Acórdão nº 0225/20.2T8AMT.P1.S1 de Tribunal dos Conflitos, 17-04-2024

Data de Julgamento17 Abril 2024
Número Acordão0225/20.2T8AMT.P1.S1
Ano2024
ÓrgãoTribunal dos Conflitos - (CONFLITOS)
recurso

**


O Tribunal dos Conflitos, acorda: ------

1. Relatório:


AA apresentou-se à insolvência que requereu em 6/02/2020, no Juízo de comércio de Amarante. Tribunal que, por sentença de 04/03/2020, transitada em julgado, declarou a insolvência da ora recorrente e que, além do mais determinou “a avocação de todos os processos de execução fiscal eventualmente pendentes, que serão apensados aos presentes autos, cfr. artigo 180.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (…)”.


Por decisão de 23/06/2020, transitada em julgado, foi declarado encerrado o processo de insolvência, declarando-se cessados os efeitos da declaração de insolvência e cessadas as funções da administradora com dispensa da apresentação de contas.


Por decisão de 14/07/2020, transitada em julgado, foi liminarmente admitido o pedido de exoneração do passivo restante apresentado pela requerente.


Em 30/12/2022 a insolvente veio requerer que se “...notifique a Administração Tributária e Aduaneira (AT) para: ------

i. Aplicar retroativamente à situação fiscal da Insolvente, os efeitos da declaração de insolvência, designadamente os previstos nos artigos 85.º e 88.º do CIRE;

ii. Regularizar os valores em dívida e os novos processos instaurados, eliminando todas as coima e juros de mora vencidos em data posterior à declaração, ficando em débito o valor reclamado (€34.002,08); e a

iii. Proceder ao levantamento da penhora existente sobre o veículo com a matrícula ..-..-DS.

E bem assim “a notificação do Instituto da Mobilidade e dos Transportes I.P., para proceder ao cancelamento da matrícula ..-..-DS.”.


Por despacho de 09/01/2023, foi ordenada a audição da fiduciária e da AT.


De seguida e após esclarecimentos prestados pela AT, a Insolvente apresentou vários requerimentos em que manteve aqueles pedidos.


O tribunal, por despacho de 22.02.2023 indeferiu o pedido de notificação do Instituto da Mobilidade e dos Transportes, IP para que cancele a matrícula do automóvel “uma vez que o veículo automóvel não foi objeto de apreensão nestes autos, tendo o processo sido encerrado por insuficiência da massa”.


A insolvente, ora recorrente, por requerimento apresentado em 7/03/2023 peticionou ao tribunal que “sejam declarados nulos todos os atos praticados e omitidos após a declaração de insolvência pela AT, colocando a Insolvente na situação em que estaria se o disposto nos artigos 88.º e 242.º n.º 1 do CIRE tivesse sido respeitado”.


Em 28/04/2023, foi proferido despacho de onde consta: ----


"O Tribunal já decidiu o que lhe foi suscitado pela insolvente.


De facto, o Tribunal não determinou o cancelamento da matrícula do veículo, em virtude de tal bem não ter sido apreendido para os autos, e determinou que a AT esclarecesse os valores penhorados durante o período de cessão.


Prestada esta informação, o Tribunal determinou que a Sra. AI solicitasse a devolução dos valores que foram indevidamente penhorados, aguardando-se que a mesma concretize tal pedido e dele dê conhecimento aos autos.


Por fim, o Tribunal também tomou posição no sentido de que as dívidas vencidas após a insolvência, não caem na proteção conferida pelo deferimento liminar do pedido da exoneração do passivo restante.


Assim sendo, apenas resta determinar que a Sra. AI informe se já solicitou que a AT devolvesse os valores indevidamente penhorados, o que deverá fazer no prazo de 10 dias.


O demais, nomeadamente, o cancelamento da matrícula e a contestação de apreensão de valores referentes a dívidas constituídas após a declaração de insolvência, terão de ser solucionados pela devedora mediante mecanismo processual que entenda adequado, que não é o destes autos".


Inconformada, a insolvente interpôs recurso para a 2.ª instância terminando a pedir que se: ----

a) declarassem “nulos todos os atos praticados e omitidos pela AT, colocando a Insolvente na situação em que estaria se o disposto nos artigos 88.º e 242.º n.º 1 do CIRE tivesse sido respeitado. E, bem assim, sejam regularizados os valores em dívida e os novos processos instaurados, eliminando todas as coimas e juros de mora aplicados em data posterior à declaração de insolvência”;

b) considerasse “suspensa, desde a declaração de insolvência, a execução fiscal n.º ..............76 (instaurada em 11/09/2014) e ordene o levantamento da penhora do veículo ..-..-DS, realizada após a declaração de insolvência;

c) lhe seja devolvida a quantia de €185 (cento e oitenta e cinco euros) indevidamente penhorada pela AT, relativamente ao IRS de 2021, por este valor se enquadrar no rendimento disponível”.

O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 26/09/2023, julgou a apelação improcedente.


Da fundamentação do acórdão recorrido consta, de relevante para o que aqui importa, o seguinte: -----


Queixa-se a insolvente/apelante que a Autoridade Tributária e Aduaneira não suspendeu as diligências executivas que levou a cabo nos processos de execução fiscal, cujos créditos foram reclamados nos presentes autos e prosseguiu com as ações executivas e intentou novas execuções.


Resulta da conjugação do disposto no art. 64.º do C.P. Civil e do art. 40.º, n. º 1, da LOSJ que os tribunais judiciais têm uma competência residual, isto é, têm competência para decidir as causas que não sejam atribuídas a outros tribunais. Já os tribunais administrativos e tributários têm a sua competência limitada às causas que lhes são especialmente atribuídas.


Ora, como é sabido o processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos atos que não tenham natureza jurisdicional, cfr. art. 103.º da Lei Geral Tributária (DL n.º 398/98 de 17.12). Por norma, a execução fiscal corre termos nas repartições de finanças com exceção dos atos jurisdicionais atribuídos aos tribunais tributários, pois a estes compete o conhecimento "dos incidentes, embargos de terceiros, verificação e graduação de créditos, anulação da venda, oposições e impugnação de atos lesivos, bem como de todas as questões relativas à legitimidade dos responsáveis subsidiários, levantados nos processos de execução fiscal, cfr. art. 49.º, n.º 1, do ETAF (Lei n.º 13/2012 de 19.02).


Competência, essa, que é ainda firmada no art. 151.º, n.º 1 do CPPT (DL n.º 433/99 de 26.10) que preceitua "compete ao tribunal tributário de 1.ª instância da área onde correr a execução (...) decidir os incidentes, os embargos, a oposição, incluindo quando incida sobre os pressupostos da responsabilidade subsidiária, a graduação e verificação de créditos e as reclamações dos atos materialmente administrativos praticados pelos órgãos da execução fiscal".


Do exposto resulta que é do mais residual bom senso, sem olvidar que a insolvente/apelante se encontra devidamente representada por profissional forense, que jamais seria competência dos tribunais comuns apreciar da validade e declarar uma qualquer nulidade de atos praticados e/ou omitidos pela AT no âmbito de processos de execução fiscal que nem sequer foram avocados e consequentemente apensados aos autos de insolvência, enquanto estes estiveram pendentes.


Daí que sobre o insólito pedido da insolvente/apelante, a 1.ª instância, que corretamente e à luz do princípio da cooperação diligenciou junto das entidades visadas pelas queixas da insolvente para apurar da sua realidade, veio depois a decidir em sede de despacho recorrido, além do mais, que "...o Tribunal ... determinou que a AT esclarecesse os valores penhorados durante o período de cessão. Prestada esta informação, o Tribunal determinou que a Sra. AI solicitasse a devolução dos valores que foram indevidamente penhorados, aguardando-se que a mesma concretize tal pedido e dele dê conhecimento aos autos. (...) apenas resta determinar que a Sra. AI informe se já solicitou que a AT devolvesse os valores indevidamente penhorados, o que deverá fazer no prazo de 10...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT