Acórdão nº 02371/07.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 2022-05-19

Data de Julgamento19 Maio 2022
Ano2022
Número Acordão02371/07.9BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. A Recorrente (A..., S.A.), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em que foi julgada totalmente improcedente a impugnação judicial deduzida contra o indeferimento parcial da reclamação graciosa relativa à autoliquidação de IRC do exercício de 2004, no montante de €1.139,79, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«1. A douta Sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia (artigos 125º nº 1 do CPPT, 608º nº 2 e 615º nº 1 d) e nº 4 do CPC).
Sem prescindir,
2. Deve ser alterado julgamento da matéria de facto expresso nos pontos 1. e 70. dos factos provados.
3. Desde logo, contrariamente ao julgamento da matéria de facto expresso no ponto 1. da factualidade assente, o trabalhador FF... foi admitido em 2002 mediante contrato de trabalho sem termo, conforme prova documental e testemunhal produzidas, especificadas nas Alegações (que aqui damos por reproduzidas), e atentos os demais sinais dos autos (aceitação por parte da AT e reconhecimento na própria Sentença, em 57. dos factos provados).
4. Por outro lado, contrariamente ao referido em 70. dos factos provados, os trabalhadores aí mencionados e que saíram em 2000, 2001, 2002 e 2003, haviam sido contratados sem termo – conforme prova documental e testemunhal produzidas, especificadas nas Alegações (que aqui damos por reproduzidas).
Acresce que,
5. Tal como se afirma no douto Parecer do Ministério Público proferido nos presentes autos, a presente Impugnação Judicial deveria ter sido julgada procedente.
6. Conforme, aliás, entendimento do STA, 2ª Secção, expresso no douto Acórdão de 19.10.2011, Processo nº 0607/11.
7. Com efeito, dali se extrai que a conversão de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo equivale à criação líquida de emprego para efeitos do benefício fiscal consignado no artigo 17º do EBF.
8. Com efeito, a douta Sentença omitiu indevidamente que o entendimento unânime da própria AT sempre foi no sentido de que a conversão dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo deveria contar positivamente para efeitos do apuramento do benefício fiscal em causa,
9. conforme extensa doutrina da AT especificada nas sobreditas Alegações, e atenta a prova documental e testemunhal produzidas, igualmente acima especificadas nas Alegações, que aqui damos por reproduzidas.
10. Por conseguinte, a douta Sentença violou o princípio da igualdade (artigos 55º da LGT, 6º do CPA e 266º nº 2 da CRP).
11. Com efeito, deve ser aditado aos factos provados que a própria AT considera que as conversões de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo devem contribuir positivamente para a criação líquida de postos de trabalho, cabendo, por isso, no benefício fiscal da criação líquida de emprego para jovens (CLEJ) consignado no artigo 17º do EBF.
12. Atentos estes entendimentos administrativos unânimes e inequívocos da AT, os mesmos deveriam ter sido oportunamente vertidos em circular administrativa, por imposição do disposto no nº 3 do artigo 68º-A da LGT e do princípio da boa-fé (artigo 10º do CPA e 266º nº 2 da CRP) – o que a AT não fez.
13. O contribuinte não pode ser prejudicado pela inércia da AT, tendo a douta Sentença violado aqueles preceitos e princípios legais.
14. Foi legitimamente confiado naquele entendimento da própria AT que o contribuinte reclamou o aproveitamento do benefício da criação líquida de emprego para jovens tendo em conta, também, os casos de conversão dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo.
15. Não há razão para que a AT tivesse conferido tratamento diferenciado ao caso dos presentes autos, em prejuízo do contribuinte, ao contrário do tratamento que a AT conferiu a outros contribuintes – em casos, iguais, de conversão de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo,
16. em violação dos princípios legais da igualdade e da justiça, e do dever jurídico de imparcialidade (artigos 266º nº 2 da CRP, 5º e 6º do CPA e 55º da LGT).
17. É imperioso que haja segurança jurídica, protecção da confiança e das legítimas expectativas dos administrados, atento o primado do Estado de Direito Democrático (artigos 2º, 9º b) e 266º nº 2 da CRP).
18. Tendo a douta Sentença violado estas normas e princípios legais.
19. A douta Sentença também desconsiderou indevidamente que, por força dos artigos 55º do CPPT e 68º-A nº 1 da LGT, a AT está juridicamente vinculada às orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza emitidos pela própria AT.
Sem prescindir,
20. A douta Sentença padece de errada interpretação e aplicação do artigo 17º nº 1 do EBF, pois as conversões dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo estão abrangidas pelo benefício fiscal previsto naquele preceito legal.
21. Como decorre do artigo 17º do EBF, este não exige a condição de desempregado do trabalhador, à data da sua entrada mediante contrato sem termo.
22. O artigo 17º do EBF não pode nem deve ser integrado mediante aplicação de conceitos de outros regimes jurídicos, bem diferenciados, de índole meramente financeira, que nada têm a ver com impostos ou tributos – como é o caso do conceito de criação líquida de postos de trabalho previsto no artigo 7º nº 2 do DL 34/96, de 18/4, ou no antecedente DL 89/95, de 6/5.
23. Com efeito, não existe qualquer lacuna jurídica (que legitime o recurso à analogia ou à “criação de norma equivalente”), ao contrário do que pressupõe a douta Sentença.
24. Face ao artigo 17º nº 1 do EBF, importava apenas averiguar se e em que medida teria havido “criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo e com pelo menos 30 anos”.
25. Logo, o que interessava era tão só apurar a diferença entre (i) o número de trabalhadores contratados mediante contrato de trabalho sem termo e (ii) o número de trabalhadores que saíram e que tinham o mesmo tipo de vínculo contratual.
26. E, não, verificar se houve “um aumento do número global de trabalhadores da empresa” com idade não superior a 30 anos – como erradamente entende a douta Sentença.
27. A contratação de trabalhadores por tempo indeterminado, quer ela ocorra “ex novo”, quer surja no decurso de relação de trabalho já existente, executa plenamente o interesse público extrafiscal do legislador na criação do benefício fiscal do artigo 17º do EBF - a criação de emprego estável para jovens (cfr. artigo 2º nº 1 do EBF).
28. Os benefícios fiscais integram os “elementos essenciais” dos impostos, abrangidos pelo princípio fundamental da legalidade e tipicidade (cfr. artigos 8º da LGT e 103º nº 2 e 3 da CRP) e, por via disso, de reserva de lei (cfr. artigo 165º nº 1 i) da CRP).
29. Logo, contrariamente ao preconizado na douta Sentença, está expressamente proibida, pelo artigo 11º nº 4 da LGT, a integração de quaisquer lacunas em matéria de benefícios fiscais, designadamente por aplicação alegadamente analógica de outros diplomas legais – que nada têm a ver com benefícios fiscais, como é o caso do referido DL 34/96, de 18/4.
30. Aliás, nos termos do artigo 9º do EBF, as normas que estabelecem benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, embora admita interpretação extensiva.
31. Aliás, aquela interpretação extensiva vai naturalmente no sentido de abranger mais situações de benefício fiscal para além daquelas que de imediato decorrem da “literalidade” da norma sobre benefícios fiscais (por ser essa a intenção do legislador ou a “ratio” do preceito) – e não, como sucede na douta Sentença, de restringir o número de situações de benefício fiscal enquadráveis no artigo 17º do EBF (neste sentido, também o artigo 10º do EBF).
32. Com efeito, atenta a unidade do sistema jurídico (artigo 9º nº 1 do CC, ex vi do artigo 11º nº 1 da LGT), as normas sobre benefícios fiscais devem ser interpretadas no sentido de estender o seu âmbito de aplicação ao maior número de situações possível (sempre com o limite da letra da lei, como é óbvio), em benefício dos contribuintes.
33. Por outro lado, o artigo 9º do EBF não consente uma interpretação das normas sobre benefícios fiscais que não tenha correspondência com a letra da lei (como também decorre do artigo 9º nº 2 do CC, por remissão do artigo 11º da LGT).
34. Por isso, não se pode acrescentar o requisito da prévia condição de desempregado para que o trabalhador conte para a criação líquida de postos de trabalho a que alude o artigo 17º nº 1 do EBF.
35. O artigo 17º do EBF, interpretado no sentido de que nele não cabem as conversões de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo, padece de inconstitucionalidade formal e material, por violação dos referidos princípios fundamentais da legalidade e tipicidade das normas sobre benefícios fiscais, consagrados nos artigos 103º nº 2 e 3 e 165º nº 1 i) da CRP.
36. Com efeito, do artigo 17º do EBF extrai-se que a respectiva criação líquida de postos de trabalho é apenas aquela que se reporta à contratação de trabalhadores sem termo – e não a que respeita à contratação de trabalhadores, sem termo ou a termo, como erradamente pressupõe a douta Sentença.
37. É no momento da conversão do contrato de trabalho, anteriormente a termo, em contrato de trabalho sem termo, que se cria e afere a criação líquida de postos de trabalho nos termos do artigo 17º nº 1 do EBF.
38. O artigo 17º nº 1 do EBF visou expressamente a empregabilidade não precária (ou seja, visou a contratação sem termo), com as vantagens que lhe estão associadas, designadamente ao nível dos direitos garantidos e potenciados pelo aumento da antiguidade no trabalho (ex. diuturnidades).
39. Não tendo qualquer...

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