Acórdão nº 02064/11.2BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10-04-2024

Data de Julgamento10 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão02064/11.2BELRS
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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"A..., SGPS, S.A." (à data dos factos "B..., SGPS, S.A."), com os demais sinais dos autos, deduziu recurso de revista ao abrigo do artº.285, do C.P.P.T., dirigido a este Tribunal e tendo por objecto acórdão do T.C.A. Sul, datado de 16/09/2021, constante a fls.1157 a 1184 do processo físico (IV volume), o qual negou provimento aos recursos interpostos da decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, mantendo a sentença recorrida que, além do mais, julgou verificar-se a inutilidade superveniente da lide relativamente à "parte não inovatória" do acto de liquidação sindicado (5º. acto de liquidação de I.R.C. relativo ao exercício de 1999), assim confirmando o juízo judicial recorrido, embora por "inimpugnabilidade do acto", dado ser mero acto de execução de Acórdão do S.T.A.
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O recorrente termina as alegações do recurso de revista (cfr.fls.1197 a 1211-verso do processo físico - IV volume) formulando as seguintes Conclusões:
A-O presente Recurso tem como objeto o Acórdão proferido no processo n.º 2064/11.2BELRS, que correu os seus termos na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul.
B-Conforme resulta dos autos, a RECORRENTE deduziu Impugnação Judicial contra o ato de liquidação de IRC (e de juros compensatórios) n.º ...26 e correspondente demonstração de acerto de contas tendo em vista a discussão da sua legalidade, tendo por referência as correções resultantes do procedimento de inspeção tributária efetuada ao exercício de IRC de 1999.
C-Com efeito, entre 2002 e 2010, por referência ao período de tributação de 1999 (em crise nos presentes autos), a Administração tributária emitiu cinco atos de liquidação de IRC, que foram regulando, sucessivamente, a situação tributária da RECORRENTE e os quais foram objeto de impugnação.
D-Porém, a legalidade das correções efetuadas pela Administração tributária, no decurso de um procedimento de inspeção tributária ao IRC do exercício de 1999, não foi objeto de apreciação, por, de todas as decisões que foram sendo emitidas ter resultado a extinção da instância com fundamento na verificação de uma exceção dilatória, relacionada com a (alegada) impossibilidade de impugnar os atos contestados.
E-No que se refere à sentença proferida no âmbito do processo de impugnação judicial n.º 65/03 (1.º ato - IRC 1999) foi objeto de recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul (recurso n.º 06030/12), tendo o processo já transitado em julgado, em maio de 2015, na sequência de Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul.
F-Por sua vez, no âmbito do processo de impugnação judicial n.º 2064/11.2BELRS relativo ao 5.º ato - IRC 1999, a RECORRENTE interpôs recurso da sentença proferida, para o Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito do qual foi proferido o Acórdão ora recorrido, no qual se sustenta que o ato de liquidação contestado (5.º ato - IRC 1999) consubstancia um ato de liquidação corretivo e que, atenta esta natureza, era passível de ser considerado como: "(...) um mero ato de execução, e portanto, inimpugnável.
G-Assim, tendo em consideração a aplicação que foi efetuada da referida disposição processual, resultou uma situação que carece de ser revista para que possa existir uma melhor aplicação do direito, designadamente, a aplicação que permita que nos casos em que existe a emissão sucessiva de atos tributários referentes ao mesmo período tributário, seja assegurado ao sujeito passivo o direito de contestar as correções efetuadas, permitindo, por essa via assegurar, que sem prejuízo das vicissitudes processuais que advenham da contestação de cada um dos atos emitidos, exista uma efetiva tutela jurisdicional, conforme previsto no artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa.
H-Que é o mesmo que dizer que, no caso em que são emitidos, pela Administração tributária, atos subsequentes ao ato originário de liquidação, o contribuinte possa contestar a (i)legalidade, quer do ato originário, quer das correções refletidas nos atos subsequentes, independentemente do entendimento que a Administração tributária ou os Tribunais tenham em cada uma das contestações em relação à impugnabilidade de cada um dos actos de liquidação em virtude da emissão de ato(s) subsequente(s).
I-Neste contexto, dispõe o artigo 285.º, n.º 1 do CPPT que "Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito".
J-Ora, o citado artigo 285.º, n. º 1, do CPPT prevê, como já indicado, que, das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo, apenas poderá haver, excecionalmente, Revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando:
c. esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; ou
d. a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
K-Relativamente ao primeiro requisito - o de estarmos perante uma questão com relevância jurídica -, o mesmo deverá ser apreciado, de acordo com a jurisprudência, não perante o interesse teórico ou académico da questão, mas perante o seu interesse prático e objetivo, medido pela "utilidade da revista em face da capacidade de expansão da controvérsia ou da sua vocação para ultrapassar os limites da situação singular (…) e verificar-se-á tanto em face de questões de direito substantivo como de direito processual, quando apresentem especial ou elevada complexidade" (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo número 0509/12, datado de 11 de julho de 2012).
L-Por seu turno, a relevância social fundamental da questão verificar-se-á quando estiver em causa uma questão que apresente contornos indiciadores de que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto e das partes envolvidas no litígio e se detete um interesse comunitário significativo na resolução da questão (vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo número 01487/12, datado de 17 de janeiro de 2013).
M-Em suma, tanto a importância jurídica da questão, como a sua relevância social têm sido entendidas pela jurisprudência como verificadas sempre que a questão decidenda se revista de uma relevância manifestamente prática, considerando a suscetibilidade de a questão controvertida se expandir para além dos limites da situação singular, independentemente da sua relevância teórica, medida pelo exercício intelectual, mais ou menos complexo, a que a mesma obrigue (vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo número 01108/11, datado de 7 de Março de 2012).
N-Quanto ao segundo requisito - o da necessidade de garantir a melhor aplicação do direito -, a verificação do mesmo resulta da possibilidade de repetição da questão subjacente ao processo noutros casos e da necessidade de garantir a uniformização do direito, estando em causa matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente e/ou contraditória, impondo-se, por esse motivo, a intervenção do órgão de cúpula da justiça - papel assumido, quanto à matéria em causa, pelo Supremo Tribunal Administrativo, no ordenamento jurídico nacional - como condição para dissipar dúvidas e alcançar melhor aplicação das normas jurídicas.
O-Tendo presente o supra exposto, importa, desde logo, notar que a reapreciação do teor do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul configura uma situação que, a título excecional, deverá ser reexaminada, por configurar uma questão que, pela sua relevância jurídica e social, se reveste de importância fundamental.
P-Na verdade, a questão em apreço, referente à impugnabilidade de actos tributários nas situações em que existe a emissão de atos de liquidação sucessivos trata-se de uma questão cuja relevância jurídica e social decorre, em especial, da frequência com a qual estas situações se repetem no ordenamento jurídico, não sendo raras as vezes em que a Administração tributária recorre à emissão de múltiplos atos de liquidação com vista a regular o IRC de um único período tributário, como aliás sucede no caso em apreço.
Q-Atente-se nos casos em que da conjugação dos diferentes meios de reação passiveis de serem adotados pelos sujeitos passivos resulta uma situação em que nenhum dos órgãos decisórios reconhece a impugnabilidade de um dado ato, seja porque considera que o mesmo foi objeto de uma revogação por ato posterior, seja porque entende que sendo um ato sucessivo, a sua impugnabilidade fica prejudicada pela sua (eventual) natureza corretiva.
R-Desse modo, cristalizar na ordem jurídica um entendimento de acordo com o qual a natureza de ato revogatório e sucessivo está, necessariamente correlacionada, com uma natureza corretiva desse ato e, nessa medida, a uma inimpugnabilidade do mesmo, poderá originar, em última instância, uma negação da tutela jurisdicional efetiva.
S-Por outro lado, a reapreciação do teor do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul configura uma situação que, a título excecional, deverá ser reexaminada, também, pela necessidade manifesta de corrigir a aplicação do direito feita quer noutras decisões judicias, quer pela própria Administração tributária.
T-Tal como se deixou demonstrado, os Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Sul, sustentam, que o ato de liquidação de imposto objeto dos autos, o 5.º ato - IRC 1999, é inimpugnável, por, em seu entender, se consubstanciar num mero ato de execução de uma decisão proferida anteriormente.
U-Sendo que, com base neste...

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