Acórdão nº 02128/17.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 03-02-2022

Data de Julgamento03 Fevereiro 2022
Ano2022
Número Acordão02128/17.9BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1 – RELATÓRIO

P., S.A., melhor identificada nos autos, inconformada com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 19/03/2019, que no âmbito de processo de contra-ordenação nº 3514201606000000… a condenou pela prática de contra-ordenação prevista no art. 128º, nº 2 do RGIT, em conjugação com o art. 123º, nº 9 do CIRC, na coima de €1.500,00, deduziu o presente recurso, formulando nas alegações que apresenta as seguintes conclusões:

“III - CONCLUSÕES:

i. O legislador está consciente que, no campo da imposição de obrigações fiscais de natureza formal, deve existir sempre uma adequada ponderação e compatibilidade entre, por um lado, a actividade dos agentes económicos e, por outro lado, o combate à fraude e evasão fiscal, demonstrando uma preocupação em eliminar, tanto quanto possível, situações menos justas.

ii. No caso em apreço, não existe qualquer evasão fiscal, nem qualquer incumprimento de obrigações fiscais por parte da Recorrente – sendo inequívoco que cumpriu o seu dever de emitir documento comprovativo da transação, mormente a factura com todas as menções impostas pela lei fiscal, e sendo certo que a AT não coloca em causa que os elementos da factura lhe foram também oportunamente transmitidos nos termos do artigo 3.º do D.L. n.º 198/2012, de 24.08.

iii. Vale isto por dizer que, no caso em apreço, não existem ponderosas razões de controlo que justifiquem a elevada sanção em causa, atento o facto de o bem jurídico que a lei pretendeu acautelar não está, nem nunca esteve, em perigo – porquanto foi devida e atempadamente emitido o documento comprovativo da transacção, apetrechando a AT do total controlo da situação tributária, e da prova segura dos factos a controlar.

iv. Em face do contexto factual constantes dos autos, não se afigura legítimo, nem proporcional, impor à Recorrente a paralisação da sua actividade económica pelo facto de não estar atempadamente concluído um procedimento administrativo que incumbia à própria AT promover no prazo legal (e razoável) de 30 dias – e que, in casu, foi largamente ultrapassado.

v. Tampouco se afigura legítimo e proporcional que a mesma entidade encarregue de certificar o programa informático da Recorrente, venha depois, na veste de entidade autuante em sede contra-ordenacional, aplicar-lhe uma coima pela falta de certificação atempadamente requerida MAIS DE TRÊS MESES antes da emissão da referida factura.

vi. A aplicação de uma coima haverá de justificar-se pela necessidade de proteger os bens jurídicos em causa – in casu o combate à fraude e evasão fiscal - não se vislumbrando que a tutela desses bens, ou as necessidades gerais e especiais de prevenção sejam susceptíveis de, no caso concreto, justificar a aplicação de uma (elevada) coima.

vii. No julgamento que efectuou, o Tribunal a quo não teve em consideração qualquer um dos seguintes factos: i) o elevado atraso administrativo na certificação; ii) o momento em que foi emitida a factura em causa – mormente se ocorreu, ou não, dentro do prazo legal de certificação; iii) os montantes da factura em causa – em que se concretiza o risco de evasão fiscal (bem jurídico protegido) e iv) o facto de os elementos da factura terem sido previamente comunicados à AT.

viii. Deve a Recorrente ser dispensada do pagamento da coima, uma vez que, se encontram preenchidos os requisitos do artigo 32.º do RGIT, nomeadamente, a actuação revelou diminuta culpa, a falta encontra-se regularizada, nunca a Recorrente teria qualquer proveito próprio com essa actuação, e também não ocorreu qualquer prejuízo para a Fazenda Pública.

ix. Pese embora a verificação dos pressupostos da dispensa da coima tenha sido expressamente invocada pela Recorrente, o Tribunal a quo omitiu pronúncia sobre os mesmos – o que constitui nulidade da sentença.

x. Ainda que se entendesse que o comportamento da Recorrente merece censura – o que não se concede e apenas se admite como mera hipótese - afigura-se que os factos em causa seriam, quando muito, passiveis de admoestação, nos termos do artigo 51.º do D.L. n.º 433/82, de 27 de Outubro, aplicável por força do artigo 3.º b) do RGIT, e não uma coima – sendo que, uma vez mais, o Tribunal a quo omitiu pronúncia sobre os pressupostos da admoestação, o que constitui nulidade da sentença.

xi. Ao proceder à pretendida atenuação especial da coima, o Tribunal a quo incorreu em erro na determinação da coima, na medida em que, quando o artigo 32.º n.º 2 do RGIT se refere à redução para metade das coimas, é evidente que remete para as coimas abstractamente aplicáveis - já que se refere expressamente aos “limites mínimos e máximos da coima”.

xii. No caso em apreço, com base num manifesto lapso, o Tribunal a quo teve por referência a coima aplicada pela AT, de €3.000,00, e, considerou, com base nesse mesmo lapso, que o limite mínimo seria €1.500,00 – quando, nos termos dos artigos 26.º n.º 4, 32.º n.º 2 e 128.º n.º 2 do RGIT, tal limite se situava em €375,00.

xiii. Deste modo, e caso se mantivesse incólume o julgamento do Tribunal a quo, sempre se imporia a anulação da sentença no segmento em que procede à errada quantificação da coima especialmente atenuada.

NESTES TERMOS e nos melhores de Direito, deve conceder-se provimento ao presente recurso, anulando-se a decisão recorrida, o que se deverá fazer por obediência à Lei e por imperativo de
JUSTIÇA!”

*** ***
O Ilustre Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo apresentou contra-alegações onde formulou as seguintes conclusões:
“EM CONCLUSÃO:

- Nos autos foi proferida sentença, julgando a impugnação da coima apresentada parcialmente procedente, decidindo-se “adequada e proporcional às circunstâncias do caso concreto, designadamente à gravidade do facto, culpa do agente e sua situação económica, a fixação da coima em € 1.500,00, que corresponde ao mínimo aplicável no caso vertente.”

- Inconformada com a douta sentença, interpõe a arguida o presente recurso, alegando erro na apreciação da matéria de facto e na valoração dos requisitos enunciados na conclusão VII da sua alegação, pugnando pela dispensa de coima face à regularização da situação que deu causa ao procedimento contraordenacional, ou pela aplicação duma admoestação.

– Salvo o devido respeito, o recurso não merece provimento: com efeito, consta dos factos provados, nomeadamente dos números 6 a 9 que a arguida, tendo emitido em 22/10/2015 uma fatura em programa de faturação não certificado, possui volume de negócios superior a € 100.000,00 (cf. informação de fls. 61 e seguintes), sendo que em 26/11/2015 conseguiu que fosse emitido pela Administração Tributária o “Certificado de Programa de Faturação” (fls. 91 dos autos). E em 1.7.2015, a arguida submetera o modelo 24 n° 213904286, solicitando a certificação do programa informático de faturação denominado OMS SR –SYSTEM, versão 0.1.1.16, que veio a ser substituída, em 20.11.2015, pela modelo 24 n° 221717465, relativa à versão 0.1.0.21 do mesmo programa (informação de fls. 61 e seguintes, pontos 13 e 14).

- Ou seja: a arguida pedira a certificação do seu programa de faturação em 1.7.2015, mas não esperando pela decisão da ATA, em 22/10/2015 emite a fatura a que o procedimento contraordenacional se reporta, sem ser possuidora dessa certificação.

- Daqui resulta que a arguida, que é uma empresa pertencente a um grupo empresarial de reputação, conhecedora das regras do mercado e dos seus deveres fiscais, e com um elevado volume de faturação, sabia que precisava dessa certificação e apesar disso emite a referida fatura, fora desse programa certificado, pelo que a coima que lhe foi aplicada, que observou o limite mínimo aplicável não merece qualquer censura, a não ser pela sua manifesta benevolência, não aceite pela arguida.

- Assim sendo, não pode a arguida beneficiar da dispensa de coima ou da aplicação duma sanção de admoestação, porquanto não se verificam os requisitos de que depende a aplicação destes institutos, conforme entendimento perfilhado no acórdão do STA de 01/10/2014, proferido no P. 1665/13, disponível em www.dgsi.pt: “Para que se verifique a possibilidade de dispensa da coima o art.º 32º do Regime Geral das Infrações Tributárias impõe que se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos: que a prática da infração não ocasione prejuízo efetivo à receita tributária (al. a); que esteja regularizada a falta cometida (al. b); que a falta revele um diminuto grau de culpa.”

- Ora, no caso dos autos, a infração da arguida causou um prejuízo não material, mas de sustentabilidade e de credibilidade do sistema fiscal, na prevenção da evasão fiscal e de tudo o que isso implica para o bem-estar geral de todos os contribuintes.

- Não é, pois, qualquer reparação de prejuízo material, ou regularização da situação fiscal, que pode conduzir à dispensa de coima, sendo aliás patente que a regularização que a arguida efetuou foi tão somente a de ter obtido a certificação do seu programa de faturação.

- E não é esta a regularização de que nos fala o n° 3, do art.° 75 do RGIT é a que vem definida no n° 3, do art.° 30 do mesmo diploma (neste sentido, também os citados autores), ou seja, “o cumprimento das obrigações tributárias que deram origem à infração”, e essencialmente o pagamento dos tributos em dívida, tal como defendem Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infrações Tributárias, anotado, 4ª edição, áreas Editora, 2010, pág. 508.

10ª - Quanto à aplicação duma sanção de admoestação: a aplicação desta sanção, pressupõe a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente, o que manifestamente nos parece que não resulta da matéria de facto julgada como provada - neste sentido, acórdão do STA de 10/10/2018,...

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