Acórdão nº 02052/17.5BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2024-02-07

Data de Julgamento07 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão02052/17.5BELRS
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)

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Processo n.º 2052/17.5BELRS (Recurso Jurisdicional)



Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

“A..., S.A.”, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 06-09-2023, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com o indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra o acto de indeferimento expresso da reclamação apresentada contra os actos de liquidação de taxas pela renovação das licenças de afixação de publicidade em veículos de transporte colectivo, relativas ao ano de 2017, no valor total de € 86.960,51, todos reflectidos na Relação Valorizada n.º ...08, de 01-03-2017.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

i. Vem o presente Recurso interposto da Sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa no processo de impugnação judicial n.º 2052/17.5BELRS, contra a decisão que indeferiu a reclamação graciosa dos atos de liquidação de Taxas de Publicidade em unidades móveis de via pública referentes ao ano de 2017;

ii. Corridos os seus trâmites, foi a ora Recorrente notificada da Sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, Tribunal a quo, a qual julgou a impugnação judicial improcedente e, em consequência, condenou a Recorrente em custas;

iii. Como é balizado pela Sentença recorrida, as duas questões cuja apreciação foi solicitada ao Tribunal Tributário de Lisboa consistiam em saber se a tributação através da Taxa de Publicidade se justifica pelo princípio da sinalagmaticidade inerente a “taxas” e, ainda, se lhe assiste proporcionalidade sob a bilateralidade que subjaz a estas.

iv. O facto tributário discutido nos presentes é a renovação da licença de publicidade da Recorrente para o ano de 2017;

v. A Câmara Municipal de Lisboa fundamentou a liquidação aqui em causa no artigo 20.º do Regulamento de Publicidade;

vi. Conforme já referido na petição inicial, as taxas são receitas públicas estabelecidas como retribuição pelos serviços prestados individualmente aos particulares no exercício de uma atividade pública, como contrapartida da utilização de bens do domínio público ou semipúblico ou da remoção de um limite jurídico à atividade dos particulares;

vii. O caráter bilateral, sinalagmático ou comutativo das taxas implica que a obrigação de pagamento pelo sujeito passivo tenha como pressuposto uma prestação administrativa concreta, específica, determinada ou individualizada, de tal forma que se possa assegurar que o sujeito passivo é o seu efetivo causador ou beneficiário e como finalidade compensar o ente público por essa mesma prestação;

viii. O artigo 36.º, n.º 1 da LGT estabelece que é com o facto tributário que se constitui a relação jurídica tributária (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul no processo n.º 08300/14, de 19 de março de 2015 e ALBERTO XAVIER, Manual de Direito Fiscal, Vol. I, FDL, 1981, pp. 247 e ss.;

ix. A propósito da estrutura da norma tributária, a prestação administrativa consubstancia a previsão (ou pressuposto de facto) por contraposição à estatuição, esta última representada pela obrigação de pagamento da taxa, recaindo sobre a Administração Tributária e, em geral, sobre todas as entidades com poderes tributários o ónus da prova da ocorrência do facto tributário, uma vez que é elemento constitutivo do seu direito de exigir o tributo (cfr. artigo 74.º, n.º 1, 1.ª parte da LGT);

x. No caso específico das taxas de licença, a contraprestação (i.e., o facto tributário, pressuposto ou previsão) consiste no próprio licenciamento, i.e., no ato administrativo que remove o limite ou obstáculo substantivo ao exercício pelo particular de uma determinada atividade;

xi. No entanto, se é inegável a existência de um ato administrativo suscetível de configurar uma contraprestação tributável com uma taxa no momento da emissão da licença, o mesmo não se pode dizer acerca da renovação das licenças, pelo menos no caso da CML;

xii. Com efeito, o artigo 20.º do Regulamento de Publicidade da CML deixa claro que uma vez emitida uma licença com duração igual ou superior a 30 dias a sua renovação no termo do prazo é automática, ou seja, ocorre independentemente de qualquer impulso do particular ou da própria edilidade;

xiii. O que significa que é o próprio Regulamento de Publicidade que estabelece que no ato de renovação da licença a CML não realiza qualquer atividade no sentido de averiguar se as mensagens publicitárias afetam a estética ou ambiente dos lugares ou da paisagem, ou causam danos a terceiros, ou de assegurar que não são afixadas em locais, edifícios ou monumentos de interesse histórico, cultural, arquitetónico ou paisagístico, ou de garantir que não prejudicam a segurança das pessoas e bens, nem a iluminação pública ou a visibilidade de sinais de trânsito, entre outros fatores;

xiv. Ou seja, aquando da renovação das licenças, em causa nos presentes autos, a CML não realiza ao sujeito passivo das taxas (i.e., à ora Recorrente) uma atividade que possa consubstanciar uma prestação individualizada e concreta que sirva de pressuposto ou facto tributário de uma taxa;

xv. O artigo 20.º do Regulamento de Publicidade estabelece, pois, expressamente que a renovação da licença é automática, pelo que não implica a intermediação dos agentes públicos ou a prática de atos administrativos;

xvi. Existe, pois, no momento da renovação apenas uma operação aritmética de apuramento da taxa, sendo que a renovação não é precedida de uma atuação dos agentes camarários destinada a avaliar se cada um dos anúncios publicitários licenciados observa as condições previstas no Código da Publicidade e no regulamento da CML;

xvii. De facto, não há quaisquer indícios de que antes de cada renovação a Recorrida realize diligências com vista a comprovar que os pressupostos existentes à data da emissão da licença inicial se mantêm;

xviii. Ou seja, não existe procedimento administrativo e, por maioria de razão, ato administrativo (cfr. neste sentido também acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo proferido, em 18 de maio de 2015, no processo n.º 01176/04);

xix. Mas mais: não se pode dizer que a renovação automática da licença consubstancia um ato administrativo, pois este, por definição, exprime uma decisão do ente público destinada a produzir efeitos numa situação individual e concreta, contém menções obrigatórias e é devidamente fundamentado, requisitos que não se compaginam com o automatismo das renovações nem com o teor da “Relação Valorizada” (cfr. artigos 148.º, 150.º a 153.º do CPA);

xx. Estamos, na verdade, perante um simples prolongamento de uma situação preexistente sem que o seu conteúdo seja por qualquer meio reapreciado pelo município e dê origem a uma decisão;

xxi. O ato de licenciamento inicial não se repete nem se reforma anualmente, sendo antes um ato único cujos efeitos de protelam indefinidamente no tempo. Ou seja, a ora Recorrida não pratica um novo ato administrativo de licenciamento;

xxii. O que significa que através de um único ato administrativo de licenciamento a autarquia cobra múltiplas vezes a mesma taxa, numa duplicação indevida da tributação que fere o princípio geral de direito conhecido como non bis in idem;

xxiii. Assim, desde já se invoca que o artigo 20.º do RPML padece de inconstitucionalidade orgânica, na interpretação e aplicação feitas pela Sentença recorrida proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, uma vez que o tributo liquidado pela renovação automática de licenciamento da atividade publicitária tem a natureza de um imposto e não de uma taxa, nos termos dos artigos 103.º, n.ºs 2 e 3 e 165.º, nº 1, alínea i) da CRP;

xxiv. No entanto, mesmos admitindo, que o encargo cobrado tenha a natureza de taxa (e não de imposto) - o que aqui se admite, sem conceder, por mera cautela de patrocínio -, então, ao decidir como decidiu, a Sentença recorrida violou o princípio da equivalência, o que também ficou inequivocamente demonstrado através das presentes alegações de recurso;

xxv. Na verdade, o mencionado princípio (contido no artigo 4.º, n.º 1, do RGTAL), determina que a finalidade da taxa cobrada resida na compensação da prestação administrativa efetuada e, por conseguinte, que o seu quantum seja fixado de forma proporcional e adequada a esse fito compensatório (equivalência económica);

xxvi. Ora, inexistindo no caso vertente um ato administrativo ou uma atividade pública efetiva e especificamente direcionada à Recorrente no momento da renovação da licença, que a legislação municipal classifica como automática e sucessiva, não há, por maioria de razão, qualquer custo para o ente público que tenha de ser compensado mediante o pagamento de uma taxa;

xxvii. E mesmo que se aplicasse no caso o chamado princípio do benefício, haveria sempre dificuldade de princípio porque na renovação das licenças de publicidade não se descortina uma prestação administrativa dirigida ao sujeito passivo que constitua o pressuposto de facto da cobrança da taxa;

xxviii. Em virtude do exposto, a taxa liquidada é ilegal na medida em que o seu quantum não tem em vista compensar custos efetivamente provocados pelo sujeito passivo, nem remunerar o valor de uma prestação que lhe é dirigida, o que afronta o princípio da equivalência e a regra contida no n.º 1 do artigo 4.º do RGTAL, expressão do princípio constitucional da igualdade e critério material de repartição dos encargos públicos aplicável às taxas;

xxix. Concluindo-se que a Sentença a quo ofende o princípio da equivalência contido no n.º 1 do artigo 4.º do RGTAL;

xxx. Com vista à suspensão do processo de execução fiscal n.º ...38, a ora Recorrente prestou em 25 de maio de 2017 a garantia bancária n.º...

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