Acórdão nº 02043/20.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 2024-02-22

Data de Julgamento22 Fevereiro 2024
Número Acordão02043/20.9BEPRT
Ano2024
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência os Juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. «AA», devidamente identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida em 04-09-2023 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada improcedente a reclamação que deduziu contra ato praticado pelo Chefe do Serviço de Finanças ... em 7/2/2020, pelo qual foi indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia, no Processo de Execução Fiscal nº ...59.

1.2. O Recorrente terminou as suas alegações formulando as seguintes conclusões sintetizadas:
«1. A Sentença erra no julgamento de factos relevantes para a decisão da causa (desconsideração de prova credível: por testemunha, documentos e acordo) e na interpretação e aplicação do direito.
2. O depoimento de «BB» é credível: o tribunal a quo, em erro, confundiu a [SCom01...] (sociedade relacionada com os presentes autos) com uma outra sociedade onde a testemunha declarou que conheceu o recorrente (nos termos do art. 513.º, n.º 1, do CPC).
3. No contexto da sua atividade profissional, esta testemunha conhece os factos relevantes e as sociedades implicadas neste processo ([SCom01...] e [SCom02...]) – e depôs com rigor e isenção: o seu depoimento devia ter sido considerado pelo Tribunal recorrido e deve sê-lo na revisão da matéria de facto.
Ato reclamando emitido em 2020 com base nos factos relativos a 2018
4. Sendo o segundo ato sobre dispensa de garantia (na sequência de anulação do anterior), em 2020, antes de o emitir, a AT tinha, pelo menos, de conceder prazo (mas não concedeu) para o recorrente apresentar novo pedido (ou atualização do anterior) para atualizar a informação relevante, dado o longo intervalo face ao pedido originário (3/2018).
5. Donde, a Sentença erra, por não ter anulado o ato reclamado, por violação de lei (art. 52.º, n.º 5 e 6, da LGT), por vício de procedimento (art. 170.º do CPPT) e por violação do princípio da Participação do administrado (art. 267.º, n.º 5, da CRP, art. 12.º do CPA, ex vi, art. 2.º al. c), da LGT).
6. A verificação dos pressupostos materiais da dispensa de garantia afere-se perante a realidade factual vigente aquando da emissão do ato reclamado, ou seja, em 2020 e não em 2018 – art. 52.º, n.º 5 e 6, da LGT; e o procedimento (pedido) efetua-se nos 15 dias após a cessação da suspensão da execução fiscal (em 2020, na sequência da anulação do anterior ato) (art. 170.º, n.º 1, do CPPT).
7. In casu, não foi concedida a participação antes da emissão do ato; não se verificam exceções (ou contemporizações) do Princípio da participação do Administrado e o mesmo não foi sanado no decurso do processo.
Omissão do ato reclamado sobre o tema da prescrição
8. A Sentença efetua errada interpretação e aplicação do art. 56.º, n.º 1, da LGT: teria de anular o ato reclamado por violação do princípio da decisão, pois a AT não se pronunciou sobre um dos argumentos com que o recorrente sustentou o pedido de dispensa de garantia (prescrição) – e a AT tem de decidir todos os temas (e argumentos) que lhe são colocados pelos cidadãos.
9. Não está provado que a AT tenha glosado sobre a prescrição na oposição à execução (cfr. factos provados) e o disposto no art. 208.º, n.º 2, do CPPT é diverso do indicado na Sentença recorrida.
Prescrição
10. A sentença procedeu a errada interpretação e aplicação do art. 48.º, n.º 1 e 3, da LGT e dos artigos 89.º, al. a), b) e 90.º, n.º 1, al. b) do CIRC.
11. A obrigação tributária (IRC de 2009 da [SCom02...]) está prescrita em relação ao recorrente (responsável subsidiário): o prazo de 8 anos terminou em 31/12/2017; e o recorrente apenas foi citado, por reversão, em 9/2/2018 [facto provado 3] (art. 48.º, n.º 1, da LGT);
12. Não há causas de suspensão do prazo de prescrição; e as causas de interrupção contra o devedor originário não se aplicam ao recorrente (responsável subsidiário) porque, nos termos do art. 48.º, n.º 3, da LGT, foi citado em 9/2/2018 ou seja após o quinto ano posterior ao da liquidação (art. 89.º, al. a), e 90.º. n.º 1, al. b) e 120.º, do CIRC).
13. A Sentença procede a ilegal interpretação do art. 48.º, n.º 3, da LGT: por argumento literal, teleológico, sistemático e racional, o prazo de 5 anos começa-se a contar da liquidação, voluntária (31/5/2010) ou oficiosa (30/11/2010) (referida no art. 89.º, al. a), e 90.º, n.º 1, al. b) do CIRC) e não, como assume a Sentença, da liquidação adicional (1/2014) indicada no art. 89.º, al. b), do CIRC,.
14. A Sentença efetua a ilegal interpretação e aplicação do art. 45.º, n.º 7, al. a), da LGT: a génese do facto tributário e informação sobre os lucros do IRC de 2009 não se conexiona com o Panamá; e este preceito refere-se à caducidade e, no caso, aborda-se a prescrição da obrigação tributária.
15. O regime da prescrição, incluindo o prazo, cristaliza-se com o facto tributário (8 anos, segundo a lei em vigor a 31/12/2009), sem aplicação de ulteriores regras de aumento de prazo (aos prazos pendentes) [12 anos segundo o art. 45.º, n.º 7, da LGT, que entrou em vigor em 2012 [art. 149.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30/12 e sem disposição transitória]], sob pena de ilegal e inconstitucional retroatividade em termos fiscais do art. 45.º, n.º 7, al. a), da LGT, como concretização do princípio da segurança jurídica e proteção da confiança (art. 103.º, n.º 3, da CRP) em matéria de garantias, como a prescrição, um dos elementos essenciais do imposto (art. 103.º, n.º 2, da CRP).
Pagamento, via RERT III
16. Porque provado e relevante para a decisão da causa (depoimento de «BB») deve-se aditar aos factos provados: “A [SCom01...], SA, empresa da esfera do Reclamante, é um agente de navegação que, através de armadores/transportadores marítimos que agencia, faz transportes marítimos numa linha marítima do norte da Galiza, Leixões, Lisboa e Angola”.
17. Porque provado e relevante para a decisão da causa (depoimento de «BB»), deve-se aditar aos factos provados: “A [SCom01...] era agente de navegação da [SCom02...]: estava encarregue de arrecadar as receitas da [SCom02...] e, deduzidos os custos incorridos por conta desta e a sua própria comissão de agência, em 2009 e 2010, transferiu o (lucro) proveito líquido das viagens marítimas para a [SCom02...], por transferência para conta bancária que a [SCom02...] tinha na Suíça”.
18. Porque provado e relevante para a decisão da causa (facto alegado e documentado [doc. 6 e 7 da PI e aceite pela AT]), deve-se aditar aos factos provados: “A [SCom02...] Inc, sociedade do Panamá, era detida integralmente pelo Reclamante, que era o seu beneficiário efetivo”.
19. Porque provado e relevante para a decisão da causa (doc. 5 a 7 da PI e não contestado pela AT), deve-se aditar aos factos provados: “O Reclamante detinha integralmente, a [SCom03...] Inc, sociedade com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, e era o seu beneficiário efetivo”.
20. Porque provado e relevante para a decisão da causa (doc. 5 e 8, identificadas na declaração do RERT III), deve-se aditar aos factos provados: “Até 2010, o Reclamante transferiu os lucros da [SCom02...] recebidos numa conta bancária na Suíça (Banco 1... (antes Banco 1...)) para contas bancárias da [SCom03...] Inc junto do Banco 2... e do Banco 1..., identificadas na declaração do RERT III”.
21. A Sentença efetuou errada interpretação e aplicação do art. 4.º, n.º 1, al. a), do Regime Excecional de Regularização Tributária (RERT III) – art. 166º da Lei nº 64-B/2011, de 30/12: ao aderir ao RERT III, o recorrente (beneficiário efetivo da [SCom03...] e [SCom02...]) pagou o imposto em relação aos elementos patrimoniais no exterior em 31/12/2010, valores detidos nas contas bancárias do Banco 1... e Banco 2... provenientes da [SCom02...], o que determina a extinção de todas as obrigações tributárias relativas àqueles rendimentos e elementos, até 2010 – logo, está pago o IRC de 2009 da [SCom02...] (dívida deste processo) o que leva à extinção do decorrente processo executivo (e extinção/ inutilidade da presente ação).
22. Os lucros da [SCom02...] (IRC de 2009) foram transferidos para uma conta bancária da [SCom02...] na Suíça, sendo depois transferidos para as duas contas da [SCom03...] no exterior (no Banco 2... e Banco 1...), que corporizam a adesão ao RERT III.
23. A Sentença efetua ilegal interpretação dos artigos. 2.º, n.º 1 do RERT III: o RERT III produz efeitos na [SCom02...], em exceção ao princípio da separação de patrimónios: um terceiro, o beneficiário efetivo, paga os impostos da [SCom02...] (IRC de 2009) e os seus, via esse instituto.
24. Se o beneficiário efetivo (sócio único) pagar o imposto previsto no RERT III, consideram-se pagos todos os impostos associados aos valores das contas bancárias no exterior (incluindo o IRC de 2009 da [SCom02...]); o imposto é liquidado e pago por referência aos elementos patrimoniais no exterior, ligados aos rendimentos que geraram esses elementos (art. 6º da Lei do RERT III).
25. A Sentença erra na análise da prova e é ilegal, por violação do art. 75.º, n.º 1, da LGT, em relação ao ónus da prova, quando refere que das declarações do RERT III e seus anexos não resultaria que os montantes regularizados fossem provenientes da atividade da [SCom02...].
26. Se o recorrente cumprir (como cumpriu) os requisitos legais (materiais e formais) na adesão ao RERT III, presumem-se preenchidos todos os requisitos do RERT III (art. 75º, n.º, 1 da LGT), passando o ónus da prova a competir à AT: que teria de provar (e nada provou) que os valores localizados no estrangeiro em 2010 não se relacionam com os lucros da atividade da [SCom02...].
27. Esta repartição do ónus da prova vai ao encontro da situação factual típica; e não se pode chegar a resultado interpretativo que faça impender sobre o recorrente o ónus da prova...

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