comunitária e poderiam...

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